TRAMBIQUES A GRANEL: Pretenso combate à corrupção deu espaço a negócios
na 'lava jato
Uma estranha coincidência fica patente no último
lote de diálogos divulgados na apelidada "vaza jato" — as conversas
de procuradores da República e outros protagonistas interceptadas pelo hacker
Walter Delgatti. Trata-se de um conluio que desembocou na maior guerra
empresarial em curso no país: a que opõe o grupo J&F e a Paper Excellence,
na disputa pela Eldorado Celulose.
O palco da cena, em Brasília, é a chamada
"operação greenfield", que foi conduzida pelo procurador da República
Anselmo Lopes. O sujeito oculto da oração é o empresário Josmar Verillo, que
até dias atrás era executivo da Paper Excellence e que, durante anos dirigiu a
papeleira Klabin. Sabia-se que Verillo estava predestinado a dirigir a
Eldorado, caso a Paper pagasse a segunda metade da compra. O que não se sabia
era que ele trabalhou junto ao Ministério Público Federal na costura que levou
a J&F a vender a empresa à Paper.
No diálogo divulgado (abaixo), o procurador Anselmo
revela que o acordo de leniência do grupo brasileiro fora desenhado junto com a
Transparência Internacional — empresa que se apresenta como ONG. Verillo, a
essa altura era o representante da Transparência Internacional no Brasil. No momento
do diálogo em questão, o consórcio já falava em repactuar o acordo para
aumentar as penas impostas ao grupo.
A reportagem não conseguiu contato com os
envolvidos, mas o espaço está aberto para eventuais manifestações
• Sequestro,
tortura e resgate
O valor da multa imposta à J&F, que
condicionava o acordo, obrigou a venda de empresas do grupo, cujo valor de
venda geraria o dinheiro para a compra da alforria oferecida pelo MPF. Ou seja,
para não perder tudo, Joesley foi levado a vender a Eldorado, com outros ativos
— o que beneficiaria, na transversal, o empresário Josmar Verillo.
Joesley fora afastado do comando do grupo
empresarial em outubro de 2016, na esteira das acusações de Anselmo. A venda
forçada, chegou a estimar o procurador, geraria algo como R$ 4 bilhões. Em
troca, o empresário se livraria do Procedimento Investigatório Criminal (PIC).
Para totalizar o pagamento do resgate, seria preciso vender também a Vigor e a
Alpargatas.
A imbricação já foi objeto de reportagens do
jornalista Luís Nassif, em que se mostrou a versatilidade de Verillo, com
manobras que se assemelham a interessante metamorfose de alguém que forjou
junto com o MPF um acordo, que levou à venda de uma empresa que ele, se
vingasse, seria "o homem certo" para dirigir.
• O
homem das mil caras
Verillo chegou à Transparência por meio de outro
gazuá usado para abrir portas em tempos de moralismos exaltados. Ele criou a
"Amarribo" uma metralhadora giratória criada para alvejar prefeitos
e, segundo alguns deles, extorqui-los. Qualquer pesquisa no google associando
"Josmar Verillo" e "Transparência Internacional" revela o
que agora ambos os lados querem omitir.
Em outro papel, o executivo da Paper Excellence
aparece também nas investigações sobre a tentativa de golpe que se esboroou a 8
de janeiro deste ano.
O relato de Nassif é detalhado: "Nas primeiras
investigações, passou despercebido o papel da Transparência
Internacional", diz ele, apontando para dois episódios controvertidos.
"O primeiro, seu envolvimento com a fundação da Lava Jato Curitiba. Os
procuradores pretendiam que a TI Brasil se tornasse a grande gestora dos R$
1,250 bilhão destinados a projetos contra a corrupção. Os outros R$ 1,250
bilhão foram reservados para pagamento de ações contra a Petrobras."
O segundo, relata o jornalista, "foi a
contratação de um dos principais parceiros da TI, Josmar Verillo, para fazer o
lobby de um empresário da Indonésia, envolvido em vários episódios de
corrupção, em demanda contra a JBS brasileira, alvo da Lava Jato".
• O mal
em nome do bem
A família Verillo controla a Amarribo, que, segundo
seu próprio site, foi convidada por Deltan Dellagnol para cuidar da fundação
que eles pretendiam administrar juntos, com o aporte de 2,5 bilhões (não há
referência à moeda) da Petrobras.
