A 'poeira cósmica' alojada nos telhados das catedrais
Está na terra do chão, nos detritos do telhado e no
pó que faz cócegas no nariz dele — são pequenos pedaços de “poeira cósmica” que
estão por toda parte.
Essas partículas microscópicas do espaço sideral
são micrometeoritos — principalmente detritos de cometas e asteroides — e
instalaram-se por todo o nosso planeta.
A poeira, segundo os cientistas, contém pistas
sobre como a Terra e o nosso Sistema Solar se formaram. Mas embora o material
esteja por toda parte, encontrá-lo entre a sujeira e os detritos está longe de
ser fácil.
A maior parte da poeira cósmica provavelmente vem
da nuvem Zodiacal, uma nuvem de poeira interplanetária que orbita o nosso Sol.
A Terra passa por esta nuvem e a poeira cósmica é varrida pela atmosfera do
nosso planeta.
Depois que as partículas assentam no solo, elas
podem ser encontradas em qualquer lugar. Elas podem estar nas suas roupas
agora. Mas, apesar da presença generalizada, encontrar poeira cósmica não é
fácil.
Um lugar onde as partículas aparecem com mais
facilidade é na Antártida. Há cerca de uma década, Matthew Genge, do Imperial
College London, passou sete semanas procurando e coletando poeira por lá, como
parte do programa de Busca por Meteoritos na Antártida (Ansmet, por sua sigla
em inglês). Esse é um projeto científico de campo liderado pelos Estados Unidos
que recupera espécimes de meteoritos. Desde então, ele passou anos analisando
os materiais que encontrou nesta viagem.
“Às vezes sinto que se parece um pouco com as
roupas do imperador. Passei a vida estudando algo que ninguém consegue ver”,
diz Genge.
A Antártida pode parecer um longo caminho a ser
percorrido apenas para varrer um pouco de poeira, mas é o lugar perfeito para
ir se você estiver procurando material cósmico. “É o lugar mais seco da Terra
porque toda a água que existe é gelo. E isso significa que a poeira cósmica e
os meteoritos duram muito tempo”, diz Genge.
“Imagine se
um meteorito cair no Reino Unido e você tentar encontrá-lo na grama. É
literalmente procurar uma agulha cósmica no palheiro”, diz Genge.
As amostras coletadas na Antártida têm maior
probabilidade de conter material cósmico e serão muito mais limpas do que as
amostras coletadas em ambientes com muitas pessoas, carros e chuva, que podem
remover a poeira. Entre os 5kg de poeira que Genge coletou na Antártida, ele
encontrou milhares de micrometeoritos.
• Raspando
o telhado
A desvantagem de coletar poeira na Antártida é o
custo e as complicações de viajar para lá. É por isso que Penny Wozniakiewicz,
da Universidade de Kent, no Reino Unido, concentrou a pesquisa dela mais perto
de casa. O segredo é coletar o material em um local razoavelmente tranquilo.
Wozniakiewicz vasculha os telhados de antigas
catedrais no Reino Unido como fonte de suas amostras. Neste mês, ela coletou
poeira e detritos nas catedrais de Canterbury e Rochester, no sul da
Inglaterra.
Ela se concentrou nesses telhados porque são
antigos e mais intocados do que os edifícios modernos. Além disso, prédios
históricos como catedrais geralmente possuem registros bem guardados que
indicam quando a manutenção e a limpeza foram feitas.
Com essas informações, fica mais fácil determinar
há quanto tempo a poeira cósmica se acumula e dá aos pesquisadores informações
sobre que outras partículas podem estar presentes na poeira que eles recolhem.
Isso permite que eles removam com mais eficiência o material da Terra e se
concentrem no material espacial.
O processo de classificação pode ser tedioso.
Primeiro, o material deve ser limpo, porque os telhados dos edifícios não são
tão imaculados como os da Antártida. Depois disso, o material é passado por
peneiras, para separar os pedaços pequenos o suficiente para serem apenas
poeira cósmica e grandes o suficiente para serem estudados. O que sobra é
colocado no microscópio.
Uma cientista com tanta experiência como
Wozniakiewicz pode identificar uma potencial partícula cósmica pelo seu
formato, mas isso só é determinado pela composição elementar. Ao contrário da
poeira comum, a poeira cósmica apresenta sinais inconfundíveis de exposição à
radiação do Sol e de toda a galáxia: isótopos radioativos que decaem muito
rapidamente.
Wozniakiewicz e seu parceiro no projeto da
catedral, Matthias van Ginneken, têm planos de visitar os telhados de várias
outras catedrais com seus sacos de coleta a vácuo. E, eventualmente, eles
esperam exibir o que encontraram ao público de uma forma artística única. Eles
querem transformar as inspeções detalhadas de poeira cósmica em modelos 3D
muito maiores para serem exibidos na catedral onde foram encontrados.
“A ideia é pegar algo que você mal consegue ver no
dedo e torná-lo muito maior para que você possa segurá-lo na mão”, diz
Wozniakiewicz.
Todos os anos, aproximadamente 100 bilhões de
partículas de poeira espacial aterram na Terra, transportando segredos de
asteroides e oferecendo vislumbres da formação de sistemas planetários. Esses
micrometeoritos não contêm apenas água, mas também moléculas orgânicas. Eles
potencialmente serviram como blocos de construção para a vida na Terra. Sabemos
que a água e a vida surgiram após a formação do nosso planeta, então tiveram de
vir do espaço sideral – possivelmente de asteroides congelados.
A poeira cósmica poderia, portanto, contar aos
cientistas sobre a intrincada relação entre esses corpos celestes e a Terra.
Ela atua como uma ponte, nos conectando ao cosmos.
Fonte: BBC Future
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