Lauro Veiga: No
“planeta BC”, política de juros pode até fomentar o pleno emprego
O
comunicado emitido pelo Comitê de Política Monetária (Copom) no encerramento de
sua mais recente reunião, na quarta-feira, 22, quando decidiu manter a taxa
básica de juros em indecentes 13,75% ao ano, demonstra contradição e, sob certo
aspecto, certa dose de dubiedade ao fundamentar a decisão tomada com base numa
conjuntura marcada por “alta volatilidade nos mercados financeiros e
expectativas de inflação desancoradas em relação às metas em horizontes mais
longos”. Basicamente, os juros vão continuar nas alturas porque os mercados
continuam voláteis, o que não chega a ser novidade, e ainda porque as
expectativas dos mesmos mercados em relação à inflação deste ano e de 2024
mantêm-se acima da meta inflacionária perseguida pelo Banco Central (BC), fixada
em 3,25% em 2023 e em 3,0% para 2024. Além disso, o Copom deixa em aberto a
possibilidade (no caso, a ameaça) de novos aumentos dos juros, ao anotar que
“não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não
transcorra como esperado”.
No
que parece ser um distanciamento da realidade, o comitê considera ainda que a
estratégia escolhida para a política de juros, “sem prejuízo de seu objetivo
fundamental de assegurar a estabilidade dos preços, (…) também implica
suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno
emprego”. Resta saber em que planeta juros reais muito próximos de 8,0% ao ano
podem ser considerados um “fomento ao pleno emprego”.
• O “jogo das expectativas”
Na
prática, a alta direção do BC praticamente deixou de lado o “balanço de riscos”
delineado pelos mesmos diretores, que formam o colegiado do Copom, desprezando
a ameaça de recessão que paira sobre a economia, associada a uma crise de
crédito – muito embora o próprio comunicado faça menção ligeira a esses
fatores. O problema esteve desde sempre no “jogo de expectativas” fomentado
pelo mercado financeiro, que movimenta suas peças tendo sempre em mira seus
interesses próprios, que pouco ou nada têm a ver com os interesses maiores do
País. As previsões do mercado financeiro para a inflação ajudam a construir a
“base técnica” que fundamenta as decisões do Copom.
Além
dos juros no mercado futuro, amplamente manipulado pelo mercado, o BC afere as
expectativas inflacionárias a partir de seu relatório Focus, ferramenta criada
pela autoridade monetária para aferir o que os mercados esperam em relação às
taxas inflacionárias, desconsiderando todo o restante da sociedade e seus
representantes. “As expectativas de inflação para 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa
Focus se elevaram desde a reunião anterior do Copom e encontram-se em torno de
6,0% e 4,1%, respectivamente”, reforça o comunicado da última quarta-feira.
Entre
o começo de fevereiro e o início desta semana, quando saiu a edição mais
recente do relatório, as previsões dos mercados para o Índice Nacional dos
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2023 saiu de 5,78% para 5,95%, numa
preciosidade que jamais descarta a segunda casa depois da vírgula, eliminada no
comunicado do Copom. As apostas para a inflação de 2024 variaram quase na mesma
proporção, variando de 3,93% para 4,11%. Se houvesse maldade no mundo, o
comentarista poderia afirmar que os juros vão continuar onde estão, sob o risco
de afundar a economia e acelerar o desemprego, por conta de um acréscimo de
meros 0,17 pontos percentuais nas projeções inflamadas pelo mercado. Não que o
BC desconheça os riscos, mais uma vez. “O comitê (leia-se Copom) avalia que a
desancoragem das expectativas de longo prazo eleva o custo da desinflação
necessária para atingir as metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional
(CMN)”, assinala em seu comunicado.
• Balanço de riscos
No
seu “balanço de riscos”, no lado das ameaças, o Copom relaciona a “maior
persistência de pressões inflacionárias” em todo o mundo (embora as taxas de
inflação venham cedendo ao longo do tempo, saindo de pouco mais de 9,0% ao ano
nos Estados Unidos para algo próximo a 6,0% nas medições mais recentes, num
exemplo); “a incerteza sobre o arcabouço fiscal”, que teve seu anúncio pelo
governo adiado para depois da viagem à China; e “uma desancoragem maior, ou
mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos”.
No
lado mais positivo daquele balanço, o colegiado menciona a possibilidade de
baixa “adicional nos preços das commodities internacionais em moeda local”; a
perspectiva de desaceleração mais acentuada do que a esperada da atividade
econômica global; e “desaceleração na concessão doméstica de crédito maior do
que seria compatível com o atual estágio do ciclo de política monetária”.