A especialidade da Amarribo, empresa travestida de
ONG sempre foi a de usar o mote do "combate à corrupção" para
explorar incautos. Nassif explica: "De estilo truculento, a Amarribo
montou uma estratégia de criminalização de meras irregularidades administrativas"
de prefeituras.
O jornalista narra que, quando publicou um dos
primeiros textos sobre o esquema, ele recebeu um e-mail da TI avalizando a
conduta de Verillo — "uma atitude impensável para um órgão que se
pretendia anticorrupção. Tempos depois, participei de um evento no qual a
representante da TI era a própria sobrinha de Verillo, que se apresenta no
Twitter como fundadora da TI Brasil. Depois, se soube que coube a Verillo
trazer a TI para o Brasil."
Veja a troca de mensagens entre os procuradores em
que Anselmo Lopes revela a parceria da "greenfield" com a turma de
Verillo:
30 Oct 17
15:23:58 Paulo confirmado TCU dia 7?
15:28:20 Paulo Caríssimos, boa tarde! Em razão de
falta de tempo para escrever esta mensagem, acabei não narrando a vocês uma
reunião que a FT Greenfield teve com o Presidente do TCU na semana passada,
para tratar do acordo de leniência da J&F. Em suma, fomos (eu, Sara e
Frederico Siqueira – não confundir com Frederico Paiva, rs) lá recebidos pelo
presidente Raimundo Carreiro e equipe técnica do Tribunal. De início, eles
expuseram que receberam com um pouco de surpresa o ofício nosso para que eles
aderissem ao acordo ou participassem das tratativas de eventual
aditamento/repactuação, mas registraram o apreço que trabalho
interinstitucional que nossa FT tem desenvolvido desde o início. Chegando nossa
vez de falar, fizemos uma narração geral de todo o histórico do acordo de
leniência e de suas principais cláusulas, bem como explicamos a ideia dos
projetos sociais como reparação social, ideia compartilhada pela Transparência
Internacional. Explicamos que a ideia central da adesão institucional não é
limitar a atuação da instituição aderente, mas sim conferir mais segurança ao
fluxo de informações e provas, bem como garantir a produção de novas provas e
elementos de convicção pelo relacionamento direto entre a instituição aderente
e os colaboradores. Igualmente, registramos que a possibilidade de aditamento
do acordo (com o acréscimos de condições mais rigorosas em decorrência do
surgimento de novos fatos) é uma janela de oportunidade para que todas as
instituições parceiras da FT Greenfield possam participar diretamente da
formulação de regras pro acordo de leniência, incrementando nosso nível de
interação e cooperação e conferindo maior legitimidade social ao acordo. Em
resposta, o Presidente do TCU e equipe disseram que a iniciativa é bem-vinda,
mas eles talvez tenham dificuldade formal de aderir ao acordo ou participar do
aditamento, considerando o papel revisor do TCU nos acordos firmados pela CGU.
Afirmaram respeitar nosso acordo, mas apresentaram essa dificuldade. O
Presidente do TCU mostrou-se até mais flexível à adesão, entendendo o documento
somente como um acordo para acesso à prova; a equipe técnica é que se mostrou
mais resistente. Como encaminhamento da reunião, ficaram os técnicos
capitaneados por Rafael Jardim com a missão de estudar o documento (modelo de
adesão institucional) e propor alterações que possam dar mais conforto à
participação do TCU no processo em questão. Com o desenrolar de novos andamentos,
volto a enviar informações para vocês. Grande abraço, Anselmo
15:39:49 Paulo lembrando... não foi na leniência,
mas na colaboração dos Batista, que o TCU já decidiu o seguinte:
15:39:49 Paulo
https://www.conjur.com.br/2017-jul-05/tcu-afasta-clausula-delacao-jbs-cita-joesley-bndes
18:21:29 Paulo chegou a minutar alguma coisa para o
TCU? não sei se vc entendeu a questão dos compartilhamentos já efetivados, qq
coisa me pergunta... não adianta ver apenas o que tem ofício pq passamos as
chaves, e inclusive as chaves estão na página...
19:24:12 Deltan Paulo, tá na escuta?
