quarta-feira, 29 de março de 2023

Ex-relator da ONU revela 8 maneiras de investigar o Nord Stream apesar de negativa do CSNU

O fracasso da resolução sino-russa no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) para estabelecer uma investigação internacional sobre os ataques ao Nord Stream não é o fim do caminho, e Moscou tem mais de meia dúzia de caminhos para abordar o assunto, diz o ex-relator da ONU e especialista veterano em direito internacional, Alfred de Zayas.

Moscou expressou confiança nesta terça-feira (28) de que a verdade sobre as explosões no gasoduto Nord Stream (Corrente do Norte) acabaria sendo revelada, apesar do fracasso no CSNU em adotar uma resolução sino-russa exigindo uma investigação internacional formal sobre a sabotagem.

"Qualquer tribunal condenaria os EUA com base nas informações disponíveis hoje, 'a fortiori' na ausência de qualquer evidência confiável em contrário. Nos Estados Unidos, qualquer grande júri consideraria que as evidências já em domínio público são suficientes para indiciar o suspeito pelo crime e abrir um processo criminal formal", disse Zayas à Sputnik.

A resolução recebeu apoio da Rússia, China e Brasil. Os EUA, o Reino Unido, a França e os membros rotativos do Conselho de Segurança – Albânia, Gabão, Gana, Malta, Moçambique, Emirados Árabes Unidos, Suíça, Equador e Japão – se abstiveram. O vice-representante permanente russo na ONU, Dmitry Polyansky, disse à Sputnik que a resolução fracassou devido à "grande pressão" do Ocidente.

Seymour Hersh, o jornalista vencedor do Prêmio Pulitzer cuja reportagem bombástica revelou que mergulhadores da Marinha dos EUA auxiliados pelos militares noruegueses foram os responsáveis pela destruição dos gasodutos, disse que não estava nem um pouco surpreso com o fracasso da resolução. "O que mais você achou que eles fariam? Se eles fizessem qualquer outra coisa, isso seria notícia", disse Hersh à Sputnik.

Zayas caracterizou a reportagem de Hersh como "completa, coerente e crível à primeira vista" e disse que suas investigações "constituem uma base sólida para iniciar uma investigação internacional independente, que exigiria o consentimento dos países cuja soberania territorial se estende sobre a área onde as explosões ocorreu, ou seja, Suécia e Dinamarca".

Infelizmente, disse o especialista jurídico, a Suécia até agora se opôs ao assunto e não compartilhou as descobertas de sua própria investigação com a ONU. "O silêncio da Suécia só pode ser interpretado como um encobrimento, porque as consequências de revelar a prova da violação dos Estados Unidos da soberania sueca e dinamarquesa e a violação colossal do direito internacional e das leis da guerra teriam explodido a Organização do Tratado do Atlântico Norte [OTAN] da mesma forma que os EUA explodiram os gasodutos", suspeita Zayas.

O especialista enfatizou que, para ser crível, qualquer investigação dos nórdicos sobre os ataques do Nord Stream vai ter que ser aberta a todas as partes interessadas, incluindo a Rússia. Caso contrário, "tendo em mente que todos os três países se uniram contra a Rússia, o grande perigo é que suas investigações possam ser um encobrimento" dos crimes cometidos.

•        As 8 ferramentas à disposição da Rússia

Felizmente, diz Zayas, há uma série de caminhos que a Rússia e outros países podem seguir em nível internacional.

Para começar, os países poderiam recorrer ao Artigo 19 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, que dá a todas as pessoas o direito de acessar informações e de buscar e transmitir informações de todos os tipos, especialmente quando as informações retidas dizem respeito a atos criminosos como o terrorismo.

Em segundo lugar, Zayas observa, porque o CSNU falhou em estabelecer uma Comissão Internacional de Inquérito, ou Missão de Apuração de Fatos — ferramentas para examinar possíveis violações graves do direito internacional humanitário e dos direitos humanos — a Assembleia Geral pode fazê-lo. "A Assembleia Geral deve ir além da mera condenação da sabotagem do Nord Stream e adotar uma resolução sob o Artigo 96 da Carta da ONU solicitando um parecer consultivo da Corte Internacional de Justiça sobre a questão das consequências legais da explosão dos gasodutos, em especial as responsabilidades cíveis e penais envolvidas", explicou o advogado.

Em terceiro lugar, o especialista jurídico diz que, uma vez que as explosões do Nord Stream se enquadram na definição de terrorismo internacional, elas estão sob a alçada do Escritório de Drogas e Crime da ONU em Viena, que deve conduzir sua própria investigação.

Em quarto lugar, Zayas argumenta, uma investigação poderia ser iniciada pelo escritório do Programa Ambiental da ONU em Nairóbi, uma vez que seu alcance se estende à investigação dos impactos ecológicos adversos que as explosões podem ter causado na pesca no mar Báltico.

