Lítio: “ouro branco” é fundamental para o futuro de uma Bolívia quase
sem gás
Após quase duas décadas usando recursos do gás
natural para bancar os programas sociais iniciados por Evo Morales, o país
andino vê o recurso próximo do fim em um momento em que uma nova commodity se
torna a bola da vez: o lítio, usado em baterias de carros elétricos. Com as
maiores reservas do mundo, a Bolívia agora luta para extrair o recurso de forma
eficiente – e o mais rápido possível.
No final de julho, o presidente Luis Arce, da
Bolívia, fez um anúncio que deu esperanças ao país: segundo novas estimativas
oficiais, a nação andina conta com reservas de lítio ainda maiores do que
imaginava até então. Hoje, são pelo menos 23 milhões de toneladas da commodity
já confirmadas em território boliviano, 2 milhões a mais do que na última
contagem.
“Temos a maior reserva de lítio do mundo e
precisamos saber como explorar isso de forma inteligente e transformar esse
recurso”, bradou o mandatário – ciente da importância da matéria-prima, e
também das dificuldades do país em aproveitá-la da melhor maneira.
Embora a Bolívia realmente seja a líder mundial em
reservas, ela sequer pega pódio entre os maiores produtores do planeta, uma
lista que conta com Austrália, Chile e China.
{indice] E extrair adequadamente o lítio, o “ouro
branco” tão cobiçado para fabricar baterias em um mercado crescente de veículos
elétricos, é fundamental para o governo conseguir manter seus programas sociais
em dia: afinal, outro produto que hoje centraliza a pauta de exportação em La
Paz, o gás natural, está muito próximo do fim.
De forma quase simultânea ao anúncio otimista de
Arce, na mesma semana, um novo estudo mostrou que a Bolívia está vendo suas
reservas de gás se exaurindo rapidamente e, até 2030, deve inclusive se tornar
importadora do produto.
Hoje, em função de uma queda na produtividade, o
país já enfrenta uma redução das suas reservas internacionais de dólares, o
que, no início do ano, chegou a provocar uma corrida ao sistema bancário por
medo de uma iminente crise cambial – que, no entanto, ainda não se confirmou.
A necessidade de encontrar um novo caminho, porém,
é um fato inegável dentro e fora da Bolívia.
“Os governos do MAS (Movimento ao Socialismo,
partido de Evo Morales e Luis Arce) enfrentam não apenas a urgência da geração
de divisas por meio da exportação para garantir seu programa de cunho social,
mas também a problemática da conservação de biomas e proteção de comunidades
tradicionais, centrais como base de apoio popular em suas sucessivas vitórias
eleitorais”, argumenta a doutora em Relações Internacionais Heloisa Gimenez,
professora da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), em
Foz do Iguaçu (PR).
Até recentemente, o caminho escolhido pela Bolívia
para aproveitar o recurso foi manter a exploração inteiramente nas mãos da
gestão pública, sob a batuta da estatal Reservas de Lítio Bolivianas (YLB, na
sigla em espanhol).
O modelo, no entanto, revelou-se pouco eficiente:
sem tecnologia ou recursos suficientes para avançar com a velocidade
necessária, o governo Arce passou a procurar alternativas fora de suas
fronteiras.
No início de 2023, a Bolívia, enfim, anunciou a
assinatura de um convênio com grupos chineses para a instalação de duas
fábricas nos desertos de sal de Coipasa e Uyuni, onde estão os depósitos do
mineral: o objetivo é que, uma vez em plena operação (algo previsto para o
próximo ano), cada planta seja capaz de produzir 25 mil toneladas de lítio por
ano, uma revolução frente às 600 toneladas que a Bolívia conseguiu produzir por
conta própria em 2022 – número que, mesmo modesto, já foi um recorde nacional.
• Equilíbrio
diante da cobiça estrangeira
Luis Arce corre contra o tempo não somente porque o
gás está acabando: sentado em riquezas capazes de ver a Bolívia virar uma
espécie de “Arábia Saudita do lítio”, uma analogia ao que o petróleo fez para a
economia da nação do Oriente Médio, o país sul-americano sabe que não faltam
interessados em colocar as mãos no recurso que hoje ainda está pouco explorado.
