Cinco desafios que
o retorno de Trump à Casa Branca traz para o Brasil
Com a aproximação
da posse do republicano, a Sputnik Brasil lista os principais desafios a serem
enfrentados pelo governo brasileiro na próxima era Trump.
O presidente eleito
dos EUA, Donald Trump, toma posse no dia 20 de janeiro para seu segundo
mandato como presidente após um hiato de quatro anos. Embora o período afastado
tenha sido curto, foi suficiente para grandes mudanças no cenário geopolítico,
que nortearão a política externa de Trump, criando desafios para outros países,
sobretudo do Sul Global.
A Sputnik
Brasil lista cinco desafios que o retorno de Trump à Casa Branca traz para
o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
·
Aumento
do protecionismo
Já durante a
campanha presidencial, Trump demonstrava que seu próximo mandato seria
marcado pelo aumento do protecionismo nos EUA e pelo uso de tarifas como
ferramenta de pressão.
Trump já
ameaçou impor
tarifas de 100% a
países do BRICS, caso não abandonem os planos de desdolarização em transações
comerciais internas do grupo.
·
Aproximação
dos EUA com a Argentina
A Argentina é o
maior parceiro comercial do Brasil na América do Sul e terceiro no cenário
global, atrás apenas de China e EUA. Entretanto, o país vem se aproximando
dos EUA desde
a eleição de Javier Milei, enquanto se afasta do Brasil.
Essa tendência pode
causar dois impactos negativos. O primeiro efeito é o esfriamento das relações
políticas e econômicas entre Brasil e Argentina. Além de ir contra a agenda de
integração regional do governo brasileiro, o afastamento reduziu o comércio
entre os países, o que resultou em queda de 24,8% nas exportações
brasileiras para o país vizinho entre janeiro e outubro.
O outro problema é
o impacto político interno, já que a ascensão de Milei, inflada após a eleição
de Trump, é vista por analistas como demonstração de força da direita radical e
pode conferir novo fôlego ao bolsonarismo no Brasil.
·
Rusga
entre EUA e China
A China é o maior
parceiro comercial do Brasil. Porém, essa parceria pode colocar o Brasil
em uma situação política delicada.
Isso porque tudo
indica que a gestão de Trump será marcada por maior pressão contra a influência
da China na América do Sul e na América Latina, uma vez que terá como seu
futuro secretário de Estado o republicano Marco Rubio, conhecido por ter
liderado todas as sanções e medidas contra a China e por sua postura incisiva
contra países não alinhados dos EUA.
·
Pressão
contra a regulamentação das redes
Donald Trump
anunciou dois renomados representantes do setor de tecnologia para compor seu
governo: o empresário Elon Musk, dono da rede social X (antigo Twitter), que
comandará o Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, na sigla em
inglês); e Devin Nunes, dono da rede Truth Social, que presidirá o Conselho Consultivo
de Inteligência da Presidência.
Musk e Nunes são
ligados às chamadas big techs e defendem a manutenção das redes sociais de
maneira desregulamentada. A ascensão de ambos a cargos importantes do governo
estadunidense ocorre em um momento em que o Brasil segue a tendência mundial de
conter o avanço da desinformação e do extremismo on-line, por meio da
regulamentação e responsabilização das redes pelos conteúdos postados.
Musk já proferiu
uma série de ataques ao Judiciário brasileiro, acusou ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF) de promover a censura e, após empossado, pode
protagonizar mais embates com o objetivo de minar
as tentativas de regulamentar as redes.
·
Descrédito
em relação à agenda climática
Uma das prioridades
do governo Lula é alçar o Brasil ao posto de protagonista da agenda global de
sustentabilidade. Esse desejo se dá porque o tema está no centro do debate na
comunidade internacional, por conta dos eventos causados pelas mudanças
climáticas.
Porém, o retorno de
Trump à Casa Branca — com uma visão negacionista sobre as mudanças climáticas e
a anunciada intenção de fortalecer a indústria de carvão estadunidense — pode
prejudicar o debate global sobre sustentabilidade, uma vez que a adesão
dos EUA em acordos referentes ao clima é importante, levando em consideração
que o país é um dos maiores poluidores globais.
¨ Feitas por Biden, deportações de imigrantes para
América Latina quebram recorde de Trump, diz mídia
Apesar da retórica
anti-imigração do presidente eleito dos EUA Donald Trump, o atual líder
estadunidense Joe Biden deportou mais imigrantes de seu país do que qualquer
presidente dos EUA durante a década, escreve o jornal The Guardian.
