Parto: Os riscos para mãe que come a placenta após dar à luz
A influenciadora Fernanda Lacerda, conhecida como
"mendigata", apareceu em um vídeo numa rede social comendo a própria
placenta após o parto de seu filho. Na imagem, ela alega que comer seria bom
para a produção de ferro e combate à anemia, além de melhorar na produção de
leite. No entanto, não há qualquer comprovação científica de que a ingestão de
placenta possa trazer benefícios.
👉 A placenta é um órgão que faz a conexão entre a mãe e o bebê, facilita
a troca de nutrientes e protege a criança das substâncias eliminadas pelo corpo
da mãe.
A placentofagia -- o costume de ingerir partes do
órgão ou ele por completo -- se tornou uma tendência e já foi reproduzida por
famosas como as Kardashian e a atriz January Jones. Além da ingestão "in
natura", há quem faça até cápsulas com partes do órgão.
A ingestão se baseia na crença de que ela possa
trazer benefícios à saúde da mãe e do bebê. Segundo especialistas, porém, não
há qualquer evidência de que isso seja verdade. Eles alertam ainda para os
riscos de transmissão de doenças.
• 🔎 Um
levantamento feito na Faculdade de Medicina de Northwestern, em Chicago,
analisou dez pesquisas sobre o tema publicadas recentemente e disse não ter
encontrado evidências de que o consumo de placenta ofereça proteção contra
depressão pós-parto ou que reduza dores, dê mais energia, ajude na amamentação,
promova a elasticidade da pele, auxilie no vínculo entre mãe e bebê, nem
tampouco seja fonte de ferro para a mãe.
Não, não comam placenta. Tem muita modinha, mas ela
é um tecido e pode transmitir doença. — Lígia Mascarenhas, ginecologista
obstetra
Os especialistas alertam que o risco é maior no
caso de mães com hepatite ou HIV, mas outras doenças infecciosas também podem
ser transmitidas.
A ginecologista e obstetra Mariana Lemos Osiro
ainda argumenta que, além de não ter estudos que comprovem os benefícios, as
doenças que seriam "tratadas" pela ingestão de placenta já têm
tratamento.
"A gente escuta esse argumento de que melhora
na anemia, na produção de ferro na gestante, mas não temos qualquer base científica
para isso. E já existe tratamento para essas questões".
Outro agravante é o fato de que, por se tratar de
um tecido como qualquer outro, irá apodrecer se não estiver armazenado
adequadamente, o que irá expor a mãe ainda mais a infecções.
Ø Comer a placenta tem vantagens ou é perigoso?
A placenta é um órgão formado durante a gestação,
responsável por produzir hormônios e proteger o bebê no útero, repassando a ele todos os nutrientes
e o oxigênio de que precisa. Depois do parto, ela sai, junto com o bebê. Por
conta de sua função e também por ser o principal elo de ligação da mãe com o
bebê na barriga, muitas pessoas acreditam que consumí-la pode trazer benefícios
à mãe e ao recém-nascido. A prática, que tem adeptos famosos, como Fernanda Lima e Bela Gil,
tem até nome: placentofagia. Ela pode ser ingerida em preparados, como se fosse uma refeição
mesmo, ou em forma cápsulas, com a placenta em pó, ou ainda nas formas de óleo,
tintura e creme.
A prática, no entanto, divide opiniões de
especialistas, já que não há estudos científicos que comprovem nem que faz mal
ou que tenha benefícios. Médicos do Centro de Controle e Prevenção de Doenças
(CDC) dos Estados Unidos (EUA) não recomendam a ingestão de placenta, pois o ato pode levar à infecção por bactérias, como
o estreptococo do grupo B, causando problemas graves nos pulmões, cérebro,
sangue, ossos e articulações em bebês recém-nascidos.
