Bahia tem mais de 40 mortes em confronto com a polícia em setembro;
entenda a onda de violência
Pelo menos 45 pessoas morreram em confronto com as forças de segurança na
Bahia durante os 23 dias do mês de setembro de 2023. A maioria das mortes
aconteceu durante operações policiais em bairros periféricos de Salvador.
As corporações afirmam que, dos 46 mortos, 45 eram
integrantes de facções criminosas ou suspeitos de outros crimes, como
homicídios, e houve troca de tiros em todas as situações. Apenas uma vítima, o
policial federal Lucas Caribé, não teria ligação com a criminalidade, segundo a
polícia.
>>>> Relembre:
- 6 de setembro: sete homens foram mortos em uma operação policial em Porto
Seguro, no extremo sul da Bahia;
- 6 de setembro: um homem, o último foragido suspeito de matar 10 pessoas em
uma chacina
em Mata de São João, Região Metropolitana
de Salvador (RMS), foi morto em troca de tiros Dias
D'Ávila, também na RMS;
- 3 a 7 de setembro: 11 suspeitos de integrar facções criminosas foram mortos em
troca de tiros com a Polícia Militar nos bairros de Alto
das Pombas e Calabar, que são vizinhos.
Durante os dias de operações, mais de 15 moradores dos bairros foram
feitos reféns por suspeitos;
- 10 de setembro: 2 pessoas foram mortas no Engenho
Velho da Federação, bairro que fica
próximo ao Alto das Pombas e Calabar;
- 15 de setembro: 4 suspeitos e um policial federal foram mortos
no bairro de Valéria, durante uma operação da Polícia Civil em conjunto com a Polícia
Federal;
- 16 a 21 de setembro: 10 suspeitos de envolvimento na ação que resultou na morte do
policial federal foram mortos em Salvador
e cidades da região metropolitana;
- 22 de setembro: cinco suspeitos de integrarem facções criminosas foram mortos
em Águas Claras, bairro de Salvador, e um foi morto em Feira
de Santana, a 100 km da capital baiana;
- 23 de setembro: cinco suspeitos mortos após dois
confrontos com policiais militares na
madrugada deste sábado (23), na cidade de Crisópolis, a cerca de 212 km de Salvador.
O g1 pediu à
Secretaria de Segurança Pública a identificação dos mortos na operação
realizada no bairro de Valéria e nas ações que se sucederam, e o órgão disse
que aguardava retorno do Departamento de Polícia Técnica, que fez a
identificação dessas pessoas. Apenas parte dos nomes foi divulgada pela pasta.
Apesar do número alto de mortes em setembro, a
realidade da insegurança não é novidade na Bahia. Em 2022, o estado liderou o
ranking de mortes violentas no país, com quase 7 mil assassinatos, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O número
representa 50 casos a cada 100 mil habitantes.
Ainda segundo o Fórum, 1.464 dessas mortes
aconteceram em confrontos policiais – uma média de 122 por mês. O Estado da
Bahia também foi o que mais matou pessoas em intervenções policiais no ano
passado, seja de agentes em serviço ou fora dele. Esse número saltou de 1.335
em 2021, para 1.464 mortes em 2022. O órgão não dispõe de dados referentes ao
ano de 2023.
Embora não tenha detalhado números, a SSP-BA
informou, em nota que,
de janeiro a agosto deste ano, as intervenções policiais com resultado morte
apresentaram redução de 4,3%, em comparação com o mesmo período do ano passado.
Após diversos registros de confrontos neste mês de
setembro, especialmente em Salvador, o secretário de Segurança Pública da
Bahia, Marcelo Werner, afirmou que a guerra
entre facções é a principal causa da violência no estado.
Por isso, operações integradas entre as polícias
Federal, Civil, Militar e Rodoviária Federal foram implementadas. Apesar do
reforço nas ações, o gestor garantiu que o estado não passa por uma intervenção
federal.
No mês de agosto, um acordo entre a SSP-BA e a PF
foi assinado, e assim surgiu a Força Integrada de Combate ao Crime Organizado
(FICCO), dos governos estadual e federal, com o objetivo de reforçar o combate
a grupos criminosos. O prazo de vigência do pacto é de dois anos, podendo ser
prorrogado por igual período.
·
Avanço das facções
criminosas
O advogado Luiz Henrique Requião, especialista em
ciências criminais e presidente do Tribunal do Júri baiano da Associação
Nacional da Advocacia Criminal (ANACRIM/BA), afirma que as facções criminosas
em Salvador e em cidades do interior da Bahia sempre existiram, mas passaram a
ganhar força e se enfrentar após se juntarem com grandes grupos criminosos de
fora do estado.
De acordo com o especialista, a Bahia tem uma
localização geográfica muito favorável para receber mercadorias, sejam elas
drogas, armas ou qualquer produto ilícito.
"Nos últimos anos, vem se descobrindo a Bahia
como um local estratégico de trânsito de drogas. A Bahia é a porta de entrada
do Nordeste e faz fronteira com o Sudeste e Centro-Oeste", pontuou.
Segundo o especialista, as facções Primeiro Comando
da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV) observaram que os grupos criminosos
baianos tinham "malha de distribuição amadora", mas que poderiam
aproveitar a atuação para ampliar poder e transitar no estado.
Ainda segundo ele, pichações em alguns bairros de
Salvador com mensagens do Comando Vermelho com o grupo baiano Bonde do Maluco
(BDM) apontam para uma possível conexão entre eles. A mesma situação se
encontra entre o Primeiro Comando da Capital e o grupo Katiara.
