Resistencia
à ivermectina pode ser chave de surto de sarna em Santa Catarina
Duas
creches tiveram as aulas suspensas na cidade de Balneário Camboriú, em Santa
Catarina, por conta da grande quantidade de casos registrados de escabiose,
também conhecida como sarna humana.
E
um dos fatores que pode ter levado a esse surto foi o uso desenfreado de
ivermectina, medicação que compunha o chamado “kit covid” e tinha seu uso
incentivado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a pandemia, mesmo
que tal medicação não tenha sua eficácia comprovada contra a doença.
Segundo o site NSC Total, tal
hipótese foi inclusive admitida pelo médico infectologista Fábio Gaudenzi de
Faria, superintendente de vigilância em saúde de Santa Catarina, mas não totalmente
confirmada por não ter sido feita uma análise da resistência do parasita
responsável pela escabiose.
O
caso confirma estudos realizados por universidades federais durante a pandemia
de covid-19, onde destacavam que o uso desenfreado de medicamentos como
hidroxicloroquina e ivermectina poderiam tornar esses remédios ineficazes
contra os casos para os quais eles foram originalmente desenvolvidos.
Vale
lembrar que, em 2021, o sistema de saúde de Santa Catarina colapsou por conta do grande número de casos de covid-19, e
pacientes diagnosticados com o vírus da covid-19 eram orientados a fazer o uso
de medicamentos como ivermectina e cloroquina.
·
Pesquisa alerta para
resistência ao medicamento
Em
2021, o Núcleo de Estudos em Farmacoterapia (NEF) da Universidade Federal de
Alagoas (UFAL) desenvolveu um trabalho onde
cogitou que um surto de escabiose registrado em Pernambuco estava relacionado
ao uso em excesso de ivermectina, que acabou por gerar cepas responsáveis pela
escabiose que eram resistentes ao medicamento.
“O
nosso artigo lança a hipótese de que poderíamos ter problemas com surtos de
escabiose resistente, por conta do uso irracional da ivermectina. O surto está
configurado, pois está havendo um aumento rápido de casos de lesões de pele com
coceira e outros sintomas”, contextualiza Sabrina Neves, pesquisadora do
Instituto de Ciências Farmacêuticas (ICF) e uma das autoras do artigo.
“Ainda
não há diagnóstico da doença que está causando o surto. Algumas hipóteses da
etiologia [origem] estão sendo testadas, entre elas está a escabiose levantada
pelo artigo”, ressaltou.
A
ivermectina era um dos medicamentos que faziam parte do chamado “kit covid”,
que muitas pessoas recorreram para lidar com os efeitos da covid-19 inclusive
com o incentivo do poder público no auge da pandemia, como por parte do então
presidente Jair Bolsonaro.
Segundo
a UFAL, o consumo desse antiparasitário aumentou quase dez vezes no Brasil
graças a automedicação e a prescrição desenfreada – profissionais de saúde e
pessoas continuaram usando o medicamento contra a covid-19 mesmo com evidências
científicas e pareceres contrários do Ministério da Saúde e da indústria
farmacêutica.
“O
uso irracional de medicamentos é um problema de saúde pública, porém, no caso
de antibióticos, antiparasitários e antifúngicos, esse problema ganha
proporções maiores. Quando utilizamos de forma irracional/incorreta
medicamentos, como a ivermectina, corremos o risco de induzir a resistência do
parasita ao medicamento que deveria tratar a doença causada por ele”, reforça a
professora Sabrina.
¨
Trabalho alertou sobre
surto de sarna associado ao uso de ivermectina
Um
trabalho publicado pelo Núcleo de Estudos em Farmacoterapia (NEF) da Ufal pode
servir de base para ajudar na investigação de um surto de escabiose, a sarna
humana, que está acontecendo em Santa Catarina. A hipótese levantada é que os
casos estejam associados ao uso indiscriminado de ivermectina, medicamento que
se popularizou no Brasil com o chamado “kit covid”.
O
artigo publicado em agosto de 2021 foi elaborado pelos pesquisadores do
Instituto de Ciências Farmacêuticas (ICF), Alfredo Oliveira-Filho e Sabrina
Neves, e pelos estudantes Lucas Bezerra e Natália Alves, a partir da observação
de casos de resistência à ivermectina já relatados, surtos isolados e os dados
de aumento de consumo do medicamento por causa da pandemia de Covid-19.
“O
nosso artigo lança a hipótese de que poderíamos ter problemas com surtos de
escabiose resistente, por conta do uso irracional da ivermectina. O surto está
configurado, pois está havendo um aumento rápido de casos de lesões de pele com
coceira e outros sintomas”, contextualiza Sabrina, mas ressalta: “Ainda não há
diagnóstico da doença que está causando o surto. Algumas hipóteses da etiologia
[origem] estão sendo testadas, entre elas está a escabiose levantada pelo
artigo”.
A
pesquisadora explica que ainda são necessários alguns testes e o descarte de
outras hipóteses para então confirmar as questões levantadas no artigo.
Surto
em Pernambuco e possível problema de saúde pública
Pelo
menos 264 moradores de seis cidades da região metropolitana de Recife já
apresentam lesões cutâneas, que ainda estão sendo investigadas pelas
secretarias de saúde municipais.
Os
pacientes se queixam de uma coceira forte, intensificada no período da noite, e
que evolui para feridas, mesmo com o uso de antialérgicos.
Segundo
Neves, para mapear os possíveis casos em outras regiões do Brasil, a vigilância
epidemiológica emitiu um alerta com os sintomas para os serviços de saúde,
assim todos devem notificar o atendimento a pacientes com os sintomas da
doença.
A
docente também está acompanhando de perto e, caso confirmado, prevê futuras
complicações de saúde pública: “A hipótese do artigo é que é possível que
o Sarcoptes scabiei, ácaro causador da escabiose pode ter
desenvolvido resistência à ivermectina. Se essa hipótese se confirma, temos um
problema enorme, pois a doença poderia atingir qualquer população, e o que é
pior, com dificuldade de tratamento”.
Resistência
a medicamento
O
trabalho, assinado por Alfredo Oliveira-Filho, Lucas Bezerra, Natália Alves e
Sabrina Neves, aponta que, após o início da pandemia causada pelo SARS-CoV-2,
“a ivermectina foi identificada como um fármaco com potencial antiviral para
tratamento de pacientes - a princípio hospitalizados e depois ambulatoriais -
com Covid-19”.
Por
causa disso, o consumo desse antiparasitário aumentou quase dez vezes no
Brasil. Mesmo com pareceres do Ministério da Saúde e da indústria farmacêutica,
somados a evidências científicas, a prescrição e automedicação
baseada neste medicamento continuaram a acontecer.
“O
uso irracional de medicamentos é um problema de saúde pública, porém, no caso
de antibióticos, antiparasitários e antifúngicos, esse problema ganha
proporções maiores. Quando utilizamos de forma irracional/incorreta
medicamentos, como a ivermectina, corremos o risco de induzir a resistência do
parasita ao medicamento que deveria tratar a doença causada por ele”, reforça a
professora Sabrina.
E,
assim como antecipou o risco de aumento da resistência do Sarcoptes
scabiei à ivermectina, ela deixa mais uma reflexão: “Esse é um
problema mundial, principalmente no que diz respeito à resistência bacteriana,
que é um problema sério, uma vez que já temos vária cepas de bactérias
resistentes a antibióticos no mundo todo. Ou seja, nesse caso, o uso irracional
do medicamento leva a um problema geral, pois gera cepas resistentes a
tratamento, que podem infectar qualquer pessoa”.
Fonte:
Jornal GGN
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