sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Por que Bolsonaro e sua caterva se calaram na PF e agora desafiam o STF?

O Brasil aguardou atentamente o depoimento simultâneo à PF, na manhã desta quinta-feira (31), de Jair Bolsonaro (PL), sua esposa Michelle e de um grupo de ex-assessores de confiança do líder da extrema direita brasileira. Pouco tempo após comparecerem aos locais estabelecidos, vem a informação de que o ex-presidente, a mulher, o ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten e o coronel Marcelo Câmara, ex-assistente pessoal, optaram por ficar em silêncio quando questionados sobre fatos relacionados ao escândalo das joias e relógios desviados da Presidência da República para serem vendidos no exterior.

O ‘argumento’ para tal decisão tomada pelos diferentes advogados, naturalmente combinado com alguma antecedência, é de que os depoentes não iriam se submeter à competência do Supremo Tribunal Federal no inquérito das joias, uma vez que a PGR já teria se posicionado alegando que o STF não seria o foro adequado para o caso. Eles exigem um “juiz natural”, ou seja, um magistrado que seja o correspondente para instruir a ação segundo a lei brasileira. Nada mais correto e justo, não fosse pelo fato de que o juiz que eles rejeitam é o ministro Alexandre de Moraes.

Trocando em miúdos, Bolsonaro entrou pela sala da PF onde seria ouvido e já disparou que não falaria nada porque Moraes e o STF não representam quem, pela lei, deveria estar com a sua ação penal, de acordo com uma deliberação da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, uma tese imediatamente acolhida pelos advogados do grupo.

Não precisa ser muito ambientado com o juridiquês para fazer uma leitura mais simples e evidente do fato: o ex-presidente quer escolher o juiz que o julgará e quer, obviamente, um ‘amigo’, uma vez que sabe que o Judiciário está infestado de bolsonaristas. Sobretudo, ele não quer ser julgado por Moraes, o homem que não engole seus rompantes autoritários e pisa fundo na condução dos procedimentos delegados à PF na hora de investigar o antigo ocupante do Palácio do Planalto.

Mas você pode estar se perguntando se isso é tudo na estratégia da equipe de defesa de Bolsonaro e de sua caterva. Não, não é. O ex-presidente está apostando num expediente mais do que conhecido e que foi colocando em marcha durante todo seu mandato, especialmente nos dois anos finais de sua estadia no poder. Para Bolsonaro a tática consiste em enfrentar a autoridade de Moraes e do STF.

Qualquer brasileiro que olhe para os inquéritos que investigam o ex-chefe de Estado verá que sua situação é um caso perdido, seja nos autos do processo sobre a tentativa de golpe após a derrota na eleição ou no episódio da espoliação dos itens preciosos do Estado que estavam sendo comercializados nos EUA. Fora dos círculos dos birutas de sua claque hipnotizada, as teses de defesa de seus advogados são uma piada infantil.

Tensionar a coisa e jogar seus radicais lobotomizados e violentos contra “Xandão” e o STF é uma velha artimanha nada original do ex-capitão que ousou impor-se como ditador no Brasil. Retomar a guerra com a Corte mais alta do Judiciário brasileiro, na cabeça de Bolsonaro, seria um caminho para minar a credibilidade do juiz e do tribunal onde tramitam seus processos, além de servir como intimidação a esses magistrados.

 

       Delação vai blindar hacker contra vinganças

 

Diante do aval da Advocacia do Senado para que a Comissão Parlamentar de Inquérito do 8 de Janeiro firme delações premiadas, parlamentares governistas afirmam que devem oferecer a possibilidade de acordo ao hacker Walter Delatti Neto. Em depoimento na semana passada, ele afirmou aos parlamentares ter participado de reuniões com o ex-presidente Jair Bolsonaro para tratar de formas de descredibilizar as urnas eletrônicas.

— Vamos oferecer. Se for de interesse do Delgatti, a CPI está aberta para colher a contribuição dele —disse o deputado Rogério Correia (PT-MG).

