Entenda como a Rússia consegue driblar as sanções ao petróleo impostas
pelo G7
Os russos estão conseguindo evitar com sucesso as
sanções do G7 à maior parte das suas exportações de petróleo bruto e atualmente
exporta a commodity além do limite de US$ 60 por barril. A Rússia alcança valores
que beiram os US$ 100 (R$ 500) por barril. O fato levanta questionamento sobre
a eficácia das sanções ocidentais, que estariam, portanto, errando o
alvo.
A cronista de economia da RFI,
Dominique Baillard, demonstrou em uma análise quais as manobras usadas
pela Rússia para conseguir
driblar o teto imposto pelo grupo composto por: Alemanha, Canadá, Estados
Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido.
"Já sabíamos que a Rússia havia encontrado
rapidamente novos clientes na Ásia, especialmente na China e na Índia, países
que não haviam aderido ao regime de sanções. Eles fizeram um bom negócio porque
esse petróleo foi vendido com um grande desconto em relação ao preço
oficial", conta ela.
Baillard explica que as regras do G7 acabaram por
causar um efeito contrário, dando mais lucro e facilidades nas garantias de
entrega do produto: "Agora estamos descobrindo que a Rússia está vendendo
seu petróleo bruto a um preço muito bom, bem acima do teto de US$60, sem a
necessidade de garantias ocidentais. Isso se deve ao fato de que o teto, que
está em vigor desde dezembro, aplica-se apenas a cargas cobertas por seguradoras".
De acordo com uma reportagem do jornal
britânico Financial Times citada pela jornalista, três quartos
do petróleo bruto exportado pelas empresas russas em agosto foram enviados sem
seguro. Por fim, Moscou teria se beneficiado da cumplicidade de intermediários
localizados em países parceiros, como a Turquia e os Emirados Árabes Unidos,
por onde passam as remessas.
Dominique Baillard aponta que desde o verão europeu
- que durou de julho a setembro - Moscou vem conquistando "o máximo
proveito da recuperação dos mercados de petróleo".
Esse aumento dos preços é o que estaria ajudando a
manter o sucesso russo, juntamente com a Arábia Saudita, ao reduzir seu
fornecimento dentro do cartel da OPEP+ (Organização dos Países Exportadores de
Petróleo), segundo a especialista.
"Além disso, o desconto aplicado a essa
variedade de petróleo bruto diminuiu. Há alguns meses, o Ural (marca de
petróleo de referência usada como base para a precificação da mistura de
petróleo de exportação da Rússia) estava sendo vendido com um desconto de até
US$ 40 no mercado", destaca ela.
Esse desconto caiu para US$12, de acordo com um
estudo publicado recentemente pela Escola de Economia de Kiev. De acordo com a
mesma fonte, entre junho e agosto, o preço do petróleo bruto russo para exportação
saltou de US$ 55 para US$ 73 por barril.
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Receitas do petróleo impulsionam o crescimento
russo
De acordo com o FMI, o crescimento global de 2023
previsto em torno de 1,5%, já seria bom para as finanças públicas. Por outro
lado, o presidente russo, Vladimir Putin, planeja um aumento de 70% no
orçamento de defesa para 2024.
Nesta quarta-feira (27/09), o Banco Europeu para a
Reconstrução e o Desenvolvimento, criado para ajudar as ex-repúblicas
soviéticas, confirmou as previsões de crescimento fornecidas pelo FMI e
expressou sua decepção: "Esperávamos que as sanções fossem mais
eficazes", disse em um comunicado à imprensa.
A Ucrânia quer que o laço seja mais apertado, e
sugere uma redução do teto de US$60 por barril e novas medidas para barrar o
crescimento russo. Eles fazem um apelo para que a Europa seja mais consistente
no rastreamento das exportações de componentes essenciais para o setor militar
que transitam por países terceiros. E pedem um embargo aos diamantes, assunto
que atualmente está sendo discutido no G7. As importações russas desses
elementos preciosos, como os semicondutores, voltaram aos níveis anteriores à
guerra.
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Ucranianos pedem que os europeus abandonem o GNL
russo
As sanções abrangem petróleo e carvão, mas não o
gás, a exceção adotada para garantir que os países europeus mais dependentes
dos suprimentos russos não sejam penalizados. Desde o fechamento dos gasodutos
russos, os 27 países da UE não demoraram a encontrar fornecedores alternativos,
aumentando as importações de gás natural liquefeito, especialmente dos Estados
Unidos.