Nitidamente,
ainda que reconheça o risco de um encolhimento do mercado de crédito, o BC
parece crer que os níveis atuais dos juros não teriam “poder” suficiente para
detonar uma crise ainda mais séria na oferta de crédito. Mantidas as condições
atuais, portanto, o “atual estágio do ciclo da política monetária” seria
compatível com um cenário de alguma redução no crédito, mas nada dramático, na
avaliação da autoridade monetária. A ver se sua avaliação corresponde ao que de
fato têm sugerido indicadores mais recentes.
Na
segunda menção à questão fiscal, o comitê considera que a volta da cobrança de
impostos e contribuições federais sobre os combustíveis reduziu a incerteza em
relação aos resultados fiscais no curto prazo. Para reforçar na sequência: “Por
outro lado, a conjuntura, marcada por alta volatilidade nos mercados
financeiros e expectativas de inflação desancoradas em relação às metas em
horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política
monetária”.
• Nem tão dramático
Em
seu relatório de avaliação de receitas e despesas primárias, considerando os
dados do primeiro bimestre deste ano, o Ministério da Fazenda revisou para cima
a previsão de receitas para 2023, reduzindo ligeiramente a projeção para a
despesa primária (aquela que exclui gastos com juros). A receita líquida
esperada para este ano foi elevada em 6,09%, saindo de quase R$ 1,806 trilhão
para R$ 1,916 trilhão, num ganho de R$ 110,0 bilhões, em função de um
incremento de quase 7,0% nas receitas administradas pela Receita Federal do
Brasil (RFB), principalmente por conta de alta de 21,3% na arrecadação da
Cofins, frente à previsão incluída na lei orçamentária deste ano.
A
despesa primária esperada foi reduzida em 0,52%, de R$ 2,034 trilhões para R$
2,023 trilhões, como decorrência de gastos menores do que os previstos
inicialmente com pensões e aposentadorias, com a folha de pessoal e com abono e
seguro desemprego. A consequência dessas revisões foi um corte de quase 53,0%
no déficit primário previsto para 2023, saindo de R$ 228,1 bilhões (2,1% do
PIB) para R$ 107,6 bilhões (1,0% do PIB). A se confirmarem, as projeções
deveriam esfriar os ânimos dos fiscalistas mais exaltados, diante da
perspectiva de um cenário mais favorável para a gestão da dívida pública
federal.
Arcabouço, não calabouço fiscal. Por
Paulo Nogueira Batista Jr.
Foi
adiada para abril, para depois da viagem do presidente Lula à China, a decisão
sobre o arcabouço fiscal que substituirá, por lei complementar, o teto
constitucional de gastos. A decisão de adiar a proposta do governo me parece
correta. Por que tomar de afogadilho, a portas fechadas, decisão de natureza
estratégica, que afetará a política fiscal ao longo dos próximos anos?
Recorde-se
que o governo está dando sequência a algo muito importante aprovado na PEC de
transição. Ali, por sugestão e redação do próprio ministro Haddad, como ele
mesmo me disse, foi estabelecido um dispositivo inteligente que – ponto nem
sempre notado –efetivamente desconstitucionalizou o arcabouço fiscal, ao prever
que o teto de gastos deixará de existir depois que for aprovada a lei
complementar estabelecendo um novo marco fiscal. É a elaboração dessa lei
complementar que está em discussão.
• Credibilidade versus flexibilidade
Não
tenho conhecimento da alternativa ou alternativas elaboradas no Ministério da
Fazenda, pois tudo foi conduzido até agora sob segredo. Mas a matéria em si
mesma não requer sigilo. Melhor seria que se inaugurasse debate aberto sobre o
assunto, antes do presidente Lula encaminhar proposta ao Congresso.
Do
ponto de vista teórico, existe sempre um trade-off, um dilema entre
flexibilidade e credibilidade. A busca de credibilidade leva a fórmulas mais
rígidas, sacrificando a liberdade da política econômica. Inversamente, regras
muito flexíveis tendem a não gerar confiança. Isso vale não só para a área
fiscal, mas também para as áreas monetária e cambial.