“Politicamente, a situação da Bolívia é muito
crítica. Lideranças ligadas ao MAS e o próprio Evo Morales já acusaram
potências, em especial os Estados Unidos, de apoiarem o golpe de 2019
interessadas diretamente no domínio do lítio”, comenta a cientista social e
economista Angelita Matos Souza, professora da Universidade Estadual Paulista
(Unesp), em Rio Claro (SP).
Em 2019, após concorrer de forma controversa a um
novo mandato consecutivo, Evo Morales teve sua vitória nas urnas questionada
por mobilizações encabeçadas pela direita. Em pouco tempo, polícia e Forças
Armadas se juntaram ao movimento, levando o presidente – que estava no cargo
desde 2006 – a renunciar de maneira forçada para tentar evitar derramamento de
sangue.
Pouco depois, já com a Bolívia sob a gestão
interina de Jeanine Áñez (hoje presa por seu envolvimento no golpe), o
bilionário Elon Musk escreveu no X (antigo Twitter): “Vamos dar golpe em quem
quisermos! Lidem com isso”.
Nunca ficou claro até que ponto Musk falava sério
ou ironizava seus críticos, mas é certo que ele tem interesse íntimo na
exploração do lítio: além de ter se tornado desde então o dono do próprio X, o
oligarca ainda é proprietário da Tesla, uma das maiores empresas do mundo no
setor de veículos elétricos, que dependem das baterias feitas a partir da
matéria-prima para andar.
Antes mesmo de um possível efeito da ingerência
norte-americana ser sentido na concessão do recurso, porém, o golpe acabou
fracassando: um ano após a derrubada de Evo, o MAS voltou ao poder com Arce
sendo eleito democraticamente.
O resultado, agora, é uma política em que o Estado
boliviano ainda tenta manter o controle sobre as jazidas, mas com o novo
entendimento de que precisa do know-how estrangeiro.
“Hoje, há uma disputa entre Estados Unidos e China,
e também países europeus, por esse recurso. É algo que pode favorecer os países
latino-americanos ricos em lítio, que podem jogar com essa concorrência”,
entende Angelita. Por uma questão que também envolve a afinidade ideológica, a
primeira opção da Bolívia para chegar lá foi se aproximar dos chineses.
Segundo os especialistas, uma das formas de tirar
proveito da disputa estrangeira pelo lítio é exigir termos mais favoráveis nos
acordos para explorar as reservas: um negócio que passa pela transferência de
tecnologia, modelo que, no médio prazo, daria autonomia ao país para fazer os
processos de transformação da commodity em seu próprio território.
“Não adianta só exportar carbonato e hidróxido de
lítio (a matéria-prima extraída). Se fizermos isso, vamos apenas reproduzir a
velha estrutura da nossa região. É preciso modificar o cenário para entrar de
vez na quarta revolução industrial. Não é à toa que, quando fez o anúncio do
convênio, Luis Arce falou que começava a era da industrialização do lítio na
Bolívia”, diz o doutor em Economia Política Internacional Bernardo Salgado
Rodrigues, pesquisador do Laboratório de Estudos de Hegemonia e
Contra-hegemonia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e professor
visitante da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).
Em suas falas públicas, o presidente boliviano
garante que, “até o primeiro trimestre de 2025”, o país deve começar a exportar
baterias de lítio feitas ali mesmo, dando um passo decisivo para se afastar da
simples venda de matéria-prima.
• Brasil
pode ter papel de mediação no novo mercado
Quando o assunto é lítio, a conversa dificilmente
sai dos países com a Cordilheira dos Andes em seu horizonte. Pudera: estima-se
que pelo menos 60% das reservas mundiais do recurso estão no chamado “Triângulo
do Lítio”, composto pela própria Bolívia, que tem as maiores jazidas, pela
Argentina e pelo Chile.
Isso não quer dizer, no entanto, que o Brasil
necessariamente vai ficar alheio à nova realidade. Por um lado, o país também
tem uma extração – modesta – do recurso, hoje conduzida pela iniciativa privada
estrangeira no norte de Minas Gerais.
