Black
Friday: como os robôs passam a perna em você na disputa por pechinchas
A
Black Friday e a onda de compras de Natal chegaram. Mas qualquer pechincha
envolvendo um novo console ou aquela placa de vídeo disputada provavelmente
será abocanhada por um exército de robôs trabalhando para aqueles que procuram
ter lucro dos preços baixos nesse período.
Esses
robôs (bots) são programas em funcionamento constante que afetam o comércio
online há anos. Mas, desde a pandemia de covid-19, o comércio eletrônico
aumentou consideravelmente. E a dificuldade também.
E
qual é o problema desses robôs?
Bem,
os robôs de varejo vasculham todas as páginas desses sites de comércio por todo
o mundo de olho no momento exato em que um item é colocado à venda. E daí eles
alertam seus administradores para que possam vencer a multidão de consumidores
comuns em busca de preços baixos. Alguns desses robôs até compram
automaticamente o produto, mais rapidamente do que qualquer ser humano é capaz.
É
por isso que alguns produtos ficam fora de estoque em lojas comuns, mas estão
disponíveis por milhares de dólares a mais do que o preço inicial em sites como
o eBay.
Isso
é apenas "a ponta do iceberg", diz Thomas Platt, da empresa de
gerenciamento de robôs Netacea. Robôs abocanham o estoque de tudo, de
brinquedos fofinhos a coleções de filmes.
Se
houver um "nicho de mercado" ou um lançamento de alto padrão,
"essas indústrias estarão sendo visadas", explica Platt.
Em
2020, o lançamento da placa de vídeo de jogos para PC da Nvidia, a 3080,
ilustrou "provavelmente o caso mais extremo do que os robôs podem
fazer", disse um dos moderadores do fórum do Reddit r/BuildaPCSalesUK, um
grupo de caçadores de pechinchas que se ajudam a encontrar peças de
computadores.
"Menos
de um segundo após o lançamento, todas as peças acabaram."
"Os
usuários em sites de varejo não viram um botão 'comprar agora', mas sim um
botão 'esgotado', já que todo o estoque tinha sido imediatamente levado por
robôs, com uma ou outra pessoa sortuda lá no meio (da lista de
compradores)."
Rob
Burke, ex-diretor de comércio eletrônico internacional da grande varejista
internacional GameStop, diz que os robôs sempre foram um problema.
"Às
vezes, mais de 60% do tráfego no nosso site, representando centenas de milhões
de visitas por dia, era de robôs ou raspadores (os scrapers, que monitoram
preços). Especialmente às vésperas de grandes lançamentos."
Essa
situação cria um certo dilema ético para as lojas.
"Por
um lado, você só quer vender o produto. Então, quem se importa se foi um robô
ou um cliente 'real'? Por outro, se nenhum, ou muito poucos, de seus clientes
reais puderem adquirir um produto com você, eles naturalmente vão buscar outro
lugar para comprar."
• Como esses
robôs funcionam?
Os
chamados robôs "sniping" (em referência aos snipers ou atiradores de
elite) emitem alertas para os usuários quando um item volta ao estoque,
permitindo que o responsável pelo robô o compre antes de qualquer outra pessoa.
Mas
os robôs mais avançados são soluções completas que identificam a pechincha e
fazem a compra automaticamente. Eles geralmente vêm de um lugar incomum: o
mercado de tênis de edição limitada.
Esses
calçados têm sido um foco de lançamentos limitados e de alta demanda nos
últimos anos, com as pessoas fazendo fila do lado de fora das lojas para
comprá-los, ou tentando obtê-los online. Isso levou ao desenvolvimento de robôs
avançados, e são esses que agora estão sendo usados para outros fins.
Os
chamados "grupos de cozinheiros" vivem em canais de bate-papo
privados em aplicativos como o Discord trocando dicas sobre quem vai estocar o
quê, boatos de horários de lançamento e páginas dos sites disponíveis antes do
produto estar oficialmente à venda. Os proprietários de robôs usam essas
informações para ajustar suas estratégias.
Platt
diz que conhece um exemplo extremo em que um grupo alugou um servidor
localizado fisicamente mais perto do servidor do site que estavam de olho,
dando a eles uma vantagem de frações de segundo no tempo que leva para o
tráfego da internet ocorrer.
Por
quê? Porque os cambistas estão competindo uns com os outros tanto quanto os
compradores regulares.
A
adesão a esses grupos de elite pode custar de dezenas a centenas de dólares.
"Definitivamente,
há um elemento de exclusividade no segmento mais sofisticado do mercado",
diz Platt.
"Existem
robôs à venda que podem custar milhares de dólares. Alguns dos robôs se
tornaram tão caros e tão limitados que agora você os aluga."
Isso
significa que algumas pessoas que estão genuinamente atrás de um item estão
alugando um robô para ter certeza de que o conseguirão ou apenas
"empregando" um "robozeiro" para comprá-lo para elas.
Está
se tornando um grande negócio. O mercado de revenda de tênis esportivos sozinho
está avaliado em cerca de US$ 2 bilhões e cresce 20% ao ano, segundo a
consultoria americana Cowen.
• O que isso
significa para as compras de Natal e da Black Friday?
No
fim, os itens de maior demanda estarão mais difíceis do que nunca,
especialmente se houver um bom desconto envolvido.
E
depois há o movimento habitual de mercado: comprar itens na baixa e vender na
alta, explorando a diferença de preço. Os robôs ajudam isso a acontecer em
escala comercial automatizada.
"Você
pode levar todos esses itens, se souber que dali a duas semanas, quando as
vendas acabarem, poderá vendê-los pelo dobro do preço", explica Platt.
Há
uma fresta de esperança na proliferação de robôs em torno dos principais dias
de vendas, como a Black Friday: eles podem levar a preços mais baixos em alguns
casos.
Isso
porque os robôs de raspagem, do tipo que monitora preços, mas não compra nada,
são realmente usados pelos próprios varejistas. Muitos dos maiores comerciantes
examinam os sites uns dos outros, certificando-se de que não sejam derrotados
na disputa pela melhor oferta de negócio ao consumidor.
• E o que pode
ser feito sobre isso?
Procurados
pela reportagem, muitos grandes varejistas se recusaram a tratar das
estratégias de defesas contra esses robôs, e vendedores de programas robôs
tampouco quiseram falar.
Tecnicamente,
não há nada de ilegal nessa prática. O Reino Unido proibiu o uso desses robôs
para a venda de ingressos, mas em outros setores de varejo isso não é
explicitamente proibido por lei.
No
entanto, varejistas estão criando soluções alternativas inteligentes.
A
loja britânica Currys PC World confundiu muitos de seus clientes quando o
PlayStation 5 e o Xbox Series X foram colocados à venda, em 2020. Eles
apareciam por 2 mil libras a mais do que se esperava, mas os clientes reais com
pré-encomendas receberam um código de desconto de 2.005 libras, que teve de ser
inserido manualmente, levando o preço de volta ao patamar esperado pelos
clientes.
Alguns
varejistas estão cobrando nos cartões das pessoas o preço total do item por um
lugar na fila de espera (e estornam o lançamento se a compra não for
concretizada). Outros estão vasculhando listas de pedidos e cancelando compras
suspeitas: por exemplo, se um mesmo endereço está recebendo muitas unidades do
mesmo item.
Essa
disputa de gato e rato deve ir bem longe.
Fonte:
BBC News Brasil
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