Em quinto lugar, propõe a apresentação de uma chamada "queixa interestatal" sob o Artigo 41 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, dizendo que violações dos Artigos 1, 2, 6, 19 e 26 do documento podem ser argumentadas.

Em sexto lugar, o advogado diz que o Conselho de Direitos Humanos da ONU poderia estabelecer uma Missão de Apuração de Fatos para investigar "os impactos adversos sobre os direitos humanos na região e no mundo" das explosões do Nord Stream, "como de fato, o ataque ao fornecimento de energia tem consequências generalizadas, especialmente para o gozo dos direitos econômicos e sociais".

Em sétimo lugar, há os Procedimentos Especiais do Conselho de Direitos Humanos – especialistas independentes em direitos humanos com mandato para relatar e aconselhar sobre questões de direitos humanos, que têm seus próprios caminhos para investigar os ataques do Nord Stream. "Certamente cabe a três relatores – o relator sobre Terrorismo, o relator sobre o Direito à Verdade, Justiça e Reparação e o relator sobre Liberdade de Opinião e Expressão" investigar, sugeriu Zayas.

Finalmente, o especialista justifica que a Rússia e outros países poderiam argumentar que os ataques do Nord Stream constituem uma violação da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM). "E mesmo que os EUA nunca tenham ratificado [o tratado], nada impede que o Secretariado da CNUDM estabeleça um grupo de trabalho para estudar as implicações da sabotagem de gasodutos submarinos", explicou.

•        'Padrão duplo'

Zayas enfatizou que o fracasso do CSNU em condenar a sabotagem terrorista do Nord Stream da mesma forma que condenou os ataques terroristas de 11 de setembro em 2001 sinaliza "a aplicação de padrão duplo".

"O silêncio da ONU em relação à sabotagem terrorista do Nord Stream é tão ensurdecedor quanto seu silêncio em relação aos 40 laboratórios biológicos dos EUA na Ucrânia", disse o advogado.

Felizmente, Zayas argumenta, a pressão sobre os EUA está aumentando, principalmente por causa da hostilidade comprovada das autoridades norte-americanas à infraestrutura de gasodutos russos muito antes de ela ser destruída.

"Certamente foi descuido de Joe Biden ter ameaçado que, se a Rússia invadisse a Ucrânia, o Nord Stream não existiria mais. Isso foi repetido por funcionários do Departamento de Estado. Além disso, os EUA já haviam feito tudo ao seu alcance para frustrar a conclusão do Nord Stream 2, como evidenciado pelas medidas coercitivas unilaterais ilegais impostas a empresas em todo o mundo para intimidar empresas como a holandesa-suíça Allseas e uma seguradora suíça com penalidades colossais. Tais ações eram ilegais, constituíam interferência nos assuntos internos dos Estados e aplicação extraterritorial ilegal das leis dos EUA, mas o mundo de alguma forma as tolerou. Ainda assim, elas contribuem para o crescente dossiê legal contra os EUA", concluiu Zayas.

 

       Decisão do CSNU sobre Nord Stream pretende 'isolar o discurso da Rússia', opina analista

 

O Conselho de Segurança das Nações Unidas rejeitou o projeto da Rússia de instalar uma comissão para investigar as explosões nos gasodutos Nord Stream (Corrente do Norte). Esta decisão, no entanto, apenas mostra a clara influência dos Estados Unidos na comunidade internacional, disse um analista à Sputnik.

Só a Rússia, a China e o Brasil votaram a favor do projeto do Kremlin, enquanto os restantes 12 membros do Conselho se abstiveram.

O fato não é estranho se tiver em conta que, desde o início da operação militar russa, este órgão internacional vota contra qualquer resolução que não esteja alinhada com os interesses da Casa Branca, assegura Carlos Manuel López Alvarado, especialista em relações internacionais da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM).

"[A decisão do Conselho] é uma questão diplomática e política orquestrada para tentar isolar o discurso da Rússia, país que na realidade só está reivindicando sua segurança nacional", afirmou o especialista, acrescentando que, embora a decisão não surpreenda, é "lamentável".

"Não deve surpreender ninguém [...] Os Estados Unidos e seus aliados se comportaram de maneira moralista e padecem do mesmo que criticam", disse.

Embora nenhum dos Estados-membros tenha votado contra a investigação das explosões nos Nord Stream 1 e 2, ocorridas em setembro passado, a verdade é que, com isto, Washington está apenas a tentar ficar bem e a delegar a responsabilidade aos seus parceiros europeus.

"Os Estados Unidos, com esta abstenção, decidem simplesmente delegar a responsabilidade de dar o voto de veto aos demais aliados, mas a realidade é que uma abstenção desse número de membros [12] também pode ser interpretada como uma rejeição", indicou.

