Os arrastões
evangélicos e o apelo ao cristofascismo
Há
alguns dias fui apresentado a um vídeo, no qual um grupo de evangélicos entoava
louvores dentro de um supermercado na zona oeste do Rio de Janeiro. Em meio a
frutas e legumes, os participantes do ato manifestaram toda uma adoração a
Jesus, a pretexto de um “avivamento” coletivo que, dentro do conceito religioso
protestante, significa um despertar, uma conversão espiritual provocada pela
presença de Deus em um determinado lugar. No caso do suposto avivamento
ocorrido no supermercado carioca, ele bem que poderia ter sido uma forma de
despertar social chamando a atenção para as milhões de pessoas que estão
passando fome no país, em função dos altos preços dos produtos que compõem a
cesta básica do brasileiro. Mas isso é utópico demais. Seria quase apocalíptico
imaginar que o “Cristo” que a maioria dos evangélicos adora hoje em dia,
estivesse preocupado com os mais pobres e com os mais necessitados.
Antes,
porém, é necessário entender a origem dessa ideia religiosa “avivamentista” e
perceber em que ponto ela se intersecciona com o fascismo e com o projeto de
poder evangélico que pretende tomar o Brasil de assalto, com direito a gesto de
“arminha” na mão e muito ódio no coração. A ideia teológica de restauração
espiritual sugerida pelo termo “avivamento” e que remete à manifestação do
Espírito Santo na festa de Pentecostes, do grego pentēkostḗ, que significa
“quinquagésimo”, festividade originada a partir de uma tradição hebraica
chamada Shavuoth, cujo significado é “Semanas”, e era uma celebração feita
pelos Judeu em agradecimento à Deus pela colheita realizada cinquenta dias após
a Páscoa, ganhou força a partir do protestantismo norte-americano em 1730,
quando historicamente eles reconheceram “o primeiro grande despertamento”, que
teria se dado até 1740.
É
importante considerar que, ao contrário do que acontecia na fase da igreja
primitiva, onde tais avivamentos eram puramente motivados pelo fervor dos fiéis
em receberem em si o “fogo do espírito santo” e se converterem a Cristo, como é
possível observar na Bíblia, no livro de Atos – 2,41, durante a idade média
tais manifestações eram induzidas em outras culturas, por meio da expansão do
cristianismo aliada à colonização europeia. Um pouco mais adiante, tal
“despertar espiritual coletivo” acontecia quando o domínio religioso se via
ameaçado. Como no período iluminista, quando o movimento cultural propunha
mudanças políticas, econômicas e sociais naquela época. O Iluminismo se opunha
à religião e acreditava na disseminação do conhecimento e no estímulo ao
pensamento crítico, como forma de enaltecer a razão em detrimento do pensamento
religioso vigente.
O
que estamos começando a presenciar no Brasil, longe de ser uma pentecostes
tupiniquim, não passa de um movimento orquestrado por líderes de denominações
evangélicas influentes na política, cujo intuito é manter acesa a chama do fogo
do cristofascismo nos corações de seus fiéis eleitores. O comunismo continua a
ser o “diabo” a ser destruído e o progressismo das esquerdas, que visa promover
inclusão social e mais igualdade através de investimentos em educação e
cultura, sugerindo uma desconstrução de valores conservadores que mantêm,
sobretudo, os mais pobres como reféns de uma senzala ideológica construída pela
igreja evangélica dentro das periferias brasileiras, demônios a serem repreendidos
através de avivamentos coletivos em locais públicos. Outras manifestações
supostamente espirituais e espontâneas, também foram registradas em dois
shoppings do país. Um em Goiânia, outro em Petrópolis, no Rio de Janeiro.
A
ideologia cristofascista que pontua essas manifestações, se caracteriza por uma
ideia totalitarista e imperialista representada por segmentos da chamada igreja
cristã. Uma antítese da teologia da libertação defendida pelo Frei Leonardo
Boff e pela teóloga alemã Dorothee Sölle, criadora do termo “cristofascismo” a
partir da percepção de que o partido nazista e as igrejas cristãs na Alemanha,
se relacionavam de modo a contribuir com o desenvolvimento do Terceiro Reich.
Os protestantes alemães eram, em sua grande maioria, luteranos, e Hitler nunca
escondeu a sua profunda admiração pelo reformista. Tanto, que no seu livro
“Mein Kampf”, ele cita Martinho Lutero como uma das três principais figuras da
Alemanha. Pouco se fala também, mas Lutero, que é considerado o pai do
nacionalismo alemão e de sua igreja reformada, era tido como terrivelmente
antilatino e antissemita. A identificação do nazismo com sua representatividade
social era tanta, que a sua imagem foi utilizada por Hitler em sua campanha à
presidência nas eleições de 1933, ao lado da suástica.
