terça-feira, 2 de julho de 2024

AGU conclui que programa de escolas cívico-militares de Tarcísio de Freitas é inconstitucional

A Advocacia-Geral da União (AGU) concluiu que o programa de escolas cívico-militares do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), é inconstitucional, em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF) na sexta-feira (28). 

O documento foi enviado a pedido do ministro Gilmar Mendes, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7662, protocolada pelo Psol. O partido questiona a implementação do modelo híbrido de educação, sancionado pelo governador em 27 de maio. 

Para Flavio José Roman, Advogado-Geral da União substituto, o programa vai contra a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que orienta o ensino nos âmbitos municipal, estadual e federal. 

"Ao analisar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e a Lei que instituiu o Plano Nacional de Educação 2014-2024, constata-se a ausência de qualquer menção ou estratégia que inclua a polícia militar como participante dos esforços de política educacional na educação básica regular", afirmou o advogado-geral. 

A manifestação se soma a uma representação do Ministério Público Federal (MPF) enviada ao procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, sobre a inconstitucionalidade do programa.  

No ofício, o procurador federal Nicolao Dino afirmou que cabe somente à União legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional e que a seleção de militares para funções de cunho pedagógico viola o princípio constitucional de valorização dos profissionais de educação. Também defendeu que não há estudos científicos suficientes que atestem que o modelo cívico-militar impacta na melhoria da qualidade do ensino. 

Os mesmos argumentos são utilizados pela ação protocolada pelo Psol. Na ADI, a sigla afirma que o programa “viola frontalmente normas constitucionais, especialmente aquelas que determinam a competência privativa da União para legislar sobre educação”. 

“Fato é que a educação civil deve seguir sendo a base estrutural sobre a qual todo o edifício republicano brasileiro se erige, de modo que a alteração dessa estrutura fundamental pode fazer ruir, caso não combatida, a nossa democracia, na medida em que a militarização das escolas públicas representa verdadeira antítese institucional do espírito republicano e democrático que alicerçou a Constituição Federal de 1988”, argumentou também a legenda. 

Além da manifestação da AGU, o rito processual demanda a manifestação do governo de São Paulo e de um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR). Somente depois a ação será analisada pelo Plenário do STF. 

¨      Onze dos 25 secretários de Tarcísio acumulam cargos em conselhos de estatais e incham salários

Levantamento feito pelo Brasil de Fato mostra que onze dos 25 secretários do governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) foram nomeados para cargos em conselhos de estatais. Em alguns casos, a remuneração total ultrapassa o teto salarial do funcionalismo no estado de São Paulo, que atualmente é de R$ 44 mil. Esse valor determina o limite salarial para uma função, mas não há ilegalidade caso o montante seja ultrapassado com acúmulo de cargos.

Três secretários de Tarcísio recebem mais do que o teto. Arthur Lima, chefe da Casa Civil, recebe dos cofres paulistas, todo mês, R$ 50.890,96. Além do salário de secretário, ele é conselheiro de duas estatais, a Companhia Paulista de Parcerias (CPP) e a Companhia das Docas, onde recebe R$ 9.872,69 em cada uma.

Guilherme Afif Domingos, secretário de Projetos Estratégicos, também ultrapassa o teto com cargos em conselhos, com R$ 50.890,96 de salário dividido em três funções. Além do saldo que recebe para chefiar a pasta, ele é conselheiro da Companhia Paulista de Securitização (CPSEC) e da CPP. Em ambas, recebe R$ 9.872,69.

O secretário de Segurança Pública de São Paulo (SSP), Guilherme Derrite, abriu mão de seu salário à frente da pasta. Ele não poderia acumulá-lo com os R$ 44 mil que recebe da Câmara dos Deputados, pois é deputado federal licenciado. Somado a esse valor, ele também ganha R$ 9.663 da Polícia Militar, R$ 5.667,80 como conselheiro do Metrô e R$ 6.581 por integrar o conselho da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). No total, sua a conta bancária recebe R$ 66 mil dos cofres públicos, todo mês.