A ingestão também é desaconselhada por médicos da
Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). “Temos uma
preocupação muito grande pela questão de transmissão de doenças, pois a
placenta funciona como um filtro entre a mãe e o feto e algumas doenças podem
acometer a gestação, como HIV, sífilis, hepatite viral. Com isso, este órgão pode
ser um vetor de contaminação”, pontua a ginecologista Rivia Lamaita, membro da
Comissão Nacional Especializada em Reprodução Humana da Febrasgo.
A médica alerta que não se sabe qual a melhor forma
de preservar a placenta até a ingestão. “Como o órgão tem um fluxo sanguíneo
muito grande, se não for corretamente preparado, pode conter a presença de
bactérias e levar à contaminação da mãe e
do bebê, já que algumas doenças se transmitem pelo leite materno. Mas não temos
nenhuma fórmula para conservar a placenta ou garantir que ela não vá trazer
nenhum problema", explica.
A médica confirma que, do ponto de vista da
ciência, não há evidência de nenhum benefício na ingestão do órgão. “Nem
nutricional, nem hormonal, nem para reduzir a dor ou o risco de depressão
pós-parto", afirma.
Rivia observa que a prática cresceu nos últimos
anos, com a busca pela humanização do parto, e que, apesar de a opção de
ingerir a placenta não se recomendada, é um direito da mulher. “Não podemos
negar, apenas orientar sobre os riscos e desestimular. Porém, se for o desejo
da paciente, ela deve informar o seu médico e o hospital, pois existe um
protocolo para isso e é necessário autorização prévia", diz.
·
Mais leite, mais energia,
menos depressão. Será?
Apesar da ausência de evidências científicas,
existem até profissionais que defendem o consumo da placenta e ajudam as
mulheres a prepará-la para isso. São as chamadas ‘placenteiras’, que manipulam
o órgão e treinam outras mulheres para fazer o mesmo.
Segundo os adeptos, a ingestão melhora a produção
de leite, dá mais energia e diminui os sintomas da depressão pós-parto. É
possível consumi-la em cápsulas (seca, desidratada e em pó), em tintura
(extrato líquido), óleo e ainda em creme para a pele, da mãe e do bebê.
A ginecologista e obstetra Melania Amorim, da
Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), ressalta que a ciência não
conseguiu demonstrar nenhum benefício com a ingestão da placenta, mas,
tampouco, malefícios. “Sou cientista e não acredito que haja efeitos benéficos
na prática. Só defendo, como feminista, que a placenta é da mulher e que ela
tem o direito de fazer o que quiser com ela, já que não há comprovação de
efeitos maléficos. Desde que não seja uma placenta infectada", explica.
Para a médica, há uma forte simbologia envolvida
nesta prática. “Por ser o órgão que abriga e nutre o bebê, quem consome acredita
que pode haver melhora da anemia em longo prazo, com as cápsulas ou no consumo
imediato, redução de hemorragia etc. Nada disso foi cientificamente comprovado.
Porém, também não há evidência de efeitos adversos", aponta.
A pesquisadora, aliás, contesta o termo
placentofagia. “Há quem pense que a pessoa pega a placenta e come aos bocados,
como fazem os animais - e não é isso. Até parece que as mulheres estão pegando
a placenta e consumindo toda, como se fosse um ato de antropofagia. Este termo
não inclui todas as práticas”, aponta Melania.
Ela diz que é como um ritual, que pode envolver
crenças espirituais e de saúde. “A minha placenta eu enterrei e plantei
simbolicamente uma árvore por cima, que ficou sendo ‘a árvore de Joaquim’ [filho
dela, hoje com 10 anos]. É uma forma de eternizar o órgão, sem,
necessariamente, ingeri-lo. Outra maneira de criar uma lembrança é
o ‘carimbo da placenta’, técnica em que ela é usada para fazer uma espécie
de “print” em um papel, Como o formato da placenta com o cordão umbilical
lembra o de uma árvore, muitas pessoas chamam o desenho de “árvore da vida”.
Fonte: g1/Crescer
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