terça-feira, 18 de junho de 2024

Como seus dados de localização são rastreados?

Não importa se você está sempre online ou se é quase um eremita moderno, a realidade é que os dados sobre onde você come, dorme, faz compras e passa o tempo estão à disposição.

Nos últimos anos, nós carregamos pequenos computadores conosco em todos os lugares que vamos, e quase todos eles coletam e compartilham grandes quantidades de informações pessoais, inclusive dados de localização, para empresas privadas que podem vendê-los.

“Os dispositivos de rastreamento são capazes de fazer coisas incríveis, permitindo que nos conectemos com qualquer pessoa no mundo e acessemos informações como nunca antes”, comenta Kade Crockford, diretor do Programa de Tecnologia para a Liberdade da ACLU de Massachusetts, nos Estados Unidos.

“Mas elas também permitem que as empresas e os governos acompanhem cada movimento nosso e até mesmo cada pensamento que temos como nunca antes”, afirma Crockford.

•           Por que é difícil dizer não ao rastreamento de localização?

Para algumas pessoas, as tecnologias de rastreamento proporcionam uma certa tranquilidade. Isso porque muitos usam aplicativos de compartilhamento de localização para comunicar seu paradeiro a amigos e familiares. Dispositivos como AirTags da Apple ou SmartTags da Samsung foram recrutados para a batalha dos pais para rastrear seus filhos mais novos e até mesmo passageiros frequentes tendem a etiquetar seus pertences em caso de extravio de bagagem.

E, é claro, a localização geográfica é um ótimo complemento para publicações em redes sociais, pois coloca os usuários em qualquer destino badalado do mundo.

A conveniência e praticidade é outro grande benefício. Os aplicativos de navegação, como o Google Maps, fazem busca de dados de localização em tempo real para coletar informações sobre as condições das estradas e ruas na área em que a pessoa está, o que, presumivelmente, permite que os motoristas façam escolhas melhores e com mais informação sobre suas viagens e, assim, também criam resultados de pesquisa individualizados para lugares que os usuários gostariam de visitar.

Softwares de rastreamento semelhantes podem ser encontrados em aplicativos de clima e programas de navegação como o Apple Maps, que usam sensores de dispositivos para coletar dados como coordenadas de GPS e informações de Bluetooth para funcionar.

Até mesmo as empresas de seguro de automóveis começaram a rastrear o diagnóstico do veículo para prever o possível risco de um cliente, alterando os prêmios ou oferecendo descontos com base em informações como o quanto ele acelera ou freia. 

A invasão de dados pessoais pode parecer mais “palatável” quando os consumidores também estão obtendo produtos e serviços mais personalizados.

No entanto, Alessandro Acquisti, professor de tecnologia da informação e políticas públicas no Heinz College da Carnegie Mellon University, na Pensilvânia (Estados Unidos), afirma que, em nível econômico, quem se beneficia mais com as experiências online personalizadas não é tão claro.

Isso inclui aquelas geradas a partir de dados de localização, como anúncios direcionados por comportamento: por exemplo, se você costuma sempre frequentar cafeterias, poderá ver anúncios de produtos de café ou de outras lojas localizadas nas proximidades.

“Os intermediários de publicidade podem usar estrategicamente a quantidade de informações que coletam sobre os consumidores para beneficiar principalmente a si mesmos... Em vez dos outros participantes do ecossistema”, diz Alessandro. “O rastreamento, quando se trata de publicidade, não parece ser tão benéfico para os consumidores como normalmente se afirma.”

Veja rastreamentos que talvez você não conheça – e quem pode acessar os dados

Embora celulares, smartwatches e computadores sejam alguns dos culpados mais óbvios, há muitos tipos de tecnologias com as quais compartilhamos, sem saber, alguns fatos mais confidenciais de nossas vidas.

Descobriu-se que alguns aplicativos bancários rastreiam os dados geográficos do seu telefone para ajudar a determinar fraudes e evitar transações suspeitas. Já os sistemas de segurança residencial usam dados de localização para impor um limite virtual chamado de geofence, que pode ajudar a automatizar determinados recursos, como o modo de casa e de ausência quando você sai.