"Mas, ao contrário de todas as expectativas,
vários países também estão importando grandes quantidades de GNL russo, como
mostram as estatísticas europeias. Este ano, isso se aplica especialmente à
Bélgica e à Espanha. Madri, que atualmente ocupa a presidência da UE, gostaria
de ver o fim dessas compras. Porque elas são contrárias aos objetivos das
sanções, ou seja, privar a Rússia de recursos, mas também porque colocam a
Europa à mercê do Kremlin: 16% das importações europeias de GNL ainda virão da
Rússia este ano", detalha Dominique Baillard.
Ø Lula, Putin e as perspectivas da parceria Brasil–Rússia para a América
Latina e para o mundo
Durante o início dos anos 2000, Brasil e Rússia
testemunharam mudanças significativas em seu status internacional, devido ao
crescimento de suas economias, ao pagamento de antigas dívidas perante o
Ocidente e, não menos importante, por conta da chegada ao poder de novas
lideranças políticas, como Lula e Putin.
Tendo estabelecido boas relações com Putin já em
sua primeira passagem pelo governo brasileiro, Lula, que retornou à presidência
em 2023, vem dando sinais de que a cooperação entre Brasil e Rússia tende a se
aprofundar, o que também trará consequências para a América Latina e para o
mundo.
A própria visita de Sergei Lavrov ao Brasil e de
Celso Amorim a Moscou ainda no início do mandato de Lula já indicava que as
relações russo-brasileiras continuarão próximas. Além disso, como quinto maior
país do mundo e 12ª economia global, o Brasil se apresenta como uma potência
regional proeminente, o que o credencia a um papel político importante para a
política externa russa no Sul Global.
Até é por isso que durante os anos 2000 ambos os
países ampliaram sua cooperação no âmbito do BRICS e do G20, no intuito de
melhorarem sua posição internacional em instituições de governança global
dominadas pelo Ocidente. Ademais, o atual distanciamento com a União Europeia e
os Estados Unidos fez com que a Rússia direcionasse maiores esforços para regiões
como a África e a América Latina, com as quais Moscou detém um rico histórico
de cooperação por conta do legado soviético.
Neste sentido, é importante ter em mente que os
países do chamado Sul Global (do qual o Brasil faz parte) correspondem
justamente àquelas regiões ou países cuja história está fortemente associada à
exploração exercida pelas potências ocidentais em séculos passados. Logo, em
vista de suas desconfianças comuns quanto ao Ocidente, tanto a Rússia como o
Sul Global vêm unindo forças para atingir um mundo multipolar mais justo e
solidário.
Não por acaso, com Lula novamente à frente do
Brasil, o país tem retomado sua liderança na defesa da multipolaridade e do
multilateralismo nas relações internacionais, discurso esse que se coaduna com
o dos russos e, no limite, com o do BRICS. Aliás, o grupo recentemente ampliou
sua presença na América Latina por meio do convite feito à Argentina para fazer
parte do BRICS em 2024, Argentina essa com quem a Rússia também possui boas
relações políticas.
No mais, a Rússia vê com bons olhos demais
iniciativas regionais como o Mercosul, a CELAC e a UNASUL, por entender que
elas objetivam consolidar a América Latina como um dos centros de influência do
mundo multipolar. Com Lula, a liderança do Brasil nestes blocos tem sido
fundamental, atuando na organização de diálogos com outras regiões e países do
globo. A Rússia, por exemplo, possui relações oficiais com a CELAC, assim como
a China, a Turquia, os países árabes e outros atores importantes.
Diante desse contexto, seria razoável esperar por
novas conversações em torno da cooperação entre o Mercosul e a União Econômica
Eurasiática liderada pela Rússia, dado o entrave nas negociações do Mercosul
com a União Europeia, por exemplo. Aliás já existe um memorando nesse sentido
assinado ainda em 2018, mas que acabou sendo deixado de lado devido a crises
políticas internas no Brasil e também por conta de mudanças no governo durante
a administração Bolsonaro.
Seja como for, atualmente o Brasil de Lula e a
Rússia de Putin voltam a se apresentar como atores fundamentais para o
fortalecimento desse diálogo inter-regional, assim como para a defesa do
multilateralismo e da pluralidade civilizacional nas relações internacionais.