19:30:19 Deltan Acho que entendi... estou
minutando, mas cada hora uma coisa passa na frente, como sempre.
19:30:46 Deltan acabei de acabar de enviar os
subsídios que o Ministro Paciornik pediu sobre colaboraçoes... agreguei
bastante ao que o Fábio mandou. Temos que tratar bem ali, afinal, revisa nossos
casos rsrsrs
19:30:58 Deltan agora vou ver uma demanda sobre as
10 medidas urgente
19:31:38 Deltan E volto a ver, ainda hoje espero, o
negócio do TCU, mas vou me basear na nota técnica (e não naquele super estudo
imenso), aprovetiando que tá alinhavada... qq coisa em contrário, grite
19:48:29 Paulo Blz, tenho aula agora!
21:12:55 Deltan PG, pedido de palestra do
citibank... acho ruim aceitar um desses pago porque tem chance de irmos pra
cima, ou Vc acha frescura?
21:14:52 Paulo não sei se tem alguma coisa do
citibank, mas se tiver melhor não aceitar mesmo...
21:15:03 Paulo mas não descartaria o setor
financeiro inteiro, apenas por ser banco
22:54:09 Deltan Robinho disse que não tem, mas to
meio assim...
31 Oct 17
06:45:08 Paulo Bom se vc ainda pensar em.se
candidatar, receber dinheiro.de banco estrangeiro é um prato.cheio p a gleisi
te criticar
06:45:17 Paulo Se não, não vejo problema mesmo
Conrado
Hubner submetia antes à 'lava jato' o que publicaria
O cronista Conrado Hübner Mendes, em pelo menos um
caso, submeteu o que ia publicar aos procuradores da República da autoapelidada
"força-tarefa da lava jato". Nas conversas registradas na chamada
"vaza-jato", o procurador Paulo (possivelmente Paulo Roberto Galvão
de Carvalho) relata ao esquema curitibano que passou 45 minutos ao telefone com
o cronista — tempo suficiente para se saber o que os veículos de imprensa para
os quais ele colaborava publicariam, bem como para algumas recomendações que só
um bom assessor de imprensa pode dar.
A conversa registrada a seguir ocorreu em 11 de
março de 2019. Três dias depois, saía publicada uma crônica de Conrado Hubner
citando Carlos Fernando Santos Lima e dando conselhos aos tarefeiros.
21:25:35 Paulo 45 min no telefone com o Conrado
Hubner, a pedido do Andrey
21:26:22 Paulo tirou todas as dúvidas, entendeu
bastante, mas dois pontos ele vai fazer "criticas construtivas",
embora eu tenha dito que são detalhes que não desnaturam a importância da
fundação: o assento na gestão e a sede em Critiba
21:31:33 Paulo além disso, vai bater em CF chamar
os críticos de burros e Deltan messiânico
Hubner diz ter obtido doutorado com tese sobre
Direito Constitucional na Escócia, um país que não tem Constituição. Algo como
fazer mestrado sobre a vegetação do Alaska no deserto do Sahara. Ele é listado
como pesquisador do Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo (Laut),
que se define como uma instituição independente e apartidária de pesquisas
interdisciplinares e é financiada por George Soros.
No mesmo diálogo em que mencionam o cronista, os
procuradores também relataram conversas com a Advocacia-Geral da União, que vinha
se opondo à destinação "específica" de valores bloqueados por Marcelo
Bretas no Rio. Também ficam evidentes as tentativas da turba de se opor, por
várias vias, à destinação do dinheiro oriundo dos acordos de leniência para o
caixa da União.
Outras conversas, também obtidas com exclusividade
pela ConJur, mostram que Deltan Dallagnol planejou usar a ONG Transparência
Internacional para receber um prêmio, abastecer seu fundo e evitar impostos; e
que a entidade temia não receber sua parte no esquema armado para desviar o
dinheiro das leniências para uma fundação privada.
As conversas também mostram movimentações de
bastidores para tentar impulsionar o projeto das "10 medidas contra a
corrupção", que envolveu costuras com Silas Malafaia, que na época tinha
sido investigado pela Polícia Federal por desvio de dinheiro, e com um
empresário que ocupava uma das vice-presidências da Caixa Econômica Federal.
Fonte: Conjur
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