Bolsonaro se pronuncia sobre joias e subestima inteligência dos brasileiros
O
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi alvo de uma das mais duras denúncias
surgidas até agora sobre o tempo em que esteve no Palácio do Planalto. O jornal
O Estado de S.Paulo mostrou, com farta documentação e testemunhos, que o antigo
mandatário tentou entrar no Brasil ilegalmente com joias avaliadas em 3 milhões
de euros (R$ 16,5 milhões), que teriam sido “dadas” à então primeira-dama
Michelle Bolsonaro pelo governo da Arábia Saudita. O “mimo” teria sido entregue
ao casal presidencial na viagem deles ao país do Oriente Médio, em outubro de
2021, durante uma visita oficial ao reino islâmico.
Isso
já teria sido o suficiente para causar um estrago monumental em sua já
destroçada reputação política, mas para piorar a reportagem mostrou que na
tentativa desesperada de recuperar um colar, um anel, um relógio e um par de
brincos, todos feitos com diamantes, da grife Chopard, devidamente acompanhados
de um certificado de autenticidade da marca, o ex-presidente envolveu o
ex-ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, determinando que levasse
para ele as joias de sua esposa. O ministro pegou os objetos, mas teria dado a
um assessor seu, que era militar, identificado como Marcos André dos Santos
Soeiro, tenente da Marinha, que ficou incumbido de ingressar com o pequeno
tesouro no país, vindo no voo comercial 773, da Qatar Airways, saído de Doha e
com destino a São Paulo. Só que o fardado foi pego pelo raio-x da Receita
Federal no Aeroporto de Guarulhos (SP). A partir daí, Bolsonaro teria gasto
tempo, influência e dinheiro público para de todas as formas “resgatar” a
fortuna presa num cofre da Alfândega de Guarulhos.
O
caso, revelado na noite de sexta-feira (3), caiu como uma bomba na imprensa e
nas redes sociais. Sua esposa, como faz habitualmente, respondeu com uma ironia
torpe e falando como se estivesse entre sua patota de seguidores. Entretanto,
de um ex-presidente, esperava-se pelo menos uma versão minimamente crível para
justificar tal absurdo.
Só
que não. Jair Bolsonaro deu declarações à CNN Brasil e, talvez de uma forma
como jamais tenha feito, subestimou a inteligência dos brasileiros com um jogo
de palavras infantil para negar o grave crime a ele imputado, inclusive
misturando o assunto com fatos sem qualquer ligação com a denúncia.
“Estou
sendo acusado de um presente que eu não pedi, nem recebi. Não existe qualquer
ilegalidade da minha parte. Nunca pratiquei ilegalidade. Veja o meu cartão
corporativo pessoal. Nunca saquei, nem paguei nenhum centavo nesse cartão”,
disse o ex-presidente.
Ninguém
disse que Bolsonaro “pediu” o presente milionário, e tampouco está em causa se
ele e sua esposa eram os beneficiados pelo "presente", já que isso é
um fato comprovado por seu próprio ministro, pelo cerimonial de Estado do
Planalto e pela própria apreensão do material pela Alfândega, no Aeroporto de
Guarulhos. Sobre o cartão corporativo, esse é um outro escândalo em que ele
segue bastante enrolado, mas que nada tem a ver com o crime de tentar se
apossar de joias de R$ 16,5 milhões que seriam do Estado brasileiro, apontado pela
reportagem do Estadão.
• Ex-ministro mentiu sobre joias em carta
para príncipe da Arábia Saudita
Em
22 de novembro de 2021 o então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque,
enviou uma carta ao príncipe Abdulaziz bin Salman Al Saud, da Arábia Saudita,
em que fez agradecimentos ao monarca pela recepção dada à comitiva brasileira
no país, que contou com a presença do então presidente Jair Bolsonaro (PL).
