segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Secretaria de Educação do Paraná divulga material com conteúdo golpista

Investigar, perseguir, torturar e matar eram os procedimentos da Operação Condor, um pacto letal firmado nos anos 1970 entre os governos militares de nações sul-americanas, com o objetivo de eliminar indivíduos que se opunham ao regime golpista.

Conforme um slide fornecido pela Secretaria da Educação do Paraná (Seed) para ser compartilhado por professores com os alunos, as pessoas que sofreram os horrores da ditadura eram classificadas como “antipatriotas” e “esquerdistas”.

Segundo uma captura de tela recebida pelo App Sindicado (Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná), é possível ver diversos usuários visualizando a apresentação.

A Secretária Educacional da APP-Sindicato, Vanda Santana, caracteriza a situação como extremamente séria, uma vez que observa que o texto reflete as inclinações políticas e ideológicas de quem elaborou o material, que está acessível a todos os professores da rede estadual.

A líder sindical critica a abordagem adotada pelo sistema educacional do Paraná na criação de materiais didáticos, uma vez que esse método permite que a perspectiva de uma única pessoa se torne uma referência no processo de ensino.

“Por isso nós temos reforçado constantemente a importância da autonomia no trabalho docente, desde o seu planejamento, produção de material e o encaminhamento das aulas”.

Vanda ressalta que a APP-Sindicato defende o conhecimento científico que tenha passado pelo rigoroso processo de pesquisa e validação realizado por instituições acadêmicas e inúmeros pesquisadores. “Portanto, não podemos aceitar esse negacionismo e revisionismo histórico que esse tipo de slide apresenta”, argumenta.

A denúncia sobre o conteúdo do material se espalhou por grupos de mensagens. Algumas horas mais tarde, o texto foi modificado. Na nova versão, as vítimas da ditadura são descritas como “opositores e pessoas consideradas subversivas à ordem estabelecida”.

Segundo a professora, a alteração no texto ainda é problemática, pois mantém uma orientação ideológica que defende um Estado sob regimes autoritários, sem democracia, e continua a estigmatizar qualquer perspectiva política que seja diferente dos partidos conservadores.

•        O caso já aconteceu outra vez

Este não é um incidente isolado ou a primeira ocorrência desse tipo. Em fevereiro deste ano, o sindicato já havia denunciado outro material fornecido pela Seed que apresentava abordagens inadequadas. O conteúdo destinado às aulas de Educação Financeira continha slides que estigmatizavam a pobreza e culpabilizavam os estudantes por sua condição social.

O professor aposentado, Luis Claudio Pereira, que acumulou mais de 32 anos de experiência no ensino da disciplina de História tanto na rede pública quanto privada, considera o que aconteceu como algo inaceitável. Ele acredita que isso expõe claramente a influência da ideologia bolsonarista que parece ter se infiltrado na educação pública do Paraná sob a gestão de Ratinho Jr. e Renato Feder.

“É assustador. O governo cria uma narrativa justificando um posicionamento ideológico da direita. Isso é nocivo para a democracia e nos afasta de uma visão de mundo pautada nos direitos humanos”.

O regime militar no Brasil perdurou por 21 anos. A ditadura começou após o golpe militar que destituiu o então presidente João Goulart em 31 de março de 1964. Além do autoritarismo e das violações dos direitos humanos, esse período se caracterizou pela ausência de eleições diretas para a presidência, pelo fechamento do Congresso Nacional e pela prática da censura à imprensa e à sociedade.

Conforme o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, as sérias violações aos direitos humanos cometidas durante o regime militar no Brasil resultaram em 434 mortes e desaparecimentos políticos. Além disso, um levantamento divulgado pela Human Rights Watch aponta que aproximadamente 20 mil pessoas foram submetidas à tortura, e 4.841 representantes eleitos pelo povo foram destituídos de seus cargos durante esse período.

 

       Em SP, Tarcísio ‘esquece’ social e investe apenas 1% em vulneráveis

 

O governo de São Paulo ignorou o orçamento e reduziu os investimentos destinados a programas sociais do estado entre janeiro e setembro deste ano. Os dados foram confirmados pelo iG junto à Secretaria da Fazenda.

De acordo com a pasta, o governo Tarcísio de Freitas investiu apenas 1% do orçamento previsto para pessoas em situação de vulnerabilidade social cadastradas no Bolsa do Povo. A dotação inicial previa o investimento de R$ 542 milhões para esse público, mas apenas R$ 3,5 milhões foram pagos até o dia 28 de setembro.

