Fake News: DIU hormonal não aumenta em 40%
chance de câncer de mama; veja o que diz estudo
Na esteira dos médicos
que compartilhando informações falsas de que o câncer de mama não existe, estão
circulando na rede posts que associam o uso do DIU hormonal – um método
contraceptivo – ao aumento de 40% nas chances de ter a doença. O g1 leu o
artigo e conversou com especialistas que explicam que isso não é verdade. Por
exemplo, o estudo encontrou mais casos desse tipo de câncer em pessoas que não
usavam o DIU.
➡️ O outubro rosa, mês de conscientização sobre o câncer de mama
parece ter movimentado o tema nas redes. Nesta semana, o CFM abriu investigação
contra dois médicos que alegaram que o câncer de mama não existe. Agora,
entidades se mobilizam para desmentir posts que estão associando método
contraceptivo com esse tipo de câncer.
O estudo que vem sendo
citado foi feito por pesquisadores na Dinamarca, que observaram os registros
médicos de 78 mil mulheres que usavam o DIU de levonorgestrel, com idades entre
15 e 49, e compararam com o mesmo número de pacientes, na mesma faixa etária,
mas que não usavam o dispositivo. O objetivo era saber qual era a taxa de
câncer de mama nos dois grupos.
O que eles descobriram
é que 720 pacientes que usavam o dispositivo tiveram câncer de mama. No
entanto, o número foi maior entre as que não usaram: foram 897 casos.
Após a repercussão do
artigo, entidades como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e
Obstetrícia (Febrasgo) e Sociedade Brasileira de Mastologia, que reúne médicos
especialistas em câncer de mama, emitiram nota alertando que os achados da
pesquisa não indicam um aumento de 40% nos casos de câncer de mama.
O g1 leu o artigo,
ouviu especialistas e, abaixo, traz, ponto a ponto, os resultados da pesquisa e
o que analisam os médicos.
<><> DIU
pode aumentar a chance de câncer de mama?
• O que diz a pesquisa
A pesquisa é um estudo
retrospectivo que observou registros médicos, ou seja, essas mulheres não foram
acompanhadas. No estudo, foram selecionados dois grupos: mulheres entre 15 e 49
anos que tinham o DIU de levonorgestrel e que não tinham.
Nos dois grupos,
descobriu-se que 720 casos de câncer de mama entre pacientes que usavam o
dispositivo e 897 entre as que não usavam. Com isso, houve um achado de aumento
do risco relativo de 1,4.
• O que dizem os especialistas
O primeiro ponto
levantado é que a pesquisa não analisa o perfil das pacientes. Ou seja,
questões como tabagismo, obesidade, sedentarismo, problemas hormonais e até a
incidência de câncer na família não foram levadas em consideração.
Em uma pesquisa, isso
é chamado de fator confundidor. Isso porque se a pessoa tem um ou mais desses
problemas têm um risco mais alto para câncer, o que pode confundir os
resultados.
Eles analisam um grupo
grande, com idades diferentes. Adolescentes e mulheres jovens têm menos chance
de ter câncer de mama do que pessoas de mais de 40 anos e isso não é
diferenciado no estudo. A análise é precária para levar isso como decisivo
sobre o DIU.
<><> A
pesquisa diz que o aumento é de 40%?
• O que diz a pesquisa
A pesquisa aponta que
identificou um risco de 1,4 em relação ao risco original de 1, o que seria
mesmo um aumento de 40%. No entanto, sinaliza a seguinte proporção:
Embora o risco
absoluto de cancer da mama seja baixo em mulheres jovens, este estudo encontrou
um risco excessivo de 14 por 10.000 mulheres. O risco não aumentou com a
duração do uso.
• O que dizem os especialistas
Os médicos alertam que
o aumento citado incide sobre o risco pré-existente. Ou seja, não significa que
quatro em cada dez mulheres vão ter câncer de mama, mas sim que o risco que era
de 1% aumentou para 1,4%.