Clóvis Bueno de Azevedo, chefe do departamento de Gestão Pública da Faculdade Getúlio Vargas (FGV), explica que não há ilegalidade no acúmulo de funções com superação do teto do funcionalismo. Ele afirma, no entanto, que há outros fatores que devem ser avaliados. "Não é ilegal, mas eu entendo ser imoral, até porque muitas vezes nem sequer, ainda que participem de reuniões de conselho, exercem efetivamente a função de aconselhamento", acredita.

Ao lado de Derrite, Wagner de Campos Rosário, que chefia a Controladoria Geral do Estado (CGE), que tem status de secretaria, é quem mais acumula cargos em conselhos de empresas estatais, três no total. Além do salário como controlador, R$ 11.705,96, ele soma outros valores em seu holerite, por estar nos conselhos da Cetesb, da Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo (Prodesp) e do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), onde recebe R$ 2.193,93, R$ 6.581,79 e R$ 6.581,79, respectivamente, totalizando R$ 27.063,47 mensais.

Com dois cargos, além do comando das secretarias, estão Andrezza Rosalém Vieira, que chefia a pasta de Desenvolvimento Social, e Natália Resende, secretária do Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, que recebem, ao todo, R$ 39.799,30 e R$ 43.599,58, respectivamente.

Por integrar o conselho da Companhia das Docas, Rosalém Vieira recebe R$ 2.632,72. A secretária de Desenvolvimento Social também é conselheira do CPSEC, onde mensalmente ganha mais R$ 6.051,00 dos cofres paulistas.

Já Natália Resende, secretária do Meio Ambiente e responsável pelo plano de privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), acumula os salários de cabo da Polícia Militar, R$ 5.902, e de conselheira justamente da Sabesp, onde ganha R$ 6.582,00.

Lais Vita, secretária de Comunicação do governo paulista, é também conselheira da Companhia das Docas, onde ganha R$ 9.872,69. Apesar de ocupar o mesmo cargo na mesma estatal, Marilia Marton, chefe da pasta de Cultura, recebe menos, R$ 6.581,79. Ao todo, seus vencimentos somam R$ 40.988,27 e R$ 37.697,37, respectivamente.

Por fim, os secretários Rafael Benini, de Parcerias e Investimentos, Jorge Lima, de Desenvolvimento Econômico, e Marco Antonio Assalve, de Transportes Metropolitanos, que recebem dos cofres públicos exatamente os mesmos R$ R$ 40.988,27 todo mês. 

Além de secretário do governo de Freitas, Benini é também conselheiro do CPP, onde recebe R$ R$ 9.872,69, mesmo valor que Lima e Assalve ganham no conselho do CPSEC.

Outro lado

Em nota, o governo de São Paulo informou que "as nomeações são realizadas de acordo com a legislação vigente" e que "os conselheiros são, sem exceção, profissionais com vasta experiência nos setores público e privado. Dentre suas atribuições nos conselhos estão a formulação de estratégias para as empresas e auxílio na tomada de decisões."

O Palácio dos Bandeirantes explicou que "sobre o teto remuneratório do funcionalismo estadual, há reiteradas manifestações da Procuradoria Geral do Estado, Tribunal de Contas do Estado e Supremo Tribunal Federal de que o valor pago por participação em conselhos não é considerado como salário, e sim verba de representação. Não há nada de ilegal, portanto."

¨      Privatização da Sabesp: governo Tarcísio vende ações 44% abaixo do valor real da empresa

Um estudo sobre os critérios adotados pelo governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos), para estabelecer o valor das ações da Sabesp foi divulgado pelo Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema), nesta quinta-feira (27).

O documento é assinado por especialistas do setor e tem como principal coordenador o economista André Locatelli. No texto, o Sintaema afirma que o valor justo a ser recebido por cada ação da Sabesp seria de R$ 103,90. O governo de Freitas fixou o preço em R$ 72.

