COP16: Colômbia assume liderança de Pacto
Amazônico, como instrumento de soberania sul-americana
O governo de Gustavo
Petro conseguiu os consensos necessários para liderar a Organização do Tratado
de Cooperação Amazônica (OTCA). Em entrevista à Sputnik, o analista Daniel
Prieto destacou o valor "geopolítico" da entidade e lembrou a ideia colombiana
de uma "OTAN amazônica".
No final da 16ª
reunião da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica
(COP16) na cidade colombiana de Cali, nesta quarta-feira (30), a Colômbia
celebrou uma conquista diplomática decisiva para o governo de Gustavo Petro:
assumir a Secretaria-Geral do Pacto Amazônico.
Assinado em 1978, o
Tratado de Cooperação Amazônica, também conhecida como Pacto Amazônico, integra
a Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, e tem
como objetivo principal a coordenação de políticas para a preservação da floresta
amazônica e de todo o seu ecossistema.
Com a designação do
colombiano Martin Von Hildebrand — antropólogo de 81 anos com ampla trajetória
como ativista em favor da Amazônia e dos povos indígenas que nela vivem, a
Colômbia também conseguiu implementar o objetivo de "revitalizar" o
organismo, que estava bloqueado desde o início do ano devido à falta de acordo
com o governo do Peru para a nomeação de um dirigente colombiano:
"É o principal e
o único bloco socioambiental da América Latina e do Caribe e um exemplo do que
se conhece como cooperação Sul-Sul. Tem um eixo político-diplomático, outro
estratégico para a intervenção no bioma Amazônia e um terceiro eixo técnico e
de cooperação com movimentos sociais, a comunidade científica e, sobretudo, as
comunidades locais e indígenas", explicou à Sputnik Prieto.
Analista político
colombiano e especialista em temas de ecologia, Prieto acrescentou que, embora
conte com várias instâncias e órgãos de trabalho, a OTCA tem seus principais
eventos nas cúpulas amazônicas.
Prieto destacou a
importância da terceira cúpula, realizada em 2019 na cidade colombiana de
Letícia, quando os membros assinaram o Pacto de Letícia, comprometendo-se a
"fortalecer" o mecanismo e coordenar ações concretas para combater
desastres e crimes ambientais contra a Amazônia.
Cinco anos depois, os
países se reuniram novamente na cúpula amazônica de Belém do Pará, no Brasil.
Lá, Petro surpreendeu ao propor "uma OTAN da Amazônia" para proteger
militarmente a região e constituir um "tribunal de justiça amazônico"
para julgar os crimes ambientais na região.
<><> OTCA
A entidade é o único
bloco socioambiental de países dedicado à Amazônia e coordena os procedimentos
do Tratado de Cooperação Amazônica (TCA).
O TCA foi assinado
pelos países amazônicos em julho de 1978, com o objetivo de promover o
desenvolvimento harmônico da região com ações conjuntas para gerar
"resultados equitativos e mutuamente benéficos para alcançar o
desenvolvimento sustentável" do território.
Como parte do tratado,
os países-membros assumiram o compromisso comum de preservar o meio ambiente e
o uso racional dos recursos naturais da Amazônia.
Em 1995, os
representantes dos países-membros, reunidos em Lima, Peru, acordaram criar a
Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).
Em 1998, foi aprovada
uma emenda ao TCA. A Secretaria Permanente foi estabelecida em Brasília em
dezembro de 2002 e instalada definitivamente em março de 2003.
• Crise diplomática: Venezuela convoca
embaixador e ataca Amorim, assessor de Lula
A Venezuela convocou
nesta quarta-feira (30) seu embaixador em Brasília para retornar ao país. Em
comunicado, o governo venezuelano também classificou as falas do assessor da
Presidência Celso Amorim sobre "quebra de confiança" entre Brasil e
Venezuela como "declarações intervencionistas e grosseiras".
A convocação de um
embaixador é uma espécie de repreensão de um país a outro na linguagem
diplomática internacional. A atitude desta quarta-feira é o episódio mais
recente da crise diplomática entre os governos de Brasil e Venezuela.
As tensões se
intensificaram após a eleição presidencial venezuelana, quando Maduro foi
declarado vencedor em um resultado contestado pela oposição e por órgãos
internacionais, com acusações de falta de transparência.
A declaração de Celso
Amorim questionada pelo governo venezuelano foi dada em audiência na Câmara dos
Deputados nesta terça-feira. O governo Lula insiste na necessidade de
apresentação das atas eleitorais, que comprovariam o resultado anunciado pelo
Conselho Nacional Eleitoral (CNE), para reconhecer a vitória de Maduro no
pleito.
