sexta-feira, 29 de setembro de 2023

STF prepara re-anulação do marco temporal

O texto aprovado pelo Congresso Nacional que trata do marco temporal – o Projeto de Lei nº 2903/2023 – poderá ser considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com base nos mesmos argumentos debatidos pelos ministros, segundo especialistas.

“Para isso, deverá ser proposta uma ação direta de inconstitucionalidade em relação a essa nova lei, após ela entrar em vigor”, afirma o advogado especialista em direito público, com ênfase em questões socioambientais, Daniel Cavalcante. Argumentos extraídos da decisão do STF que derrubou o marco temporal poderão ser usados novamente no próprio Supremo, de acordo com Cavalcante.

 “A autorização para garimpo nessas terras e a possibilidade de empreendimentos econômicos nelas, sem que os povos indígenas sejam consultados, são alguns dos dispositivos da nova lei que poderão ser atacados.” Leia também: Mounjaro: Veja efeitos colaterais do medicamento Presença da mulher no STF é importante, mas deve-se respeitar indicação de Lula, diz Mendonça Como já foi discutido no STF, acrescenta, “a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) determina que todo empreendimento que atinja direitos indígenas, antes de ser autorizado, deve ser precedido de consulta livre e informada ou ensejará nulidade”.

A Convenção 169 da OIT é um tratado internacional de direitos humanos ratificado pelo Brasil. Segundo Cavalcante, a norma está abaixo da Constituição, mas acima das leis e, portanto, não pode ser contrariada por leis ordinárias ou complementares, como a que poderá ser fruto do PL nº 2903. Bruno Sales, sócio do VBD Advogados, também entende que a nova lei poderia ser objeto de novo julgamento e declaração de inconstitucionalidade. O que poderia, afirma, provocar nova reação no Congresso, com a aprovação de novo texto sobre a matéria sob a forma de emenda constitucional, “tornando muito mais difícil novo julgamento pelo STF”.

Segundo a advogada Vera Chemim, o tema é sensível e a discussão é bastante polarizada, mas o Supremo já decidiu pela inconstitucionalidade do marco temporal. “Isso acaba configurando um ciclo vicioso, uma vez que o Supremo já deu sua última palavra. E a não ser que o STF mude sua forma de pensar, provavelmente declarará essa nova lei inconstitucional”, diz.

<><> Aprovado no Senado, o Marco Temporal das terras indígenas já era. Por Ricardo Noblat

A aprovação a toque de caixa pelo Senado do Marco Temporal das terras indígenas dará a Lula mais uma oportunidade de reforçar sua aliança com o Supremo Tribunal Federal.

Não foi uma derrota do governo. A aprovação foi uma resposta do Congresso ao tribunal que na semana passada, por 9 votos contra 2, decidiu que o Marco temporal é inconstitucional.

A tese do Marco Temporal estabelece que a demarcação dos territórios indígenas deve respeitar a área ocupada pelos povos até a data da promulgação da Constituição, em outubro de 1988.

O entendimento do Supremo é outro: a Constituição assegura aos povos indígenas os direitos sobre as terras que historicamente sempre ocuparam, e não só em outubro daquele ano.

Aprovado no mesmo dia na Comissão de Constituição e Justiça e no plenário do Senado por 43 votos a 21, o projeto passou em maio último pela Câmara com o apoio da bancada ruralista.

O texto, agora, seguirá para Lula que poderá sancioná-lo ou vetá-lo. Deverá vetá-lo. O Congresso poderá derrubar o veto. Se o fizer, o assunto voltará a ser examinado pelo Supremo.

Em suma: não há chance de o Marco Temporal ficar de pé. A oposição sabe disso. Tanto que apresentou no Senado uma Proposta de Emenda à Constituição prevendo o Marco Temporal.

Uma vez que a proposta fosse aprovada no Senado e depois na Câmara, o Supremo, a princípio, não poderia derrubá-la. Mas não será aprovada. A oposição carece de votos para isso.