Na apresentação do documento à imprensa, Locatelli afirmou que a Sabesp tem um fluxo de caixa de R$ 90,5 bilhões. Desse total, foi descontado a quantia da dívida da empresa, R$ 19,5 bilhões, para estimar o valor da empresa: R$ 71 bilhões. O valor da empresa dividido pela quantidade de ações que serão disponibilizadas, 683 milhões de papéis, resulta no valor unitário de R$ 103,90.

“Não houve debate regulatório e por isso é importante a intermediação do poder judiciário para que haja debate esclarecedor e profissional”, afirmou o advogado Rubens Naves, que participou da elaboração do estudo.

José Antônio Faggian, presidente do Sintaema, criticou a oferta de ações da empresa abaixo do valor e reafirmou a importância da Sabesp e do conjunto de trabalhadores que atuam na empresa.

“A Sabesp é a maior empresa de saneamento da América Latina e a maior do mundo. Nossa capacidade de atuação foi comprovada recentemente na catástrofe do Rio Grande do Sul e no litoral norte, quando a Sabesp conseguiu, rapidamente, reestabelecer o fornecimento de água”, finalizou.

O documento elaborado pelo Sintaema será protocolado no Tribunal de Contas do Estado (TCE) na próxima segunda-feira (27), em São Paulo.

 

¨      Democracias nas mãos de governantes ineptos funcionam muito precariamente. Por Marcus André Melo

Para Giovanni Sartori (1924-2017), a democracia consiste em um maquinismo e um conjunto de maquinistas que têm que pôr a máquina para funcionar. Mas quando nos queixamos da democracia e denunciamos sua crise geralmente focamos o maquinismo e esquecemos os operadores. Ou atacamos os maquinistas e esquecemos o maquinário.

O maquinismo é a estrutura constitucional do país. Embora defenda que o maquinário das democracias atuais é “decente”, embora esteja “caindo frequentemente nas mãos de mecânicos ineptos”.

Sartori é cáustico em relação a nossa Constituição, que é repleta de “dispositivos quase suicidas” e “promessas irrealizáveis”. (Sim, a carta de 1988 continha um dos mais bizarros dispositivos já incorporados a uma constituição: o tabelamento da taxa de juros).

3Mas o núcleo duro do nosso maquinário é o presidencialismo de coalizão com um Poder Executivo constitucionalmente forte, e com forte delegação de poderes ao Judiciário e Ministério Público. Não tenho dúvidas que o nosso maquinário é “decente”: na realidade, o presidencialismo multipartidário é a forma modal de sistema de governo no mundo atualmente.

Ele produz, sob certa condições, governabilidade e bom governo. Os múltiplos pontos de veto garantem inclusividade —muitos atores participam dos processos decisórios— e certa irreversibilidade quando as decisões são tomadas (deixemos de lado por um momento a imprevisibilidade criada pelo STF). O sistema se move de forma lenta e ineficiente. Como um transatlântico. Mas por isso mesmo não permite transformações radicais, como aconteceu sob Bolsonaro.

O risco de imobilismo é perene, sim. As democracias sempre produzem bom governo em um sentido negativo porque impedem a tirania. Mas não são sinônimos de bom governo.

As escolhas coletivas sob a democracia podem produzir resultados pífios. Mas há um mecanismo que potencialmente pode permitir correção de rumos —eleições novas—, e alternância de poder; (mecanismo que sob o parlamentarismo quando não temos mandatos fixos para o Executivo é eficiente).

Como já discuti neste espaço, o mal governo pode resultar também de crenças tecnicamente infundadas que produzem resultados pífios nas políticas públicas.

A máquina também exige um operador eficiente, como insiste Sartori. Para forjar consensos e maiorias. Aí está o nosso principal desafio: não temos tido operadores que combinem capacidade de forjar coalizões efetivas, crenças tecnicamente fundadas, e apoio popular. Ausência de confrontos institucionais paralisantes, portanto, governabilidade não equivale a bom governo.

 

Fonte: Brasil de Fato/Folha

 

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