sábado, 27 de julho de 2024

Carlos Wagner: ‘Por que Bolsonaro semeou provas contra o seu governo, como o áudio da Abin paralela?’

Na sua passagem pela Presidência da República (2018 a 2022), Jair Bolsonaro, 69 anos, deixou muitas provas espalhadas por todos os cantos dos seus deslizes fora da lei. Em outros tempos seria difícil encontrá-las. A começar pelo fato de que não era fácil achar uma testemunha e convencê-la a falar. Muito mais complicado era encontrar provas técnicas, como impressões digitais, do suspeito de um crime. Nos dias atuais, o trabalho de descobrir provas foi facilitado pelas novas tecnologias da comunicação, que as registram em áudios, imagens e outras formas de comunicação. Foram justamente essas novas tecnologias que, em 2018, ajudaram a eleger Bolsonaro. E são elas que agora estão mostrando as ilegalidades cometidas pelo ex-presidente. Bolsonaro não se deu conta de que isso aconteceria ou apostou na impunidade e se deu mal? Essa pergunta será respondida pelo tempo. Vamos conversa sobre o assunto.

Bem somados, Bolsonaro responde a mais de 300 processos, inquéritos policiais e outros procedimentos legais. A maioria dos delitos foi documentada em vídeos e áudios. Podia ficar relatando esses casos por intermináveis parágrafos. Mas vou citar só os mais importantes. Em 18 de junho de 2022, ele se reuniu com embaixadores de vários países no Palácio do Planalto para denunciar que as eleições presidenciais seriam fraudadas em favor do seu principal adversário, Luiz Inácio Lula da Silva, 78 anos (PT). As acusações foram feitas sem que fosse apresentada uma prova sequer. O PDT entrou com uma ação na Justiça Eleitoral contra o ex-presidente. Em 30 de junho de 2023, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou o ex-presidente a oito anos de inelegibilidade. No dia 22 de abril de 2020, Bolsonaro reuniu o seu governo para jogar lama no ventilador contra os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e vários dos seus adversários políticos. O vídeo da reunião entrou para a história política brasileira graças à intervenção do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, 49 anos, que aconselhou o governo a acelerar a desestruturação dos órgãos de controle ambiental enquanto a imprensa estava preocupada com os danos causados pela pandemia da Covid. “Vamos aproveitar e passar a boiada”, disse o ex-ministro e atual deputado federal Salles (PL-SP). A invasão dos garimpeiros às áreas indígenas foi uma das consequências da desestruturação da fiscalização ambiental. A fome e a devastação transformaram os índios yanomami em pele e osso. Imagens circularam o mundo e tornaram o ex-presidente “persona não grata” em vários países.

Por último, vou lembrar a joia da coroa. Um áudio de mais de uma hora feito pelo delegado federal e atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), 52 anos, durante uma reunião, em 25 de agosto de 2020, no Palácio do Planalto. Ramagem, que é candidato a prefeito do Rio do Janeiro, era diretor da Abin e estava reunido com duas advogadas, Juliana Bierrenabach e Luciana Pires, que trabalhavam na defesa do filho mais velho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro, 43 anos, no caso das “rachadinhas”. Também participaram do encontro o general reformado Augusto Heleno, então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, e o próprio Bolsonaro. O objetivo era montar uma estratégia usando a máquina do governo federal para desmontar o caso da “rachadinhas”, como ficou conhecido o esquema comandado pelo então chefe de gabinete de Flávio, que na época era deputado estadual do Rio de Janeiro (2015 a 2018), o subtenente reformado da Policial Militar Fabrício Queiroz, 58 anos. Queiroz pegava ilegalmente parte dos salários pagos aos funcionários do gabinete de Flávio. Em 2022, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) mandou arquivar o caso. Que contribuição teve a reunião com Ramagem para o arquivamento? O áudio ajuda na procura por esta resposta.

