sábado, 25 de março de 2023

Decisão do Banco Central de manter os juros em 13,75% não é econômica, é político-partidária

A decisão do Banco Central (BC) de manter os juros em 13,75% e ainda sinalizar a “manutenção da taxa básica de juros por período prolongado” não tem fundamento técnico ou econômico; é de natureza puramente político-partidária.

Não há justificativa técnica ou econômica para a taxa básica do Brasil continuar no patamar mais alto do mundo, de 8% de ganho real, já descontada a inflação. Há, sim, um enorme consenso em sentido contrário dentre economistas de renome mundial.

O Nobel da Paz Joseph Stiglitz, por exemplo, classifica como “chocante” manter juros reais em 8%, que significam “uma pena de morte” para qualquer economia.

Para o economista Jeffrey Sachs, “o Brasil precisa de um aumento da taxa de investimento”, não da taxa de juros. Ele entende que os juros estão altos “devido à política”, não à realidade fiscal do país.

Esta escolha do BC “não tem como base os fundamentos fiscais”, ele sustenta. Sachs calcula que “se a taxa fosse 5% mais baixa hoje, o déficit seria cortado em 3%”.

As alegações do BC para justificar a continuidade da política altista são frágeis e insustentáveis. E revelam o fracasso da atual diretoria na condução da política monetária, que precisa ser mudada urgentemente.

O comunicado do BC [22/3] reconhece sua incompetência, pelo terceiro ano consecutivo, em controlar a inflação, que “segue acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação”.

Isso significa que os juros altos não conseguiram conter a inflação e, pior, se tornaram um veneno mortal para a economia, como alerta o economista Stiglitz.

Na realidade, além de não conseguir controlar a inflação dentro da meta, a prática de juros altos também cria um círculo vicioso de desequilíbrio fiscal permanente, pois o Banco Central cria despesa [sem autorização legislativa e sem concordância do Poder Executivo] e ainda obriga o Tesouro a desviar dinheiro público de investimentos e políticas sociais para pagar o serviço da dívida pública.

Com isso, a dívida pública aumenta, ao invés de diminuir.

O BC também alega que “a política monetária nas economias centrais segue avançando em trajetória contracionista”. Isso justificaria, na opinião dos gênios do rentismo, a manutenção da taxa atual. Trata-se, no entanto, de puro eufemismo.

É verdade que os Bancos Centrais dos EUA e da Europa elevaram as taxas de juros no período recente, mas com uma diferença fundamental em relação ao Banco Central do Brasil.

Enquanto nas principais economias planetárias os juros reais continuam negativos, mesmo com o aumento recente das taxas pela maioria dos Bancos Centrais, no Brasil pratica-se a maior taxa de juros reais do mundo – 8% ao ano.

O presidente do BC, o bolsonarista Roberto Campos Neto, perdeu as condições legais para permanecer no cargo.

Ele e toda a diretoria da instituição demonstraram “comprovado e recorrente desempenho insuficiente para o alcance dos objetivos do Banco Central do Brasil” – inciso IV do artigo 5º da Lei Complementar 179/2021, de autonomia do BC.

Campos Neto é um agente provocador e sabotador que no campo econômico segue a cartilha terrorista da extrema-direita.

Aposta na recessão e no desemprego para levar o país ao caos e desestabilizar o governo Lula. A política de juros altos significa, nesta perspectiva, a continuidade do 8 de janeiro via terrorismo financeiro.

Sob a gestão ultraliberal e bolsonarista de Campos Neto, o Banco Central “autônomo” – em relação à soberania popular, mas vinculado ideologicamente à extrema-direita ultraliberal – é um fator de pilhagem do país e, ao mesmo tempo, uma arma de sabotagem e de luta política para inviabilizar o governo Lula.

 

       Lula faz crítica mais ostensiva a Banco Central: “que paguem pelo que estão fazendo com o país”

 

O presidente Lula mostrou indignação com a decisão do Banco Central de manter a taxa básica de juros, Selic, no alto nível de 13,75% ao ano: “que paguem pelo que estão fazendo com o país.”

“Não existe explicação”, manifestou Lula, um dia após o Copom (Comitê de Política Monetária) manter alta a taxa de juros pela quarta reunião consecutiva, mantendo o mesmo índice de setembro de 2022.

“Não tem explicação para nenhum ser humano do planeta Terra a taxa de juros no Brasil estar 13,75%. Não existe explicação”, criticou.

O presidente da República também afirmou que não o Banco Central não está seguindo a lei de autonomia da autoridade financeira e, ao manter os altos níveis de juros, não tem preocupação de cuidar do emprego da população. “É preciso a gente deixar que quem tem que cuidar das coisas, cuide.”

 “Eu como presidente da República eu não posso ficar discutindo todo relatório do Copom, eu não posso. Eles paguem o preço pelo que eles estão fazendo. A história julgará cada um de nós. A única coisa que eu sei é que a economia brasileira precisa crescer, nós precisamos gerar emprego”, continuou.

Nesta quinta-feira (23), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também criticou a medida. Em tom mais discreto, Haddad disse que a decisão do Copom foi “muito preocupante”. Haddad tenta fazer o meio de campo com o chefe do Banco Central, Roberto Campos Neto, por isso levanta críticas mais sutis do que o próprio presidente.

De forma mais ostensiva, já Lula disse que Campos Neto não precisaria nem “conversar” com ele, “só precisa cumprir a lei que estabeleceu a autonomia do Banco Central”. “Ele precisa cuidar da política monetária, mas ele precisa também [cuidar] do emprego, da inflação e da renda do povo.”

 

       Por que bancos médios são os que estão sofrendo mais na atual crise

 

Uma onda de insolvências entre bancos de médio porte está deixando os mercados nervosos no mundo todo — com intensas especulações sobre qual pode ser a próxima instituição a quebrar.