Por outro, a importância brasileira como liderança
regional pode ser essencial para que as várias partes interessadas consigam
chegar a consensos em bloco sobre como explorar e negociar o produto e seus
derivados.
“O Brasil não pode interferir diretamente na
condução do manejo do recurso pelos países do Triângulo do Lítio, mas pode, e
faz sua defesa ampla pela integração regional e autonomia da região frente ao
Norte Global – nem que seja de forma discursiva”, argumenta Heloisa Gimenez,
professora da Unila.
Para os pesquisadores ouvidos pelo Extra Classe, o
canal que poderia viabilizar essa nova realidade é a ressurgida União das
Nações Sul-Americanas (Unasul), órgão multilateral deixado à míngua nos anos de
Jair Bolsonaro e cuja importância vem sendo resgatada no primeiro ano do
governo Lula.
“A Bolívia não teria condições de liderar um projeto
de política integrada, mesmo tendo mais lítio. O Brasil é o país que pode e
deve fazer isso, como já tenta fazer hoje em relação à preservação da Amazônia.
E não precisa ser uma relação de subordinação e dependência, mas de
integração”, defende Angelita Matos Souza.
Em qualquer cenário, a Bolívia e seus vizinhos
sul-americanos estão diante de uma janela de oportunidade para assumir um posto
central na busca em andamento no mundo inteiro por encontrar uma alternativa
aos combustíveis fósseis, um processo conhecido como “descarbonização”.
Essa janela, no entanto, não é infinita: hoje, o
lítio é o futuro, mas pode continuar a ser por muito menos tempo do que se
imagina. Analistas apontam que o ciclo das baterias tende a ser mais curto que
o dos hidrocarbonetos, que há mais de um século movimentam o transporte
terrestre, aéreo e marítimo em todo o mundo.
“Talvez daqui a 10 ou 20 anos não seja mais o lítio
o responsável por essa transição energética: podem surgir baterias mais
eficientes com outros materiais ou, quem sabe, vem o hidrogênio como a grande
alternativa ‘verde’ viável”, argumenta Bernardo Rodrigues. “O que temos que
fazer é buscar sementes de futuro. Precisamos modificar a estrutura que existe
hoje e potencializar nossas indústrias para o mundo descarbonizado,
independentemente da tecnologia que estiver na ordem do dia”, conclui.
Evo
Morales anuncia candidatura à Presidência da Bolívia em 2025
O ex-presidente da Bolívia Evo Morales participará
das eleições do país em 2025, disse ele no domingo (24) em uma mensagem na
plataforma de mídia social X, acrescentando que foi “obrigado” pelos ataques
contra ele.
O anúncio confirma um rompimento entre Morales, um
dos políticos de esquerda mais proeminentes da América Latina, e o atual
presidente da Bolívia, Luis Arce, seu ex-ministro da Economia, dentro do
partido governista MAS.
“Obrigado
pelos ataques do governo… Decidi aceitar os pedidos de nossa militância e de
tantos irmãos e irmãs que participam de comícios em todo o país para ser
candidato à Presidência de nossa querida Bolívia”, disse Morales.
Morales, que liderou a Bolívia por quase 14 anos,
deixou o poder em novembro de 2019, após concorrer a um quarto mandato sem
precedentes em uma eleição marcada por alegações de fraude.
Morales fugiu do país e alegou ter sido vítima de
um “golpe” de direita apoiado pelos Estados Unidos.
Após um governo provisório de 11 meses, Arce obteve
uma vitória eleitoral esmagadora em outubro de 2020, abrindo caminho para que
Morales voltasse para casa.
Futura
fábrica de chips com tecnologia de ponta tornaria China líder no setor de
semicondutores
A tecnologia sem precedentes pode superar as
sanções dos EUA, tornando a China um novo líder no setor de chips
semicondutores, disseram cientistas. Atualmente estão em andamento planos para
a construção do maior acelerador de partículas para ajudar os pesquisadores a
colocar em prática a tecnologia de ponta.