Conforme explicações do advogado, o tráfico nos
bairros de Valéria e Águas Claras, alvos de operações
da FICCO nas duas últimas semanas, já foram comandados pelo BDM e Katiara, mas
hoje vivem momento de disputa.
O bairro de Tancredo Neves, que também registra constantes tiroteios, seria área
de atuação da BDM. Já o Nordeste
de Amaralina, do Katiara.
·
Falta de políticas
eficientes
Requião ainda afirma que a estratégia usada pelo
Governo da Bahia para reprimir os grupos criminosos é o combate. Ele acredita
que apenas a implantação dessa política pública é ineficiente.
"Você prender ou matar o chefe ou o integrante
da facção, você está apenas substituindo ele por outro. Acaba sendo uma ação
que nunca vai ter fim, de enxugar gelo, porque vai ter alguém para ocupar
aquele lugar", opinou o especialista em ciências criminais.
Para o cientista político e professor de Direito da
Universidade Salvador, Fábio Santos, o combate às facções criminosas deve ser
pautado em três linhas: imediata, médio-prazo e longo-prazo. Todos os três
tipos de enfrentamento devem ser aplicados nas zonas onde há grande atuação das
facções criminosas, como é o caso dos bairros de Valéria e Águas Claras, por
exemplo.
As ações imediatas seriam as operações táticas
policiais, como as que ocorreram nos últimos dias em Salvador. O professor
destaca que um ponto extremamente importante das ações imediatas é conhecer bem
o local da ação. Entendendo melhor as características da área, é possível
preparar melhor as equipes e evitar contratempos.
"É preciso fazer o mapeamento das áreas, saber
os horários e os locais exatos que as ações criminosas costumam acontecer. É um
trabalho de monitoramento, de inteligência", afirmou.
Já as de médio prazo são associadas aos
investimentos, como a contratação de concursados nas forças de segurança e a compra
de equipamentos de inteligência. As de longo-prazo são os investimentos em
educação e na geração de emprego, por exemplo.
Para o cientista político, os moradores de
localidades conhecidas pela violência podem sofrer preconceitos em algumas
situações, como uma entrevista de emprego, por exemplo. É aí que as medidas de
médio e longo prazo podem atuar, oferecendo para essas pessoas possibilidades
que são minadas fora do bairro ou região.
"Algumas localidades já são etiquetadas como
locais violentos. São regiões que os motoristas por aplicativo não querem
entrar, por exemplo. É preciso haver a implementação de políticas públicas
nessas regiões, como geração de primeiro emprego e de escolas de tempo
integral", afirmou.
·
Ações de combate ao crime
organizado
Em 5 de setembro, durante a intensa troca de tiros
nos bairros do Calabar e Alto das Pombas, em Salvador, o secretário da SSP-BA,
Marcelo Werner, e o comandante da PM, Paulo Coutinho, fizeram uma coletiva
de imprensa para falar sobre o balanço das operações nos
dois bairros. No mesmo dia, o governador Jerônimo Rodrigues se reuniu com a
cúpula da Segurança Pública no estado.
Um dia após a morte do policial federal Lucas
Caribé, em 15 de setembro, a SSP-BA e a
Polícia Federal se reuniram para discutirem ações
de combate ao crime organizado no estado. Eles também falaram sobre a ampliação
de esforços para que sejam encontrados todos os suspeitos de envolvimento no
confronto que resultou na morte do agente.
Após o encontro, Werner afirmou que todos os
recursos estaduais e federais estão disponíveis. Ele destacou que o trabalho
integrado entre a SSP-BA e a Polícia Federal está focado no combate às facções
criminosas.
Como reforço para as operações, três
viaturas blindadas da Polícia Federal foram enviadas à Bahia e chegaram no estado nesta sexta-feira. Os veículos foram
embarcados em um navio da Marinha, no porto do Rio de Janeiro, na segunda-feira
(18), mas ainda não têm data para começarem a circular.
Além disso, agentes federais foram trazidos para a
Bahia para integrar as operações em Salvador e cidades próximas. Cerca de 400
agentes, no total, fazem parte da força-tarefa entre as forças policiais.
>>>> Veja
abaixo a nota enviada pela SSP-BA:
"A
Secretaria da Segurança Pública destaca que as ações policiais são pautadas na
legalidade e buscando sempre a preservação da vida. Ressalta ainda que de
janeiro a agosto as intervenções policiais com resultado morte apresentaram
redução de 4,3% na Bahia, na comparação com o mesmo período do ano passado.
Salienta
também que são constantes os investimentos em equipamentos, capacitação,
tecnologia e inteligência para as forças de segurança do Estado.
O
Reconhecimento Facial é um grande exemplo. Em 2023, a SSP ultrapassou a marca
de 1.000 foragidos da Justiça localizados. Cerca de 80% das pessoas encontradas
possuíam mandados de prisão por homicídio, roubo, estupro e tráfico de drogas.
As prisões foram efetuadas sem a necessidade de uso de arma de fogo.
Enfatiza,
por fim, o clima de beligerância entre facções. Nos últimos dois anos e meio,
cerca de 200 viaturas foram atingidas por disparos de arma de fogo durante
ações ostensivas de combate ao crime organizado. Cento e trinta policiais
acabaram feridos, após ataques dessas organizações criminosas."
Fonte: g1
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