Este áudio faz parte de uma investigação maior sobre a existência de uma Abin paralela, também conhecida como Abin do Bolsonaro, que tinha como objetivo espionar ilegalmente a vida dos opositores e de pessoas aliadas ao governo suspeitas de traição. O sigilo sobre a gravação foi levantado pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF. Ramagem falou que a gravação foi feita com o consentimento de Bolsonaro. Dificilmente ele falaria qualquer coisa a respeito do assunto que desagradasse o ex-presidente, que é o principal fiador político da sua candidatura a prefeito no Rio de Janeiro. Soma-se a esse fato a enorme quantidade de provas contra si que o ex-presidente deixou semeada. O áudio é mais dessas provas e, por sinal, um assunto muito sério. Tenho escrito desde os primeiros dias em que Bolsonaro começou a cumprir o seu mandato que ele não é um gênio na lida da política. Mas é um cara esperto, que conseguiu sobreviver na disputa política por mais de três décadas como parlamentar, primeiro vereador do Rio e depois deputado federal, sem apresentar nenhum projeto relevante. Ganhou espaço na imprensa defendendo os torturadores do golpe militar (1964 a 1985), como o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (1932-2015). Uma série de fatores, como a prisão de Lula pela Operação Lava Jato, comandada pelo ex-juiz e hoje senador Sergio Moro (União Brasil-PR), à frente da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), foram fundamentais para a eleição de Bolsonaro. Ele soube aproveitar todas as chances que apareceram. Examinei os vídeos e áudios que envolvem o ex-presidente em crimes. Uma coisa me chamou a atenção. Bolsonaro sempre solta uma frase do tipo: “Estou aqui. Mas não estou envolvido”. Dei-me conta de um fato. O ex-presidente transformou todos os rolos dele com a Justiça em capital político. Ao ponto de hoje se manter nas páginas nobres dos jornais mesmo estando fora do poder. Também é dele a frase: “Falem bem ou falem mal. Mas falem de mim”.

<><> PGR nega à defesa de Bolsonaro acesso à delação de Mauro Cid sobre as joias sauditas

A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou, nesta quarta-feira, 24, contrária ao pedido feito pela defesa de Jair Bolsonaro (PL), que solicitava acesso à delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid e a outros documentos ligados à venda de joias sauditas. O caso foi revelado pelo Estadão em 2023.

No documento, o procurador Paulo Gonet explica que a colaboração de Cid vai além das joias e ela pode gerar outros desdobramentos. “Existem outras investigações em curso, ainda não finalizadas, que também se baseiam nas declarações prestadas pelo colaborador, o que reforça a inviabilidade do acesso pretendido neste momento processual”, pontuou em trecho da decisão.

Ele também afirmou que Bolsonaro não possui direito de acessar as informações e que, segundo a legislação, a delação precisa continuar em sigilo até que seja formalizada uma denúncia ou queixa-crime. Ou seja, até que a investigação seja concluída.

“Todos os elementos relevantes para as investigações desenvolvidas nesta Petição já se encontram documentados e foram franqueados à defesa do investigado. Caso exista outra investigação relacionada ao interessado, o pedido de acesso, certamente, será deferido nos autos pertinentes, uma vez demonstrada a condição de investigado”, conclui Gonet.

“Frise-se que o acesso tal como pleiteado há que ser irrestrito, haja vista que o enunciado da súmula vinculante 14 somente excepciona o acesso aos elementos de prova que não tiverem sido documentados em procedimento investigatório, o que não se aplica ao presente caso, haja vista a midiática informação sobre o indiciamento e conclusão da apuração”, diz trecho do documento escrito pelos advogados.

•        Bolsonaro se reuniu ao menos 6 vezes com informante do caso das 'rachadinhas' de Flávio

Um coronel da reserva do Exército, que se encontrou ao menos seis vezes com Jair Bolsonaro (PL) nos palácios do Planalto e da Alvorada em 2019, é apontado como o informante mencionado pelo ex-mandatário na reunião sobre as "rachadinhas" envolvendo Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Este dado foi revelado à Folha de S. Paulo por pessoas próximas ao caso.

Na última segunda-feira (15), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirou o sigilo do áudio de uma reunião de agosto de 2020, na qual Bolsonaro discutiu estratégias para usar a máquina pública federal na tentativa de anular a investigação contra seu filho mais velho.

Durante a reunião, Bolsonaro comprometeu-se a dialogar com os chefes da Receita Federal e do Serpro para buscar provas de que Flávio Bolsonaro teria tido seus dados acessados ilegalmente no início da investigação. Além de Bolsonaro, participaram do encontro o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, o então diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem (PL), e as advogadas de Flávio, Luciana Pires e Juliana Bierrenbach.