O acelerador de partículas terá uma circunferência
de 100 a 150 metros– aproximadamente o tamanho de duas quadras de basquete. O
feixe de elétrons do acelerador se transformará em uma fonte de luz de alta
qualidade para a fabricação de chips no local e para pesquisas científicas, de
acordo com o comunicado do jornal South China Morning Post.
A equipe da Universidade de Tsinghua está em
discussões ativas com as autoridades da Nova Área de Xiong'an para selecionar
um local de construção para o projeto de ponta.
O projeto chinês tem como objetivo localizar a
fabricação por meio da construção de uma fábrica enorme com várias máquinas de
litografia em torno de um único acelerador.
Essa inovação pode facilitar o desenvolvimento da
produção de chips de alto volume e baixo custo e impulsionar a China para uma
posição de liderança na produção industrial de microchips avançados, conhecidos
como chips de dois nm, e mais além.
Os sistemas de litografia estão entre as peças de
máquinas mais sofisticadas já criadas pelo homem. Atualmente, o ultravioleta
extremo (EUV, na sigla em inglês) com comprimento de onda ultracurto é amplamente
utilizado na produção de chips de sete nm ou menos.
Embora muitos pesquisadores estejam buscando essa
tecnologia, os cientistas chineses seguiram um caminho diferente. Esse projeto
está em andamento desde 2017, mas, graças ao avanço da empresa Huawei na
fabricação de chips, ele só se tornou público recentemente.
"Uma das possíveis aplicações de nossa
pesquisa é como uma fonte de luz para futuras máquinas de litografia EUV. Acho
que é por isso que a comunidade internacional está prestando muita atenção a
nós", disse o líder do projeto e professor da Universidade de Tsinghua
Tang Chuanxiang.
Devido ao fato de que a maior atenção ao projeto
está tendo um impacto negativo no trabalho acadêmico normal, a equipe de Tang
parou de aceitar entrevistas.
A base teórica do estudo é um novo mecanismo de
luminescência, chamado microfeixes em estado estável (SSMB, na sigla em
inglês). Esse mecanismo foi proposto pela primeira vez pelo professor Zhao Wu
da Universidade de Stanford e seu aluno Daniel Ratner em 2010. Zhao é ex-aluno
do famoso físico Yang Zhenning.
Em resumo, a teoria de SSMB usa a energia liberada
por partículas carregadas durante a aceleração como fonte de luz. O resultado é
uma largura de banda estreita, um pequeno ângulo de dispersão e luz EUV pura e
contínua.
As partículas carregadas emitem luz quando são
aceleradas, e os aceleradores que usam esse fenômeno estão entre as fontes
artificiais de luz mais brilhantes disponíveis.
"Ao contrário dos lasers de elétrons livres,
que produzem lasers pulsados com alta potência de pico, as fontes de SSMB
produzem luz contínua com alta potência média", disse Zhao Wu.
O estabelecimento de uma fábrica de chips depende
de fundos e de outros detalhes de engenharia. Mas o mais importante é que novas
ideias podem trazer novas vias técnicas.
Sem nenhum progresso do projeto divulgado ao
público, Tang esperava mais esforços da equipe e do setor para ajudar a
desenvolver os SSMB.
"Sendo uma fonte de luz completamente nova,
foi implementada a verificação experimental da tecnologia. Mas é necessário
construir um dispositivo sólido de pesquisa de fonte de luz de SSMB operando na
banda EUV", afirmou o professor Tang.
Tang acredita que a tecnologia poderia ajudar a
China a se livrar de sanções futuras, mas não falou sobre o progresso
específico de uma máquina de litografia baseada em SSMB.
"Ainda estamos muito longe de desenvolver
máquinas de litografia EUV de forma independente, mas as fontes de luz EUV
baseadas em SSMB nos oferecem uma alternativa às tecnologias sancionadas",
acrescentou Tang.
A criação de fontes de luz SSMB-EUV fornecerá novas
ferramentas para pesquisas avançadas em ciência de materiais, física básica,
bioquímica e outras disciplinas, de acordo com o comunicado do professor.
Fonte: Extra Classe/CNN Brasil/Sputnik Brasil
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