Cirurgias ambulatoriais podem ser
alternativa para redução de custos e diminuição de filas de espera
Procedimentos
cirúrgicos frequentemente necessitam de recuperação dentro do ambiente
hospitalar. No entanto, existe um grande número de cirurgias que podem ser
realizadas em modelo ambulatorial, sem necessidade de internação. As cirurgias
ambulatoriais são amplamente adotadas em diversos países e de tempos em tempos
surgem iniciativas no Brasil por serem uma alternativa mais custo-efetiva no
setor hospitalar. Segundo estudo da Associação de Centros Cirúrgicos
Ambulatoriais dos Estados Unidos, até 2028, 85% dos procedimentos poderão ser
realizados em regime ambulatorial com o avanço da medicina.
Diferente de pequenas
cirurgias que podem ser realizadas em consultórios médicos, as cirurgias
ambulatoriais atendem diversas especialidades. Entre os procedimentos mais
realizados destacam-se cirurgias oftalmológicas, otorrinolaringológicas,
ressecção de tumores, biópsias e cirurgias pouco invasivas. Além disso, podem
ser realizadas operações mais complexas como implantação de marcapassos
cardíacos, válvulas e intervenções ortopédicas.
As cirurgias
ambulatoriais podem ser feitas em hospitais gerais ou em Unidades de Cirurgia
Ambulatorial (UCAs), também conhecidas como hospitais-dia. As UCAs requerem a
permanência do paciente por um período máximo de 12 horas e são equipadas da
mesma forma que um hospital convencional. Estes estabelecimentos também são
projetados para oferecer um circuito de cuidados pré e pós operatórios que
permitem que o paciente receba alta no mesmo dia.
Países como Estados
Unidos, Canadá e Reino Unido lideram o mercado com modelos de cirurgia
ambulatorial bem elaborados, com regras bem estabelecidas, protocolos rigorosos
de segurança e integração tecnológica avançada. Esse tipo de procedimento
também tem se espalhado em países em desenvolvimento como México, Índia e
China.
No Brasil, algumas
instituições já investem na área. Em abril deste ano, por exemplo, o Hospital
Sírio-Libanês destinou R$ 150 milhões para a expansão das suas instalações
ambulatoriais com a construção de uma nova unidade que vai funcionar como
hospital-dia. De acordo com o diretor médico adjunto do Centro Cirúrgico do
Hospital Sírio-Libanês, Sérgio Arap, a pandemia da Covid-19 acarretou uma
mudança no comportamento hospitalar e muitos pacientes passaram a preferir
centros ambulatoriais para evitar hospitais com alta ocupação e limitações no
atendimento de consultas, exames e cirurgias.
“A migração de
tratamentos mais invasivos, que antes exigiam internação, para procedimentos
menos complexos que oferecem o mesmo resultado é uma tendência mundial. Entre
os benefícios estão processos mais ágeis, sem desperdício de tempo e que
proporcionam uma experiência mais agradável durante a jornada do paciente”,
afirma o diretor.
• Diminuição de gastos e aumento de
procedimentos
De acordo com a
Sociedade Brasileira de Cirurgia Ambulatorial (Sobracam), o modelo ambulatorial
traz diversas vantagens para os pacientes como maior suporte familiar, menor
risco de infecções hospitalares, redução do estresse e ansiedade e maior
conveniência ao permitir um retorno mais rápido à rotina. Além disso, também
podem ser uma alternativa para reduzir custos. Segundo dados obtidos através de
consulta no DataSUS, entre janeiro e julho deste ano o SUS teve mais de dois
milhões e 900 mil pacientes internados em clínicas cirúrgicas, o que gerou um
gasto de mais de R$7 bilhões. Em contrapartida, foram cerca de 134 mil
internações em clínicas cirúrgicas ambulatoriais (com média de menos de um dia
de permanência) que custaram em torno de R$113 milhões.
“Há uma redução
substancial de custos devido à eliminação de despesas como diárias
hospitalares, UTI, alimentação e cuidados de enfermagem 24 horas. A menor taxa
de complicações e infecções hospitalares associadas a este modelo resulta em
menos readmissões e tratamentos adicionais, o que também se traduz em economia
a longo prazo”, explica o presidente executivo da Sobracam, Fabrício Galvão.
A expansão do modelo
ambulatorial também pode diminuir as filas de espera por cirurgias do SUS. Uma
das estratégias adotadas pela Prefeitura de São Paulo para reduzir a espera
pelos procedimentos cirúrgicos de baixa e média complexidade na cidade foi a ampliação
dos hospitais-dia. Como parte do Programa “Avança Saúde – Cirurgias e Exames”,
em 2021, a Secretaria Municipal de Saúde ampliou o horário de funcionamento de
12 dos 17 hospitais dia da cidade para funcionarem 24 horas. Isso gerou um
crescimento de 85% nos procedimentos cirúrgicos realizados nesses
estabelecimentos em relação a 2019.