Admitindo-se
que seja necessário ou aconselhável estabelecer regras ou âncoras, convém
seguir modelos rigorosos e buscar a credibilidade a todo custo? Não parece
razoável. Estou entre aqueles que preferem dispositivos flexíveis, que não
engessem a política econômica. O futuro é sempre incerto e fixar regras rígidas
acaba não sendo recomendável na prática. Melhor deixar margem para adaptações e
revisões. A confiança pode ser criada e fortalecida ao longo do tempo, com a
execução responsável das políticas públicas.
No
campo das contas públicas, o papel de uma regra flexível é ajudar na criação de
confiança, sem impedir, entretanto, que a política fiscal desempenhe seu papel
como instrumento central da política econômica. Arcabouço, não calabouço
fiscal.
No
caso do Brasil, a flexibilidade é particularmente importante, uma vez que é
difícil imaginar um cenário de recuperação da economia e distribuição de renda
que não passe por uma política fiscal ativa, que inclua ampliação do
investimento público e das transferências e outros gastos sociais. O arcabouço
fiscal que agradará o mercado financeiro e o Banco Central, que corresponda a
suas expectativas e preconceitos, dificilmente será compatível com um programa
de desenvolvimento econômico e social. Não se deve adotar regras que o mercado
financeiro aplauda como “robustas” para depois descobrir, ao longo dos anos,
que a política fiscal não pode isso, não pode aquilo, e ficou basicamente
manietada e imobilizada.
• Uma regra flexível e simples
A
minha preferência, assim como a de muitos outros economistas, no Brasil e no
exterior, é por regras flexíveis, simples e que não sejam pró-cíclicas, como
são alguns tipos de âncoras. Em outros termos, melhor adotar regra ou arcabouço
fiscal facilmente inteligível que dê margem à adoção de políticas anticíclicas
sempre que necessário, permitindo que a política fiscal seja mais restritiva em
períodos de aquecimento excessivo da economia e mais expansiva em períodos de
recessão ou estagnação.
Um
arcabouço fiscal desse tipo poderia tomar o seguinte formato. Seriam definidas,
com certa antecedência, metas anuais para o resultado primário do governo na
forma de uma banda, com distância ampla entre piso e teto. A lei preveria que,
em épocas de recessão ou crescimento lento, o resultado ficaria próximo do
piso; em épocas de crescimento elevado, próximo do teto. A regra não seria,
assim, pró-cíclica.
Evitar
pró-ciclicidade é importante. Quando a economia cresce mais vigorosamente, as
receitas públicas sobem e diminuem certos tipos de gastos, como o
seguro-desemprego. O déficit se reduz, ou o superávit aumenta, de forma
automática. O inverso ocorre quando a economia desacelera. O arcabouço fiscal
teria que ser desenhado com esses efeitos automáticos em mente. E deveria
deixar, além disso, certa margem para uma política fiscal ativa, capaz de
proporcionar impulso ou contração fiscal, conforme a situação da economia.
Uma
banda atenderia esses requisitos. Fixar uma meta única para o resultado
primário já não. Em época de recessão, por exemplo, o resultado primário
diminuiria automaticamente, distanciando-se da meta fixada. O governo, para
cumprir o estabelecido, seria levado a cortar gastos ou aumentar tributos,
reforçando o movimento recessivo da economia. Um erro seria, por exemplo, fixar
um horizonte para zerar o déficit primário. Se a economia continuasse crescendo
pouco ou nada, esse tipo de objetivo conduziria à recessão e ao aumento do
desemprego.
Uma
banda para o resultado primário tem algumas outras vantagens como alvo da
política fiscal. Primeiro, o superávit ou déficit primário é uma variável
conhecida, com longa série histórica. Segundo, é uma variável observada, e não
construída por modelos, como seria por exemplo o resultado primário estrutural
ou ajustado para excluir efeitos cíclicos. Terceiro, é um resultado sobre o
qual a política fiscal tem razoável controle, diferentemente da dívida pública
ou do déficit fiscal total, mais sensíveis a outros aspectos da política
econômica e a variáveis fora do controle governamental.
A
simplicidade da regra é outra vantagem. Um arcabouço complexo, com muitos
dispositivos, cláusulas de escape e gatilhos, dificultaria a compreensão da
proposta e o acompanhamento da sua execução. Seria, também, mais fácil
desfigurá-lo durante a tramitação no Congresso, pois a complexidade abriria a
porteira para todo tipo de ideia extravagante.
