'África francesa não existe mais': Macron anuncia retirada de militares
franceses do Níger
O presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou
neste domingo (24/09) que Paris vai repatriar o seu embaixador no Níger e retirar, em
breve, a presença de 1,5 mil militares franceses que se encontram no país
africano. Em julho, um levante militar derrubou o presidente eleito Mohamed
Bazoum e as relações entre os militares nigerinos e a França se deterioraram.
“Não existe mais ‘Françáfrica’. Quando tem um golpe
de Estado, a gente não intervém”, afirmou Macron, em uma entrevista às duas
principais emissoras de TV francesas, TF1 e France 2.
O presidente explicou que, neste contexto, a presença de soldados franceses – que
estão há vários anos na ex-colônia para combater o terrorismo na região – será
encerrada.
“Nas próximas horas, o nosso embaixador [Sylvain
Itté] vai voltar para a França (…) e os nossos soldados, na semana e nos meses
que vêm”, com uma previsão de finalização "até o fim do ano”, informou.
O diplomata já havia sido
declarado "persona non grata” pela junta militar no poder em Niamei.
“Nós não estamos lá para sermos reféns dos
golpistas. Nós continuaremos ajudando o continente africano na luta contra o
terrorismo, mas somente a governos democraticamente eleitos”, advertiu o chefe
de Estado, ao ressaltar o “sucesso” da operação Barkhane, iniciada em 2014 para
conter a emergência do grupo Estado Islâmico e o fortalecimento da Al Qaeda,
entre outras organizações jihadistas, na região africana do Sahel.
“Os golpistas são amigos da desordem. No Mali, há
dezenas de mortos todos os dias”, lembrou, referindo-se a outro país em que a
cooperação militar francesa foi encerrada, no ano passado.
·
Revés para operação francesa
na África
O anúncio sobre o Níger representa um revés da
política da França para África, após militares franceses já terem se retirado
dos vizinhos Mali e Burkina Faso nos últimos anos após golpes militares nesses países.
A França enviou militares à região do Sahel para
combater grupos jihadistas, a pedido de líderes africanos. Desde 2013, quase 5
mil militares franceses foram enviados com essa missão no Mali, em Burkina
Faso, no Chade, no Níger e na Mauritânia.
Em agosto de 2022, mais de nove anos depois de
serem recebidos no Mali como "salvadores", os 2.400 soldados
franceses concluíram sua retirada do país, ordenada por Macron devido à
deterioração das relações com a junta militar no poder em Bamako e perante a
crescente hostilidade da opinião pública local em relação à França.
Dois meses depois, foi a vez de os cerca de 400
militares franceses no Burkina Faso deixarem o país. Desde 2022, o Níger
vinha abrigando boa parte dos militares restantes dessa operação.
A saída dos soldados franceses em alguns casos
costuma ser seguida de uma aproximação com
o Grupo Wagner, como no caso
do Mali, onde a junta militar no poder em Bamako fez um acordo com os
mercenários para apoiar o seu exército.
"Estivemos lá porque o Níger pediu a nós,
Burkina Faso e Mali, para os ajudarmos a combater o terrorismo nos seus
territórios. Hoje, esses países foram vítimas de golpes de Estado. Ainda hoje
falei com o presidente Bazoum, que agora está detido porque realizava reformas
ambiciosas", disse Macron.
O contingente francês no Níger, país onde a França
também tem interesses econômicos no urânio, está distribuído entre a capital
Niamey, Ouallam, ao norte, e Ayorou, perto da fronteira com o Mali. Macron
afirmou que a retirada dos militares será feita de forma gradual e em
coordenação com a junta militar que atualmente governa o Níger.
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Relações tensas com o Níger
A junta que assumiu o poder em Niamei já havia
sinalizado que desejava a retirada do contingente francês do país. No início de
agosto, os militares anunciaram o fim dos acordos de cooperação assinados com
Paris.
O regime afirmou que, em 1º de setembro, que houve
uma reunião entre o chefe do Estado-Maior nigerino e o comandante das forças
francesas no Sahel para discutir "um plano de retirada das capacidades
militares francesas”.
Antes do levante de 26 de julho, o país da África
Ocidental e antiga colônia francesa era um dos seus últimos aliados no Sahel. A
França considera o presidente deposto Mohamed Bazoum, mantido refém pela junta
militar no poder, como presidente legítimo do país e rejeita as reivindicações
dos golpistas.
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Sentimentos antifranceses
O Níger foi uma colônia francesa desde o início do
século 20 até 1960, quando se tornou um país independente. Hoje é um dos
principais fornecedores de urânio para as usinas nucleares francesas, com cerca
de um terço do total num país onde 70% da eletricidade é gerada por reatores
atômicos.
Para muitos africanos, o passado colonial pesa
contra a França. E a isso se une, no período pós-colonial, o frequente apoio do
Eliseu a autocratas africanos. Além disso, muitas pessoas na África percebem o
presidente Emmanuel Macron como arrogante, o que certamente não melhora a
imagem da França.
Apesar da percepção de arrogância que o acompanha,
deve ser dito que poucos líderes franceses empreenderam tantos esforços para
melhorar a imagem da França na África como Macron.
Num gesto pouco comum para líderes franceses, ele
viajou até Ruanda para reconhecer que a França teve grande responsabilidade no genocídio de 1994, que deixou cerca de 800 mil mortos.
Macron elevou a ajuda financeira ao continente,
começou a devolver obras de arte roubada na época colonial e deu apoio militar para combater militantes jihadistas que já
mataram inúmeros civis na África.
