quinta-feira, 11 de julho de 2024

O que Partido Democrata perde e ganha se substituir Biden na eleição dos EUA

O desempenho hesitante do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, no recente debate (27/06) em Atlanta, no Estado americano da Geórgia, levantou sérias questões sobre sua aptidão física e mental para concorrer a um novo mandato. E uma entrevista concedida à emissora ABC, veiculada na sexta-feira (05/07), no horário nobre, alimentou ainda mais as especulações sobre o futuro de sua candidatura.

Em meio à incerteza, Biden apareceu, no domingo (07/07), em dois eventos de campanha na Pensilvânia, um importante estado indeciso.

Mas os esforços não impediram que os colegas democratas pesassem os riscos e vantagens de manter Biden, 81, como o candidato do partido.

Na tarde de domingo, o líder da minoria na Câmara, Hakeem Jeffries, convocou uma reunião com legisladores democratas de alto escalão. A candidatura de Biden teria sido um dos tópicos de discussão.

Quatro dos participantes disseram achar que Biden deveria desistir, segundo a emissora americana CBS, parceira da BBC nos EUA. Fontes disseram que pelo menos três outros expressaram preocupação com relação às chances do presidente em novembro.

Várias figuras importantes do Partido Democrata também manifestaram suas posições em entrevistas na TV durante o fim de semana, respondendo se seria mais arriscado continuar com Biden ou deixá-lo no passado.

Alguns dizem que o partido caminha para a derrota em novembro caso Biden permaneça como o candidato, mas outros dizem que, por outro lado, substituí-lo traz muitas incertezas.

·        Para alguns, potencial em um novo começo

Em meio às consequências do desempenho desastroso de Biden no debate com Trump, pedir que o presidente se afaste da disputa presidencial pode trazer um alívio imediato.

Foi o que disseram alguns democratas, apoiadores declarados do presidente entre eles, sugerindo que as preocupações sobre sua idade e acuidade mental tornaram-se difíceis de superar.

O debate "levantou, com razão, a questão entre o povo americano sobre se o presidente tem vigor para derrotar Donald Trump", disse, no domingo, Adam Schiff, deputado pelo Estado da Califórnia.

Em entrevista dada à NBC News, Schiff não chegou a dizer que Biden deveria desistir — uma posição assumida publicamente por cinco democratas da Câmara até agora.

Em vez disso, Schiff sugeriu que o presidente se aconselhasse com pessoas com “distanciamento e objetividade” e decidisse sobre se acredita ser o melhor candidato para disputar a eleição com Trump.

"Dado o histórico incrível de Joe Biden, dado o histórico terrível de Donald Trump, ele (Biden) não deveria estar lado a lado com Donald Trump", disse Schiff. "Não deveria estar nem perto. E há apenas uma razão para estar perto, a idade do presidente."

Biden tem 81 anos e Trump acaba de completar 78. As idades de ambos tornaram-se um ponto cada vez mais polêmico entre os eleitores.

À esquerda, as pesquisas sugerem que alguns eleitores estão perdendo a fé em Biden. Segundo uma pesquisa do Wall Street Journal divulgada na sexta-feira, 86% dos democratas disseram que apoiariam Biden, comparado com 93% em fevereiro.

Um candidato diferente pode oferecer um novo cenário em outras áreas também. Antes da atual onda de pânico democrata, Biden foi alvo de críticas de eleitores em diversas frentes políticas, incluindo sua forma de lidar com a economia dos EUA e a crise migratória na fronteira sul do país.

O presidente enfrentou, ainda, uma ameaça de deserção de eleitores progressistas que se opõem à sua resposta à guerra de Israel em Gaza. Essa resistência custou a Biden mais de 100 mil votos em Michigan - um Estado decisivo crucial - durante as eleições primárias realizadas em fevereiro no Estado.

Uma chapa de Biden "vai arrastar todo mundo para baixo", disse o ex-deputado por Ohio Tim Ryan no domingo (07/07), em uma entrevista à Fox News.

"Acho que vocês verão uma pressão significativa, seja hoje, amanhã ou em algum momento desta semana, à medida que os membros disserem que isso pode ser insustentável para eles."

·        Para outros, o desconhecido representa um risco muito grande

Qualquer benefício de tirar Biden pode ser atenuado pelos riscos iminentes, de acordo com alguns líderes democratas.

Se o presidente se afastasse, a maior parte do que viria depois estaria incerto: quem substituiria Biden e como? E como esse candidato se sairia contra Trump?

