10 mulheres
brasileiras que deveriam ser mais estudadas nas escolas
A história de Emmy Noether - matemática alemã que
desafiou as universidades em 1903 para cursar o ensino superior e que foi
citada por Albert Einstein como "genial" por sua contribuição à
Física - inspirou leitores da BBC Brasil.
Após
a reportagem ser citada no boletim de notícias ao vivo que a BBC Brasil
transmite pelo Facebook todos os dias às 12h45, leitores começaram a sugerir
nomes de mulheres que deveriam ser estudadas com mais ênfase nas escolas.
Entre
as diversas sugestões, que incluíram personalidades como a mexicana Frida
Kahlo, selecionamos dez brasileiras para destacar e relembrar a contribuição
delas para a nossa história.
As
trajetórias são muito diferentes entre si, assim como as áreas de atuação: da
música à política, das artes plásticas à dedicação religiosa. O que quase todas
têm em comum foi a luta por reconhecimento e pelos direitos da mulher.
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1. Cora Coralina
Apesar
de ser considerada uma das poetisas mais importantes da literatura brasileira,
Cora Coralina, pseudônimo de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, só
publicou o primeiro livro, Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais,
aos 76 anos.
Antes
disso, criou quatro filhos trabalhando como doceira após a morte do marido e
não chegou a terminar o ensino fundamental.
Cora
ficou conhecida por escrever sobre a cidade de Goiás e, embora não falasse
sobre a questão de gênero na sua obra, é considerada por especialistas como uma
escritora pioneira e libertária que enfrentou os preconceitos da sociedade para
mostrar a contribuição das mulheres.
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2. Irmã Dulce
Maria
Rita de Sousa Brito Lopes dedicou a vida a ajudar as pessoas carentes e é uma
das ativistas humanitárias mais importantes do século 20.
Ela
mostrou aptidão e desejo para essas atividades ainda pequena - aos 13 anos
transformou a casa dos pais em Salvador em um centro de atendimento aos
necessitados, pobres e doentes.
Conhecida
como "o anjo bom da Bahia", ajudou a fundar diversas instituições
filantrópicas, como o Hospital Santo Antônio. Foi indicada ao Prêmio Nobel da
Paz em 1988 e beatificada em 2011.
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3. Lina Bo Bardi
Nascida
na Itália e naturalizada no Brasil, Lina nasceu Achillina Bo e veio para o
Brasil em 1942 para se afastar da instabilidade política da Europa, que a
deixava inconformada.
Aqui,
abriu caminho para as mulheres na arquitetura e foi responsável pelos projetos
do Masp (Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand) e do Sesc Pompeia,
entre outros prédios emblemáticos.
Estudiosa
da cultura brasileira, Lina tinha um forte engajamento político e acreditava
que a arquitetura deveria simples e uma ferramenta para melhorar a vida da
sociedade e dos mais pobres - e criticava a ostentação.
Apesar
da contribuição para a arquitetura, ela não teve tanto reconhecimento em vida e
enfrentou muitos preconceitos por ser mulher e estrangeira.
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4. Maria Quitéria
Primeira
mulher a entrar nas Forças Armadas e a defender o Brasil em combate, Maria
Quitéria de Jesus Medeiros é frequentemente comparada a Joana d'Arc. Foi uma
das heroínas da Guerra da Independência.
O
pai dela não permitiu que se alistasse, mas em 1822 ela fugiu de casa, cortou
os cabelos, se vestiu como homem e se juntou ao Regimento de Artilharia.
Foi
descoberta pelo pai logo depois, mas teve a permanência na tropa defendida por
um major por causa de sua disciplina e destreza com as armas. Depois do serviço
militar, foi perdoada pelo pai, se casou e teve uma filha.
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5. Clementina de Jesus
Uma
das principais sambistas de todos os tempos, Clementina foi empregada doméstica
até ser descoberta e reconhecida já com mais de 60 anos.
Famosa
pelo repertório de músicas de raízes afro-brasileiras tradicionais, ela foi
importante por registrar e divulgar cantos ancestrais dos escravos na história
da música.
Sua
biografia, intitulada Quelé - A Voz da Cor, foi lançada no ano
passado.
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6. Nise da Silveira
Psiquatra
brasileira e aluna de Carl Jung, Nise ficou conhecida pela contribuição pela
luta antimanicomial e por ter implementado a terapia ocupacional e as artes no
tratamento das doenças psiquiátricas no processo terapêutico.
Ela
se formou em 1926 - era a única mulher em uma turma com 157 alunos. Chegou a
ser presa durante o Estado Novo, acusada de envolvimento com o comunismo, e
dividiu a cela com Olga Benário, militante do movimento no Brasil.
Nise
criticou, discutiu e revolucionou o tratamento psiquiátrico e as condições dos
manicômios no Brasil.
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7. Zilda Arns
Zilda
foi uma médica pediatra e sanitarista brasileira, responsável pela fundação da
Pastoral da Criança.
Ela
dedicou a vida à saúde pública com enfoque no combate à mortalidade infantil,
desnutrição e violência contra as crianças e desenvolveu uma metodologia
própria para realizar os tratamentos preventivos.
Irmã
de Dom Paulo Evaristo Arns, Zilda morreu no Haiti. Ela trabalhava em uma missão
da Pastoral quando o país foi atingido por um terremoto, em 2010.
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8. Tarsila do Amaral
Um
dos principais nomes do modernismo brasileiro, Tarsila criou algumas das obras
emblemáticas do movimento, como o Abaporu.
Mesmo
com formação sólida em Artes Plásticas, nas escolas de Julian e de Émile Renard
em Paris, ela enfrentou dificuldades por ser mulher.
O
primeiro marido se separou dela porque não concordava com a sua dedicação à
arte, e não exclusivamente às tarefas do lar.
Tarsila
dizia querer ser a "pintora do Brasil" e dedicou várias fases de sua
obra às cores, paisagens e cultura brasileiras.
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9. Chiquinha Gonzaga
A
trajetória de Chiquinha Gonzaga é referência tanto para a música brasileira
como para a conquista dos direitos da mulher.
Ela
começou a carreira ainda na época do Segundo Reinado e, embora tocasse os
ritmos populares à época, como valsas e polcas, também se dedicou a conhecer e
divulgar os ritmos brasileiros. Foi autora de uma das primeiras
marchinhas: Ó Abre Alas.
Casou-se
aos 16 anos e aos 18 decidiu abandonar o marido, que não concordava com sua
atividade musical. Ficou conhecida pela militância política e foi ativista de
grandes causas sociais - especialmente a abolição da escravatura.
Também
foi a fundadora da primeira instituição arrecadadora e protetora dos direitos
autorais no país.
·
10. Anita Garibaldi
Uma
das mulheres mais reconhecidas da história do Brasil, Anita Garibaldi é chamada
de "Heroína dos Dois Mundos" pela participação em diversas batalhas
tanto no Brasil como na Itália ao lado do marido, Giuseppe Garibaldi.
Anita
foi muito influenciada pelos ideiais do marido. Eles foram parceiros de vida e
de combate: ela aprendeu a usar armas e espadas e foi combatente na Revolução
Farroupilha e Revolta dos Curitibanos, entre outras.
<<
A guerreira que abriu caminho para as mulheres brasileiras nos livros de
História
Anita
Garibaldi, cuja morte completa 195 anos nesta semana, foi uma das poucas
mulheres a conseguir despontar em um universo majoritariamente masculino: as
páginas dos livros didáticos sobre a história brasileira.
Um
dos motivos, apontam pesquisadores, é o fato de sua trajetória fugir - e muito
- do esperado para as mulheres de sua época.
Em
pleno do século 19, Anita escolheu não ter filhos ao ser casar pela primeira
vez, se separou do marido para se juntar às tropas dos Farrapos e se tornou,
com seu companheiro Giuseppe Garibaldi, uma heroína revolucionária não só no
país, mas também na Itália.
"Além
de atuar na Revolução Farroupilha, no sul do Brasil, e em lutas no Uruguai,
Anita também teve importante atuação nas guerras da unificação italiana junto a
Garibaldi, que foi reconhecido como o maior herói daquele país", conta
Cristina Scheibe Wolff, historiadora da Universidade Federal de Santa Catarina.
"Ela
se destacou em um campo que não era visto como possível para as mulheres: a
guerra revolucionária."
Segundo
a pesquisadora, uma das autoras do livro Nova História das Mulheres no Brasil
(Editora Contexto), o país teve diversas personagens importantes como Anita
Garibaldi, mas que acabaram não tendo a mesma "sorte" dela.
O
fato de a revolucionária ter sido uma exceção, aponta, é obra de um homem: o
próprio marido, que sempre a incluiu em suas memórias.
"O
que sabemos sobre Anita veio principalmente das memórias do Garibaldi, que
demonstrava uma grande admiração por ela. De certa forma, a fama de Anita é
decorrente da vida longa de Garibaldi, que ainda em vida foi reconhecido como
herói e fez questão de dividir esse lugar com a memória da mulher."
#
As mulheres e os livros escolares
Segundo
a pesquisadora, a ausência de mais personagens como Anita nos livros escolares
brasileiros se deve à demora destes em incorporar estudos mais recentes.
"É
somente a partir dos anos 1980 e, com mais força nos anos 2000, que temos uma
produção mais significativa sobre a história das mulheres. Infelizmente, essa
produção muitas vezes se dá de forma um pouco distanciada, como uma história a
parte, nem sempre reconhecida por todas as correntes historiográficas."
Para
ela, a ação de setores conservadores também tem parcela da culpa.
"Recentemente, a bancada conservadora da Câmara de Deputados e setores
ligados a igrejas forçaram a retirada do termo 'gênero' dos planos nacional,
estaduais e municipais de educação", exemplifica.
"Acontece
que a história das mulheres na escola é importantíssima para que meninos e
meninas percebam a importância da igualdade de gênero, desfaçam preconceitos e
vivam de forma mais igualitária suas relações sociais com respeito à
diversidade."
Entre
as mulheres guerreiras "esquecidas" pela História do Brasil, Cristina
cita as indígenas - "quem sabe até as Amazonas descritas por
Carvajal", em referência as lendárias guerreiras nativas relatadas por
jesuíta no século 16 -, Dandara e outras negras que lutaram contra a escravidão
e as participantes da Guerra da Independência, como a militar Maria Quitéria.
Além
disso, lembra as cangaceiras, as enfermeiras das Força Expedicionária
Brasileira na Segunda Guerra Mundial e as guerrilheiras que lutaram contra a
ditadura militar.
#
'Heroína de dois mundos'
Vários
quadros retratam Anita à beira da morte, carregada por Garibaldi
Ana
Maria de Jesus Ribeiro, nasceu em 30 de agosto de 1821 em Laguna, em Santa
Catarina - foi a terceira de uma família humilde de dez filhos.
Aos
14 anos, foi obrigada pela mãe a se casar com um sapateiro muito mais velho.
Segundo outra versão, o casamento ocorreu porque a menina havia sido
violentada.
Ainda
adolescente, adotou costumes considerados avançados para as mulheres da época:
se recusou a ter filhos, cavalgava e se interessava pela política do Brasil
Império.
Em
1838, os rebeldes da Revolução Farroupilha (1835-1845) chegaram à cidade. E aos
18 anos, Anita fugiu de casa com as tropas comandadas pelo italiano Giuseppe
Garibaldi.
Com
o revolucionário, aprendeu manejar espadas e armas de fogo. Casaram-se em 1842
e tiveram quatro filhos, mas nunca viveram como uma família tradicional; mesmo
grávida, ela não deixou de participar das batalhas que a fizeram entrar para a
história.
Em
1846, ela se mudou para a Itália. Com a proclamação da República Romana, em
1848, Garibaldi se envolveu na luta pela unificação italiana e ela, grávida do
último filho do casal, lutou ao lado do marido. Para integrar as tropas, cortou
os cabelos e se vestiu como homem.
Acabou
morrendo pouco tempo depois, em 4 de agosto de 1849, durante uma fuga das
tropas. Tinha apenas 28 anos.
Ela
entrou para os livros de História como a "heroína de dois mundos". Em
1931, o governo italiano reconheceu sua importância e enterrou seus restos
mortais em Roma, em um monumento construído em sua homenagem na colina de
Gianicolo. No Brasil, além da presença nos livros escolares, Anita Garibaldi
tem um museu dedicado à sua memória em Laguna, além de dar nome a duas cidades
de Santa Catarina.
#
Primeira feminista?
Para
Cristina, Anita é importante para os movimentos pró-mulheres no Brasil. "É
um exemplo conhecido de uma mulher que saiu de um casamento violento e não
satisfatório para uma relação de companheirismo amoroso e ideológico",
afirma.
Ela
avalia, porém, ser anacrônico dizer que ela era feminista.
"Anita
Garibaldi viveu no início do século 19, quando ainda não se falava em
feminismo, uma noção desconhecida naquela época", explica, ao citar a o
início da luta de mulheres de vários países pelo voto e pela educação, no fim
do mesmo século, como o estopim do movimento.
"Mas
certamente era uma mulher que não se conformava com os estereótipos e lugares
designados às mulheres de seu tempo - e mesmo do nosso tempo."
Fonte: BBC News Brasil
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