Na semana passada, o
Brasil se posicionou contra a entrada da Venezuela no Brics durante cúpula
realizada em Kazan, na Rússia.
O governo Maduro citou
nominalmente Amorim no comunicado e afirmou que declarações dadas pelo assessor
especial da Presidência "constituem uma agressão constante que mina as
relações políticas e diplomáticas entre os Estados, ameaçando os laços que unem
os dois países".
"Amorim tem se
comportado mais como um mensageiro do imperialismo norte-americano e se
dedicado, de maneira impertinente, a emitir juízos de valor sobre processos que
são responsabilidade exclusiva dos venezuelanos e de suas instituições
democráticas", afirmou o comunicado.
Além de chamar de
volta o diplomata que está em Brasília, o governo venezuelano também convocou o
representante de negócios do Brasil para dar explicações.
O governo brasileiro
não reagiu à convocação até a a última atualização desta reportagem.
De acordo com o Blog
da Julia Duailibi, o Itamaraty não deve responder publicamente ao gesto da
Venezuela.
<><>
Relações estremecidas
Nas eleições de julho,
Edmundo González foi o candidato da coalizão de oposição que disputou as
eleições presidenciais contra Maduro. Corina Machado é a principal opositora do
presidente venezuelano e foi impedida de concorrer pela Suprema Corte em janeiro.
Citando um possível
ataque hacker, o CNE se recusou a divulgar as atas eleitorais que mostram os
votos depositados nas urnas, mas declarou Maduro vencedor. A oposição reuniu
atas por conta própria que atestariam a vitória de González.
O governo brasileiro
atuou como observador internacional das eleições, assim como o Centro Carter. O
Brasil cobra a divulgação das atas para considerar válidos os resultados do
CNE.
Já o Centro Carter
afirma que o pleito "não atendeu aos padrões internacionais de integridade
e não pode ser considerado democrático", e que a autoridade eleitoral
"demonstrou claro viés" em favor do atual presidente, Nicolás Maduro.
Desde então, Maduro e
aliados têm dado declarações hostis contra o Brasil, membros do governo Lula e
funcionários do Itamaraty.
<><> Veja
a íntegra do comunicado do Ministério das Relações Exteriores venezuelano:
"O Ministério do
Poder Popular para as Relações Exteriores da República Bolivariana da Venezuela
convocou, hoje, o encarregado de negócios da República Federativa do Brasil,
com o objetivo de manifestar seu mais firme repúdio às recorrentes declarações
intervencionistas e grosseiras de representantes autorizados pelo governo
brasileiro, em particular as feitas pelo assessor especial de Assuntos
Exteriores, Celso Amorim, que, comportando-se mais como um mensageiro do
imperialismo norte-americano, tem se dedicado, de maneira impertinente, a
emitir juízos de valor sobre processos que são responsabilidade exclusiva dos
venezuelanos e de suas instituições democráticas. Tais declarações constituem
uma agressão constante que mina as relações políticas e diplomáticas entre os
Estados, ameaçando os laços que unem os dois países.
Da mesma forma, foi
manifestado o total repúdio à atitude antilatino-americana, contrária aos
princípios fundamentais da integração regional expressos na Comunidade de
Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) e na longa história de unidade
na nossa região. Essa atitude foi consumada pelo veto aplicado pelo Brasil na
cúpula dos Brics em Kazan, pelo qual a Venezuela foi excluída da lista de
convidados como membros associados da referida organização.
Denunciamos, também, o
comportamento irracional dos diplomatas brasileiros que, contrariando a
aprovação do restante dos membros dos BRICS, adotaram uma política de bloqueio,
semelhante à política de Medidas Coercitivas Unilaterais e de punição coletiva ao
povo venezuelano.
Foi expressado que a
Venezuela reserva-se, no marco de sua política exterior, o direito de tomar as
ações necessárias em resposta a essa postura, que compromete a colaboração e o
trabalho conjunto desenvolvidos até então em todos os espaços multilaterais.
Por fim, informamos à
comunidade nacional e internacional que, seguindo instruções do presidente
Nicolás Maduro Moros, decidiu-se convocar imediatamente para consultas o
embaixador Manuel Vadell, que exerce nossa representação em Brasília."
• Por que a relação entre Maduro e Lula
azedou
Aliados históricos, e
alvos de críticas por isso, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, do
Brasil, Nicolás Maduro, da Venezuela, passaram a enfrentar uma crise política
na relação entre eles, que atualmente chegou aos níveis diplomáticos.
Em 29 de maio do ano
passado, por exemplo, Lula recebeu Maduro no Palácio do Planalto com honras de
chefe de Estado, isto é, a visita de mais alto nível. Maduro subiu a rampa do
palácio e, ao final do encontro, os dois presidentes fizeram um pronunciamento
à imprensa no Salão Leste.