A forma como isso vem
sendo divulgado não está correta. Existe uma diferença enorme entre dizer que a
taxa é de 14 para 10 mil mulheres e dizer que uma em cada dez mulheres pode ter
a doença. — Marcelo Steiner, médico ginecologista,
A Sociedade Brasileira
de Mastologia, que reúne especialistas em câncer de mama, publicou uma nota alertando
que os dados não mostram risco elevado em relação ao dispositivo.
“Os anticoncepcionais
hormonais possuem amplos benefícios e podem ser utilizados na população em
geral, sob supervisão médica. Os benefícios dessas medicações são amplamente
superiores ao discreto aumento do risco transitório de câncer de mama, que
volta ao normal cerca de 10 anos após a interrupção do tratamento, ou seja,
após esse tempo o risco é similar à paciente que nunca usou o método hormonal”.
Além disso, o risco
abaixo de dois, que é o apontado no estudo, não chega a ser considerado como
potencial para câncer.
• Pânico de engravidar: entenda a
tocofobia, que leva a abstinência e a exagero em pílulas do dia seguinte
Tomar pílulas do dia
seguinte mesmo usando anticoncepcional. Sexo só com proteção e, ainda assim,
fazer vários testes de gravidez. Ficar meses sem transar. Essas são algumas das
estratégias usadas por mulheres com pânico irreal de engravidar ou do parto.
Isso tem nome na medicina: tocofobia - e é bem mais comum do que parece.
Em grupos de WhatsApp,
comunidades virtuais, redes sociais, mesas de bar e rodinhas de conversa, a
troca de experiências sobre métodos contraceptivos virou algo recorrente.
👉 O que serve de gatilho para essas mulheres que não querem
engravidar ou pretendem adiar a gestação é que, embora eficazes, nenhum desses
métodos é 100% garantido. Ou, então, quando ficam sabendo de quem engravidou
mesmo se prevenindo (leia mais ao fim desta reportagem) ou de casos de
múltiplos, como o da jovem de 18 anos do Rio de Janeiro que se descobriu
grávida de cinco.
Se você não tem
tocofobia, provavelmente consegue identificar alguma mulher do seu entorno que
tenha.
— Sheila Rodrigues de
Medeiros, psicóloga voluntária do Programa Saúde Mental da Mulher do Instituto
de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP
Ela explica que a
tocofobia está classificada dentro do transtorno de ansiedade.
"A identificação
da doença é recente e nós já temos visto cada vez mais mulheres chegando com um
quadro patológico de medo sobre a gravidez", diz.
<><>
Impactos da tocofobia
Segundo ginecologistas
e psicólogos, é comum que mulheres que não queiram engravidar sintam algum
medo, mesmo usando proteção, mas há situações em que isso se torna patológico e
afeta o dia a dia, a vida sexual, o relacionamento e a saúde dessas mulheres.
É o caso da assistente
social Carolina, 33 anos, que pediu para que ter seu sobrenome preservado.
Atualmente morando na Dinamarca, ela relembra que, desde que começou a ter
relações sexuais, tinha pânico de que os métodos contraceptivos não
funcionassem e que engravidasse.
Muitas vezes, mesmo
tomando o anticoncepcional, eu ficava tão nervosa que tomava pílula do dia
seguinte. Em um ano, usei a pílula seis vezes. Sentia um medo descontrolado e
recorria à pílula.
— Carolina, assistente
social que mora na Dinamarca
No último mês,
Carolina fez vários testes de gravidez porque acreditava estar grávida. Sua
última relação sexual tinha acontecido em maio, antes do término de um
relacionamento. Ela fazia uso de contraceptivo, mas, mesmo assim, passou os
cinco meses seguintes acreditando que estava grávida, tomando pílulas do dia
seguinte e fazendo testes.