A consulta à Advocacia do Senado foi feita tendo em vista uma possível delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid. Em caráter reservado, porém, alguns parlamentares avaliam como baixa a possibilidade de o militar colaborar com o colegiado. Um dos obstáculos é a participação de dois filhos de Bolsonaro na CPI, o senador Flávio (PL-RJ) e o deputado Eduardo (PL-SP). Por isso, há uma avaliação de que a defesa de Cid dê preferência para uma possível delação com a Polícia Federal.

Neste cenário, para esse grupo, o ideal seria aproveitar o aval da Advocacia do Senado para a oferta de delação para outros personagens mais suscetíveis a aceitar o acordo. Em relação a Delgatti, a possibilidade é dada como certa para alguns, mas há dúvidas se a defesa dele ainda teria “cartas na manga” para barganhar, após todos os depoimentos já feitos pelo hacker.

A Advocacia do Senado deliberou na terça-feira, 29, que a CPI pode fazer essa negociação, em resposta a uma consulta da relatora da comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA). O órgão técnico afirmou que a proposta é legítima, mas condicionou a negociação à participação do Ministério Público Federal e à homologação de um juiz.

A intenção inicial era a de propor um acordo ao ex-ajudante de ordens para que ele colabore com as investigações sobre os atos golpistas. Caso a CPI consiga uma delação premiada, será um feito inédito na história do Congresso.

Após ficar em silêncio nas primeiras vezes que foi chamado a depor à PF, Cid já prestou dois depoimentos aos investigadores desde a semana passada— um na sexta-feira e outro nesta terça.

Os dois depoimentos prestados, segundo informações da PF, estavam relacionados ao inquérito que investiga a suposta contratação dos serviços do hacker Walter Delgatti Netto para invasão das urnas eletrônicas.

De acordo com Delgatti Netto, Mauro Cid teria participado da reunião em que a deputada federal Carla Zambelli promoveu entre ele e Jair Bolsonaro, em agosto do ano passado, no Palácio da Alvorada. O hacker está preso preventivamente por incluir no sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) um falso mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), supostamente por ordem da parlamentar.

 

       PF impõe condições a CID para aceitar delação

 

Personagem central no escândalo da joias, o ex-ajudante de ordens Mauro Cid é um dos oito intimados para depor simultaneamente à Polícia Federal nesta quinta-feira (31). Dias antes, Cid foi proibido por Alexandre de Moraes de se comunicar com o ex-presidente Jair Bolsonaro, com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e com outros investigados.

De acordo com os investigadores, a delação premiada de Mauro Cid no caso das joias não é necessária. Para ser aceita, a delação do tenente-coronel teria de entregar informações importantes para outros crimes que estão sendo apurados.

 “É uma investigação que tem cinco troncos. As joias são um desses troncos”, explica Daniela Lima em entrevista a Natuza Nery. “Cid conhecia tudo e vai ter de entregar tudo. E ele decidiu falar”, afirma a apresentadora da Globonews e colunista do g1.

“Bolsonaro usava o telefone de Cid quando queria falar com alguém e não queria que fosse do próprio número. Esse era o grau de entrega, de confiança. Se ele, Bolsonaro – que era conhecido por tudo menos pelo receio – receava usar o aparelho, ele usava o do Cid. E Cid entregava.”

O celular de Mauro Cid foi apreendido pela PF e foi fundamental para que a investigação descobrisse que Frederick Wassef, advogado de Bolsonaro, foi aos Estados Unidos para comprar o Rolex dado de presente pelo governo da Arábia Saudita à comitiva brasileira em 2019.

O dinheiro envolvido na operação foi depositado na conta do pai de Mauro Cid, o general Mauro César Lourena Cid, que também é alvo da operação da Polícia Federal.

