terça-feira, 26 de setembro de 2023

Produtores do Mercosul criticam falta de diálogo com UE

Agronegócios da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai afirmam que exigências ambientais podem isolar Europa e esperam que Lula destrave impasse do acordo comercial entre os blocos.

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Para mais de trinta entidades que formam o Grupo de Países Produtores do Sul (GPS), a União Europeia (UE) corre o risco de se isolar do continente americano. A rede, que agrega associações e empresários do setor na Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, afirma que o bloco quer impor políticas discriminatórias e que geram novas barreiras.

"Historicamente, temos tido um problema de diálogo com a União Europeia. Eles decidem regras importantes do jogo não em negociação, mas por conta própria", critica à DW Marcelo Regúnaga, coordenador-geral GPS e ex-secretário da Agricultura da Argentina.

As críticas mais recentes se baseiam nas exigências do Pacto Ecológico Europeu, o Green Deal. A estratégia para guiar o velho continente rumo à uma economia neutra em carbono, na prática, também determina o que é ou não sustentável – e isso se aplica aos parceiros que vendem produtos para o bloco.

"Fizeram um decreto de como deve ser a exportação para a Europa e de como se deve demonstrar determinados parâmetros. Mas não houve nenhuma oportunidade de diálogo de demonstrar o que é viável, o que é racional e o que não é", justifica Francisco Lezama, coordenador do GPS no Uruguai.

Por conta disso, o acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia corre o risco de não ser ratificado, caso a Europa permaneça inflexível, avalia Luiz Carlos Corrêa Carvalho, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). "O Green Deal tem falhas, e não somos só nós que dizemos. Uma das maiores é que eles não consideram a realidade nossa de produção, que é de clima tropical", exemplifica.

Ingo Plöger, empresário que acompanha há décadas a negociação do acordo e atualmente está na vice-presidência da Abag, ressalta que a UE é um importante provedor de conceitos mundiais, de regulamentações, mas que sua atual estratégia pode provocar um isolamento. "É um bloco, um continente estratégico, não podemos reduzir sua importância. Mas esta inflexibilidade pode levar a um afastamento efetivo da Europa do continente americano", opina.

Representantes europeus no Brasil alertam para o risco de a UE perder a janela de oportunidade. "Entendemos que o acordo entre a União Europeia e o Mercosul trará benefícios para ambos os lados e significará, principalmente para a Europa, uma diversificação de sua cadeira de fornecedores", pontua Barbara Konner, vice-presidente da Câmara Brasil-Alemanha em São Paulo (AHK São Paulo), à DW, mencionando as mudanças no cenário geopolítico agravado pelo ataque russo à Ucrânia.

•        Queda de braço

Negociado ao longo de vinte anos, o acordo entre Mercosul, formado por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela – atualmente suspensa – e os 27 países da União Europeia foi assinado em 2019. A partir daquele ano, o Brasil do então presidente Jair Bolsonaro ganharia fama internacional pelas elevadas taxas de desmatamento na Amazônia e no Cerrado, o que criou um impasse para a ratificação do acordo com os europeus.

Em março, já sob administração de Luiz Inácio Lula da Silva, que assumiu a presidência do Mercosul, o bloco recebeu uma carta da UE pedindo novas garantias de que os sul-americanos não destruiriam o meio ambiente para turbinar as trocas comerciais.

Analistas apontam que o agronegócio é o setor que mais deve se beneficiar com o acordo. Em 2022, o Brasil foi o principal vendedor de produtos do setor para UE – soja, café e carne foram os mais comercializados. Para o Mercosul, por outro lado, a Europa ficou menos interessante nas últimas décadas. A China se transformou no principal destino das exportações do bloco, com 29% de participação.

Para Lezama, a potência asiática oferece algo a mais que os europeus: escuta. "Nós conseguimos discutir o estabelecimento de padrões com chineses. Um exemplo foi o padrão para contaminação de sorgo-de-alepo na soja. Foi uma discussão difícil, mas conversamos e chegamos a um ‘final feliz'", pontua Lezama.

O sorgo-de-alepo, ou capim-massambará, é uma planta invasora que afeta cultivos como o de soja e milho. No Brasil, um novo protocolo fitossanitário foi implantado em 2022 para atender as demandas de exportação de milho para o mercado chinês.

•        Peso das metas ambientais

A preocupação ambiental e facilidade para fechar, ou não, alguns negócios marcam diferenças importantes entre europeus e chineses, pontua Leandro Consentino, professor de Ciência Política e Relações Internacionais no Insper.  "Na China, há uma predisposição maior de se fazer negócio por vários motivos. Não só porque há uma necessidade maior das nossas commodities. Há uma institucionalidade mais baixa de proteção ao meio ambiente também", comenta.

DW Revista: Por que o acordo UE-Mercosul não sai do papel?

Na análise do especialista, a falta de uma sociedade civil organizada no país governado por uma ditadura precisa ser considerada. "Na Europa, até por conta da pressão da sociedade civil, é mais difícil que o bloco tenha quaisquer parceiros que não atendam essas características mais duras de proteção ambiental", pondera Cosentino.

Alguns interesses, por outro lado, podem se camuflar neste cenário, pondera o pesquisador. "Vale mencionar que há uma boa dose de protecionismo por parte do agronegócio europeu que também influencia a negociação com o Mercosul", adiciona.