Trump, conhecido
por sua promessa de concluir a construção de seu
muro na
fronteira com o México, mais uma vez reiterou seus planos através de um anúncio
feito pela porta-voz da equipe dele, Karoline Leavitt, que afirmou:
"No primeiro
dia, o presidente Trump consertará o pesadelo
da imigração e
da segurança nacional que Joe Biden criou, por lançar a maior operação de
deportação em massa de criminosos ilegais da história dos Estados
Unidos."
O The
Guardian cita os
números de 13 milhões a 14 milhões de imigrantes ilegais que estão
agora nos EUA.
Porém, o jornal
descobriu que o atual presidente dos EUA é responsável pelo maior número de
deportações por ano, 2023, do que em qualquer ano da presidência de Trump.
"Os
EUA deportaram mais de 270.000 imigrantes em um período recente de 12
meses, a maior quantidade anual em uma década", cita o jornal os dados de
um relatório do governo dos EUA.
O Serviço de
Imigração e Alfândega dos EUA deportou imigrantes para 192 países durante o ano
fiscal de 2024, de 1º de outubro de 2023 a 30 de setembro de 2024.
As autoridades
norte-americanas conseguiram aumentar as deportações por:
Simplificar o
procedimento de envio de pessoas para El Salvador, Guatemala e Honduras;
Aumentar o número
de voos de deportação, inclusive nos finais de semana.
Anteriormente, o
jornal também revelou que Biden expandiu o número de celas para imigrantes, que
poderá ajudar Trump a realizar sua
promessa.
¨ Especialista: influência chinesa na América Latina dará
resultados positivos na luta contra pobreza
O desenvolvimento
tecnológico na América Latina estimulado pela presença da China resulta na
superação dos problemas econômicos, disse o consultor da Frente Parlamentar do
BRICS do Congresso Nacional do Brasil Rafael Gontijo ao jornal Global Times.
O artigo nota que a
cooperação entre a América Latina e a China está se intensificando, com a
China ocupando o primeiro lugar entre parceiros
comerciais do
Brasil desde 2009.
Isso se aplica, em
particular, para o setor energético, com o mercado da região sendo "um dos
mais promissores mercados fotovoltaicos do mundo" em que o líder é o
Brasil, seguido pelo Chile e México.
Em sua entrevista,
Gontijo expressou a opinião de que a região latino-americana pode seguir
o exemplo
da China para
superar problemas econômicos.
O especialista
destacou o anúncio das autoridades chinesas em 2021 de que o
país "erradicou completamente" a pobreza absoluta, elevando
cerca de 800 milhões de pessoas para um nível mais alto.
A extensão do
acesso das pessoas comuns a bons sistemas de educação, de saúde e de transporte
atende à realização dos direitos humanos na prática, disse ele.
Gontijo chamou o
gigante asiático de "parceiro indispensável para a América Latina" e
acredita que os investimentos chineses em várias áreas estratégicas vão
dar resultados positivos.
"A presença da
China na região, por meio de investimentos diretos, se tornará ainda mais
significativa, promovendo
o desenvolvimento tecnológico
e a criação de empregos na América Latina", disse, citado no artigo.
Segundo o
consultor, as relações comerciais entre o Brasil e China vão continuar a
crescer, especialmente com o crescimento
do BRICS.
Gontijo também
ressaltou a importância da cooperação com a China no âmbito do Sul Global,
cuja ascensão representa uma mudança
positiva na
abordagem aos desafios globais que não podem ser resolvidos sem participação da
maior parte do mundo.
"Uma ordem
mundial multipolar é essencial para alcançar a paz, a prosperidade e mitigar os
efeitos das mudanças climáticas, com a China desempenhando um papel
de liderança entre
os países do Sul Global devido à sua relevância econômica e respeito à
diversidade."
¨ O que a Coreia do Sul fez o Brasil pode fazer na
indústria audiovisual. Por José Dirceu
Há 30 anos, a Coreia do Sul, a exemplo de muitos outros países que
cultuavam as produções de Hollywood, praticamente só exibia em suas salas de
cinema filmes norte-americanos. Hoje, sua indústria audiovisual é motivo de
orgulho nacional e importante fonte de divisas. As exportações coreanas de
filmes, série e games somaram US$ 13,2 bilhões em 2022, a produção de conteúdo
é base de um complexo industrial e cultural que está recebendo, a partir de
2023, investimento público de US$ 4 bilhões, em cinco anos, e o Comitê da
Indústria de Conteúdo, com seu plano plurianual, é coordenado pelo
primeiro-ministro.