Para uma emenda à Constituição ser aprovada são necessários os votos de 308 dos 513 deputados e de 49 dos 81 senadores. O projeto aprovado ontem não alcançou esses números.

Na Câmara, o placar foi de 283 votos a favor contra 155, e no Senado, 43 contra 21. Talvez Lula nem chegue a vetá-lo. Provocado, o Supremo liquidará o assunto antes.

<><> Direita promete derrubar veto de Lula ao marco temporal

O provável veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei do marco temporal, aprovado nesta quarta-feira (27) pelo Congresso com apoio até de integrantes da base do governo, deve ter vida curta. A oposição ao Palácio do Planalto já se articula para derrubar o veto ao texto, que se tornou pivô do enfrentamento entre o Parlamento e o Supremo Tribunal Federal (STF).

Como mostrou a Coluna do Estadão, no aniversário do senador Renan Calheiros (MDB-AL) — aliado do presidente que contrariou o governo e votou a favor do marco temporal — a conclusão entre os convidados foi a de que Lula não tem outra alternativa a não ser vetar o projeto. O petista tem até quinze dias úteis para oficializar sua decisão de veto no Diário Oficial da União (DOU).

Para derrubar um veto presidencial, é preciso reunir 257 votos de deputados e 41 votos de senadores. O projeto de lei do marco temporal foi aprovado com 283 votos na Câmara e 43 no Senado. Ou seja, hoje existe margem política para a derrubada do veto.

O líder do PL no Senado, Carlos Portinho (RJ), diz que o iminente veto presidencial seria um “péssimo gesto político” por parte do Planalto. “O governo sabe que vamos derrubar [o veto], porque isso foi aprovado na Câmara e no Senado com larga vantagem”, declarou à Coluna. O parlamentar destaca que o marco temporal foi aprovado com votos para além da oposição a Lula. “Foi um movimento suprapartidário”.

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Se o Congresso derrubar o veto (que ainda nem foi oficializado), o marco temporal ganha força de lei com caminho pavimentado para ser questionada junto ao Supremo, que já se posicionou pela inconstitucionalidade da tese. A judicialização do tema são é vista como “favas contadas” nos gabinetes de Brasília.

Mesmo nesse cenário, de o STF derrubar a lei do marco temporal, o Congresso promete reação. “Se isto acontecer, aprovamos uma PEC”, antecipa Ciro Nogueira. Mudar a Constituição, então, seria a saída para acabar com a inconstitucionalidade do projeto.

“O STF cometeu um erro e hoje está pagando por esse erro. Hoje, ele está na berlinda com a aprovação do marco temporal pelo Senado. E se o governo vetar, ficará ele na berlinda”, acrescenta Portinho.

Congresso e STF estão em “guerra” depois de a Corte derrubar a tese do marco temporal e dar início a julgamentos de temas ao arrepio dos parlamentares, como a descriminalização da maconha e do aborto.

Como revelou a Coluna do Estadão, como reação ao que chamam de “ditadura do STF” e “invasão de prerrogativas do Parlamento”, lideranças do Congresso decidiram resgatar uma PEC para dar a deputados e senadores o poder de anular decisões não unânimes de ministros do STF que “extrapolem os limites constitucionais”.

<><> Ruralistas criticam ausência de Flávio em votação do Marco Temporal

Lideranças ruralistas não ficaram nada satisfeitas com a ausência de alguns senadores bolsonaristas na votação do projeto de lei do Marco Temporal, na noite de quarta-feira (26/9), no plenário do Senado.

A proposta foi aprovada por 43 votos a 21, como uma resposta do Congresso Nacional ao STF, que, na semana passada, havia declarado o marco temporal como inconstitucional.

A ausência mais criticada por ruralistas foi a do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Filho 01 de Jair Bolsonaro, Flávio estava em um evento sobre turismo no Rio, no qual chegou a posar ao lado de integrantes do governo Lula.

Outro senador bolsonarista ausente na votação foi o Astronauta Marcos Pontes (PL-SP). Ex-ministro de Bolsonaro, o parlamentar está em viagem a Roma, onde se encontrará com papa Francisco.