 

       Confira versões que casal Bolsonaro ensaiou

 

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse, este mês, que seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid tinha “autonomia” para agir enquanto ele ocupou o Planalto. A afirmação, dada ao jornal “O Estado de S. Paulo” durante viagem a Goiânia (GO), veio acompanhada de negativas sobre o recebimento de dinheiro oriundo da venda de joias e representa mais uma versão apresentada por Bolsonaro e seu entorno sobre o caso, investigado pela Polícia Federal, que mira supostas transações irregulares envolvendo presentes entregues ao então chefe do Executivo por nações estrangeiras.

No entanto, dias depois, os advogados de Jair Bolsonaro decidiram colocar em prática uma nova estratégia de defesa: pedir ao Tribunal de Contas da União (TCU) a devolução das joias que entregaram em março à Caixa Econômica Federal por ordem da corte. De acordo com a colunista do GLOBO Bela Megale, o “cavalo de pau” se deu por ser a única tese possível e sustentável no momento”.

Veja as idas e vindas bolsonaristas sobre o caso das joias:

Logo depois de o caso vir à tona, em março, em reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo”, o ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou ao canal CNN Brasil que “não pediu, nem recebeu” os presentes. Inicialmente, foi apontado que o governo passado tentou trazer para o Brasil, de forma ilegal, um conjunto de colar e brincos recebidos do governo da Arábia Saudita, avaliado em cerca de R$ 16,1 milhões.

— Estou sendo acusado de um presente que eu não pedi, nem recebi. Não existe qualquer ilegalidade da minha parte. Nunca pratiquei ilegalidade — afirmou Bolsonaro em 4 de março.

As joias estavam com um assessor de um ministro de Bolsonaro e foram retidas pela Receita Federal no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, ao chegarem ao país. Em seguida, o governo fez uma série de tentativas de reaver os conjuntos junto à Receita.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho “zero um” do ex-presidente, saiu em defesa do pai logo após a revelação do caso, afirmando que as joias da marca suíça Chopard foram incorporadas ao seu acervo pessoal por terem caráter “personalíssimo”:

— Na minha opinião, (a caixa de joias) é personalíssima, independentemente do valor. O TCU está tendo esse entendimento agora. A Comissão de Ética falou que não tinha problema. Foi seguindo o que foi sendo pedido. Não tem nenhum dolo da parte dele, de maldade, ou ato de corrupção. Zero — disse Flávio Bolsonaro.

A defesa do ex-presidente, depois de ter se oferecido para fazer a devolução dos conjuntos de joias, afirmou que Bolsonaro “em momento algum pretende locupletar-se ou ter para si bens que pudessem, de qualquer forma, serem havidos como públicos”. O posicionamento foi apresentado pouco depois de o Tribunal de Contas da União (TCU) determinar que o segundo pacote de joias presenteadas por autoridades sauditas fosse devolvido à Presidência.

Em Goiânia: ‘Não mandei ninguém fazer nada’, diz Bolsonaro sobre venda de joias

As investigações da PF, porém, já apontaram que presentes chegaram a ser colocados à venda em um leilão, em fevereiro deste ano, com valor estimado entre US$ 120 mil e US$ 140 mil.

Quando voltou ao Brasil, no final de março, Bolsonaro afirmou que os presentes não entraram “escondidos” no país. A declaração foi dada no Aeroporto de Orlando, nos Estados Unidos, para onde ele havia viajado ainda no fim do mandato.

— Não sei por que esse escândalo todo. Vamos em frente. Nada foi extraviado, nada sumiu. Nada foi escondido. Ninguém vendeu nada. Acho que a questão desses três pacotes [de joias] está resolvida. Se eu tivesse pego escondido, ninguém teria conhecimento — afirmou, em 29 de março.

Pouco tempo depois, em abril, o ex-presidente disse à PF que teve conhecimento do conjunto de joias apreendidas no Aeroporto de Guarulhos apenas em dezembro do ano passado, duas semanas após o ocorrido. Aos investigadores, informou que buscou informações sobre o caso para evitar um “vexame diplomático” e um “constrangimento internacional” caso os itens fossem leiloados.

