Sem água e energia: serviços essenciais são negados
aos quilombolas, no Espírito Santo
Sem água e sem energia
elétrica. Dois serviços públicos essenciais seguem sendo negados a mais de
trinta comunidades que compõem o Território Quilombola Tradicional do Sapê do
Norte, localizado nos municípios de São Mateus e Conceição da Barra, no norte
do Estado. As omissões das concessionárias públicas e privadas responsáveis
pelo fornecimento na região são crônicas e já foram denunciadas algumas vezes pelas
comunidades. Neste final de 2023, a indignação tomou forma de ação civil
pública, impetrada pelas Defensorias Públicas e por requerimento da Comissão
Quilombola do Sapê do Norte ao Ministério Público Federal (MPF).
A ACP foi ajuizada pelo
Núcleo da Defesa Agrária e Moradia (Nudam/DPES) e a Defensoria Pública da União
(DPU) contra a Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan), o Serviço
Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) de São Mateus e as prefeituras de São Mateus e
Conceição da Barra. O objetivo é a regularização do acesso à água nas 33
comunidades quilombolas do Território do Sapê do Norte.
A ação pede que, até que
seja apresentada uma solução definitiva, as instituições forneçam
caminhões-pipa aos moradores. Outros pedidos são: realização de um diagnóstico
das fontes de água, com capacidade de abastecimento das famílias, e reuniões
periódicas para prestação de contas com os quilombolas.
“A Defensoria apurou que
as comunidades não contam com estrutura adequada para a distribuição de água,
nem o despejo adequado de esgoto. Muitas famílias utilizam cisternas, no
entanto, no período das chuvas, a água se mistura ao lixo da região. Para
conseguir água potável, muitas pessoas precisam percorrer cerca de 5km”,
destaca o Nudam/DPES.
A situação, afirma, é uma
nítida violação de direitos. “A falta de infraestrutura adequada tem obrigado
as famílias a utilizar água poluída, além de afetar a rotina das escolas, que
não possuem água potável para os alunos, professores e outros trabalhadores”,
acrescenta.
• Cronograma paralisado
Em agosto, a secretária
de Estado de Direitos Humanos, Nara Borgo, coordenadora da Mesa de Resolução de
Conflitos Fundiários, esteve no Sapê do Norte e relatou o andamento das
demandas diversas das comunidades, apresentadas ao governador Renato Casagrande
(PSB) desde o 8 de Março de 2022, quando ele se comprometeu em atender às
mulheres. Sobre água e energia, a gestora da SEDH informou que a Cesan, o SAAE
de São Mateus e a EDP Escelsa tinham um cronograma de ações para realizar os
serviços.
Passados dois meses, no
entanto, nada foi feito. Segundo a Comissão Quilombola do Sapê do Norte, a
Cesan alega necessitar de uma pesquisa para identificar onde estão as
comunidades, porém, não apresenta qualquer compromisso de execução da mesma, o
que demonstra a omissão do governo do Estado com uma pauta essencial do
território quilombola.
• Ameaça de tiros e ataque de cachorros
Já a EDP, denuncia a
Comissão, iniciou a instalação de redes de energia elétrica, mas interrompeu o
serviço devido a ameaças proferidas pela empresa de segurança patrimonial da
Suzano (ex-Aracruz Celulose e ex-Fibria), que mantém dezenas de milhares de
hectares de monocultivos de eucalipto na região e se recusa a recuar sua
monocultura sobre territórios quilombolas já certificados. O deserto verde de
eucaliptos da multinacional é o uso do solo que mais cresce no Espírito Santo
há quase duas décadas e é responsável pelo secamento de nascentes, lagoas e
córregos outrora abundantes no Sapê e pela contaminação das águas, solo e
lavouras quilombolas, bem como criações animais e pessoas, devido ao uso
intensivo de herbicidas.
No documento encaminhado
ao MPF, a Comissão Quilombola relata que no dia 13 de setembro, lideranças das
comunidades de Angelim II e Nossa Senhora da Penha receberam um telefonema do
técnico da empresa EDP que estava trabalhando nas comunidades dando conta do
fato. “Ele foi ameaçado por um carro de vigilância da empresa Suzano, um carro
com cachorro, e o vigilante afirmou a ele que se retornasse às comunidades,
soltaria os cachorros nele e alvejaria de tiro, com isso, o técnico responsável
pelas visitas acionou os seus superiores que suspendeu o trabalho nas
comunidades”, expõe a denúncia.
