terça-feira, 26 de dezembro de 2023

Jeferson Miola: Um ano de impunidade das cúpulas militares

O 8 de janeiro de 2023 foi uma espécie de 31 de março de 1964 que, todavia, não deu certo.

Foi um ataque violentíssimo e impetuoso aos poderes da República e à democracia que fracassou no objetivo de promover ruptura institucional e destruir o Estado de Direito.

Diferentemente de 1964, em 2023 os golpistas não contaram com o apoio dos EUA. E por isso não puderam avançar outra vez a empreitada antidemocrática.

Além disso, os “exageros” da barbárie fascista-militar assustaram certos setores da oligarquia dominante que preferiram desembarcar da escalada golpista à qual tinham se associado organicamente na fraude eleitoral de 2018 armada pelo judiciário lavajatizado.

O 8 de janeiro tem parentesco com outros atentados antidemocráticos perpetrados pelas oligarquias golpistas na história recente do país – como o 17 de abril e o 31 de agosto de 2016, dois momentos-chave do impeachment fraudulento da presidente Dilma; e como o 3 de abril de 2018, data em que o Alto Comando do Exército obrigou o STF a prender ilegalmente o presidente Lula para impedí-lo de disputar e vencer a eleição daquele ano.

A rememoração do 1º aniversário do 8 de janeiro de 2023 programada pelo governo será incompleta e insuficiente, porque fortemente permeada pelo “vício” do Brasil em contemporização e impunidade.

Se bem é verdade que cerca de 1.200 criminosos da extrema-direita bolsonarista e lavajatista tenham sido presos na ocasião, o fato lastimável é que nenhum –absolutamente nenhum– líder central, planejador ou arquiteto intelectual da intentona do 8 de janeiro foi processado e preso.

Todas as pessoas presas ou que respondem a processos criminais são cidadãos e cidadãs civis de relevância e responsabilidade terciárias na cadeia geral de planejamento e execução dos atentados.

Não foram processados e presos nem mesmo aqueles oficiais militares e membros da família militar que durante meses acamparam nas áreas dos quartéis e inclusive ajudaram nos preparativos dos atos terroristas de 12 e 24 de dezembro em Brasília.

A justiça militar, essa excrescência jurisdicional herdada da ditadura, julgou e condenou a um mês e 18 dias de prisão e em regime aberto um único militar criminoso, o coronel bolsonarista Adriano Camargo Testoni.

O incrível, porém, é que este delinquente fardado que participou ativamente da devastação no 8 de janeiro não foi condenado pela participação nos eventos, mas porque xingou seus superiores, chamando-os de “frouxos e ‘fdp’” porque não posicionaram, como prometido, as tropas nas sedes dos três Poderes então tomadas pela horda fascista.

Que se saiba, o próprio Bolsonaro ainda não responde a nenhum inquérito criminal sobre o 8 de janeiro. De igual maneira não foram responsabilizados os comandantes militares e oficiais de alta patente da ativa e da reserva que durante quatro anos ameaçaram a ordem institucional e até o último minuto de 2022 tramavam a virada de mesa porque não aceitavam o resultado da eleição.

O ministro bolsonarista do TCU Augusto Nardes, que distribuiu áudio a apoiadores relatando “um movimento muito forte nas casernas que terá um desenlace bastante forte na Nação”, continua impune e recebendo cerca de R$ 45 mil por mês no Tribunal.

É até possível que Bolsonaro e “seus” generais, almirantes, brigadeiros, coronéis, capitães e outros delinquentes civis e fardados venham a ser investigados em razão do relatório da CPMI dos atos golpistas, mas isso só acontecerá se for revertido o acordão firmado para livrar a cara deles.

Do mesmo modo que os agentes de terror da ditadura de 1964, os golpistas de 2023 também ficarão outra vez impunes. As cúpulas fardadas novamente conseguiram impor ao poder político e à sociedade civil a anistia para militares que perpetram crimes contra a democracia.

Os militares exigiram e ganharam uma nova anistia. Ainda que não seja na forma de uma nova Lei da Anistia, é uma anistia tácita.

Isso é sinal não só de que os militares estão conseguindo se reposicionar depois da tentativa fracassada de golpe, mas que estão absolutamente fortalecidos, fortes e rearticulando seu projeto próprio de poder fardado.

Assim como a impunidade depois da ditadura encorajou a dinâmica golpista do último período, a impunidade em relação ao 8 de janeiro encorajará – e num futuro menos distante que se imagina– novas investidas de militares golpistas contra a democracia e o Estado de Direito.

A rememoração do 8 de janeiro só terá eficácia democrática real se produzir um grande esforço do Congresso, do governo federal, do judiciário e das instituições da República para punir aqueles que representam, historicamente, uma ameaça à democracia.

 

Ø  8 de janeiro: memorial para nunca mais. Por Ronaldo Lima Lins

 

Quando o ano se aproxima do final, depois de tantas conquistas e alguns dissabores, parece inevitável o ritual do balanço. Um olhar para o que se passa na Argentina, traz uma onda de conforto pelo que já passamos e agora estamos passando.

No entanto, aproxima-se o 8 de janeiro, a recordação funesta dos bárbaros que invadiram e quebraram os Três Poderes, imaginando um golpe de estado, com Jair Bolsonaro à frente. Seguidores do dito cujo, conscientes da dimensão da catástrofe em termos de dignidade nacional, esforçaram-se em reinventar os acontecimentos, como se eles resultassem de agentes infiltrados do governo para desgastá-los.