Os ataques ocorreram simultaneamente em 26 de setembro de 2022 nos dois gasodutos russo-alemães que transportavam gás natural russo para a Europa – o Nord Stream 1 e o Nord Stream 2.

Recentemente, Seymour Hersh, jornalista e autor da investigação sobre o envolvimento dos EUA nas explosões do gasoduto, disse que o chefe do governo alemão Olaf Scholz tem apoiado as tentativas de Washington de encobrir informações sobre a sabotagem do gasoduto Nord Stream desde o outono europeu.

Conselho da ONU está atolado

López Alvarado afirma que a Organização das Nações Unidas (ONU) é uma instituição que foi intimidada pela obstinação dos Estados Unidos de impor sua hegemonia em diferentes partes do mundo.

"As Nações Unidas viram-se atoladas numa obstinação por parte do governo dos Estados Unidos por não perder a batuta. Não esqueçamos que Washington é o maior contribuinte econômico das Nações Unidas", diz o especialista da UNAM.

"A dependência é fundamental: se os Estados Unidos fizeram algo bem, foi tornar o mundo dependente das finanças americanas", sentencia.

Ele sugere também que a narrativa de que Washington não está por trás do que aconteceu nos Nord Stream 1 e 2 é absurda.

"[Os EUA] buscam preservar sua narrativa. Esta ideia de que [os ataques] foram pró-ucranianos e que [Washington] não participou é absurda. Seymour Hersh disse abertamente: os Estados Unidos pretendem desconectar a Europa Ocidental da Rússia", garante.

•        Voto do Brasil mostra um fator de mudança

Um dos três países que votaram a favor do projeto russo foi uma nação latino-americana: o Brasil, um fato que, segundo o especialista em temas globais, marca uma clara tendência regional que aposta mais no multilateralismo que na hegemonia única da Casa Branca.

"Sim, marca uma tendência clara que estamos vendo, que estamos experimentando, com a chegada de governos progressistas à região [latino-americana] que, naturalmente, exigem uma saída para o conflito [...] A chegada de Lula ao Brasil representa um alívio porque os três países mais importantes da região: México, Argentina e Brasil estão orientados para uma mesma visão sobre os assuntos globais", assinala.

Se o projeto de Moscou tivesse sido aprovado, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, iria liderar as investigações sobre estes fatos que, a meio ano de distância, não foram esclarecidos.

 

       Rússia: Dinamarca, Suécia e Alemanha terão que informar ONU sobre sabotagem no Nord Stream

 

A Dinamarca, a Suécia e a Alemanha terão que informar a ONU sobre os resultados das suas investigações sobre as circunstâncias da sabotagem dos gasodutos russos Nord Stream, escreveu no Telegram Dmitry Polyansky, vice-embaixador da Rússia nas Nações Unidas.

Ontem (27) o Conselho de Segurança da ONU não adotou um projeto de resolução russo que pedia a criação de uma comissão internacional sob auspícios da ONU para investigar a sabotagem no gasoduto. A favor votaram apenas a Rússia, a China e o Brasil, os outros membros do Conselho de Segurança se abstiveram.

Entretanto, os coautores do projeto de resolução, além da Rússia, foram a China, Belarus, República Popular Democrática da Coreia, Síria, Eritreia, Nicarágua e Venezuela.

"Tenho a certeza que voltaremos a este tema no Conselho de Segurança e, em geral, graças aos nossos esforços com os chineses, ele tem todas as chances de firmemente "se instalar" no Conselho de Segurança. Copenhague, Estocolmo e Berlim agora terão mais dificuldade de fingir que tudo está indo bem – eles terão, de uma forma ou de outra, de dar explicações ao Conselho de Segurança sobre o progresso de sua investigação", escreveu o diplomata.

Polyansky apontou que a Rússia não tinha ilusões de que os países ocidentais no Conselho de Segurança deixariam passar o projeto de resolução russo.

"Uma investigação internacional justa deste crime importante é um pesadelo para os EUA e seus satélites, que prevalecem no Conselho de Segurança. Mas, mesmo assim, nenhum deles se atreveu a votar 'contra'", observou.

Por sua vez, Vasily Nebenzya, o embaixador russo na ONU, questionou o seu homólogo dos EUA como a Rússia deve interpretar a admissão do presidente dos EUA Joe Biden de que o gasoduto seria destruído, feita alguns meses antes da explosão ocorrer. "O [representante] americano simplesmente permaneceu em silêncio e seu silêncio foi mais eloquente do que qualquer confissão", concluiu Polyansky.

Os ataques ocorreram em 26 de setembro de 2022 nos dois gasodutos russo-alemães que transportavam gás natural russo para a Europa – o Nord Stream 1 e o Nord Stream 2.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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