Todo
arcabouço deve prever também normas para o caso de descumprimento das regras. O
que aconteceria se a regra aqui proposta fosse descumprida? Também nesse ponto
seria preferível adotar procedimentos simples. Em caso de resultado fora da
banda estabelecida, a Fazenda enviaria documento detalhado ao Congresso,
justificando o desvio, a exemplo do que faz o Banco Central, em carta à
Fazenda, quando a inflação escapa da banda no regime de metas para a inflação.
O ministro da Fazenda, assim como deveria fazer o presidente do Banco Central,
compareceria trimestralmente ao Congresso para dar explicações e responder a
questionamentos sobre a condução da política e o cumprimento da meta.
O
arcabouço proposto seria flexível demais? Não creio. Afinal, pergunto, por que
o regime fiscal teria de ser mais rígido do que o monetário? A política fiscal
deve, em princípio, ter o mesmo tratamento que a monetária. Isso facilitaria
inclusive a harmonização das políticas fiscal e monetária, desejada pelo
ministro Haddad. O essencial é que a regra ou regras sejam razoavelmente
flexíveis, simples e fáceis de comunicar.
• Política fiscal ativa – essencial para a
retomada econômica com justiça social
O
desafio é conferir alguma previsibilidade à política fiscal e ganhar confiança,
sem perder o essencial, isto é, a flexibilidade para acionar programas sociais,
os investimentos públicos e a reforma tributária. A economia brasileira
experimenta uma estagnação que já dura dez anos. Continua a ser um dos países
mais desiguais do mundo.
Alguém
imagina que será possível redistribuir renda sem lançar mão de políticas de
gasto e tributárias? Alguém imagina que a retomada virá da restauração da
confiança na política econômica e dos efeitos dessa restauração sobre o consumo
e o investimento do setor privado? A maior confiança poderia no máximo ajudar,
reforçada pela suavização da política monetária.
A
liderança tem que partir do Estado, único agente capaz de lançar e coordenar o
esforço de retomada econômica e distribuição de renda. A política fiscal ativa
constitui uma alavanca essencial que, coadjuvada pela mobilização dos bancos
públicos e pela revisão da política monetária, poderá realizar os objetivos
tantas vezes adiados de tirar a economia do marasmo e criar um país mais justo.
Por que recuperar a indústria brasileira.
Por José Álvaro de Lima Cardoso
Não
existe país soberano sem a presença de indústria desenvolvida, princípio que
vale para situações de paz, assim como em eventuais conflitos. A indústria é
também fundamental na geração de emprego e renda, inclusive de melhor
qualidade. Segundo estimativa da Confederação Nacional da Indústria, para cada
1 real produzido no setor, se gera 2,63 reais na economia como um todo. É fácil
compreender que a alavancagem de valor na indústria significa a movimentação da
cadeia produtiva como um todo: comércio, setor de pesquisa, serviços em gerais,
transporte, logística, infraestrutura, e assim por diante.
A
cadeia estruturada pela indústria, pode ser exemplificada pelo ramo
petroquímico, área da química encarregada dos derivados de petróleo e sua
utilização na indústria. A indústria petroquímica transforma petróleo bruto em
uma gama enorme de produtos como gasolina, gás liquefeito de petróleo (GLP),
querosene, óleo diesel, nafta petroquímica, solventes, asfalto, dentre outros.
O petróleo, além de fonte de energia essencial, é utilizado como matéria prima
para mais de 3.000 bens industriais. É fácil constatar que a cadeia de produção
de derivados do petróleo gera emprego e renda em todo o processo produtivo.
Essa característica, com especificidades, vale para todos os ramos industriais.
Indústria
significa também desenvolvimento da tecnologia. A política de venda de
refinarias de petróleo e exportação do combustível cru é também prejudicial ao
país porque restringe as possibilidades de desenvolvimento da pesquisa e
tecnologia. Se a Petrobrás é hoje uma gigante na exploração de petróleo em
águas profundas e ultra profundas, e referência mundial na área, é fruto do
desenvolvimento de tecnologia regular e de alto nível. A descoberta do pré-sal
é resultado de esforços contínuos em pesquisas, em um padrão extremamente
elevado, situação rara em países subdesenvolvidos.
A
crise gravissima da indústria de transformação no Brasil deveria ser enfrentada
como prioridade pelo governo Lula. Em tabela elaborada pelo DIEESE, com dados
do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), constata-se que, em
74 anos, desde 1947, a participação da indústria para a formação do PIB
(Produto Interno Bruto) no país foi a menor da história em 2021, apenas 11,3%.
Em 1985, ápice da industrialização no Brasil, a participação da indústria no
PIB era de 35,9%, segundo a tabela mencionada. Desde a recessão iniciada em
2014, o Brasil assiste o número de indústrias cair.