Lula, por exemplo,
disse que era um "prazer" receber Maduro, afirmou ser um
"absurdo" as pessoas não o reconhecerem como presidente da Venezuela
e completou dizendo que cabia à própria Venezuela "mostrar a sua
narrativa" e convencer as pessoas a mudarem de opinião.
Em resposta a essas
declarações de Lula, Maduro disse que "Brasil e Venezuela têm que estar
unidos, daqui para frente e para sempre".
No mesmo dia, em outro
momento - no Palácio Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores -,
Lula se voltou aos jornalistas presentes e indagou:
"Quantos anos
vocês passaram ouvindo dizer que o Maduro era um homem mau?".
O próprio Maduro,
então, tomou a palavra e respondeu a Lula: "Muitos. Muitos, muitos"
(relembre no vídeo abaixo).
Passado cerca de um
ano e meio desse episódio, as relações políticas entre os dois não é a mesma. E
as relações diplomáticas entre Brasil e Venezuela estão mais distantes.
O cenário começou a
mudar em março deste ano, quando o Ministério das Relações Exteriores disse,
oficialmente, com o aval de Lula, que acompanhava com "preocupação" o
desenrolar do processo eleitoral venezuelano. À época, uma candidata da oposição
a Maduro foi inabilitada e outra opositora sequer conseguiu registrar a
candidatura, o que fez a oposição buscar outro nome no limite do prazo.
Nos episódios mais
recentes, o assessor especial do presidente Lula para assuntos internacionais,
Celso Amorim, disse nesta terça (29) que houve "quebra de confiança"
entre os dois países. Isso porque o Brasil foi um dos mediadores do acordo que
previa eleições livres e diretas no país vizinho, o que não se confirmou.
Um dia depois, nesta
quarta (30), o governo da Venezuela convocou o embaixador em Brasília para
retornar ao país em razão de "declarações intervencionistas e
grosseiras" do governo brasileiro.
A convocação de um
embaixador demonstra, em linguagem diplomática, que um país está incomodado com
o outro.
<><>
Cronologia da crise na relação
Relembre abaixo alguns
dos episódios que mostram momentos de maior proximidade entre Lula e Maduro e
momentos de maior distância:
• 29 de maio de 2023: Maduro faz visita ao
Brasil e é recebido com honras de chefe de Estado;
• 29 de maio de 2023: Lula defende Maduro
e diz que venezuelano precisa construir a própria "narrativa" sobre
cenário no país;
• 29 de junho de 2023: Brasil defende
publicamente a entrada da Venezuela no Mercosul;
• 17 de outubro de 2023: Lula envia Celso
Amorim a Barbados para mediar acordo eleitoral na Venezuela;
• 29 de janeiro de 2024: Corina Machado,
opositora de Maduro, é inabilitada e não pode disputar eleição;
• 1 de março de 2024: Lula e Maduro se
reúnem em São Vicente e Granadinas e discutem processo eleitoral;
• 26 de março de 2024: Substituta de Maria
Corina Machado, Corina Yoris não consegue registrar candidatura;
• 26 de março de 2024: Itamaraty manifesta
'preocupação' com desenrolar do processo eleitoral na Venezuela (com opositores
sendo impedidos de participar do pleito);
• 24 de julho de 2024: Maduro não
apresenta provas e mente ao dizer que o Brasil não tem eleições auditáveis;
• 28 de julho de 2024: Eleição
presidencial da Venezuela;
• 29 de julho de 2024: Conselho Nacional
Eleitoral reconhece vitória de Maduro nas eleições;
• 30 de julho de 2024: Lula cobra
divulgação das atas eleitorais pelo governo Maduro;
• 22 de agosto de 2024: Suprema Corte da
Venezuela declara Maduro vencedor e proíbe divulgação das atas eleitorais;
• 23 de outubro de 2024: Brics se reúne e
barra entrada da Venezuela após articulação do Brasil;
• 24 de outubro de 2024: Venezuela chama
veto do Brasil de 'agressão inexplicável' e diz que governo Lula reproduz 'ódio
de Bolsonaro'
• 28 de outubro de 2024: Maduro cobra
explicação pública de Lula sobre episódio envolvendo o Brics;
• 29 de outubro de 2024: Assessor de Lula
diz que houve "quebra de confiança" entre os dois países.
• 30 de outubro de 2024: Governo da
Venezuela convoca o embaixador em Brasília para retornar ao país.
Fonte: Sputnik
Brasil/g1
Nenhum comentário:
Postar um comentário