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Criado em 2021, o programa é uma espécie de Bolsa Família do estado e prevê o pagamento de parcelas de até R$ 500 para a população de baixa renda. Dos três programas na alçada na pasta do Desenvolvimento Social, apenas o Viva Leite (88%) e os custos para a operação do programa (91%) tiveram o maior empenho do governo.

O Palácio dos Bandeirantes também segurou os gastos com programas para melhoria da condição de pessoas em situação de vulnerabilidade social, que abarca programas como o Criança Feliz, ligado à primeira infância, e o atendimento a mulheres vítimas de violência doméstica. Dos R$ 200,4 milhões previstos da Lei Orçamentária Anual (LOA), apenas R$ 52,2 milhões foram empenhados, o que corresponde a 26% da dotação inicial.

Para o cientista social e professor da Universidade de São Paulo (USP) Sérgio Kodato, a decisão do governo em segurar os custos com o setor impacta a vida da população e empobrece o estado. Kodato ainda classificou o orçamento usado para a assistência social como ‘catastrófico’.

“Isso tende a agravar todo o quadro de miséria, de falta de sustentabilidade, de saúde, principalmente das crianças e adolescentes. [Podemos esperar] um aumento da violência, o que vai acarretar a mais pobreza, mais miséria, mais desassistência, mais doença, menos recursos para atender as populações desassistidas, e, consequentemente, estimula a violência em todos os níveis da vida social, não só na periferia, mas a periferia vai acabar chegando no centro”, afirma.

“O impacto disso é uma catástrofe, é uma tragédia. É um pessoal que está em situação de risco, de vulnerabilidade, condições precárias e moradias sem saneamento básico, e crianças precocemente adoecidas, sem poder ir à escola. Então, eu entendo que nós estamos diante de uma tragédia, diante de uma catástrofe social”, completa.

•        Drogas e moradores de rua

O governo de São Paulo ainda contingenciou verbas para a promoção, saída e autonomia da população em situação de rua no estado. Segundo a Secretaria da Fazenda, o Bandeirantes investiu apenas R$ 6,6 milhões dos R$ 15,7 milhões previstos para este ano, o que corresponde a 42% da dotação inicial.

A redução acontece em meio ao aumento da população em situação de rua no estado, segundo dados do Cadastro Nacional de Empregados e Desempregados (Caged). Em 2022, o Caged registrou 95,1 mil pessoas em situação de rua no estado, sendo 53,8 mil só na cidade de São Paulo.

A Secretaria de Desenvolvimento Social também segurou verbas para o Programa Recomeço, que visa dar assistência e acolhimentos aos ex-usuários de drogas. Para a reintegração dos usuários, o governo paulista investiu apenas 23% (R$ 1,9 milhão) dos R$ 8,4 milhões previstos pela LOA.

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Sérgio Kodato vê a omissão do poder público como forma de colaborar para o aumento de usuários na Cracolândia, um dos maiores problemas sociais da capital paulista. Para o especialista, a tendência é que o cenário piore com o passar dos anos.

“Quanto maior a miséria, quanto maior emprego, quanto maior a desassistência, a tendência é ver o maior consumo de álcool e drogas, não só junto à população pobre, mas também junto à classe média. Se você somar isso com todos os quadros de ansiedade e depressão social, que estão tomando drogas tarja preta — que são legais, mas que também são drogas —, você vai ter consequências de uma certa imobilização, inatividade”.

“Eu entendo que a tendência também uma maior invasão desses usuários, desses drogados, ocupando todas as Praças. Basta ver a Cracolândia em São Paulo, que apesar de todos os esforços, a falta de políticas de Assistência Social de Saúde faz com que a gente não consiga acabar com essa vergonha que está no centro da capital paulista. Acredito que isso vai afetar diretamente a produtividade da nossa sociedade”, ressaltou.

O advogado especialista em direito eleitoral Luiz Eugênio Scarpino Júnior não vê impacto jurídico sobre o congelamento das verbas da assistência social neste momento, mas ressalta a importância de se dar transparência aos motivos do contingenciamento dos repasses. Ele acredita que a decisão de segurar os valores da pasta está ligado mais ao campo político.