Já o senador Romário (RJ), que também é do PL, estava presente na sessão, mas desagradou bolsonaristas por seu voto contra o marco temporal. Romário se juntou à bancada governista para derrubar o projeto.

“Não sei exatamente o motivo (da ausência), mas ontem a prioridade do Brasil era o Congresso dar essa reposta à inteferência de poderes. O próprio STF acabou com o texto da Constitucição Federal. A ausência de qualquer senador não é bom para o futuro político de nenhum deles”, afirmou à coluna o presidente da União Democrática Ruralista (UDR), Nabhan Garcia.

Ex-secretário do governo Bolsonaro, Nabhan afirmou ainda que a sobrevivência de qualquer político na política depende muito de seus atos e daquilo que ele mostra à sociedade”.

 “Já foi o tempo do chamado eleitor ausente. Lamentável, mas isso só o futuro dará a sua resposta adequada”, disse o presidente da União Democrática Ruralista.

Em nota à coluna, Flávio afirmou que não compareceu à votação pois estava em “agenda oficial previamente confirmada” na maior feira de turismo do Brasil, que voltou a ser realizada no Rio após 11 anos.

“Reafirmo o compromisso de apoio integral e irrestrito ao projeto que regulamenta demarcação de terras indígenas, relatado pelo senador Marcos Rogério (PL/RO)”, ressaltou o senador.

•        Entenda o Marco Temporal

O Marco Temporal estabelece que apenas as terras indígenas ocupadas até 5 de outubro de 1988, dia da promulgação da Constituição, poderiam ser demarcadas daqui para frente.

O STF, entretanto, rejeitou a tese e determinou que a promulgação da Constituição não pode ser usada como base temporal para demarcação de terras indígenas no Brasil.

Diante da decisão do Supremo, o Senado votou um projeto de lei que retoma a interpretação original. Como a proposta já havia sido aprovada pela Câmara, ela seguiu para sanção ou veto do presidente Lula.

 

       Indígenas expatriados denunciam à ONU ameaças no Brasil

 

Lideranças indígenas temem represálias depois de denunciar, na ONU, invasores em suas terras. Eles, porém, agora pedem que as autoridades brasileiras tomem medidas de proteção para garantir que emboscadas e ameaças não ocorram em seu retorno ao Brasil. Nesta semana, lideranças do povo Arara estão nas Nações Unidas para relatar aos órgãos internacionais a situação de vulnerabilidade de sua comunidade.

Em encontros fechados ou em discursos diante dos governos, eles insistiram sobre o fato de que, se os anos de Jair Bolsonaro foram superados, a situação continua sendo ameaçadora. O temor do grupo é de que, no retorno ao Brasil, a situação seja transformada em uma ameaça à vida dos dois líderes. Ao UOL, os represetantes do povo Arara confirmaram que vem sofrendo intimidações e alertas.

 “Estamos denunciando o desmatamento na Amazônia e queremos que a ONU pressione o governo para cumprir suas obrigações”, afirmou Mobu Odó Arara, cacique do povo Arara da Terra Indígena Cachoeira Seca. Segundo ele, sua comunidade conta com 120 famílias. Mas outras 2 mil pessoas também vivem dentro de suas terras. “Transitamos pela mesma estrada que essas famílias usam.

É nossa única forma de chegar em nossa comunidade. Recebemos ameaças antes mesmo de fazer essas denúncias na ONU. Eu estou aqui e não sei o que vai acontecer depois”, disse o cacique. Mobu Odó conta que já teve de ser escoltado duas vezes para chegar até sua aldeia e que seu sogro foi assassinado por pescadores. Hoje, ele diz que as ameaças vêm de fazendeiros e grileiros.