O Brasil tem todas as condições de vir a ter uma pujante indústria
de conteúdo. Tem tradição na indústria cinematográfica que começa no final dos
anos 1940, com os Estúdios Vera Cruz, passa pelo Cinema Novo, pelo Cinema
Marginal, pela Embrafilme, pelo cinema pós-redemocratização, até consolidar-se
no cenário atual. Tem um arcabouço regulatório, com agência reguladora e
legislação setorial de estímulo ao desenvolvimento do audiovisual brasileiro
que, agora, precisa ser estendida ao mundo digital, com mecanismos de fomento.
Carece, no entanto, de um conjunto integrado de políticas públicas que
contemple toda a cadeia produtiva da indústria de conteúdo, não só da produção
de audiovisual, mas também da indústria de games, que é um importante nicho de
mercado no qual o Brasil já mostrou que pode ser competitivo.
Para os envolvidos nesse debate, já estamos atrasados na regulação
do streaming na internet, ou seja, em estabelecer contrapartidas a serem
cumpridas pelas plataformas estrangeiras que operam no país exibindo filmes e
séries produzidos em outras partes do mundo. Há vários anos, países europeus e
mesmo asiáticos regulamentaram o streaming na internet. A França, por exemplo,
já está na terceira rodada da regulamentação, em que elevou os percentuais
cobrados das plataformas pela exibição dos conteúdos – a média da taxação lá é
de 25% do faturamento.
Aqui, Netflix, que desembarcou no Brasil há 13 anos,
Google/Youtube, Disney, Amazon, Apple TV, entre outros, operam pagando apenas
ISS e ICMS. Há cinco anos não pagam a taxa de Contribuição para o
Desenvolvimento Industrial do Cinema Nacional – Condecine, de 11% sobre remessa
de lucros, porque a Receita Federal está avaliando a cobrança do tributo (a
taxa não é cobrada se a empresa investe valor equivalente em produção
audiovisual no país). Segundo cálculos da Agência Nacional do Cinema – Ancine,
a Condecine Remessa deveria gerar R$ 1 bilhão/ano e existe um passivo de R$ 4
bilhões a R$ 5 bilhões que não foram cobrados.
As grandes plataformas estrangeiras de streaming não só vêm
destruindo o mercado da TV paga e mesmo da TV aberta pois têm um modelo de
negócios muito mais modular e flexível, mas também porque têm uma carga
tributária bem menor – o que, convenhamos, é uma anomalia, pois protege quem
domina o mercado. Nesse cenário, regular o streaming na internet é tarefa mais
que urgente, pois as plataformas são majoritárias nesse mercado que, segundo
estimativas, têm faturamento anual de R$ 35 bilhões (a fatia do leão seria da
internet, mas o valor inclui também publicidade na TV aberta e TV paga).
Como levar à frente a luta pela regulação do streaming na
internet? Há uma série de iniciativas a serem contempladas no âmbito do
Executivo e das agências reguladoras – Ancine, no que se refere à regulação
para disciplinamento dos serviços, e CADE, no âmbito da defesa da concorrência
–, e também do Legislativo. O Senado aprovou, em abril, o PL 2331/2022, com
relatoria do senador Eduardo Gomes (PL/TO), que regulamenta a cobrança da taxa
de Condecine para os streaming de vídeos exibidos pelas plataformas digitais
com receita bruta acima de R$ 2 milhões anuais e cem produções. Mas o texto,
que ainda vai ser examinado pela Câmara dos Deputados, é muito limitado, pois
considera empresa estrangeira instalada no país como brasileira para fins de
benefícios fiscais. Além disso, prevê o fim da Condecine Remessa.