“Inúmeros fatores podem levar com que o gestor não aplique adequadamente aquilo que foi estipulado, seja porque não teve receitas, seja porque teve outras prioridades. Não existe uma sanção específica com relação a não execução integral do orçamento. A lei estipula, em alguns momentos, para saúde e para educação um percentual mínimo de investimento, mas não há nada previsto para a assistência social, para o desenvolvimento social. Então, sai um pouco do plano jurídico e entra mais para o plano político, sobre uma incapacidade, ou demonstra talvez pouca preocupação, ou um foco menor, ou mesmo dificuldades operacionais de execução, ou mudança de linha de atuação quando você tem um orçamento e ele não é cumprido dentro de um planejamento que é estabelecido”, afirma.

“Nesse primeiro momento é um ponto de atenção, mas se eventual orçamento estiver sendo priorizado para outras áreas, isso pode ser avaliado [caso seja constatada alguma irregularidade] para algum tipo de consequência jurídica direta”. 

•        Baixa prioridade

O deputado estadual Paulo Fiorilo (PT) criticou a ação do governador e disse que ‘faltou sensibilidade’ a Tarcísio para os programas sociais.

“É um prejuízo para as pessoas mais vulneráveis e mais carentes. É um equívoco, porque o governo tem recurso e poderia continuar dispondo esse recurso para pagar o Bolsa do Povo, o que ajudaria as pessoas numa situação difícil. Nem todo mundo está empregado, nem todo mundo voltou a ter os recursos”, afirma

“São exemplos claros de um governo que não tenha sensibilidade para aqueles que mais precisam. Recursos que poderiam ser utilizados para as pessoas de alta vulnerabilidade, ou mesmo a população em situação de rua, o governo não investe. Já era pouco investiu menos do que deveria”,

O petista acredita que a cobrança poderá aumentar sobre o governo nos próximos com a chegada da LOA 2024. O texto deve ser entregue à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) até sábado (30).

“O que a gente tem feito é o debate aqui interno, e agora há possibilidade de fazer o debate no orçamento do próximo ano. A ideia é a gente expor as contradições e propor aumentos em obrigação importantes como essas, que eles estão retirando. Agora, óbvio, a peça orçamentária é uma peça que tem uma flexibilidade muito grande por conta dos índices de remanejamento. Apesar da gente brigar aqui, o governo depois pode acabar com o orçamento que a Assembleia aprova”, afirma Fiorilo.

Em nota enviada ao iG , o Palácio dos Bandeirantes justificou que os investimentos realizados em programas sociais são empenhados em um modelo multidisciplinar, que utiliza o orçamento de diversas outras secretarias de estado.

•        Veja a íntegra da nota

As políticas estaduais de assistência às pessoas em situação de vulnerabilidade no estado de São Paulo são multidisciplinares e contam com ações integradas de diferentes secretarias de estado, como Desenvolvimento Social, Saúde, Justiça e Cidadania entre outras. No Combate à Pobreza e a Redução de Desigualdades, diferentes ações alinhadas a Política Nacional para a População em Situação de Rua estão em curso. Entre elas, Serviços de Acolhimento, Centros Pop (Centro de Referência especializado para População em Situação de Rua), Centros de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, Programas de Combate à Fome, como elencado a seguir, entre outros.

Na área de segurança alimentar e nutricional, o estado de São Paulo conta com o programa Bom Prato, que mensalmente serve mais de três milhões de refeições, e o Vivaleite que entrega cerca de quatro milhões de litros de leite, enriquecidos com vitaminas A e D e Ferro para crianças e idosos.

No atendimento voltado aos dependentes químicos, o estado atua com o objetivo de oferecer encaminhamentos qualificados aos pacientes, respeitando as individualidades de cada pessoa. Equipes de saúde e assistência social especializado em abordagem e escuta fazem o encaminhamento desta população para o tratamento e acompanhamento, em uma jornada completa até a recuperação e reinserção na sociedade.

As ações de qualificação profissional, inserção no mercado de trabalho e inclusão social, bem como os serviços de acesso à justiça, fazem parte das atividades estratégicas de cada serviço de acolhimento e tratamento da população que frequenta as cenas de uso. Elas compõem os indicadores de resultados previstos nas metas qualificadas dos Planos Individualizados de Atendimento (PIAs), conforme a metodologia de trabalho dos serviços parceiros do Estado nesta temática. A política de tratamento para dependência de substâncias psicoativas integra todas as drogas, tanto as ilícitas como as lícitas. O atendimento na linha de cuidados e assistência ao dependente químico é feito para todos e todas as suas condições de dependência química. Ainda nessa área, o Governo de SP, por meio da SEDS, está inaugurando 11 Casas Terapêuticas e quatro Espaços Prevenir.

 

Fonte: O Cafezinho/iG

 

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