“Com o governo Lula, as coisas melhoraram. Mas ainda não temos segurança+, disse. Numa carta enviada ao Itamaraty e outros órgãos do governo no dia 22 de setembro, a Associação Direitos Humanos em Rede (“Conectas Direitos Humanos”), Instituto Maíra e Associação Kowit do povo Arara pediram que “providências acerca da proteção integral das lideranças indígenas do povo Arara da Terra Indígena Cachoeira Seca no regresso de sua missão à Genebra, em razão da participação de duas de suas lideranças na 54ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU”.

“A Terra Indígena Cachoeira Seca e seu povo guardião, aqui representados pelas lideranças do povo Arara, têm sido submetidos a inúmeras violações e violências enquanto povos de recente contato, estão dentro de um território enquadrado, desde 2019, enquanto um dos mais desmatados do Brasil”, diz a carta, obtida com exclusividade pelo UOL. “Junto disso, os impactos sofridos a partir da instalação do empreendimento de Belo Monte tem gerado contínuas consequências gravíssimas para o aumento das invasões que, por sua vez, geram violências diversas para as lideranças no território. Isso ocorre mesmo diante da exigência de desintrusão do território presente nas condicionantes ambientais de instalação do empreendimento”, afirmou.

Segundo as entidades, neste cenário de violações crescentes e do aumento massivo de invasores no território, representantes do povo Arara estiveram em junho de 2023 em Brasília para uma série de agendas com autoridades do Governo Federal. Continua após a publicidade “Na ocasião, buscaram informações e providências acerca do processo necessário, ainda que tardio, de desintrusão do território. Inclusive, até o momento, restam pendentes importantes encaminhamentos, a respeito de providências listadas em reunião sobre o Plano de Desintrusão da TI Cachoeira Seca”, disse.

De fato, durante a reunião em junho, Maria Janete Carvalho, diretora da Diretoria de Proteção Territorial da FUNAI, explicou que o processo de regularização fundiária da TI Cachoeira Seca começou na década de 1970. A TI, segundo ela, foi reduzida por conta da Rodovia Transamazônica e assentamentos do INCRA. Ela ainda indicou, em junho, que em 90 ocorreria a desintrusão e admitiu que a demora na retirada dos invasores aumenta a violência contra os indígenas. Por outro lado, o governo está tomando cuidado com a publicação da lista dos ocupantes de boa e má fé para não agravar ainda mais a violência. Mas, três meses depois, a carta ao governo deixa claro que muitas das promessas feitas durante a reunião ainda não foram implementadas.

O grupo, portanto, fez dois pedidos: A garantia da logística de segurança dos indígenas, com a adoção de todas as providências necessárias à tutela da vida e integridade física ao longo do trajeto de retorno de Altamira até a TI Cachoeira Seca, a partir do dia 1º de outubro; e A designação de representante desse órgão para que se possa realizar o contato direto nos próximos dias, em caso de emergência relativa a segurança, e também para tratativas a respeito da logística necessária à proteção da vida e integridade física das pessoas envolvidas na missão

r A denúncia Na ONU, as lideranças indígenas foram duras em relação à situação atual. Num discurso no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, Tymbektodem Arara, presidente da Associação Kowit, alertará sobre a situação dos povos indígenas no país. A fala foi apoiada pelas entidades Conectas e Instituto Maíra, que “demonstram muita preocupação com a violação dos direitos indígenas no Brasil”.

“Continuamos lutando contra a tese do marco temporal”, dirá a liderança indígena. “Somos um povo de contato inicial, viemos aqui para exigir respeito às nossas vidas e ao nosso território. Sofremos muitas invasões. A demarcação só foi feita 30 anos após o contato com os não indígenas, em 2016”, explicou. “Hoje, em 2023, estamos lutando pela retirada de mais de 2.000 invasores, em decorrência da instalação da usina hidrelétrica de Belo Monte. Nosso território é um dos mais desmatados do país”, alertou. “Pedimos à comunidade internacional que pressione o Brasil para que cumpra seu dever constitucional e garanta que a renovação da licença de operação de Belo Monte inclua a desintrusão da Terra Indígena Cachoeira Seca”, afirmou.

 

Fonte: Valor Econômico/Metrópoles/UOL

 

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