Para Charles Pennaforte, coordenador do Laboratório de Geopolítica, Relações Internacionais e Movimentos Antissistêmicos da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), é preciso ter cautela com as assimetrias do acordo e algumas previsões muito otimistas. "Não é possível que o impacto seja mensurado desta maneira, não dá pra prever todas as variáveis porque não se trata de um processo linear. No cômputo geral, a UE vai ser a maior beneficiada", analisa.

•        Quem ganha e quem perde

Depois dos anos de "afluxo do antiambientalismo" do governo Bolsonaro, como define Pennaforte, o atual presidente brasileiro parece empenhado em reverter a situação, diz o pesquisador. A queda na taxa de desmatamento da Amazônia e o retorno de compromissos na área enviam sinais positivos ao mundo.

Entre os produtores rurais, a esperança de que Lula resolvesse o impasse provocado pelas políticas da UE com rapidez está se enfraquecendo, opina Plöger. "Isso pode estar sendo provocado em parte às posições ambíguas de Lula frente ao confronto entre Rússia e Ucrânia, que é uma questão importante para os europeus", analisa.

Segundo Plôger, os produtores reunidos na Abag estariam dispostos a contribuir com a meta de acabar com o desmatamento ilegal e adotar medidas conjugadas que visem a redução das mudanças climáticas. Para convencer as partes envolvidas nas negociações do acordo comercial, o GPS tem trabalhado com representantes do Mercosul na finalização de um documento mais detalhado que será entregue à União Europeia.

Carlos Rittl, diretor de políticas públicas para florestas e mudanças climáticas da Wildlife Conservation Society que acompanhou de perto as negociações, avalia que as críticas feitas pelo agronegócio brasileiro vêm também do incômodo do setor em relação às adequações ambientais necessárias.

"É um acordo de longo prazo. Por mais que haja compromisso muito forte, e o presidente atual sempre fala do compromisso ambiental nos fóruns internacionais e o trabalho da Marina Silva já está entregando resultado, o acordo tem efeito no longo prazo. Se houver mudança do governo, o acordo tem que assegurar que ele mesmo não sirva de incentivo para quem está desmatando", argumenta Rittl.

 

       Venezuela espera que uso 'coercitivo' do dólar termine em breve, com moedas locais ganhando destaque

 

O dólar é frequentemente usado como uma arma de coerção a nível estatal, mas isso acabará em breve, pois surgirão outras opções para o comércio internacional, disse o ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, à Sputnik, à margem da semana de alto nível da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em Nova York.

Na cúpula do BRICS em Joanesburgo, no final de agosto, os líderes do bloco adotaram uma declaração que prevê o uso de moedas locais no comércio mútuo e o "fortalecimento das redes de correspondentes bancários entre os países do BRICS, permitindo liquidações em moedas locais".

"O estabelecimento de uma nova ordem mundial certamente contribuirá para que o dólar deixe de ser a única moeda no comércio internacional. Já podemos ver como, dia após dia, produtos como portadores de energia estão sendo cada vez mais negociados em outras moedas que não o dólar", disse Gil.

Os principais exportadores de alimentos da América Latina, como Argentina e Brasil, também estão começando a usar cada vez mais moedas que não sejam o dólar, acrescentou o ministro.

"Acredito que em breve veremos outras opções no comércio internacional, e a hegemonia do dólar diminuirá, o que todos nós queremos. Como o dólar hoje está sendo usado como uma arma de coerção contra os países, esse equilíbrio, essa cesta de moedas emergentes, será muito bom para o comércio global exatamente porque proporcionaria estabilidade a todos os nossos países", de acordo com ele.

No início de setembro, o analista geopolítico Pepe Escobar disse à Sputnik que os países do grupo BRICS das principais economias emergentes – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – deveriam trabalhar em uma unificação dos sistemas de pagamento e em um mecanismo de comércio em moedas nacionais para impulsionar o comércio mútuo e ser mais independentes.

•        MRE da Venezuela: expansão do BRICS criará uma nova ordem e equilíbrio mundial

A expansão do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) criará uma nova ordem mundial e contribuirá à criação de um mundo mais equilibrado, disse à Sputnik o ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil.

"Esta é uma nova ordem, não só política, mas também econômica, e, claro, se conseguirmos garantir com o tempo a desdolarização do comércio de energia e produtos industriais, por exemplo, das tecnologias que são produzidas na China, Índia, vamos realmente contribuir para a criação de um mundo mais equilibrado", disse o chanceler venezuelano à margem da Assembleia Geral da ONU em Nova York.

A Venezuela aspira se tornar membro do BRICS em um futuro próximo e vê apoio para sua candidatura por parte de todos os países, incluindo a Rússia.

"A Venezuela está buscando se tornar o mais rápido possível um membro oficial do BRICS. Somos fortemente apoiados por Brasil, Federação da Rússia, China e pela própria África do Sul. Todos os países apoiam a nossa candidatura", disse Gil à margem da Assembleia Geral da ONU.

O chanceler acrescentou que em Caracas estão "muito satisfeitos com a expansão que o BRICS tem nesta fase ou terá a partir de janeiro, quando a Rússia se tornar presidente".

Em agosto, durante a cúpula na África do Sul, os líderes dos países do BRICS decidiram convidar a Argentina, o Egito, o Irã, a Etiópia, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita para se tornarem membros plenos da organização. O grupo se expandirá formalmente em 1º de janeiro de 2024.

 

Fonte: Deutsche Welle/Sputnik Brasil

 

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