“A falta de energia
aumenta ou contribui com várias outras dificuldades na comunidade, como acesso
à agua, produção das casas de farinha que se encontram paradas em diversas
comunidades quilombolas do Sapê do Norte. Nossas comunidades sempre fizeram
denúncias sobre essas ameaças, impactos ambientais, direito de ir em vir, e
muitas outras. Diversas lideranças já se passaram por situação parecida, e hoje
nós queremos que os órgãos competentes se posicionem e tomem as medidas, e que
os trabalhos da EDP voltem urgentemente nas comunidades, e que não deixe que
uma empresa privada mais uma vez cerceando os nossos direitos”, acrescenta a
Comissão.
• Mais de meio século de violações
Tornar a vida humana
impraticável dentro do Sapê do Norte parece ser um objetivo permanente da
Suzano, desde os seus tempos de Aracruz Celulose, quando expulsou do território
90% das famílias quilombolas que lá viviam há gerações, derrubou milhares de
hectares de Mata Atlântica nativa e iniciou a expansão de seu deserto verde
para produção de celulose.
A criação da Mesa de
Resolução de Conflitos Fundiários, pelo Governo Casagrande, que deveria sanar
as violações de direitos humanos e fundiários das comunidades, por sua vez, não
alcança nenhum resultado efetivo, sendo manipulada pela multinacional para
continuar usurpando o território quilombola.
• Força-tarefa e retomadas
Ações efetivas surgem por
parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que sob
gestão do presidente Lula (PT), determinou uma força-tarefa para concluir a
titulação das comunidades já certificadas pela Fundação Palmares, muitas há
mais de 15 anos. As próprias comunidades também tomam medidas que lhe cabem,
realizando retomadas, como em Nossa Senhora da Penha e Nova Vista, diante da
recusa da Suzano de retirar seus eucaliptais das terras quilombolas.
Autoridades reforçam pedido para saída voluntária de invasores
da Terra Indígena Apyterewa, no sudeste do Pará
Em reunião realizada na
manhã desta terça-feira (24), representantes do Ministério Público Federal
(MPF) e do Governo Federal discutiram o andamento da operação de desintrusão da
Terra Indígena Apyterewa, no sudeste do Pará. As autoridades reiteraram a
importância de as famílias que ocupam a área de forma indevida deixarem
voluntariamente o local até o dia 30 de outubro, conforme cronograma definido
para a operação de retirada dos não indígenas da área. A reunião coordenada
pela Câmara das Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR)
foi solicitada após a circulação de notícias falsas, principalmente na região
onde está a TI, de que o cumprimento da ordem judicial que determinou a
retirada dos não indígenas seria suspensa.
Participaram das
discussões – por parte do MPF – a coordenadora da 6CCR, Eliana Torelly,
integrantes do colegiado e procuradores lotados no Pará com atuação no tema.
Pelo Executivo, estavam presentes o ministro da Justiça, Flávio Dino, a
ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, a secretária-executiva da
Secretaria-Geral da Presidência da República, Maria Fernando Coelho, o
presidente do Incra, César Shiavon, além de assessores dessas pastas e do
coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib),
Maurício Terena.
Na reunião, foi
apresentado um relato tanto da importância da medida de desintrusão para
assegurar que os indígenas possam de fato usufruírem dos territórios demarcados
há mais de uma década como das providências já adotadas desde o início da
operação, em 2 de outubro. O representante do Incra informou que, com o
objetivo de cadastrar as famílias invasoras, técnicos do órgão visitaram 851
casas existentes da Vila Renascer. Parte delas (441) estavam fechadas. O
Governo Federal reiterou que tem oferecido apoio logístico para as pessoas que
aceitam deixar o local. Ao todo, 19 órgãos federais integram a operação e atuam
em várias frentes, inclusive para apurar a possível existência de trabalho
escravo no local.
Outra frente considerada
fundamental para que a desintrusão possa se efetivar de forma pacífica é a
retirada de animais. A estimativa é que 60 mil cabeças de gado sejam criadas de
forma indevida nas duas TIs. Em relação a esse problema, os representantes do
MPF lembraram que, na última sexta-feira (20), foram ajuizadas 48 ações
judiciais que buscam tanto a condenação dos responsáveis pelos crimes quanto a
indenização e reparação dos danos provocados pela atividade irregular.