Outros gadgets, como câmeras no aeroporto com tecnologia de reconhecimento facial integrada, historicamente geraram preocupações de segurança, pois seus dados poderiam ser inevitavelmente usados contra você.

Fragmentos de sua vida pessoal, incluindo cliques em sites e cookies, compras com cartão de crédito na web e muitos outros tipos de rastreadores também podem contribuir para a criação de seu diário digital exclusivo, com milhares de dados pessoais.

“Quando você pensa nesses pontos de dados individualmente, eles não parecem tão intrusivos”, afirma Sandra Matz-Cerf, cientista social computacional da Columbia Business School que usa Big Data para estudar a relação entre o ambiente online e o comportamento humano. “Se você combinar os rastros de dados, terá uma noção bastante precisa de quem é essa pessoa em um nível muito mais íntimo.”

Em um determinado momento, esses dados também são vendidos a quem der o maior lance. Dados confidenciais podem ser distribuídos por corretores de dados, governos estrangeiros, autoridades policiais e empregadores, entre outros.

“Acho que é impossível para uma pessoa ter a noção do quanto seus próprios dados estão espalhados pelo mundo”, diz o ativista de segurança e privacidade Thorin Klosowski, que trabalha para a Electronic Frontier Foundation, uma organização sem fins lucrativos que visa defender a privacidade digital e a liberdade de expressão.

Nas mãos erradas, podem usar os dados de localização como arma para encontrar e prejudicar vítimas em potencial. Os agressores domésticos são conhecidos por usar a tecnologia de rastreamento para encontrar e intimidar suas vítimas, enquanto os golpistas e hackers profissionais podem usar informações online mais detalhadas e dados de geolocalização para criar golpes de fraude online direcionados ou obter identidades roubadas.

Como alternativa, as autoridades costumam usar dados de localização e histórico de pesquisa para ajudar nas investigações policiais e, até recentemente, usavam esses dados para obter mandados de busca de usuários que poderiam estar em uma área específica. É provável que outras invasões de privacidade em larga escala também impeçam as pessoas de buscar abortos, abrindo caminho para que seus meios de subsistência e sua saúde mental sejam colocados em risco no futuro.

•           A defesa da privacidade

 “Se você realmente quisesse ter controle total sobre seus dados, isso seria um trabalho que duraria 24 horas por dia, 7 dias por semana”, explica Matz-Cerf. “Acho que é um trabalho para o qual não estamos preparados, tanto porque não entendemos totalmente as implicações quanto porque ninguém tem tempo.”

Em 2023, para ajudar a proibir a venda e o comércio de dados de localização telefônica em seu estado, a ACLU de Massachusetts, nos Estados Unidos, lançou uma campanha chamada Your Location: It's None of Their Business (Sua localização não é da conta deles, em tradução livre).

A campanha apoia a criação de um projeto de lei que, se aprovado, exigiria que as empresas obtivessem consentimento antes de coletar ou processar esses dados de localização de celulares. Embora essa lei não impeça as pessoas de acessar serviços essenciais como o Google Maps, ela impediria que as empresas vendessem esses dados no mercado aberto, diz Crockford.

“Trata-se essencialmente de proteções básicas para garantir que a tecnologia promova a criatividade, a produtividade, a conexão e a comunicação entre os seres humanos, sem colocar em risco nossa privacidade, nossa autonomia corporal e nossa capacidade de controlar nossas próprias vidas”, diz Crockford.

Para aqueles que desejam fazer mais para se proteger, em menor escala, das violações de seus próprios dados de localização, Klosowski sugere que as pessoas desativem a identificação de anúncios, familiarizem-se com as configurações de privacidade de seus telefones e saibam mais sobre quais aplicativos estão acessando esses dados.

“A necessidade de privacidade parece ser uma característica universal do cérebro humano”, afirma Acquisti. “Mesmo diante dessas tecnologias de vigilância cada vez mais invasivas, os seres humanos ainda tentarão criar espaços privados dentro desse ambiente de monitoramento.”

 

Fonte: National Geographic Brasil

 

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