Estudo da Fiocruz aponta elevada coinfecção de dengue e chikungunya no Brasil
A partir da pesquisa conduzida pelo Instituto de
Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o
Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) criou um
teste molecular que pode identificar múltiplos vírus simultaneamente. A análise
dos resultados mostrou um aumento de 11% na coinfecção, isto é, na ocorrência
simultânea de dengue e chikungunya.
Para realizar os mais de 60 mil diagnósticos, foram
empregadas amostras que testaram positivo para arboviroses em exames de
diagnóstico sorológico (IgM) e molecular (antígeno e PCR). Essas amostras foram
coletadas em 14 estados de todas as regiões do Brasil, abrangendo os quatro
estados mais povoados: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia.
Os resultados revelaram que o número de casos de
chikungunya em 2023 é quase sete vezes maior do que o registrado em 2022. Além
disso, em Minas Gerais, os registros de dengue triplicaram em comparação ao ano
anterior.
Em nota divulgada pela Fiocruz, a especialista
científica em diagnóstico molecular da Bio-Manguinhos/Fiocruz Patrícia Alvarez,
apontou que esses testes contribuem para o monitoramento genômico e
epidemiológico dos casos de arboviroses. Segundo ela, esses dados são
fundamentais para o acompanhamento das autoridades.
De acordo com ela, durante os picos de epidemia de
arboviroses, normalmente se espera uma taxa de coinfecção de 2% a 3%. Contudo,
os números observados alcançaram 11%, ultrapassando consideravelmente essa
faixa. Essa situação ressalta a necessidade de ações eficazes no combate aos
patógenos, especialmente nos focos do mosquito Aedes aegypti.
Em agosto de 2023, o Ministério da Saúde divulgou o
balanço que mostra que o Brasil registrou 1.552.338 casos prováveis de dengue
até a publicação. O número é quase 10% maior que o registrado durante todo o
ano de 2022, quando foram contabilizados 1.393.684 casos prováveis.
Em março, a Fiocruz lançou uma publicação voltada
ao combate da dengue e mudanças climáticas em territórios periféricos. Segundo
o e-book "Enfrentando a Dengue nas Favelas e Periferias", as
alterações causadas pela emergência climática influenciam na proliferação do
mosquito Aedes aegypti, com maior impacto nas periferias. As causas desse
impacto seriam a grande densidade populacional dessas regiões, além da
precariedade de condições de moradia e acesso à água.
Brasil
pode viver epidemia de dengue tipo 3 em 2024, diz consultor de braço da OMS
A probabilidade do ressurgimento do sorotipo 3 do
vírus da dengue no Brasil acende alerta para epidemia em 2024, "importante
e com mortes", segundo Kleber Luz, coordenador do Comitê de Arboviroses da
SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) e consultor para arboviroses da Opas
(Organização Pan-Americana de Saúde), braço da OMS (Organização Mundial de
Saúde) nas Américas.
"Os sorotipos 1 e 2 da dengue predominam no
Brasil em 2023. O 3 está muito presente no México, na América Central, e já há
o encontro dele no Norte do país. Há chance de uma epidemia mais importante,
com mortes", ressalta.
A reportagem conversou com o especialista —que
também é membro do grupo técnico de arboviroses da OMS e professor da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte— durante o 23º Congresso Brasileiro
de Infectologia (Infecto2023), realizado em Salvador (BA), de 19 a 22 de
setembro.
Há mais de 15 anos, o sorotipo 3 da dengue não
causa epidemias no Brasil. Seu retorno é arriscado por causa da baixa imunidade
da população.
O vírus da dengue possui quatro sorotipos. Quando
um indivíduo é infectado por um deles adquire imunidade contra aquele vírus,
mas ainda fica suscetível aos demais. Existe o perigo da dengue grave, que
ocorre com mais frequência em pessoas que já tiveram a doença e são infectadas
novamente, por outro sorotipo. É o que pode acontecer com a infecção pelo tipo
3.
Para Luz, neste cenário, a principal preocupação
das autoridades de saúde deverá ser o manejo.
"As secretarias estaduais e municipais de
Saúde, e o ministério [da Saúde] precisarão priorizar a capacitação dos médicos
e enfermeiros, no sentido de reconhecer as formas graves de dengue e intervir.
Estamos no mês de setembro e já temos quase mil mortos por dengue no país. Você
consegue resolver tudo na medicina, menos a morte", afirma.
Segundo o especialista, também é necessário um
programa de educação para que as pessoas evitem o criadouro do mosquito.
"Popularmente, tenho visto pouca campanha. Não
só de dengue, mas também de HIV, de vacinação. Parece que houve um
arrefecimento dessas medidas. O terceiro ponto é a vacinação. Já existe vacina.
Talvez fosse interessante uma recomendação de vacinação como ação de serviço
público", defende.
Duas vacinas contra a dengue foram aprovadas para
uso comercial no Brasil –Dengvaxia (Sanofi Pasteur) e Qdenga (Takeda Pharma),
mas nenhuma está incorporada ao SUS (Sistema Único de Saúde). Ambas são
quiméricas, ou seja, atenuadas. Elas têm efeitos protetores distintos contra
sorotipos –Takeda é maior para o 1 e o 2; Sanofi, menor para o 2.
A da Sanofi tem um arcabouço do vírus da febre
amarela, com fragmentos dos sorotipos 1, 2, 3 e 4. É recomendada a pessoas de 9
a 45 anos, mas a indicação vale apenas para quem foi previamente infectado por
um dos subtipos. É administrada em três doses, com intervalo de três meses.
Estudos feitos pelo laboratório produtor apontaram
risco de que pessoas que nunca tiveram a doença desenvolvam formas mais graves
de dengue caso sejam infectadas pelo mosquito Aedes aegypti.
A da Takeda tem o arcabouço do dengue 2 atenuado,
neste caso, com proteínas do 1, 3 e 4. É voltada a indivíduos de 4 a 60 anos, e
administrada em duas doses com três meses de intervalo. Mais estudos são
necessários para análise dos sorotipos 3 e 4.
"Ainda há lacunas na decisão do uso dessas
vacinas. Se eu tiver dengue agora, quando poderei tomar a primeira dose? E se
eu tomar a primeira dose e tiver dengue daqui a 90 dias, quando eu poderei
tomar a segunda? Então, são perguntas que precisam ser respondidas.
Outra ação importante, de acordo com o pesquisador,
é estimular a Wolbachia, a bactéria que infecta o mosquito. "Quando você
controla o mosquito, controla dengue, zika e chikungunya. E as grávidas devem
usar repelente por causa do zika. Cedo ou tarde teremos casos. A microcefalia é
o maior problema em relação a arboviroses", finaliza o médico.
EM 8 MESES, BRASIL REGISTRA 946 MORTES POR DENGUE
No Brasil, até 2 de setembro de 2023, foram
registrados 1.530.940 casos de dengue e taxa de incidência de 753,9 casos/100
mil habitantes. No mesmo período do ano passado, o país teve 1.313.805 casos —
taxa de 647,0 casos/100 mil habitantes.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que
taxas acima de 300 casos por 100 mil habitantes indicam situação epidêmica
—segundo o pesquisador, neste ano, causada pelos sorotipos 1 e 2.
Em relação às mortes, no mesmo período, foram 946
em 2023 e 960 no ano passado.
Fonte: Alma Preta/FolhaPress
Nenhum comentário:
Postar um comentário