Sua cooperação bilateral também se faz importante no discurso em torno da
reforma das instituições monetárias e financeiras globais dominadas pelo
Ocidente e do próprio Conselho de Segurança das Nações Unidas. Vale lembrar que
a Rússia apoio o pleito do Brasil por uma cadeira permanente no Conselho.
Não obstante, a posição russo-brasileira contra o
unilateralismo americano, através da concertação com outras potências
importantes como China, Índia, Irã, Turquia, entre outros, tem se tornado um
dos principais marcos políticos do século XXI.
Com relação à posição do Brasil a respeito do
conflito na Ucrânia, por sua vez, ainda não se sabe quando Lula terá a
oportunidade de encontrar-se pessoalmente com Vladimir Putin para discutir o
assunto. No entanto, uma coisa é certa: quando essa reunião ocorrer, ambos os líderes
ouvirão com bastante interesse e reverência as posições um do outro, o que
poderá trazer algum impulso para o (re)estabelecimento de esforços no sentido
de uma solução negociada para a crise no Leste Europeu.
Ademais, de um futuro encontro entre Lula e Putin
também poderão surgir novas ideias e perspectivas a respeito de uma governança
global mais justa, envolvendo relações mais construtivas entre os países
desenvolvidos e os países em desenvolvimento.
Em resumo, as interações entre Brasil e Rússia possuem
grande potencial em temas como a promoção da cooperação Sul-Sul e Sul-Leste, o
aumento da influência de economias emergentes em instituições multilaterais, o
fortalecimento da América Latina e da Eurásia como atores independentes nas
relações internacionais, entre muitos outros.
Nesse sentido, as relações com a Rússia continuarão
representando um vetor essencial para a política externa brasileira sob o
terceiro mandato de Lula, assim como as relações com o Brasil continuarão
representando uma plataforma valiosa para a aproximação de Moscou com a América
Latina e o Sul Global.
Mesmo diante de um cenário atual bastante
conturbado, tudo indica que ambos os países têm totais condições de caminhar no
sentido do aprofundamento de sua parceria estratégica, cooperando com os demais
países latino-americanos e com o BRICS para a construção de uma ordem
internacional justa e verdadeiramente plural.
Afinal, atuando como líderes em suas respectivas
regiões, as expectativas em torno de Brasil e Rússia são muitas, mas talvez a
principal delas seja essa: de que ambos possam se firmar como importantes
centros de influência num mundo multipolar.
Ø Uso crescente do yuan no comércio Rússia-China está 'corroendo o
domínio do dólar'
O aumento da utilização do yuan no comércio
ampliado entre a Rússia e a China está minando o domínio do dólar americano,
confirmaram novas pesquisas europeias.
A desdolarização se tornou uma palavra da moda, com
formas de contornar o dólar através do aumento do comércio em moedas locais,
como o yuan da China, um item-chave na agenda da recente cúpula do BRICS. Além
disso, o debate sobre a rejeição do dólar vem sendo alimentado pela precária
posição global da moeda norte-americana, à medida que se aproximam as
perspectivas de uma recessão.
"Ao longo de 2022, a parcela das importações
da Rússia faturadas em yuan aumentou 17 pontos percentuais", afirmou o
documento de pesquisa do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento
(BERD). No final do ano passado, 20% das importações da Rússia foram faturadas
em yuan. Além disso, o uso do yuan para liquidar importações de terceiros
países também aumentou, atingindo 5%, acrescentou a pesquisa.
O estudo se referia às sanções ocidentais —
impostas contra Moscou por causa da Ucrânia e concebidas para
"paralisar" a economia russa, um plano que saiu pela culatra em
vários níveis. Depois de Washington e os seus aliados "derrubarem as rotas
comerciais" como parte das restrições, o comércio entre a Rússia e a China
atingiu novos níveis.
Além disso, as sanções "deram ímpeto aos
países para pensarem na diversificação das moedas de faturação e, a longo
prazo, isto poderia desgastar o domínio do dólar", disse a
economista-chefe do BERD, Beata Javorcik, coautora do artigo.
"O uso do yuan como moeda veicular aumentou,
em média, mais quatro pontos percentuais entre os parceiros comerciais que têm
uma linha de swap ativa em yuan", acrescentou o estudo.