— Um presente de chefe de Estado dado ao governo brasileiro jamais poderia ir a leilão por inação de quem quer que seja — explicou o advogado e ex-ministro Fábio Wajngarten, na ocasião.

Primeiro filho do ex-presidente a se pronunciar sobre operação da PF sobre a compra e venda de joias recebidas por Bolsonaro enquanto esteve na Presidência, desencadeada no início de agosto, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) afirmou, no último domingo, que o pai cumpriu “todas as recomendações” do Tribunal de Contas da União (TCU) no caso.

O advogado Paulo Amador da Cunha Bueno, que representa o ex-presidente no caso das joias, negou, nesta sexta-feira, que o ex-presidente tenha recebido qualquer valor referente à venda de um relógio Rolex. A defesa do ex-ajudante de ordens Mauro Cid alega que o montante teria sido entregue a Bolsonaro ou à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

— O Cid evidentemente tem muita autonomia. Imagina a quantidade de demandas que chegam a ele e que ele tem que resolver sem o presidente da República — disse o advogado, em entrevista à GloboNews nesta sexta-feira, e acrescentou: — O presidente Bolsonaro nunca recebeu nenhum valor em espécie do Cid referente à venda de nada.

Em entrevista à revista Veja, o advogado Cezar Bitencourt, que atua na defesa de Cid, afirmou que o ex-ajudante de ordens teria recebido orientação de passar o dinheiro ao ex-presidente em espécie e usou a conta do pai, o general Mauro Lourena Cid, para guardar parte da quantia proveniente da venda das joias.

O próprio Jair Bolsonaro também comentou o caso nesta sexta-feira. Além de entoar o mesmo discurso sobre a “autonomia de Cid”, o ex-presidente afirmou, em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, que deseja ver o caso solucionado o quanto antes.

— Ele (Cid) tinha autonomia. Não mandei ninguém fazer nada. (…) Eu quero clarear o mais rápido possível — disse Bolsonaro.

O ex-presidente também comentou a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes em autorizar a quebra do seu sigilo bancário e fiscal, assim como o da ex-primeira-dama, Michelle.

— Sem problemas. Tudo incomoda, mas sem problemas.

Para justificar a manutenção das joias em seu patrimônio, Bolsonaro voltou a citar o caráter personalíssimo do item. Como mostrou o GLOBO, a estratégia de citar uma portaria nula foi aderida por outros parlamentares de sua base de apoio.

— Ela (a portaria 59/2018) vale pelo menos até a data em que ela existiu. Quando a portaria é revogada, tem uma vacância. O acórdão de 2016 provoca o parlamento — disse Bolsonaro.

Os advogados de Jair Bolsonaro decidiram colocar em prática uma nova estratégia de defesa: pedir ao Tribunal de Contas da União (TCU) a devolução das joias que entregaram em março à Caixa Econômica Federal por ordem da corte. A informação foi revelada pela “Folha de S.Paulo”.

Jair Bolsonaro foi emparedado pela operação da Polícia Federal realizada neste mês que mostrou venda e recompra de um Rolex e demais peças de um conjunto de joias para devolver ao TCU. O advogado Paulo Bueno, que capitania a defesa do ex-presidente, diz que a manobra não é uma mudança de estratégia, mas um “acréscimo”.

Após debates e conversas entre membros da defesa e conselheiros jurídicos com o próprio Bolsonaro, ficou evidente que o único caminho viável diante de tantas provas da PF é voltar à carga na tese de que as joias eram bens personalíssimos.

Essa estratégia é vista como um meio para tentar derrubar premissas de crimes que devem ser imputados a Bolsonaro, como peculato, que ocorre quando um servidor se apropria de algo que não é seu, além de lavagem de dinheiro e associação criminosa.

 

Fonte: Fórum/O Globo

 

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