Vale, JBS e Braskem: conheça os ‘vilões do clima’ que pregaram
sustentabilidade na COP28
O caso Braskem, empresa
responsável pela maior tragédia urbana em curso no mundo, em Maceió
(AL), jogou luz sobre uma contradição no discurso de gigantes globais da
mineração, do agronegócio e da pecuária, que lucram alto com atividades
reconhecidas como “vilãs” do clima pela ciência.
Enquanto esses grandes grupos privados se
autoproclamam sustentáveis, o caráter essencialmente poluidor e predatório de
seus negócios estimula também o desmatamento ilegal e graves violações aos
direitos humanos, além de altas doses de contribuição para o aquecimento
global.
Com a tragédia em Maceió, a desconexão entre o
discurso e a prática da Braskem se tornou tão obscena, que a empresa
desistiu de participar da COP28, a Conferência do Clima da Organização das
Nações (ONU) deste ano, onde iria palestrar sobre “carbono neutro” e “impactos
da mudança do clima”.
Além da Braskem, o Brasil de
Fato identificou no Pavilhão do Brasil na COP28 outras cinco
megacorporações emissoras de carbono que desembarcaram em Dubai (Emirados
Árabes Unidos) com um exército de lobistas e um objetivo: garantir ao mundo que
estão resolvendo os problemas nas suas cadeias produtivas.
São empresas que até reconheceram – parcialmente ou
integralmente – os danos causados por suas cadeias produtivas e garantem que
estão gastando muito dinheiro para mitigar os impactos sobre o clima e os
territórios.
Mesmo assim, seus programas de sustentabilidade
apresentam falhas ou insuficiências que fomentam acusações de greenwashing –
termo em inglês que significa usar técnicas de marketing verde para mascarar
efeitos ambientais nefastos.
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Vale, Cargill, JBS, Marfrig e Norsk Hydro
Reincidente em gravíssimos crimes ambientais, a
mineradora Vale discutiu em Dubai a “pluralidade de atores” na transição
energética, mas o painel não contava com populações atingidas pela
empresa. Ativistas
interromperam a discussão e denunciaram “demagogia”.
Duas gigantes da proteína animal, JBS e Marfrig
também foram convidadas a palestrar sobre “pecuária sustentável”, enquanto
acumulam casos de desmatamento ilegal e invasões de terras indígenas em suas
cadeias produtivas.
A lista de multinacionais orgulhosas de suas
agendas verdes na COP28 inclui ainda a Cargill, a maior empresa de agronegócio
do mundo, dona de marcas como Pomarola e Liza.
Na Amazônia brasileira, a Cargill expande a
infraestrutura de transportes, criando mais demanda por soja e gado e
estimulando a pressão de grileiros sobre áreas protegidas. Um exemplo é a Ferrogrão,
um corredor ferroviário que atropelará terras indígenas, unidades de
conservação e povos isolados e emitirá 75 milhões de toneladas de carbono,
segundo estudo da PUC.
Já a mineradora norueguesa Norsk Hydro celebra seu
“pioneirismo na transição para o alumínio verde”. No Pará, onde indígenas e
quilombolas são afetados pela extração de bauxita sem consulta prévia, a
empresa não é vista com o mesmo entusiasmo.
Confira mais abaixo a “ficha suja” completa das
empresas citadas.
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Ativistas que interromperam painel da vale apontam
hipocrisia
Duas lideranças da Rede Vozes
Negras pelo Clima que interromperam em protesto o painel da Vale na COP28 falaram
ao Brasil de Fato. Elas afirmaram que a mineradora e outras
empresas foram a Dubai vender sustentabilidade, mas destroem o meio
ambiente.
Natural de Regência (ES), uma das regiões mais
atingidas pela tragédia da Vale em Mariana (MG), Luciana Souza vê a atuação das
multinacionais como “uma grande hipocrisia, uma falácia”.
“Essas empresas vão para dentro dos nossos
territórios, poluem nossos rios e nossos mares, contaminam a nossa água, tiram
das nossas comunidades o direito de trabalhar e produzir seu alimento. E depois
vêm para cá ocupar espaços dentro dos Pavilhões do Brasil para falar em
sustentabilidade. Sustentabilidade para quem?”, questionou Luciana Souza.
Camila Aragão, da Rede Vozes Negras pelo Clima,
também participou do protesto que emparedou executivos da Vale em Dubai. “É
fundamental estarmos aqui e ocupando esse espaço, mas – nossa! – o que é que eu
estou fazendo aqui? Eu me faço essa pergunta o tempo todo. Porque eu me sinto
impotente nas reais negociações, nas reais decisões”, disse.
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JBS: pecuária ilegal e desmatamento
Com lucro líquido de R$ 15,5 bilhões em 2022,
a JBS é a
maior produtora de proteína animal do mundo. Na COP28, representantes da
empresa participaram do painel “Caminhos para Sistemas Alimentares Sustentáveis
no Brasil”.
No Brasil, a agropecuária foi responsável por um
quarto das emissões no ano passado, índice que já chegou a 70% em anos
anteriores.
Além das emissões da pecuária em si, o setor
contribui para o aquecimento global ao estimular a criação de gado em áreas de
desmatamento ilegal na Amazônia. O desflorestamento é a atividade que mais
contribui para a pegada climática do Brasil no mundo.
Segundo auditoria
do Ministério Público Federal (MPF) divulgada em dezembro de 2022, a
JBS abateu 93.734 animais com “procedência duvidosa”. Conforme os mesmo dados,
a JBS foi líder no ranking de frigoríficos com mais irregularidades no abate de
animais no Pará. A JBS contestou a metodologia do MPF usada no cálculo.
Uma investigação exclusiva da Repórter Brasil
revelou que a JBS comprou, entre 2018 e 2022, quase 9 mil cabeças de gado
criado em fazendas de uma quadrilha de desmatadores de Rondônia. Nesse caso, a
empresa reconheceu que houve conivência de seus próprios funcionários no
esquema.
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Marfrig: bois ‘sustentáveis em terras indígenas’
Enquanto manifestantes protestavam na COP28, a
Marfrig Global Foods se reunia com um grupo seleto de convidados em um luxuoso
hotel de Dubai. O encontro, revelado pela Exame, serviu para apresentar a
autoridades e organizações da sociedade civil o compromisso da empresa com
“pecuária de baixo carbono, 100% rastreada e livre de desmatamento”.
É de fato uma iniciativa louvável, especialmente
para uma grande “ficha suja” socioambiental como a Marfrig. Como a JBS, a
empresa também tem um histórico de comprar carne cultivada em terras indígenas.
É o caso do território Apyterewa no Pará, a terra indígena mais desmatada
durante o governo Bolsonaro.
Segundo revelou a Repórter
Brasil em 2020, grandes multinacionais da indústria da carne, como
Marfrig, têm entre seus fornecedores diretos ou indiretos pecuaristas que criam
gado ilegalmente nessa área protegida da Amazônia. A empresa respondeu que os
critérios para compra de gado seriam atualizados a partir de julho daquele ano.
Em outra investigação jornalística, o site O
Joio e o Trigo descobriu que uma fazenda fornecedora da Marfrig produziu dentro
de terra do povo Mỹky no norte de Mato Grosso. O frigorífico respondeu que
considera terras indígenas apenas as já homologadas, o que contraria a
definição de terra indígena presente na Constituição e adotada por órgãos como
a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
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Vale: não dá para esquecer Brumadinho e
Mariana
A Vale está por trás de duas das mais graves
tragédias socioambientais, a de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais, que
mataram 270 pessoas e afetaram mais de 350 mil.
O relatório de uma comissão independente de
investigação contratada pela mineradora revelou que a Vale sabia, pelo menos
desde 2003, de fragilidades na barragem que se rompeu em Brumadinho (MG) e,
apesar de alertada, não retirou as instalações administrativas da área de
risco, expondo seus funcionários a uma avalanche de rejeitos.
Já em Mariana (MG), a lama tóxica da barragem de
Fundão, causou uma crise humanitária. Cidades ao longo do Rio Doce sofreram
escassez de água após suas fontes serem poluídas por lama tóxica. Todas as
atividades econômicas ligadas ao rio, como a pesca, foram inviabilizadas.
No caso de Brumadinho, a lama liberada pelo colapso
da barragem afetou pessoas que perderam suas casas e tiveram que ser deslocadas
como resultado da tragédia.
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Cargill: soja e pecuária na Amazônia a qualquer
custo
A Cargill é a maior comerciante de grãos do mundo e
a maior empresa privada dos Estados Unidos, com receita recorde no último ano
fiscal de US$ 177 bilhões (R$ 860,41 bilhões na cotação atual).
No Brasil, a empresa constrói portos e ferrovias
voltadas ao transporte de soja e outros grãos na região amazônica. Como
consequência, aumenta a pressão sobre territórios indígenas e quilombolas.
Segundo denúncias feitas a autoridades brasileiras
e reveladas por investigações jornalísticas, sojeiros são atraídos pela
infraestrutura da multinacional, contribuindo para a expansão da fronteira
agrícola em áreas preservadas da amazônia e contribuindo para o aumento de
casos de intoxicação por agrotóxicos.
Em setembro deste ano, a Cargill foi condenada pela
Justiça do Trabalho, em primeira instância, por práticas de trabalho escravo e
infantil em plantações de cacau de seus fornecedores no Brasil.
Além disso, a empresa trabalha pela construção da
Ferrogrão, um projeto de ferrovia que visa conectar o estado de Mato Grosso ao
Pará, no Brasil. O objetivo é transportar soja e milho do Mato Grosso e
exportá-los para a China.
Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais
destacou que a linha ferroviária da Ferrogrão cruzará vários territórios
indígenas na Bacia do Rio Xingu, algo que poderia resultar na perda de mais de
230 mil hectares de floresta para o desmatamento em territórios indígenas no
estado de Mato Grosso até 2035.
A construção da Ferrogrão incentivaria agricultores
e pecuaristas localizados no estado do Mato Grosso a ampliarem a produção,
aumentando a demanda por terras.
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Norsk Hydro: denunciada por indígenas no
Pará
A Hydro é uma multinacional norueguesa que extrai
bauxita na Amazônia. Nos últimos anos, a mineradora foi exposta como indutora
de conflitos com as populações do Pará, onde fica a maior parte de suas
operações.
Na lista de passivos ambientais está o vazamento de
rejeitos em nascentes por meio de um duto clandestino, descoberto na cidade de
Barcarena, região metropolitana de Belém.
Além disso, populações indígenas e quilombolas se
dizem ameaçadas por funcionários da empresa. Em uma carta pública divulgada em
outubro, moradores do Vale do Acará, no Pará, denunciaram a situação.
“A Hydro vem repetindo sua metodologia neocolonial
e violadora contra os povos do Vale do Acará. As comunidades não foram
consultadas sobre a circulação constante e intrusiva dos funcionários da
empresa, que passam em suas picapes em alta velocidade nas estradas de acesso
às aldeias e quilombos, colocando em risco nossas famílias”, diz a carta.
Fonte: Brasil de Fato
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