Nos últimos dias, vários aliados de Biden enfatizaram os riscos de traçar um novo caminho, argumentando que Biden é um sucesso comprovado.

"Biden está velho", disse o senador de Vermont Bernie Sanders, 82, na CBS News no domingo.

"Ele não é tão articulado quanto antes. Gostaria que ele pudesse subir os degraus do Air Force One. Ele não pode. Temos é que focar na política - as políticas de quem beneficiaram e beneficiarão a vasta maioria das pessoas neste país."

O governador da Califórnia, Gavin Newsom, que passou o fim de semana em campanha pelo presidente, disse o mesmo em um comício em Doylestown, Pensilvânia, no sábado.

“É o hipotético que atrapalha o progresso em termos de promover essa candidatura”, disse Newsom. “É exatamente onde o outro partido quer que estejamos, tendo essa briga interna, e acho que é extraordinariamente contraproducente.”

Os apoiadores públicos de Biden dizem que substituí-lo pode ser um benefício direto para os republicanos de Trump, que podem argumentar que os adversários estão em meio a um caos partidário.

"Temos que parar de falar sobre isso", disse a deputada Debbie Dingell, de Michigan, na CNN no domingo.

"Gastamos uma semana inteira. Os republicanos estão se divertindo. Quero dizer, precisamos voltar a falar sobre Donald Trump e seu desempenho."

·        Um caminho intermediário com Kamala Harris?

No início desta semana, Tim Ryan sugeriu uma possível substituta: a vice-presidente de Biden, Kamala Harris.

"Acredito fortemente que nosso melhor caminho a seguir é Kamala Harris", escreveu em um artigo de opinião para a Newsweek.

"Aqueles que dizem que uma candidatura de Harris é um risco maior que o Joe Biden que vimos outra noite e continuaremos a ver não estão vivendo na realidade."

Embora ela tenha demonstrado apoio e lealdade a Biden, a ideia de Kamala Harris, 59, substituir Biden ganhou força nos últimos dias.

Na entrevista de Adam Schiff na manhã de domingo, o congressista disse que Harris poderia vencer Trump "de forma esmagadora".

Vice-presidente e candidata democrata em 2020, os apoiadores dizem que ela já foi testada em campanha e está familiarizada com o establishment democrata e sua arrecadação de fundos.

Harris "sabe o que faz", disse a ex-presidente do Comitê Nacional Democrata Donna Brazile em entrevista à ABC, no domingo.

"Pedir aos delegados eleitos para a convenção que são apoiadores de Biden-Harris para ignorar Kamala Harris... seria negligência política."

Mas o que a torna atraente para os apoiadores também pode ser um problema: a idade não é a única reclamação dos eleitores contra Biden, e o histórico do governo com relação às escolhas políticas pode impactar Harris.

 

¨      Por que esta semana pode selar o futuro de Biden

Esta semana pode selar o futuro de Joe Biden.

Doze dias depois da performance vacilante no último debate, que pode ser lembrada como uma das mais desastrosas da história americana moderna, o presidente democrata luta pela sobrevivência política sob intenso escrutínio interno e internacional.

A reunião de cúpula da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) desta semana em Washington DC pode oferecer uma trégua temporária — ou ser a última batalha deste presidente.

Nos últimos dias, Biden atacou seus críticos, reivindicou o mandato dos eleitores democratas nas primárias e desafiou os oponentes a seguir em frente e tentar derrubá-lo.

Ele prometeu repetidamente que está avançando com sua campanha e que a temporada de dúvidas e lamentações acabou. Esse passo à frente vai ser dado na reunião da Otan.

Biden vai receber os líderes da aliança militar para três dias de reuniões e eventos públicos, culminando em uma coletiva de imprensa individual na tarde de quinta-feira (11/07).

É um palco no qual Biden, um homem versado em relações exteriores, deveria se sentir confortável. Mas também aumenta os riscos, que já são elevados, para sua presidência, dado que um desempenho fraco vai ter repercussões internas e internacionais.

Um deslize pode dar início a uma debandada política entre os democratas, que acabaria com sua esperança de chegar às eleições gerais de novembro, quanto mais de vencê-las.

Poderia também aumentar as preocupações dos aliados europeus que temem a possibilidade cada vez maior de um novo governo de Donald Trump, e as mudanças drásticas na política externa que viriam junto.

"Biden está começando esta semana enfraquecido", diz Kristine Berzina, diretora do Geostrategy North, do think tank americano de políticas públicas German Marshall Fund.