Logo no início da reunião de 25 de agosto de 2020, Bolsonaro referiu-se a um "coronel do Exército" como sua fonte de informações, mencionando ironicamente que deveria "ter trocado pelo serviço secreto russo". Quando questionado sobre o nome, Heleno indicou "Magela", que seria um codinome para Carlos Alberto Pereira Leonel Marsiglia.

A agenda pública de Bolsonaro revela que ele se reuniu com Marsiglia seis vezes no primeiro semestre de 2019, em encontros nos palácios do Planalto e da Alvorada, a maioria deles a sós. O primeiro encontro ocorreu em 28 de março, e o último, em 23 de maio. Apenas em uma reunião, em 22 de maio, outros ministros participaram.

Marsiglia, que estava na reserva do Exército desde 2013 e não ocupava cargo público, é irmão de um auditor da Receita Federal do Rio de Janeiro, envolvido em um litígio com o órgão e cujo caso era usado pela defesa de Flávio para alegar acesso ilegal aos dados fiscais. Ao todo, cinco auditores fiscais do Rio estavam sob suspeita de enriquecimento ilícito, mas alegavam ser vítimas de perseguição interna.

No segundo semestre de 2020, a defesa de Flávio usou esses casos para acionar órgãos federais, como a Presidência, o GSI, a Abin, e a Procuradoria-Geral da República (PGR), alegando que escritórios da Receita no Rio poderiam ter acessado ilegalmente os dados fiscais de Flávio, originando a investigação do Coaf em 2018.

A defesa de Flávio buscou no governo federal provas para anular as apurações, mas a Receita concluiu pela improcedência das alegações. O caso das "rachadinhas" foi revertido por outras razões em 2021, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou as decisões da primeira instância, argumentando que o juiz Flávio Itabaiana não tinha jurisdição para investigar Flávio Bolsonaro.

O uso da máquina pública em favor de Flávio integra uma investigação da Polícia Federal sobre a existência de uma "Abin paralela" que teria espionado adversários políticos, jornalistas e magistrados durante a gestão de Bolsonaro.

•        Bolsonaro diz que espera recuperar seus direitos políticos e disputar eleição presidencial de 2026

Em uma entrevista por telefone à coluna de Guilherme Amado, realizada nesta quinta-feira (25/7) em Caxias do Sul, RS, o ex-presidente Jair Bolsonaro deixou claro que não pretende transferir seu capital político a outros nomes da extrema-direita e disse que seu projeto é recuperar seus direitos políticos. “Se eu puder me candidatar, eu ganho, tenho certeza disso”, afirmou Jair Bolsonaro.

Alvo de diversos processos, o líder da extrema-direita brasileira tentou pacificar sua relação com o Supremo Tribunal Federal e disse que não menciona ministros da corte em seus discursos, centrando suas críticas no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Bolsonaro, que enfrenta inquéritos relacionados à fraude do cartão de vacina e à suposta apropriação indevida de presentes de luxo sob investigação da Polícia Federal, enfatizou sua distância dos ataques diretos ao tribunal. “Não defendo prisão de Alexandre de Moraes. Nem toco no assunto. Você não vê a palavra ‘Supremo’ na minha boca em nenhuma dessas minhas andanças. Não bato em [Rodrigo] Pacheco, [Arthur] Lira, no STF. Só bato no Lula”, afirmou.

Mais cedo, antes da entrevista ao jornalista, ele insinuou que poderia ser alvo de um suposto atentado. “Vocês estão acompanhando nas redes sociais o que aconteceu naquela tentativa de assassinato de Donald Trump. O Serviço Secreto foi negligente. Quando eu retornei ao Brasil, pela Presidência tinha direito a dois carros blindados, e Lula pessoalmente me retirou esses dois carros blindados. Eu tenho direito a oito funcionários. Os quatro que trabalhavam na minha segurança, por medidas cautelares, me tiraram. Até mesmo meu filho, o 02 [Carlos Bolsonaro], teve seu porte de arma negado pela Polícia Federal. Eles querem facilitar. Eles não querem mais me prender. Eles querem que eu seja executado. Não posso pensar em outra coisa”, afirmou.

 

Fonte: Observatório da Imprensa/Brasil 247

 

Nenhum comentário: