Carlos Wagner: ‘Por que Bolsonaro semeou
provas contra o seu governo, como o áudio da Abin paralela?’
Na sua passagem pela
Presidência da República (2018 a 2022), Jair Bolsonaro, 69 anos, deixou muitas
provas espalhadas por todos os cantos dos seus deslizes fora da lei. Em outros
tempos seria difícil encontrá-las. A começar pelo fato de que não era fácil
achar uma testemunha e convencê-la a falar. Muito mais complicado era encontrar
provas técnicas, como impressões digitais, do suspeito de um crime. Nos dias
atuais, o trabalho de descobrir provas foi facilitado pelas novas tecnologias
da comunicação, que as registram em áudios, imagens e outras formas de
comunicação. Foram justamente essas novas tecnologias que, em 2018, ajudaram a
eleger Bolsonaro. E são elas que agora estão mostrando as ilegalidades
cometidas pelo ex-presidente. Bolsonaro não se deu conta de que isso
aconteceria ou apostou na impunidade e se deu mal? Essa pergunta será
respondida pelo tempo. Vamos conversa sobre o assunto.
Bem somados, Bolsonaro
responde a mais de 300 processos, inquéritos policiais e outros procedimentos
legais. A maioria dos delitos foi documentada em vídeos e áudios. Podia ficar
relatando esses casos por intermináveis parágrafos. Mas vou citar só os mais
importantes. Em 18 de junho de 2022, ele se reuniu com embaixadores de vários
países no Palácio do Planalto para denunciar que as eleições presidenciais
seriam fraudadas em favor do seu principal adversário, Luiz Inácio Lula da
Silva, 78 anos (PT). As acusações foram feitas sem que fosse apresentada uma
prova sequer. O PDT entrou com uma ação na Justiça Eleitoral contra o
ex-presidente. Em 30 de junho de 2023, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
condenou o ex-presidente a oito anos de inelegibilidade. No dia 22 de abril de
2020, Bolsonaro reuniu o seu governo para jogar lama no ventilador contra os
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a Agência Brasileira de
Inteligência (Abin) e vários dos seus adversários políticos. O vídeo da reunião
entrou para a história política brasileira graças à intervenção do então
ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, 49 anos, que aconselhou o governo a
acelerar a desestruturação dos órgãos de controle ambiental enquanto a imprensa
estava preocupada com os danos causados pela pandemia da Covid. “Vamos
aproveitar e passar a boiada”, disse o ex-ministro e atual deputado federal
Salles (PL-SP). A invasão dos garimpeiros às áreas indígenas foi uma das
consequências da desestruturação da fiscalização ambiental. A fome e a devastação
transformaram os índios yanomami em pele e osso. Imagens circularam o mundo e
tornaram o ex-presidente “persona não grata” em vários países.
Por último, vou
lembrar a joia da coroa. Um áudio de mais de uma hora feito pelo delegado
federal e atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), 52 anos, durante
uma reunião, em 25 de agosto de 2020, no Palácio do Planalto. Ramagem, que é
candidato a prefeito do Rio do Janeiro, era diretor da Abin e estava reunido
com duas advogadas, Juliana Bierrenabach e Luciana Pires, que trabalhavam na
defesa do filho mais velho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro, 43
anos, no caso das “rachadinhas”. Também participaram do encontro o general
reformado Augusto Heleno, então ministro-chefe do Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência da República, e o próprio Bolsonaro. O objetivo
era montar uma estratégia usando a máquina do governo federal para desmontar o
caso da “rachadinhas”, como ficou conhecido o esquema comandado pelo então
chefe de gabinete de Flávio, que na época era deputado estadual do Rio de
Janeiro (2015 a 2018), o subtenente reformado da Policial Militar Fabrício
Queiroz, 58 anos. Queiroz pegava ilegalmente parte dos salários pagos aos
funcionários do gabinete de Flávio. Em 2022, o Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro (TJRJ) mandou arquivar o caso. Que contribuição teve a reunião com
Ramagem para o arquivamento? O áudio ajuda na procura por esta resposta.
Este áudio faz parte
de uma investigação maior sobre a existência de uma Abin paralela, também
conhecida como Abin do Bolsonaro, que tinha como objetivo espionar ilegalmente
a vida dos opositores e de pessoas aliadas ao governo suspeitas de traição. O
sigilo sobre a gravação foi levantado pelo ministro Alexandre de Moraes, do
STF. Ramagem falou que a gravação foi feita com o consentimento de Bolsonaro.
Dificilmente ele falaria qualquer coisa a respeito do assunto que desagradasse
o ex-presidente, que é o principal fiador político da sua candidatura a
prefeito no Rio de Janeiro. Soma-se a esse fato a enorme quantidade de provas
contra si que o ex-presidente deixou semeada. O áudio é mais dessas provas e,
por sinal, um assunto muito sério. Tenho escrito desde os primeiros dias em que
Bolsonaro começou a cumprir o seu mandato que ele não é um gênio na lida da
política. Mas é um cara esperto, que conseguiu sobreviver na disputa política
por mais de três décadas como parlamentar, primeiro vereador do Rio e depois deputado
federal, sem apresentar nenhum projeto relevante. Ganhou espaço na imprensa
defendendo os torturadores do golpe militar (1964 a 1985), como o coronel
Carlos Alberto Brilhante Ustra (1932-2015). Uma série de fatores, como a prisão
de Lula pela Operação Lava Jato, comandada pelo ex-juiz e hoje senador Sergio
Moro (União Brasil-PR), à frente da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), foram
fundamentais para a eleição de Bolsonaro. Ele soube aproveitar todas as chances
que apareceram. Examinei os vídeos e áudios que envolvem o ex-presidente em
crimes. Uma coisa me chamou a atenção. Bolsonaro sempre solta uma frase do
tipo: “Estou aqui. Mas não estou envolvido”. Dei-me conta de um fato. O
ex-presidente transformou todos os rolos dele com a Justiça em capital
político. Ao ponto de hoje se manter nas páginas nobres dos jornais mesmo
estando fora do poder. Também é dele a frase: “Falem bem ou falem mal. Mas
falem de mim”.
<><> PGR
nega à defesa de Bolsonaro acesso à delação de Mauro Cid sobre as joias
sauditas
A Procuradoria-Geral
da República (PGR) se manifestou, nesta quarta-feira, 24, contrária ao pedido
feito pela defesa de Jair Bolsonaro (PL), que solicitava acesso à delação
premiada do tenente-coronel Mauro Cid e a outros documentos ligados à venda de
joias sauditas. O caso foi revelado pelo Estadão em 2023.
No documento, o
procurador Paulo Gonet explica que a colaboração de Cid vai além das joias e
ela pode gerar outros desdobramentos. “Existem outras investigações em curso,
ainda não finalizadas, que também se baseiam nas declarações prestadas pelo
colaborador, o que reforça a inviabilidade do acesso pretendido neste momento
processual”, pontuou em trecho da decisão.
Ele também afirmou que
Bolsonaro não possui direito de acessar as informações e que, segundo a
legislação, a delação precisa continuar em sigilo até que seja formalizada uma
denúncia ou queixa-crime. Ou seja, até que a investigação seja concluída.
“Todos os elementos
relevantes para as investigações desenvolvidas nesta Petição já se encontram
documentados e foram franqueados à defesa do investigado. Caso exista outra
investigação relacionada ao interessado, o pedido de acesso, certamente, será
deferido nos autos pertinentes, uma vez demonstrada a condição de investigado”,
conclui Gonet.
“Frise-se que o acesso
tal como pleiteado há que ser irrestrito, haja vista que o enunciado da súmula
vinculante 14 somente excepciona o acesso aos elementos de prova que não
tiverem sido documentados em procedimento investigatório, o que não se aplica ao
presente caso, haja vista a midiática informação sobre o indiciamento e
conclusão da apuração”, diz trecho do documento escrito pelos advogados.
• Bolsonaro se reuniu ao menos 6 vezes com
informante do caso das 'rachadinhas' de Flávio
Um coronel da reserva
do Exército, que se encontrou ao menos seis vezes com Jair Bolsonaro (PL) nos
palácios do Planalto e da Alvorada em 2019, é apontado como o informante
mencionado pelo ex-mandatário na reunião sobre as "rachadinhas"
envolvendo Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Este dado foi revelado à Folha de S. Paulo
por pessoas próximas ao caso.
Na última
segunda-feira (15), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal
(STF), retirou o sigilo do áudio de uma reunião de agosto de 2020, na qual
Bolsonaro discutiu estratégias para usar a máquina pública federal na tentativa
de anular a investigação contra seu filho mais velho.
Durante a reunião,
Bolsonaro comprometeu-se a dialogar com os chefes da Receita Federal e do
Serpro para buscar provas de que Flávio Bolsonaro teria tido seus dados
acessados ilegalmente no início da investigação. Além de Bolsonaro,
participaram do encontro o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI),
Augusto Heleno, o então diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência
(Abin), Alexandre Ramagem (PL), e as advogadas de Flávio, Luciana Pires e
Juliana Bierrenbach.
Logo no início da
reunião de 25 de agosto de 2020, Bolsonaro referiu-se a um "coronel do
Exército" como sua fonte de informações, mencionando ironicamente que
deveria "ter trocado pelo serviço secreto russo". Quando questionado
sobre o nome, Heleno indicou "Magela", que seria um codinome para
Carlos Alberto Pereira Leonel Marsiglia.
A agenda pública de
Bolsonaro revela que ele se reuniu com Marsiglia seis vezes no primeiro
semestre de 2019, em encontros nos palácios do Planalto e da Alvorada, a
maioria deles a sós. O primeiro encontro ocorreu em 28 de março, e o último, em
23 de maio. Apenas em uma reunião, em 22 de maio, outros ministros
participaram.
Marsiglia, que estava
na reserva do Exército desde 2013 e não ocupava cargo público, é irmão de um
auditor da Receita Federal do Rio de Janeiro, envolvido em um litígio com o
órgão e cujo caso era usado pela defesa de Flávio para alegar acesso ilegal aos
dados fiscais. Ao todo, cinco auditores fiscais do Rio estavam sob suspeita de
enriquecimento ilícito, mas alegavam ser vítimas de perseguição interna.
No segundo semestre de
2020, a defesa de Flávio usou esses casos para acionar órgãos federais, como a
Presidência, o GSI, a Abin, e a Procuradoria-Geral da República (PGR), alegando
que escritórios da Receita no Rio poderiam ter acessado ilegalmente os dados
fiscais de Flávio, originando a investigação do Coaf em 2018.
A defesa de Flávio
buscou no governo federal provas para anular as apurações, mas a Receita
concluiu pela improcedência das alegações. O caso das "rachadinhas"
foi revertido por outras razões em 2021, quando o Superior Tribunal de Justiça
(STJ) anulou as decisões da primeira instância, argumentando que o juiz Flávio
Itabaiana não tinha jurisdição para investigar Flávio Bolsonaro.
O uso da máquina
pública em favor de Flávio integra uma investigação da Polícia Federal sobre a
existência de uma "Abin paralela" que teria espionado adversários
políticos, jornalistas e magistrados durante a gestão de Bolsonaro.
• Bolsonaro diz que espera recuperar seus
direitos políticos e disputar eleição presidencial de 2026
Em uma entrevista por
telefone à coluna de Guilherme Amado, realizada nesta quinta-feira (25/7) em
Caxias do Sul, RS, o ex-presidente Jair Bolsonaro deixou claro que não pretende
transferir seu capital político a outros nomes da extrema-direita e disse que
seu projeto é recuperar seus direitos políticos. “Se eu puder me candidatar, eu
ganho, tenho certeza disso”, afirmou Jair Bolsonaro.
Alvo de diversos
processos, o líder da extrema-direita brasileira tentou pacificar sua relação
com o Supremo Tribunal Federal e disse que não menciona ministros da corte em
seus discursos, centrando suas críticas no governo do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Bolsonaro, que enfrenta inquéritos relacionados à fraude do
cartão de vacina e à suposta apropriação indevida de presentes de luxo sob
investigação da Polícia Federal, enfatizou sua distância dos ataques diretos ao
tribunal. “Não defendo prisão de Alexandre de Moraes. Nem toco no assunto. Você
não vê a palavra ‘Supremo’ na minha boca em nenhuma dessas minhas andanças. Não
bato em [Rodrigo] Pacheco, [Arthur] Lira, no STF. Só bato no Lula”, afirmou.
Mais cedo, antes da
entrevista ao jornalista, ele insinuou que poderia ser alvo de um suposto
atentado. “Vocês estão acompanhando nas redes sociais o que aconteceu naquela
tentativa de assassinato de Donald Trump. O Serviço Secreto foi negligente.
Quando eu retornei ao Brasil, pela Presidência tinha direito a dois carros
blindados, e Lula pessoalmente me retirou esses dois carros blindados. Eu tenho
direito a oito funcionários. Os quatro que trabalhavam na minha segurança, por
medidas cautelares, me tiraram. Até mesmo meu filho, o 02 [Carlos Bolsonaro],
teve seu porte de arma negado pela Polícia Federal. Eles querem facilitar. Eles
não querem mais me prender. Eles querem que eu seja executado. Não posso pensar
em outra coisa”, afirmou.
Fonte: Observatório da
Imprensa/Brasil 247
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