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França não poderá ‘acolher toda a miséria do mundo'
Na entrevista, Emmanuel Macron também respondeu às
críticas do papa Francisco sobre a "indiferença" europeia à chegada
de milhares de migrantes nas fronteiras do bloco. O pontífice encerrou neste
sábado (23/09) uma visita de dois dias a Marselha, no sul da França, e o tema
foi evocado.
O presidente declarou que a França está fazendo “a
sua parte” em termos de acolhimento dos migrantes. “O papa tem razão em pedir
um sobressalto contra a indiferença”, mas “nós, franceses, estamos a fazer a
nossa parte”, disse o líder.
“Não podemos acolher toda a miséria do mundo",
acrescentou, usando a famosa frase do antigo primeiro-ministro socialista
Michel Rocard.
Macron convocou uma resposta europeia para
"uma abordagem consistente com os países de origem e os países de
trânsito” dos migrantes, e pediu para "não deixar os italianos sozinhos”.
A Itália é uma das principais portas de entrada na Europa de migrantes vindos
da África pelo mar Mediterrâneo.
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Cooperação com países mediterrâneos
Aos países da margem sul do Mediterrâneo, em
particular à Tunísia, ele espera que a Europa se ofereça para “levar estudos,
especialistas, equipamentos, etc. às suas costas para desmantelar os
traficantes de pessoas”, como parte de “uma parceria respeitosa”.
“É isso que estamos fazendo com os britânicos.
Concordamos em ter especialistas britânicos em Calais para nos ajudar a
desmantelar estas redes de contrabandistas e temos resultados muito bons”,
explicou Macron.
No plano interno, o presidente defendeu que a lei
de imigração que será analisada no início de novembro no Senado seja objeto de
um “compromisso inteligente”, particularmente sobre o polêmico tema da
regularização de imigrantes sem documentos para exercer profissões com falta de
mão de obra na França.
“Não devemos ser hipócritas: há, de fato,
profissões sob tensão que contratam muitas mulheres e homens que vêm da
imigração e que muitas vezes estão em situação precária há vários anos”,
lembrou o chefe do Estado. Mas adverte: “não existe direito incondicional à
regularização. Nunca haverá”.
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'Forças imperialistas não são bem-vindas':
militares do Níger apoiam retirada das tropas francesas
As novas autoridades do Níger declararam que as
forças coloniais no território do país não são bem-vindas, diz um comunicado
dedicado à retirada das tropas francesas do país fornecido à Sputnik.
No domingo (24), o presidente francês Emmanuel
Macron anunciou que a França retiraria o seu embaixador de Niamey e todo o
pessoal da sua embaixada do Níger, bem como que as tropas francesas deixariam o
Níger "de forma organizada antes do final do ano".
"Qualquer pessoa, organização ou estrutura
cuja presença ameace os interesses do nosso país deve deixar o território dos
nossos antepassados, quer queiram, quer não. O povo soberano do Níger recorda o
princípio firme e inviolável da retirada das forças estrangeiras da junta
francesa. As forças imperialistas e neocolonialistas não são bem-vindas ao
nosso território nacional", afirma o Conselho Nacional para a Salvaguarda da
Pátria (CNSP), formado pelos militares do Níger.
O papel acrescenta que o Níger se lembra da
necessidade de as forças francesas serem retiradas do país.
Atualmente, 1.500 soldados franceses estão
presentes no Níger e 1.000 no Chade. Quando ocorreram os golpes em Burkina Faso
e Mali, os militares também foram forçados a se retirarem.
No dia 26 de julho deste ano, um grupo de oficiais
integrados no CNSP proclamou pela televisão estatal a destituição do presidente
do Níger, Mohamed Bazoum, alegando "a contínua deterioração da situação de
segurança" e a "má governança econômica e social".
Dois dias depois foi anunciado que o general
Abdourahamane Tchiani, antigo comandante da guarda presidencial, assumiria a
liderança do CNSP e as funções de "presidente provisório" no Níger.
Numerosos países e organizações internacionais,
como a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO),
condenaram veementemente o golpe militar no Níger, suspenderam os seus
programas de cooperação com o país africano e exigiram a restauração da ordem
constitucional.
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'Isso é vitória do povo', diz político nigerino
após anúncio da retirada das tropas francesas
O membro do Partido da Renovação Democrática e
Republicana do Níger Omar Mokhtar al-Ansari considerou as ações da França como
uma perda para ela e uma vitória para o povo nigerino, que exigiu sua retirada
em dois meses e realizou inúmeras manifestações para esse fim.
"É muito estranho que o presidente francês
tenha dito que a decisão de retirar as tropas foi devida supostamente ao desejo
unilateral da França, na verdade, foi devido à pressão das autoridades e do
povo do Níger. Os militares do Níger estão eufóricos com a vitória e a retirada
da França", afirmou o político nigerino à Sputnik.
Ele atribuiu a incapacidade de Macron de
especificar uma data para a retirada das tropas do Níger ao fechamento do
espaço aéreo e ao processo de realocação das três bases para outro país, já que
nem todas retornariam a Paris, mas seguirão para países africanos vizinhos.
Omar Mokhtar al-Ansari enfatizou que "o Níger
exige que qualquer país respeite sua soberania, só então será capaz de cooperar
em todos os níveis com as autoridades do Níger".
Ele ressaltou que os problemas só surgem quando o
"discurso colonial" é aplicado a um país livre.
No domingo (24), o presidente francês Emmanuel
Macron anunciou que a França retiraria o seu embaixador de Niamey e todo o
pessoal da sua embaixada do Níger, bem como que as tropas francesas deixariam o
Níger "de forma organizada antes do final do ano".
Fonte: rfi/Deutsche Welle/Sputnik Brasil
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