Não
é mera coincidência o fato de Jair Messias Bolsonaro ter surgido entre boa
parte dos evangélicos brasileiros, como uma espécie de grande líder
nacionalista e defensor dos valores morais e “cristãos” da nossa sociedade. O
cristofascismo brasileiro remonta o alemão e o de outros países europeus, onde
líderes cristãos sempre apoiaram supremacias, regimes totalitários e governos
que instituíram políticas de ódio e intolerância contra minorias, se
contrapondo ao Evangelho de Cristo que passa a ser adaptado aos interesses do
fascismo político que detém o poder. Quem não se lembra de Bolsonaro ordenando
que as minorias se rendessem ao seu poder ou desapareceriam sob ele? Uma forma
de legitimar a violência contra seus opositores, a pretexto de uma legítima
defesa da pátria e de seus valores que estariam em risco. Afinal, ele teria
sido escolhido por Deus e pelo seu povo, para libertar a nação do comunismo, do
socialismo e de outros bichos-papões imaginários criados para promover
“avivamento” nos fiéis através da propagação do medo.
É
bom não subestimarmos e nem naturalizarmos esses arrastões evangélicos que
começam a pipocar em locais públicos e em diferentes pontos do país. Eles podem
ser mais perigosos do que possamos imaginar e preceder algo terrivelmente
nocivo à liberdade da população e à laicidade do Estado. O cristofascismo é
diabólico, porque faz com que os seus seguidores, além de não respeitarem a
existência de outros credos e culturas, lutem para que estes sejam instintos,
em nome de um reinado religioso único e sob a égide da glória de um deus criado
à imagem e semelhança da distopia que eles são instados a reproduzir como
vontade divina. As ideologias políticas que não estiverem alinhadas com as
normas desse “Cristo”, devem ser combatidas como inimigas da “palavra de Deus”,
assim como os seus seguidores. Assim sendo, um governo autoritário, como foi o
de Bolsonaro, se apropria de uma teologia fundamentalista para impor opressão
àqueles que fogem aos padrões conservadores e tidos como tradicionais.
O
apelo ao cristofascismo é grande. Mas a nossa resistência deve ser maior. Que
Deus nos defenda dos seus seguidores!
Ø
44%
temem “ameaça comunista com Lula”: após 4 anos de fake news
institucionalizadas, o bode na sala virou elefante. Por Laís Gouveia
Após
a vitória de Lula, uma amiga me convidou para um café. Na verdade, foi mais um
monólogo desesperado. A degustação do café que, de acordo com o solícito
atendente, vinha do mais puro solo mineiro, ficou para segundo plano.
Segue
abaixo um trecho da resenha:
“Laís,
tô ficando louca com meu namorado (namorido). Na hora que deram a vitória de
Lula, ele entrou num surto, começou a se debater no chão, rolar, chorando feito
uma nenêm com cólicas. Gritava como se estivesse esfaqueado”.
“E tem mais, não parou por aí. O vizinho é
Lula roxo, ficou feliz, começou a colocar aquela musiquinha famosa do Lula. Ele
queria invadir a casa do vizinho para brigar com o homem. Conseguimos impedir.
Mas da janela, aos prantos, ele gritava que os comunistas estavam chegando para
dominar o país”.
Então....
Para
além de indicar que a amiga em questão (que não quis revelar seu voto)
precisava urgentemente fugir do Chernobyl, lembrei-me do episódio após pesquisa
Ipec dessa semana:
44%
dos brasileiros veem ameaça comunista com Lula. Desses, 31% dizem
acreditar “totalmente” nessa possibilidade.
O
dado acima mostra que o desafio que temos é imenso.
Vou
resgatar uma situação: vocês se recordam de uma moradora de um bairro no
Guarujá que foi morta após ser espancada por moradores que caíram num boato de
que a mulher era uma bruxa que sacrificava crianças? Pois é. Um boato de rua
tomou gigantesca proporção. Uma mentira propagada de forma bruta, sem nenhum
aparato, vitimou uma inocente.
Agora,
imaginem uma fake news institucionalizada, com gabinete do ódio, com tecnologia
de ponta, funcionários, rede internacional e claro, a cereja do bolo: a
“credibilidade” da presidencia da República para propagar as maiores
sandices.
O
bode na sala virou um elefante recheado de fatos folclóricos, esses que são o
elo de sustentação do bolsonarismo, como Nikolas e sua bandalha demonstram bem
no Congresso.
O
problema é que parcela importante da população acredita e está envolto neste
universo paralelo, que cheira à naftalina.
E
vamos à luta neste imenso combate!
Fonte:
Por Ricardo Nego Tom, em Brasil 247
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