Ao longo de quase duas
horas e meia de conversas, os representantes dos diversos órgãos se revezaram
na apresentação do que está sendo feito, da importância das saídas voluntárias
e da construção de medidas articuladas para se garantir o cumprimento da
decisão judicial sem conflitos, de forma que o Estado possa garantir o direito
dos indígenas da etnia Parakanã, assegurado de forma definitiva em 2007, com a
homologação da área. A estimativa é que, antes do início da operação de
desintrusão, mais de 3 mil pessoas não indígenas residiam ilegalmente na
região, ocupada por aproximadamente 1,4 mil indígenas.
Ø MST repudia ação violenta e ilegal da PM em
Canoinhas/SC
O Movimento dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST) repudia e denuncia a
operação das forças de segurança do governo do estado de Santa Catarina, que
despejou no dia 21 de outubro aproximadamente 120 famílias que ocuparam área
pertencente à União, localizada na entrada de acesso a Valinhos, em Canoinhas.
Na manhã do sábado (21),
as famílias Sem Terra ocuparam a área para denunciar a existência de uma faixa
de terras devolutas de 600 hectares, pertencentes à União e utilizada
indevidamente de forma privada. Trata-se de uma luta antiga do Movimento Sem
Terra para que ocorra a desapropriação e destinação para a política de Reforma
Agrária.
Em poucas horas as
famílias foram surpreendidas por uma ação de um grande efetivo da PM com
mais de 150 policiais, aproximadamente 40 viaturas, oriundos dos
municípios de Canoinhas, Porto União, Mafra, São Bento do Sul, Lages, Batalhão
de Aviação de Lages (helicóptero).
Os presentes relataram
inúmeras formas de violência. “A gente foi abordado, e já cutucado com arma e
gritando”, colocaram “as armas na cabeça”, “eu tenho um ferimento na barriga
com o cano de uma 12”, “me puxou pelo cabelo… me chutaram pra abrir as perna”,
foi uma “humilhação, jogaram nossos documentos no chão”, “humilhação com as
mulheres, nem crianças respeitaram”, “me algemaram”.
Um jovem de 14 anos foi
algemado.
As famílias foram todas
dispersadas, inclusive foram impedidas de se abrigarem em um assentamento
vizinho, que ofereceu guarida para acolher as pessoas. Elas foram obrigadas a
retornar imediatamente para seus locais de origem. Três pessoas foram presas e
liberadas, ainda não há confirmação sobre a abertura de inquérito policial, mas
os celulares e veículos continuam apreendidos.
O Movimento Sem Terra
reforça que “Reforma Agrária é comida no prato”, que não parou e nem irá parar
de lutar pelo direito a terra e para que a mesma seja destinada a produção de
alimentos saudáveis. Em Santa Catarina são cerca de 6 mil famílias assentadas,
mais de 20 mil pessoas em cerca de 75 mil hectares. Essas famílias não teriam
onde morar se não fosse a luta por reforma agrária. Hoje organizaram
cooperativas, contam com escolas desde o nível básico até o ensino superior em
seus territórios.
Lutamos pelo direito de
viver e produzir no campo. Não aceitamos qualquer forma de injustiça ou
violência contra o povo.
Lutar! Construir Reforma
Agrária Popular!
Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Sem Terra (MST)
Chapecó (SC), 22 de outubro de 2023
Ø MPF ouve indígenas sobre impactos da
instalação de pequenas hidrelétricas no Rio das Mortes, em Mato Grosso
O Ministério Público
Federal (MPF) realizou, na última quarta-feira (18), reunião pública para ouvir
lideranças indígenas dos povos Xavante e Boe/Bororo sobre os possíveis impactos
da instalação de quatro pequenas centrais hidrelétricas (PCH) no Rio das Mortes
e no Rio Cumbuco, em Mato Grosso. O objetivo foi colher depoimentos,
identificar e registrar os possíveis impactos ambientais e sociais dos
empreendimentos sobre as diversas comunidades ribeirinhas na perspectiva dos
próprios indígenas.
Uma das principais
preocupações apontadas está relacionada à segurança alimentar das populações
tradicionais, uma vez que o barramento dos rios para a construção das PCHs pode
afetar a população de peixes e a caça na região. Os dois rios também são
fundamentais para a construção da identidade cultural dos povos indígenas, como
ficou registrado no encontro.