Segundo a Prefeitura,
somente em hospitais-dia já foram realizados mais de 330 mil procedimentos
ambulatoriais e 50 mil cirurgias em 2024. Em nota, a Secretaria de Saúde da
cidade afirmou que o investimento no modelo “aumentou a oferta de cirurgias
nestas unidades e trouxe a possibilidade de realizar cirurgias de média
complexidade que até então só eram realizadas em hospitais, como
colecistectomias, laqueaduras, histerectomia, cálculo urinário, incontinência
urinária, entre outras”.
Na visão de Arap, do
Sírio-Libanês, o investimento em hospitais-dia também gera maior rapidez e
eficácia nos atendimentos da rede privada: “Procedimentos ambulatoriais
realizados dentro de um centro cirúrgico de grande porte competem por horários
e salas. Separar esses procedimentos aumenta a disponibilidade de salas para os
de maior complexidade.”
Todo centro cirúrgico
ambulatorial é submetido às mesmas regras e fiscalizações que os hospitais
gerais. Há inclusive obrigatoriedade de possuir uma estrutura de emergência e
cuidados intensivos ao paciente, na eventualidade de uma intercorrência,
incluindo equipamentos, equipe assistencial e uma estrutura própria ou
terceirizada de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) móvel.
Apesar das vantagens,
o modelo possui algumas limitações. Para a realização de cirurgias
ambulatoriais, é preciso levar em consideração as comorbidades e o estilo de
vida do paciente, além da viabilidade de acesso entre o local onde o paciente
está e o do procedimento, a rede de apoio e a necessidade de estrutura da
residência do paciente – que pode variar conforme a operação.
Conforme o presidente
da Sobracam, a pré-seleção e avaliação cuidadosa do paciente e suas condições
biopsicossociais para admissão garantem as baixas taxas de complicações desse
tipo de cirurgia. “Todo esse ambiente de recuperação em casa tem que ser pensado
de acordo com o procedimento que foi realizado e de acordo com as melhores
recomendações para que essa recuperação seja efetiva”, explica Galvão.
• Política nacional de cirurgias
ambulatoriais
Com o objetivo de
expandir o modelo no Brasil, a Sobracam elaborou uma proposta de Política
Nacional de Cirurgia Ambulatorial que já foi apresentada ao Congresso Nacional.
Conforme a sociedade, o documento já foi enviado para a Comissão de Saúde da
Câmara dos Deputados e uma audiência pública para discutir a sua implementação
deve ser marcada passado o fim das eleições municipais.
A Política busca
fornecer diretrizes para melhorar o acesso e a qualidade das cirurgias
ambulatoriais no SUS de forma a reduzir as filas de cirurgias eletivas e
permitir que os hospitais gerais concentrem esforços em pacientes que realmente
necessitam de internação. De acordo com o documento, “um novo modelo
estruturado e sustentável é necessário para substituir ações temporárias e
inadequadas como os mutirões de cirurgias, que não solucionam de forma
permanente os problemas existentes”.
A proposta sugere a
integração de UCAs com Equipes de Saúde da Família e outros programas já
existentes SUS, como o Serviço Móvel de Urgência (SAMU), as Unidades de
Pronto-Atendimento (UPA) e atenção odontológica, assim como hospitais de
referência. Além disso, a política também propõe criar plataformas de
treinamento e educação para formação de equipes multidisciplinares e a
estruturação de diferentes modelos e normas para as UCAs.
“Hoje vemos uma
subutilização grande do sistema ambulatorial e esse material é uma provocação
inicial aos entes públicos para que pensem no modelo como algo consistente.
Essas propostas criam um ambiente propício para o crescimento sustentável,
melhorando a eficiência do sistema de saúde e a experiência do paciente”,
relata Galvão.
Em paralelo à
discussão da política, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) analisa a
viabilidade de planos de saúde ambulatoriais sem cobertura de internações de
emergência por até 24h. Atualmente, esse tipo de cobertura existe no mercado,
mas é pouco ofertada devido ao alto risco de judicialização e possíveis
complicações caso o paciente precise ficar no hospital mais tempo.
O presidente da
Sobracam afirma que existem lados positivos na proposta para o setor de
cirurgias ambulatoriais e acredita que seria um estímulo para o desenvolvimento
de serviços ambulatoriais mais eficientes, incluindo procedimentos cirúrgicos:
“Esse cenário é favorável para impulsionar o modelo cirúrgico ambulatorial, mas
é fundamental que qualquer nova regulamentação busque equilibrar os interesses
das operadoras, profissionais de saúde e, sobretudo, dos pacientes, visando
criar um mercado de saúde mais competitivo, acessível e seguro.”
Fonte: Futuro da Saúde
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