Florestas urbanas podem ser solução para combater ondas de calor em
grandes cidades?
O Brasil não é o único país a sofrer com ondas de
calor
Devido às mudanças climáticas, a temperatura global
vem subindo gradativamente, e o impacto é sentido de diferentes formas em todo
o mundo.
A situação tende a ser pior nas grandes cidades,
onde a imensidão de concreto e a falta de áreas verdes contribuem para uma
sensação térmica acima da que os termômetros apontam.
Algumas iniciativas, no entanto, vêm sendo
implementadas para tentar contornar tal problema, que afeta a saúde de todos: o
calor intenso pode causar exaustão, dificuldades respiratórias e insolação.
Um exemplo é Karachi, no Paquistão, a maior cidade
do Paquistão.
Em 2015, uma onda de calor elevou as temperaturas a
45 °C e 1,2 mil pessoas morreram.
Muitos procuraram combater o calor com
ar-condicionado.
Mas, em um país extremamente desigual como o
Paquistão, o acesso ao equipamento continua sendo um luxo para a imensa maioria
da população.
Além disso, não é ecossustentável.
O ar-condicionado usa combustíveis fósseis, que
liberam gases de efeito estufa, o que, por sua vez, contribui ainda mais para o
aquecimento global.
Mas um homem optou por outra solução: plantar
florestas urbanas.
"Cinco anos atrás, Karachi acabara de passar
por uma onda de calor. Sonhei que poderíamos mudar o destino da cidade",
disse o empreendedor Shahzad Qureshi à BBC em 2021.
Qureshi usou financiamento coletivo para criar a
primeira "floresta urbana" de Karachi, no parque público de Clifton,
em 2016.
O local foi projetado por um arquiteto paisagista
alemão, tendo em mente a sustentabilidade a longo prazo e o máximo de
benefícios para a comunidade.
Na floresta urbana de Clifton, é possível ouvir o
barulho dos pássaros entre as árvores onde antes havia uma montanha de lixo.
"Começamos a pensar que deveríamos fazer 25
parques como esse na cidade", disse ele.
"Nasci e cresci aqui. Jogava críquete nas
ruas. Hoje, vemos a cidade se deteriorar diante dos nossos olhos. Daqui a
alguns anos, ela vai se tornar inabitável se não fizermos nada", alertou
ele.
Desde então, a ONG de Qureshi criou oito pequenas
florestas em Karachi e duas em Lahore usando o método Miyawaki.
Batizado em homenagem ao botânico japonês Akira
Miyawaki, o método envolve a preparação cuidadosa do solo e o plantio denso de
uma variedade de plantas florestais nativas benéficas para a vida selvagem em
uma área geralmente do tamanho de uma quadra de tênis.
Mais de 9 mil pessoas plantaram mudas no parque público
de Clifton e mais de 30 escolas participaram de uma viagem educacional para
aprender sobre as espécies nativas.
Agora, Qureshi planeja expandir o conceito por todo
o Paquistão, convertendo a maior parte dos parques em florestas.
Entre os objetivos, segundo ele, estão reverter as
crescentes "ilhas de calor", que são geradas quando a cobertura
natural do solo é substituída por superfícies que absorvem e retêm calor, como
pavimentos e edifícios, e a escassez de água.
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O que diz a ciência
Estudos mostram que florestas urbanas podem reduzir
significativamente as temperaturas das cidades.
Áreas com floresta ou cobertura hídrica significam
temperaturas mais frias, até 12°C em algumas regiões.
As árvores também absorvem CO2, mitigando as
alterações climáticas.
Em um estudo no ano passado, cientistas de Pequim
usaram dados provenientes de mapas de calor via satélite para investigar os
efeitos dos parques urbanos.
Eles concluíram que os parques aquecem mais
lentamente do que as regiões urbanas durante o dia e que os espaços públicos
verdes que contém água têm um melhor efeito de arrefecimento tanto no interior
do parque como na área ao redor.
Pesquisadores brasileiros chegaram a
conclusão semelhante ao analisar a influência das florestas
urbanas na variação "termo-higrométrica" da área intraurbana da
cidade de Curitiba.
Anomalias termo-higrométricas são alterações que
ocorrem na umidade e na temperatura e são oriundas do aquecimento diferenciado
das diferentes características do ambiente urbano.
Eles constataram que as regiões da cidade "com
maior quantidade de áreas permeáveis, concentração de remanescentes florestais
ou espaços verdes públicos apresentaram menores temperaturas e aumento da
umidade relativa do ar".
Outro estudo, realizado pela Faculdade de Medicina
da USP (FMUSP) em 2021 e publicado na prestigiada revista científica Journal
of Exposure Science & Environmental Epidemiology, tratou da cobertura
verde na região metropolitana de São Paulo.
"Nós vimos que pessoas que moram em áreas mais
periféricas [bordas da cidade] convivem com 80% de verde ao redor da
residência, enquanto pessoas que moram no Alto de Pinheiros, por exemplo, podem
ter 50% ou 60% de verde nas proximidades", disse Tiana Moreira, engenheira
agrônoma e pesquisadora no Departamento de Patologia da FMUSP, ao Jornal
da USP.
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Alerta
No entanto, aumentar a quantidade de cobertura
verde sem considerar suas condições locais pode resultar em uma eficiência
limitada na redução do aquecimento urbano, apontam especialistas.
"Na maioria das condições, a mais de 100
metros de distância, esses efeitos (das áreas verdes) mal podem ser
percebidos", escreve a arquiteta romena Maria-Cristina Florian em artigo
para a plataforma de arquitetura Arch Daily.
"As formas topográficas e geométricas de seus
arredores podem determinar até que ponto o ar frio pode penetrar, pois as
fontes de calor e os edifícios físicos geralmente formam barreiras que
bloqueiam o fluxo de ar".
"Em áreas urbanas densas com disponibilidade
limitada de espaço, entender essas condições é crucial para criar uma
estratégia eficaz", acrescenta ela.
Florian destaca que, se por um lado, grandes áreas
verdes são preferíveis para criar ilhas estáveis e frias, por outro, nem todas
as cidades podem implementá-las — estudos mostram que pequenos aglomerados de
áreas verdes também podem ajudar a distribuir ar frio e reduzir
significativamente o calor urbano.
Cientistas também alertam que se a implementação
das áreas verdes não for feita com planejamento estratégico, pode acabar
levando ao aumento do valor da propriedade e ao deslocamento de moradores a
longo prazo.
Por isso, defendem uma estratégia chamada
"apenas verde o suficiente", de modo a criar intervenções
estratégicas para apoiar as comunidades locais.
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Onda de calor no Brasil
Na última sexta-feira (22/9), o Instituto Nacional
de Meteorologia (Inmet) ampliou o alerta de "grande perigo" por causa
das temperaturas acima da média para 11 estados e o Distrito Federal e estendeu
o aviso até terça-feira (26/9).
Segundo especialistas, a onda de calor que
atravessa o país guarda relação direta com o fenômeno El Niño, muito mais
rigoroso neste ano, e com a crise climática, devido à emissão de gases de
efeito estufa, que aumenta a frequência de eventos climáticos extremos.
Fonte: BBC News Brasil
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