Entre os temas tratados, comentou a respeito das joias presenteadas à então
primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Mas
se engana o leitor que crer que Albuquerque revelou aos sauditas que as joias,
avaliadas em R$ 16,5 milhões, estavam apreendidas na Receita Federal. Em vez
disso, afirmou que os presentes teriam sido incorporados ao acervo nacional.
“De acordo com a legislação nacional e o código de conduta da administração
pública”, diz a carta.
No
entanto, como se sabe, o pacote jamais entrou de fato no Brasil. Acabou
apreendido na alfândega do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, após tentativa
da comitiva de Albuquerque de trazê-las ao país sem as devidas declarações à
Receita Federal. Um auxiliar de Albuquerque chegou a improvisar um estojo
escondido dentro de uma mochila para entrar com as joias, segundo relatos
divulgados na imprensa.
Talvez
ele se referisse a um segundo pacote, contendo um kit da marca suíça Chopard
com relógio, caneta, abotoaduras, anel e rosário, supostamente destinado ao
próprio Jair Bolsonaro, que passou despercebido pelos agentes em Guarulhos e
entrou no país.
Conforme
apontado pelo jornal O Globo, a Receita Federal busca informações para intimar
os ex-ministro sobre o caso. À imprensa, o ex-ministro reiterou sua versão dos
fatos e disse que agiu conforme as normas legais.
Presentes oficiais recebidos por
Bolsonaro valem 1% do valor das joias
Se
o conjunto de joias presenteado pela Arábia Saudita fosse incorporado ao
patrimônio da União seria, muito disparado, a peça mais cara do acervo oficial
recebido por Jair Bolsonaro de autoridades do mundo inteiro.
Seria
declarado de interesse público e integrado ao patrimônio cultural brasileiro.
Mas se sabe que esse não foi o interesse da gestão passada, como revelou o
“Estado de S. Paulo”.
Com
seus R$ 16,5 milhões em valor estimado, as joias valem 277,4 vezes mais que a
maquete do templo Taj Mahal confeccionado em mármore branco, que tem o valor
estimado em R$ 59,4 mil, segundo o site da própria Presidência da República.
A
maquete é o mais caro dos 43 presentes recebidos por Bolsonaro de autoridades
estrangeiras, disponíveis no site do Planalto. O ex-presidente o recebeu em
viagem oficial à Índia em 25 de janeiro de 2020, das mãos do ex-presidente Ram
Nath Kovind.
Ao
todo, esses 43 presentes têm o valor estimado em R$ 160,3 mil, o que representa
apenas 1% do valor das joias árabes que seriam dadas a Michelle Bolsonaro,
segundo o ex-ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia), que depois mudou sua
versão.
Para
chegar ao custo de cada peça presenteada a um presidente, o governo tem como
base a valoração de um objeto semelhante.
Pela
legislação, esses presentes recebidos pelo presidente de outros chefes de
Estado, de cidadãos comuns, de entidades e de empresas integram o acervo
público.
Um
acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) determina os presentes que compõem
o acervo privado de um presidente da República. Segundo o site do Planalto, um
presidente pode levar com ele, no final do mandato, itens de “natureza
personalíssim” ou de consumo direto, e cita roupas, alimento e perfumes.
E
explica que alguns presentes oferecidos por cidadãos, empresas e entidades
costumam permanecer com o ex-presidente, o que não é o caso das joias, que nem
legalmente entrou no Brasil.
Os
presentes listados no site do Planalto foram recebidos em encontros de
Bolsonaro com chefes estrangeiro, na troca de lembranças entre autoridades, em
viagens internacionais e em audiências e cerimônias no Brasil. Os últimos
presentes foram lançados no site em agosto de 2021.
Na
relação disponibilizada no site do Planalto, dos 43 presentes recebidos por
Bolsonaro, 29 foram presenteadas por autoridades de países da Ásia.
• Na lista, até outra escultura de cavalo
A
lista de lembranças recebidas por Bolsonaro é variada: vai de miniatura de
foguete, presenteado por Xi Jinping, da China, a potes decorativos japoneses;
de copos de uísque a camisa de futebol, lembrança do amigo Donald Trump.
Diante
do escândalo das joias árabes, chama a atenção a presença de também de uma
pequena escultura de cavalo, feito de metal e com detalhes em cristais. Está
avaliado em R$ 9 mil.
As
joias doadas pelos árabes embarcaram exatamente dentro de uma miniatura de
cavalo, cujas pernas aparecem quebradas hoje.
Os detalhes da operação de Bolsonaro para
retirar joias da Alfândega em SP
Na
noite da última sexta-feira (3), o jornal O Estado de S. Paulo trouxe à tona
uma história relacionada ao ex-presidente Jair Bolsonaro de arrepiar os
cabelos. Numa visita oficial de seu ministro de Minas e Energia, à época o
almirante Bento Albuquerque, à Arábia Saudita, um estojo com joias
valiosíssimas (R$ 16,5 milhões) foi dado ao representante brasileiro por
autoridades locais, com a orientação de entregá-lo ao então chefe de Estado,
como presente à sua esposa, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Mais tarde,
soube-se que havia também um estojo para o ocupante do Palácio do Planalto, com
relógio, abotoaduras, anel e um item religioso.
O
problema é que o estojo direcionado a Michelle, o mais valioso, que havia sido
colocado na mochila de um assessor militar de Bento Albuquerque, foi confiscado
pela Receita Federal na chegada dos brasileiros ao país, no final de outubro de
2021. A partir daí, uma verdadeira novela, com Jair Bolsonaro desesperado para
recuperar as joias, passou a ocorrer.
O
Estadão publicou no domingo (5) os detalhes minuciosos daquela que teria sido a
última tentativa do então presidente de recuperar a verdadeira fortuna “dada” a
ele e à esposa, mas que não poderia ficar em suas mãos, por questões legais, e
que ficou retida na Alfândega do Aeroporto Internacional de São Paulo.
Marco
Antônio Lopes Santanna, um servidor da Receita Federal do Brasil, foi informado
de que uma “visita em caráter de urgência” acabava de chegar à Base Aérea de
Guarulhos, anexa ao aeroporto de Cumbica, local onde ele é lotado. Eram 18h10
de 29 de dezembro de 2022.
O
“visitante” acabara de chegar num avião da Força Aérea Brasileira (FAB) e vinha
tratar com ele de uma “demanda do senhor presidente da República”. Era o
sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva, um ajudante de ordens muito próximo
do então presidente Jair Bolsonaro e de sua total confiança.
O
marinheiro se apresentou a Marco Antônio, explicou o caráter extraordinário e
urgente que o fez sair de Brasília e ir até São Paulo numa aeronave militar,
paga com dinheiro público, por determinação do chefe de Estado. Ele foi
objetivo com o funcionário da Receita Federal: “vim retirar um material retido
na Alfândega” e mostrou-lhe o celular.
Na
tela do aparelho aparecia um documento com o nome do secretário da Receita
Federal na gestão de Bolsonaro, Julio Cesar Vieira Gomes, e estaria relacionado
ao Termo de Retenção de Bens do estojo de joias caríssimas apreendidos mais de
um ano antes com o assessor do ministro Bento Albuquerque, que deveria ter sido
entregue nas mãos de Jair Bolsonaro.
Marco
Antônio, o servidor da Receita Federal, afirmou que não entregaria qualquer bem
ao militar, argumentando desconhecer aquela “ordem” vinda do presidente e
explicando ao ajudante de ordens que o tal documento mostrado na tela do
celular era destinado ao secretário da Receita Federal e não a ele.
Jairo,
o marinheiro, pegou o celular e ligou, então, para alguém que ele apenas
chamava de “coronel”. Depois de muito papo, o militar da Marinha disse a Marco
Antônio que “o coronel” queria falar com ele, mas o funcionário público recusou
o diálogo e disse que não tinha coisa alguma para tratar pelo telefone.
Já
sem paciência e sem conseguir avançar na “missão” de levar o estojo com as
joias, Jairo foi “direto e claro” com o servidor da Receita Federal e disse que
“estava ali naquele horário e data” por determinação “do presidente da
República”, para retirar o tal objeto apreendido “porque estava próximo do
período de passagem do governo” e que "não poderia ficar nada lá” que
“fosse do antigo presidente para o novo”.
Passados
alguns minutos, o telefone do militar da Marinha tocou e era o “alinhado”
secretário da Receita Federal, Vieira Gomes. “Seu chefe quer falar com você”,
disso o ajudante de Bolsonaro. Marco Antônio pegou o telefone, falou com seu
superior e reiterou: “não vou entregar nada!”.
Ele
pediu então para que “o chefe” ligasse para o delegado da Alfândega de
Guarulhos, Fabiano Coelho.
O
militar da ajudância de ordens de Bolsonaro ficou alguns minutos lá, supõe-se
que para esperar um retorno com a ligação do delegado da Alfândega de
Guarulhos, ou então uma nova ligação do secretário da Receita Federal.
Entretanto, não houve qualquer nova chamada telefônica e o militar foi embora
sem falar nada, desistindo de regressar a Brasília com as joias.
A aliados, braço direito de Bolsonaro diz
que relógio de pacote que escapou do Fisco foi catalogado e levado na mudança
do ex-presidente
Ex-ajudante
de ordens de Bolsonaro, coronel Mauro Cid tem dito a interlocutores, nos
bastidores, que o relógio do segundo pacote que foi presente da Arábia Saudita
teria sido catalogado e embalado na mudança como um bem do ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL).
A
PF vai apurar se Bolsonaro catalogou como item pessoal itens do segundo pacote
— como o relógio — na hora de deixar a presidência. É preciso fazer uma espécie
de inventário de itens que se leva da presidência quando o mandatário deixa o
governo.
Segundo
relato de Cid a aliados, apurado pelo blog, Bolsonaro teria um acervo tanto no
Palácio do Planalto quanto no Alvorada em que tudo o que ganhava iria para
esses dois locais.
Quando
saiu da presidência, caminhões de mudanças teriam ido nesses acervos, embalaram
e levaram os itens para outro lugar — sem especificar qual lugar. E, na versão
de Cid a interlocutores, tudo isso está catalogado, e o “relógio também está
catalogado nesse meio”.
O
blog apurou que o documento com a relação de itens declarados por Bolsonaro
como pessoais quando deixou a presidência foi requisitado pela Polícia Federal
— que já recebeu o documento.
Cid,
segundo o blog apurou, argumenta que o relógio do segundo pacote estaria
catalogado “igual qualquer outro bem que ele recebeu”, como uma caneta, tênis,
uma Bíblia ou um chapéu.
E
que o relógio estaria com Bolsonaro “igual a outros presentes”, que Bolsonaro
teria 200 metros cúbicos de presentes.
Procurado,
Cid confirmou os relatos obtidos pelo blog.
No
entanto, o ex-auxiliar de Bolsonaro não sabe explicar a esses interlocutores
por que esse presente só foi declarado à União um ano após a entrada no Brasil.
E, mesmo assim, sem comunicação ao Fisco.
Também
não sabe explicar como um presente para o Estado teria sido levado pelo
ex-presidente como item pessoal, já que a lei só permite itens personalíssimos
no acervo privado.
Na
versão dos assessores de Bolsonaro ouvidos pelo blog, Bolsonaro não usa relógio
e não queria deixar “nada para Lula”.
Cid
também tem dito nos bastidores que todos esses itens, levados por Bolsonaro,
foram recebidos de apoiadores pelo Brasil, de autoridades nacionais e também de
outras nações — muitas coisas foram trazidas no avião presidencial, que, diz,
“nunca foi inspecionado”.
Fonte:
Fórum/Metrópoles/g1
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