Na Câmara, o texto aprovado no Senado deverá ser debatido
juntamente com o PL do deputado André Figueiredo (PL 8889/2127), que, embora
resgate o conceito de empresa brasileira para aquelas que tenham maioria de
capital nacional e estabeleça alíquota de imposto de 6% (o dobro da prevista no
PL do Senado), ainda é tímido de acordo com as análises de especialistas do
setor. Isso porque a alíquota média, em função da dedução de investimentos em
produção local, cai para 2,5% no PL da Câmara (1% no caso do Senado). A
arrecadação total, a partir de simulações feitas, na melhor das hipóteses
ficaria entre R$ 330 milhões e R$ 800 milhões. Muito pouco frente ao que é
necessário para financiar o desenvolvimento da indústria brasileira de
audiovisual. Hoje, a Condecine arrecada R$ 1,2 bilhão (a quase totalidade vem
da taxa cobrada das operadoras de telecom); 30% vão para o orçamento da União e
os 70% restantes para o Fundo Setorial do Audiovisual.
<><> Novos paradigmas
As estratégias das grandes plataformas digitais implicam desafios
regulatórios e concorrenciais importantes. As características intrínsecas à sua
atuação – o uso de dados de terceiros, por vezes concorrentes embarcados; sua
situação como mercados bilaterais ou plurilaterais e os efeitos de rede, que
tendem a gerar concentração; os movimentos agressivos de integração e a
manipulação de preços –, criam uma situação complexa, que dificulta o uso dos
instrumentos tradicionais pelas instituições de defesa da concorrência.
Diante desse cenário, o Ministério da Fazenda apresentou, em
outubro, um estudo com propostas para aperfeiçoar a regulação concorrencial
brasileira no que se refere às plataformas digitais. O objetivo das alterações
na Lei da Concorrência (Lei 12529/2011), a serem feitas pelo CADE, é impedir
que as plataformas digitais exerçam seu poder dominante, como o de dar
preferência a seus produtos em marketplaces, firmar acordos de exclusividade e
promover aquisições estratégicas para impedir aquisições futuras por terceiros.
Está em avaliação, no Ministério da Fazenda, a taxação das
plataformas digitais, que vem sendo estudada, desde 2021, no âmbito de alguns
fóruns multilaterais, como a OCDE, como parte de um acordo relativo ao processo
de digitalização. Como o acordo, que deveria ter sido formalizado até junho
deste ano, não ocorreu até por resistência dos Estados Unidos, alguns países
estão unilateralmente estabelecendo seus impostos. A Lei do Imposto sobre
Serviços Digitais do Canadá entrou em vigor no final de junho, com efeito
retroativo a janeiro de 2022; estabelece cobrança de imposto de 3% sobre
empresas de serviços digitais com faturamento acima de 20 milhões de dólares
canadenses. O primeiro pagamento será no final de junho de 2025. Nova Zelândia
aprovou lei semelhante, que entra em vigor ano que vem.
Independentemente se a Fazenda vai propor ou não a taxação das big
techs, o certo é que a indústria brasileira de audiovisual precisa se
reorganizar frente a um cenário de forte internacionalização do setor, de
concentração do mercado nas mãos de oligopólios que têm seus custos diluídos
pela escala mundial e de uma economia baseada no extrativismo dos dados, fonte
relevante de receita para as big techs.
A produção independente brasileira e mesmo as redes de TV aberta e
de TV paga estão fragilizadas, com receitas em declínio, e sua sobrevivência
depende de uma regulação que priorize produção nacional, investimentos e um
projeto de desenvolvimento que garanta espaço para a empresa brasileira,
promova sua modernização, fomente a diversidade e recupere a receita.
Fora a fragilidade frente à concorrência internacional, o setor
audiovisual brasileiro enfrenta problemas estruturais que têm que ser enfrentados
nessa fase de reorganização do segmento frente a nova realidade do mercado – o
audiovisual responde por 80% do tráfego de dados na internet. A TV carece de
diversidade editorial, há dificuldades para o desenvolvimento regional e a
produção independente segue isolada.
Para o Brasil desenvolver uma indústria de conteúdo audiovisual
que venha a ser competitiva não basta uma iniciativa legislativa de taxação das
plataformas estrangeiras de streaming na internet. É preciso um projeto de
desenvolvimento de toda a cadeia produtiva da indústria brasileira de
audiovisual, de fomento da produção independente, que é mais flexível, mais
regional e se adequa melhor ao formato de parcerias com outras empresas
nacionais e estrangeiras, de aperfeiçoamento da regulação da defesa da
concorrência para conter o poder dos oligopólios e da regulação setorial para
que ela se antecipe aos movimentos de mercado. Enfim, é preciso transformar o
Plano de Diretrizes e Metas do Audiovisual Brasileiro em um programa de governo.
Fonte: Sputnik
Brasil/Opera Brasil
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