Há
uma relação direta entre desenvolvimento da indústria e renda per capita, que é
um indicador fundamental de potencial de um país, para a distribuição de renda.
O golpe de Estado de 2016 foi também contra o desenvolvimento nacional e,
portanto, contra a indústria nacional. A fúria de Michel Temer e Bolsonaro para
entregar as refinarias de petróleo e outros ativos a preço de banana é um
sintoma da natureza dos golpistas, contra o desenvolvimento nacional. Pode-se
dizer o mesmo em relação à entrega da Eletrobrás no ano passado.
Nesse
ambiente, entre 2015 e 2020, foram extintas 36,6 mil fábricas, o que equivale a
quase 17 estabelecimentos liquidados diariamente (dados da Confederação
Nacional do Comércio, CNC). Essa dinâmica, além de decorrer do processo mais
estrutural de desindustrialização do país, está ligada diretamente ao golpe.
Tanto é verdade que até 2014 o número de fábricas crescia, apesar da perda de
importância da indústria de transformação no conjunto da economia.
Dada
a importância da indústria para o desenvolvimento nacional e a complexidade do
tema, o país deveria ter estratégias de longo prazo, envolvendo todos os
segmentos importantes da sociedade. Os motivos para a retomada do
desenvolvimento industrial são vários:
1)
Não há registro na história do país que tenha chegado ao desenvolvimento
econômico e social sem uma generalizada industrialização e um forte e ativo
Estado nacional. Mesmo economias que utilizaram mais as exportações de produtos
primários para elevar a sua renda per capita (como Austrália e Canadá), antes
atravessaram períodos de elevada diversificação industrial, elemento essencial
das suas estratégias de desenvolvimento;
2)
Existe uma relação empírica e conceitual entre o grau de industrialização e a
renda per capita, tanto nos países ricos, quanto nos subdesenvolvidos, como
mencionado acima;
3)
Há uma associação estreita entre o crescimento do PIB e o crescimento da
indústria manufatureira. A dinâmica da economia brasileira nos últimos anos,
mostra o fenômeno: o PIB apresentou queda, em boa parte, porque a indústria de
transformação recuou drasticamente, criando um círculo vicioso;
4)
A produtividade é mais dinâmica no setor industrial do que nos demais setores.
É a indústria que puxa o crescimento de produtividade da economia;
5)
O avanço tecnológico que se concentra no setor manufatureiro tende a se
difundir para outros setores econômicos, como o de serviços ou mesmo a
agricultura. Os bens com maior valor adicionado produzidos pela indústria
incorporam e disseminam maior progresso técnico para o restante da economia.
Nos
países desenvolvidos, que em alguns casos se desindustrializaram, a indústria
nacional já cumpriu o seu papel no desenvolvimento econômico, colocando a renda
per capita da população em patamar elevado. Ao se desindustrializar, o Brasil
está perdendo, gradativamente, a sua maior conquista econômica do século XX.
Entre 1930 e 1980, a economia brasileira cresceu a elevadas taxas (6,8%, entre
1932-1980) baseado no chamado “processo de substituição de importações”, com
fortes incentivos estatais à industrialização através das políticas cambial,
tarifária e fiscal.
Caberia
neste momento um vigoroso projeto nacional, que possibilitasse a retomada da
indústria do país. O conjunto de medidas encaminhadas ou anunciadas pelos
governos golpistas, a partir de 2016, debilitou ainda mais a indústria: além da
venda de estatais estratégicas e entrega de parte do pré-sal, houve achatamento
do mercado consumidor interno via arrocho salarial, regressão em décadas na
regulamentação do trabalho, esvaziamento do BRICS, fragilização do Mercosul.
Tudo isso dificultou em muito a possibilidade de crescimento de uma indústria
robusta no país.
Claro,
a implementação dessas políticas não foi um equívoco, mas um projeto dos
governos a partir do golpe de 2016. A destruição da indústria, e a
transformação do Brasil num fornecedor de commodities baratas para os países
centrais, não são efeitos colaterais, ou “erros”, da política econômica
desenvolvida desde Michel Temer, e sim parte constitutiva de um projeto de
recolonização do Brasil. Apesar de o governo Lula estar cercado por tubarões,
temos a oportunidade agora de reversão dessas políticas e da construção de um
projeto nacional.
Fonte:
Jornal GGN/Terapia Política/Outras Palavras
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