Em um contexto de crescente uso do dólar como
"arma" por parte dos EUA, Moscou e Pequim, assim como muitos outros
países, optaram por liquidar uma parte muito maior do seu comércio mútuo na
moeda chinesa, ao mesmo tempo que procuravam abandonar o dólar americano.
Assim, o yuan representou 34% das importações russas em julho e 25% das
exportações, segundo dados do Banco Central de Moscou.
Além disso, a moeda chinesa está sendo cada vez
mais utilizada por países terceiros que têm linhas de swap com o Banco Popular
da China e que não conseguiram ser coagidos a aderir às sanções punitivas e
autolesivas do Ocidente.
As linhas de swap são acordos entre bancos centrais
para trocar as moedas dos seus países entre si.
"Assim, embora o domínio do dólar americano
torne as sanções internacionais mais eficazes, uma vez que os pagamentos
denominados em dólares precisam ser compensados através do sistema bancário dos
EUA, as sanções econômicas podem encorajar um abandono do dólar como moeda
veicular, desgastando assim o domínio do dólar", afirmou a pesquisa do
BERD.
Os números citados na análise apenas destacam o
processo que tem ganhado impulso ao longo dos últimos meses — a desdolarização
está acontecendo a um ritmo constante no BRICS e na economia global.
O lento declínio do dólar americano enquanto moeda
fiduciária mundial e as reservas do banco central aceleraram em 2022, quando
Washington e os seus aliados recorreram a sanções contra a Rússia. As quase
15.000 novas sanções contra Moscou, juntamente com a decisão de congelar uma
parte das reservas internacionais da Rússia, permitiram que grandes países não
ocidentais, incluindo até mesmo aliados e parceiros tradicionais de longa data
dos EUA, finalmente acordassem para os perigos potenciais que ameaçam todos os
países que utilizam o dólar. Foi então que outras moedas como o yuan, entraram
em foco no comércio internacional.
As restrições ocidentais serviram para desencadear
um maior comércio em moedas locais entre Moscou e os seus parceiros. A
participação do rublo nos pagamentos das exportações russas ultrapassou os 50%
e representa mais de um terço do comércio exterior total da Rússia, revelou o chefe
interino do Serviço Federal de Alfândega, Ruslan Davydov, no início deste mês.
Além disso, na recente cúpula do BRICS em
Joanesburgo, os membros manifestaram a sua determinação em aumentar a
utilização de moedas locais nas transações comerciais e financeiras, tanto
entre os Estados-membros do BRICS como com os seus parceiros.
Quanto à China, o comércio da Rússia com o gigante
asiático aumentou 36,5%, para US$ 134,1 bilhões (cerca de R$ 675,9 bilhões),
entre janeiro e julho de 2023, informou a Administração Geral das Alfândegas da
China no início do ano. Durante o período, a China importou bens para a Rússia
no valor de US$ 62,5 bilhões (aproximadamente R$ 315,1 bilhões), um aumento de
73,4% em relação ao mesmo período de 2022, e as exportações da Rússia para a
China aumentaram 15,1%, para US$ 71,6 bilhões (mais de R$ 361 bilhões). Apenas
em julho, o comércio entre os dois países atingiu US$ 19,5 bilhões (cerca de R$
98,3 bilhões), do quais a Rússia forneceu bens no valor de US$ 9,2 bilhões
(aproximadamente R$ 46,4 bilhões) à China e a China forneceu bens no valor de
US$ 10,3 bilhões (mais de R$ 51,9 bilhões) à Rússia.
Durante o mesmo período, o comércio EUA-China
diminuiu 15,4%, para US$ 381,5 bilhões (cerca de R$ 1,9 trilhão), de acordo com
a Administração Geral das Alfândegas da China. As exportações chinesas para os
Estados Unidos no período em análise diminuíram 18,6% em termos anuais, para
US$ 281,7 bilhões (aproximadamente R$ 1,4 trilhão) de dólares.
Apesar das tentativas de interferência de alguns países
ocidentais, a cooperação comercial e econômica sino-russa continua a crescer,
sublinhou o ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, em junho, em
uma mensagem de vídeo na abertura da conferência "Rússia e China:
Cooperação na Nova Era", em Pequim.
Fonte: rfi/Sputnik Brasil
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