Uma das instituições no olho do furacão é o First Republic Bank dos Estados Unidos, que foi resgatado com uma injeção de capital de US$ 30 bilhões feita por 11 bancos de Wall Street.

Muitos o veem como uma vítima de uma crise maior, que começou com saques em massa nos americanos Silicon Valley Bank, Signature Bank e Silvergate Capital Corp e o suíço Credit Suisse.

Suas ações caíram de US$ 133,87 para US$ 15 em apenas 15 dias. Ou seja, hoje valem cerca de 87% menos.

Os saques em massa e a desconfiança geral do mercado explicam o rápido colapso dos bancos regionais nos EUA e o ataque de pânico sofrido pelas bolsas nos últimos dias.

Hoje "as pessoas conseguem sacar seus depósitos do sistema bancário com a velocidade e o fervor de quem tenta comprar ingressos para shows de Taylor Swift", disse Paul Donovan, economista-chefe do UBS Global Wealth Management.

"O ambiente econômico faz com que as pessoas percam a confiança nos bancos e optem por sacar seu dinheiro, como está acontecendo agora. E isso não é bom. Os depósitos bancários são uma espécie de gasolina necessária para os bancos funcionarem ", disse à BBC Mundo Víctor Alvargonzález, diretor de estratégia e sócio-fundador da empresa de consultoria independente Nextep Finance.

Quando as pessoas sacam seus depósitos em massa, o banco fica gravemente exposto à falência.

•        A origem: o aumento das taxas de juros

Embora os analistas concordem que cada banco sofreu com seus próprios problemas específicos, esses incidentes também podem ser vistos como consequências do maior e mais rápido aumento da taxa de juros em mais de 40 anos.

Os especialistas concordam: a origem desta crise está nos aumentos de juros e o que estamos vendo no setor bancário é apenas um efeito colateral e indesejável do "remédio que cura a inflação".

•        Fuga do pequeno para o grande

"A normalização extremamente rápida da política monetária traduziu-se numa perda de confiança dos clientes que os levou a retirar rapidamente os seus fundos de bancos tidos como fracos", diz Elisa Belgacem, estrategista de crédito da Generali Investments.

"Embora os bancos estejam mais capitalizados do que em 2008, especialmente na Europa, a fuga de depósitos de bancos menores para bancos maiores e mais seguros deve continuar", diz o especialista.

Os números mostram que os bancos pequenos estão claramente sob pressão.

"Há uma fuga de depósitos para os maiores e mais bem regulamentados bancos americanos", diz Axel Botte, estrategista de mercado global da Ostrum AM.

O aumento das taxas pode desencadear uma recessão, e esse medo leva os clientes a escolher com muito cuidado onde colocar seu dinheiro. Daí a preferência por bancos sólidos e confiáveis.

•        Recessão

O mais impressionante de tudo é que a teoria econômica diz que, quando as taxas de juros estão altas (como estão agora), os bancos ganham mais dinheiro.

Em um ambiente de altas taxas, o setor lucra mais.

"É muito bom para os bancos — para todos eles — que os juros subam porque eles ganham muito mais com os empréstimos. Quem tem crédito variável paga mais juros, então o banco sem fazer nada ganha muito mais dinheiro", diz Alvargonzález.

E isso acontece não só na carteira de crédito existente, mas em todos os novos empréstimos que são concedidos.

"Agora, se a economia entrar em recessão, os bancos vão oferecer menos crédito e as pessoas vão pedir menos empréstimos. E isso já estraga a boa notícia da subida das taxas de juro. Esta é a faísca que acende esta crise de confiança", explica.

Ben Laidler, estrategista de mercados globais da plataforma de investimentos eToro, explica por que os bancos médios são os que mais sofrem.

"Bancos americanos de pequeno e médio porte, com ativos abaixo de US$ 250 bilhões, são os mais prejudicados pela atual falta de liquidez e pelas medidas regulatórias."

Sua importância em algumas áreas é desproporcional.

Por exemplo, os bancos médios e pequenos respondem por 60% dos empréstimos para casa própria e mais de 70% dos empréstimos imobiliários comerciais nos EUA.

•        Indicador de crescimento econômico

"Os padrões de empréstimo nos EUA e na Europa ficaram muito mais rígidos. As entidades vão aumentar as exigências para a concessão de empréstimos", diz.

Para Laidler, a dificuldade de acesso ao crédito é um claro indicador de desaceleração do crescimento econômico.

O que acontece no Credit Suisse também demonstra que o setor bancário continua sensível à confiança.

Os investidores duvidam da saúde de outros bancos e se perguntam se os problemas bancários são sistêmicos ou não.

Ou seja, se a crise afeta todo o setor ou apenas alguns bancos.

Por isso, poucos analistas ousam arriscar que a crise bancária já acabou e que não estamos diante de algo como o que aconteceu em 2008.

"Seria presunçoso garantir o contrário, já que a única certeza que existe nas finanças é que tudo é imprevisível, ainda mais depois de altas brutais de juros como as que acabamos de ver", diz Alexis Bienvenu, gestor de fundos da La Financière de l'Echiquier

O analista adverte que "as atuais tensões, apesar de localizadas, terão consequências para o resto da economia".

Essas consequências poderão ser sentidas também na América Latina, já que a probabilidade de desaceleração do crescimento levará os bancos a serem mais cautelosos na concessão de empréstimos.

O mundo está enfrentando turbulências políticas e econômicas, e embora esta seja uma crise de confiança e não de solvência, os mercados não esquecem o que aconteceu em 2008. Por isso o nervosismo pode continuar por mais alguns meses.

 

Fonte: Por Jeferson Miola, em Viomundo/Jornal GGN/BBC News Mundo

 

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