A audiência aconteceu no
município de Barra do Garças, região leste do estado, com a participação de
diversos indígenas e de três procuradores da República: Guilherme Tavares,
responsável pelo procedimento que acompanha o processo de licenciamento
ambiental das PCHs; Ricardo Pael Ardenghi e Nathália Geraldo Di Santo, que
respondem pela atuação do MPF na temática indígena em Mato Grosso e também
conduzem procedimentos sobre o assunto.
As lideranças indígenas
presentes, com exceção da Terra Indígena (TI) Sangradouro, apontaram diversos
impactos negativos dos empreendimentos sobre as comunidades, enfatizando a
necessidade de que todas as aldeias potencialmente afetadas sejam ouvidas.
Entenda – O processo de licenciamento das PCHs incluiu, até agora, apenas a
consulta prévia à comunidade da TI Sangradouro/Volta Grande, realizada em três
reuniões em 2019 e 2020. Embora os impactos afetem outras comunidades
indígenas ao longo do rio das Mortes e afluentes, que são contrárias à
instalação das centrais hidreléticas, elas não foram incluídas nos estudos
iniciais para verificar a viabilidade de instalação dos empreendimentos
energéticos. A audiência pública evidenciou que os impactos serão sentidos por
indígenas em toda a Bacia do Rio das Mortes.
Durante a reunião, o
cacique da Aldeia Pimentel Barbosa relatou que tanto a sua comunidade como a
Aldeia Areões não foram ouvidas nos estudos feitos para aprovação da obra, mas
ressaltou que essas localidades serão impactadas pela mudança da correnteza e
pela redução da população de peixes. De acordo com ele, o Rio das Mortes é o
principal meio de sustento da Aldeia Pimentel Barbosa.
Raimundo Urebeté Ai’réró,
cacique da Terra Indígena São Marcos, afirmou que a construção das pequenas
centrais hidrelétricas representa um conflito silencioso que ameaça a vida dos
Xavante, povo que ainda mantém tradições de coleta, caça e pesca e uma profunda
relação espiritual com o Rio das Mortes.
Várias lideranças falaram
no encontro, além de indigenistas e estudiosos. Os depoimentos reafirmam a
importância do Rio das Mortes e do Rio Cumbuco na construção simbólica e na
formação da identidade do povo Xavante. Por isso, além dos impactos ambientais,
a construção das PCHs pode representar uma ameaça cultural aos povos da região.
As informações colhidas
pelo MPF na reunião pública irão subsidiar a atuação futura do órgão na
questão. “Um dos objetivos do MPF é que todas as comunidades indígenas ao longo
do Rio das Mortes e do Rio Cumbuco possam ser ouvidas no processo de
licenciamento do empreendimento”, explicou Guilherme Tavares.
Reestruturação – Desde 1º de fevereiro de 2023, o Ministério Público Federal no
estado de Mato Grosso (MPF/MT) possui uma nova organização da
área finalística, conforme previsto na Portaria PRMT nº 242, de 14 de
outubro de 2022. A norma previu uma reestruturação, com a disciplina de
distribuição do acervo processual e a especialização em ofícios comuns e
especiais. Dentre os ofícios especiais criados, estão os Ofícios de Populações
Indígenas e Comunidade Tradicionais, localizados na cidade de Cuiabá e Sinop, e
o Ofício Ambiental de Barra do Garças, com especialização na temática
hidrelétrica.
O procurador da República
Ricardo Pael, titular do 1º Ofício de Populações Indígenas e Comunidades
Tradicionais de MT (Cuiabá) e atualmente ocupando a chefia da instituição,
ressaltou que, “apesar de nenhum dos Ofícios especializados de 6ªCCR estar
localizado em Barra do Garças, isso não impediu que os indígenas fossem
atendidos presencialmente, apresentassem suas insatisfações e suas demandas”.
Pael esclarece que os
titulares dos ofícios de 6ªCCR acompanharam tudo remotamente, pela plataforma
Zoom, associando tecnologia, especialização da atuação e atendimento presencial
às comunidades indígenas. Isso demonstra uma nova dinâmica do órgão ministerial
para atender todas as comunidades indígenas do estado de Mato Grosso. “Esse
novo modelo evita a necessidade de estabelecer fisicamente um ofício em cada localidade,
sem prejudicar o atendimento, que se torna mais eficiente e acessível”, garante
o procurador.
Fonte: Século Diário/Ascom
PGR/Página do MST
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