"Não sabemos como ele vai sair dela."

·        Líderes estrangeiros preocupados

É sabido que muitos líderes europeus estão preocupados com Trump e sua estratégia de política externa. O ex-presidente menosprezou as alianças internacionais multilaterais.

Mas Berzina afirma que, nas últimas duas semanas, esses líderes vivenciaram algo novo — a ansiedade em relação a Biden.

Após seu desempenho hesitante no debate, observa ela, os aliados dos americanos começaram a duvidar se o presidente está à altura da missão.

A caminho da reunião da Otan, eles esperam ver alguma evidência de que sua performance naquela noite foi uma aberração, e não reflete uma nova realidade.

"Por isso, acho que existe uma forte esperança de que Biden passe no teste. Mas se ele não for capaz de fazer isso, vai gerar mais questionamentos sobre a credibilidade dos EUA."

As atenções vão estar voltadas para o presidente dos EUA enquanto ele comparece a sessões da cúpula, recebe líderes estrangeiros na Casa Branca e participa de reuniões bilaterais com líderes importantes, incluindo o recém-eleito primeiro-ministro britânico, Keir Starmer.

Mesmo que as reuniões da Otan sejam realizadas a portas fechadas, informações sobre o desempenho de Biden — seja bom ou ruim — vão certamente vazar.

·        Um ataque de pânico do Partido Democrata

Biden enfrenta uma tarefa ainda mais difícil esta semana internamente.

O presidente indicou o reforço e a expansão da Otan face à agressão russa como uma das suas principais realizações.

Isso é algo que diferencia sua liderança da de Trump — assim como a de qualquer democrata que possa potencialmente substituí-lo nas eleições —, e a reunião de cúpula da Otan vai ser a oportunidade que ele tem de mostrar isso ao povo americano.

"Quem será capaz de manter a Otan unida como eu?", disse o presidente em entrevista ao apresentador George Stephanopoulos, da rede americana ABC, na última sexta-feira (05/07).

Ele acrescentou que a reunião da Otan seria uma boa maneira de avaliar sua capacidade.

"Venha escutar", afirmou. "Veja o que eles dizem."

Mas simplesmente compensar as baixas expectativas na reunião de cúpula da Otan e na coletiva de imprensa de quinta-feira pode não ser suficiente para muitos dos políticos, especialistas e ativistas do partido que já pedem sua saída da disputa.

"Ter simplesmente algumas boas participações não vai impedir os questionamentos", avalia Bill Scher, analista liberal e editor do Washington Monthly, que recentemente escreveu uma coluna fazendo um apelo para que Biden fosse substituído pela vice-presidente, Kamala Harris.

"O tempo era realmente essencial para acabar com toda a especulação pela raiz, e eles perderam uma semana. Não há uma maneira clara de sair desta situação."

Scher, um apoiador de longa data de Biden, diz que as tentativas do presidente de reagir agora com entrevistas na imprensa, cartas e ligações para políticos democratas se deram depois que a opinião pública se consolidou contra ele.

E assim que esse sentimento estiver totalmente consolidado nas pesquisas de intenção de voto — o que pode levar várias semanas —, vai ser provavelmente tarde demais para substitui-lo tranquilamente.

"Entendo como deve ser difícil quando você está chegando ao fim da sua vida, e não está tendo um desempenho tão bom como antes", afirma Scher.

"Ter que se conformar com isso em público deve ser excruciante."

Mas os dados que mostram Biden perdendo apoio e enfrentando uma derrota em novembro estão se tornando cada vez mais claros.

As pesquisas indicam que quase três quartos dos americanos — e até mesmo a maioria dos democratas — acreditam que o presidente deveria desistir. Meia dúzia de membros democratas do Congresso pediram que ele retirasse a candidatura, enquanto muitos outros ofereceram apenas um apoio ambíguo.

Mas o presidente continua dizendo que vai seguir adiante com sua campanha, e ele conta com os delegados da convenção nacional democrata para garantir que seja o candidato do partido. A decisão está fortemente nas mãos dele, e se ele conseguir passar a semana sem cometer nenhum grande deslize, pode, de fato, sobreviver à tempestade iminente.

A história desta semana, no entanto, já foi definida. Não se trata da Otan celebrando seu 75º ano de existência de olho nos desafios que vêm pela frente.

Em vez disso, é uma narrativa que pode decidir se Biden é capaz de sobreviver politicamente para lutar mais um dia.

 

Fonte: BBC News Mundo

 

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