Nada provou a tese e o Tribunal Superior Eleitoral, com Alexandre de Moraes e o apoio dos demais ministros do Supremo, está julgando os infratores de acordo com o império da Lei. Cabe reconhecer, no entanto, a presença da oposição, nem sempre responsável e bastante feroz, no Congresso Nacional, atenta para qualquer campanha que consiga desmoralizar o governo, o que até hoje não aconteceu. Trata-se de um fenômeno que provoca gritarias e apupos, como se observou durante a sessão de apresentação da reforma tributária com presença do Presidente da República. Um grupo de opositores, com as caras de hábito, aparece nas fotos berrando e vaiando, enquanto muitos outros, ao contrário, aplaudiam e consagravam a figura do importante dirigente.

Dos conflitos resultaram um tapa no deputado Messias Donato que, no dia seguinte, chorava as mágoas em plenário, contando com os projetos de reparação. Esta assembleia não se mostra muito afeita a providências quanto à ética, mas vamos ver no que vai dar... Claro que um parlamentar não pode agredir o outro. A vítima, contudo, não pode empurrá-lo para lhe tomar à força o celular. No cômputo geral, todo mundo errou, fruto de impunidades anteriores que oferecem a impressão de eternas complacências. Por outro lado, a Terra continua a girar.

Quando a memória ressurge, a evidência de que algo tem de acontecer do ponto de vista de uma avaliação dos fatos, salta aos olhos. Se vivemos numa democracia e desejamos preservá-la, 8 de janeiro nunca mais! Que os saudosistas, cada vez mais isolados, mesmo aos berros de vez em quando, esbarrem na contundência da História constitui o desejo da maioria, disposta a resistir e lutar pelo pão nosso de cada dia e uma sociedade justa. Ainda que o bom aprendizado às vezes transmita a sensação de impossível, sabe-se que a humanidade se refaz e se reorganiza através da experiência. Daí a importância do Nunca Mais, em prosa e verso, cantado aos quatro cantos no território nacional. Com a vida bem sucedida que levou e continua levando, Lula conhece a importância da História e a entende como respeitável. Desta feita, promete-se um momento de reflexão, com os Três Poderes de novo em pé e cumprindo os seus deveres.

Que os dorminhocos despertem e que os frustrados lambam as suas feridas. Detidos na Papuda e os que terminarão lá, ainda em processo de avaliação, ponham as barbas de molho. O país se mostra cansado de barbárie. Pobres e remediados valorizam as medidas de caráter social em nome da libertação da miséria. Este soa como o memorial a ser erguido, para que as gerações futuras respeitem os nossos contemporâneos. Assim se ergue uma boa república, festejada dentro e fora de suas fronteiras.

 

Ø  O futuro do Brasil. Por Emir Sader

 

Foi um ano melhor para nós no Brasil. Sem dúvida. Antes de tudo, porque tivemos um primeiro ano de um novo governo do Lula, deixando para trás os anos do Bolsonaro. Com este se tornando inelegível, Bolsonaro foi derrotado, embora não necessariamente o bolsonarismo. A luta ideológica e política para consolidar a democracia e avançar no antineoliberalismo segue no novo ano.

Esse novo ano permitiu ao governo retomar a prioridade das políticas sociais, resgatando programas tradicionais, começando pelo Bolsa Família, seguido pelas outras e agregando novos programas para atacar a situação de país mais desigual do continente mais desigual que segue tendo o Brasil.

Porque não se enfrentou o problema central do Brasil no plano econômico: o capital especulativo continua sendo o eixo fundamental da economia do país. Os bancos privados expressam essa hegemonia. A especulação financeira, as altas taxas de juros, continuam a protagonizar a economia do Brasil.

Certo que o desemprego diminuiu, que a desigualdade diminuiu, que a exclusão social é menor. Mas nada disso chega às ruas. As cenas de rua generalizadas por todo o país continuam a ser a das pessoas abandonadas, dormindo nas ruas, famílias inteiras ocupando as calçadas. Nos perguntamos sempre, quando os divisamos: quando e por que mecanismos chegará o resgate dessas pessoas.

Lula sempre disse que governar é cuidar das pessoas. Essas centenas de milhares de pessoas não tem quem cuide delas. Como se os governos não chegassem a elas.

O maior voto nosso é que essas cenas deixem de ocupar nossas ruas e praças. Que. Não existam mais pessoas que não sejam cuidadas.

O Brasil melhorou em 2023 porque voltamos a ter um governo nacional, democrático, que fala, pelo Lula, para todos os brasileiros. Que volto a ser respeitado no mundo. Que tem um presidente de prestígio, que se ocupa de pacificar os conflitos bélicos pelo mundo afora.

O Brasil retomou um caminho positivo. Tem democracia, tem políticas sociais como prioritárias, tem atenção pelos mais desvalidos. Olha para os países vizinhos com atenção e preocupação em ajudá-los.

Não sabemos ainda como será 2024. Há uma grande possibilidade de Donald Trump – caso possa ser candidato – volte a ser presidente dos Estados Unidos, com posições esdrúxulas, agressivas, isolacionista para os Estados Unidos.

Sabemos que as das feridas que mais nos doem atualmente – Palestina e Argentina – dificilmente mudarão. As crianças palestinas seguirão sendo as vítimas mais cruéis da guerra no mundo. Enquanto o Brasil sai do seu pior momento, a Argentina apenas começa a entrar.

2023 foi um ano melhor para nós, em grande medida pela presidência do Lula. Se Lula se candidatar à reeleição – como ele já mencionou -, poderemos ter um período político muito especial: mais 7 anos do Brasil com o Lula. Teremos que aproveitar essa especial circunstância histórica, com um projeto estratégico que se aproveite dessas condições para colocar em prática um projeto de profundas transformações do país, que faça desse período um período histórico único e irreversível da nossa história.

 

Fonte: Brasil 247

 

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