Sentia a minha barriga
crescer, meu peito inchar. Comparava a minha barriga com barrigas de grávidas
na internet. Vi muita coisa on-line e não conseguia trabalhar, dormir, ter
outras relações. Só me acalmei quando fiz os exames do sistema que apoia mulheres
que precisam abortar aqui e o exame confirmou que não estava grávida. —
Carolina, 33 anos, que mora na Dinamarca.
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Tocofobia é transtorno de ansiedade
🔎 A tocofobia foi reconhecida formalmente em janeiro de 2000,
quando o renomado British Journal of Psychiatry (Periódico Britânico de
Psiquiatria), da Universidade de Cambridge, publicou um estudo relatando casos
do transtorno.
O artigo foi o
primeiro a classificar a fobia na literatura médica e elencou duas versões:
• primária, que atinge mulheres que nunca
engravidaram; e
• secundária, quando se manifesta em
mulheres gestantes com medo do parto.
🚨 Nas pacientes classificadas com tocofobia primária, o estudo
observou que “algumas destas mulheres utilizavam vários métodos de proteção”.
A doença faz parte do
quadro de transtorno de ansiedade e é classificada como uma fobia específica,
como é o caso da claustrofobia (medo de ambientes fechados), por exemplo.
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Motivos que levam à tocofobia
👩💻 Mudança de prioridades
A ginecologista
Mariane Nunes, membro da Comissão de Anticoncepção da Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), explica que a fobia é
resultado de dois pontos: a mudança social em relação ao papel da mulher, em
que a gestação passou a ser uma escolha e não obrigação; e a desinformação
on-line.
🤰 Essa mudança na prioridade em ser mãe vem sendo observada desde
os anos 70 quando, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), começou a sequência de quedas na velocidade de crescimento da população
brasileira -- consequência de menos nascimentos.
Entre os anos de 2010
e 2022, esse índice atingiu o menor número dos últimos 150 anos, ficando abaixo
de 1%.
A mulher tomou para si
a escolha de gerar e isso é importante. Só que isso acontece quando também elas
estão expostas a muita informação on-line, nem sempre verdadeira. Essas
informações colocam em dúvida a eficácia dos métodos contraceptivos e criam mitos
que deixam mulheres inseguras e ansiosas. — Mariane Nunes, ginecologista e
membro da Comissão de Anticoncepção da Febrasgo.
📲 Desinformação on-line
Você já deve ter visto
casos de mulheres que contam na internet terem engravidado, mesmo usando
contraceptivo.
Os ginecologistas
dizem que é possível, já que não há 100% de eficácia, mas é preciso analisar o
modo de uso: o DIU foi colocado de forma correta e foi feito exame de rotina
para saber se ele estava no lugar? O anticoncepcional foi usado conforme a
determinação do fabricante? O implante estava dentro do prazo de eficácia?
Essas perguntas não
são respondidas por quem faz esse tipo de publicação e as ginecologistas dizem
que, na maior parte dos casos, são alarmistas e não parte da porcentagem da
taxa de falha de cada método.
O consenso é que esse
tipo de conteúdo on-line só desinforma e é um agravante dessa fobia vista em
mulheres.
O que os especialistas
pontuam é que apesar de não existir um método 100% seguro, a chance é mínima em
vários deles. No caso do implante, por exemplo, a taxa de falha é de
"A laqueadura tem
uma taxa de falha de uma a cada mil mulheres. No caso do implante, é uma a cada
10 mil mulheres. Para quem só usa camisinha, a chance é de 18%. A gente vai
avaliando os métodos, aliando a outros acompanhamentos para que a mulher possa
ter melhor controle sobre isso e fazer uma escolha", explica Mariane
Nunes, ginecologista da Febrasgo.
Outro ponto ressaltado
é o uso de métodos contraceptivos do tipo LARC (traduzido do inglês,
contracepção de longa duração) e que não tem ação comportamental. Ou seja, não
depende da mulher o controle. São eles o DIU, SIU e os implantes.
Fonte: g1
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