sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Paciente que fez cirurgia desnecessária após falso laudo de câncer diz que 'maior cicatriz foi psicológica'

A servidora pública Samira Schwade Pereira, de 34 anos, uma dos mais de 30 pacientes que denunciaram a médica Carolina Fernandes Biscaia por emissão de laudos falsos e procedimentos desnecessários relatou ao g1 os danos físicos e psicológicos sofridos.

A médica é de Pato Branco, no oeste do Paraná, e foi denunciada nesta segunda-feira (28) pelo Ministério Público do Paraná (MP-PR) pelos crimes de estelionato, falsificação de documentos, lesão corporal e exercer atividade ou anunciar que a exerce sem os requisitos necessários. A denúncia é referente a 38 vítimas e a Justiça ainda não decidiu se aceita, ou não, a denúncia.

"A cicatriz na perna está grande. O procedimento feito pela médica foi em janeiro e ainda tenho hematoma ao redor da região que foi feita a ampliação de margem desnecessária, mas maior do que a cicatriz física foi a psicológica. Na verdade, essa ainda não cicatrizou", afirmou a mulher.

"Fiz várias sessões de psicoterapia e ainda estou em tratamento medicamentoso, fazendo uso de medicamento controlado para melhorar dos danos psicológicos", relatou a vítima ao g1.

Samira e os demais pacientes acusam a médica de emitir falsos laudos de câncer de pele e indicar cirurgias desnecessárias.

Biscaia começou a ser investigada em março, quando pacientes suspeitaram de procedimentos cirúrgicos solicitados por ela. Pelo menos 31 pessoas formalizaram denúncia à Polícia Civil (PC-PR) que indiciou a médica no dia 21 de outubro.

"O sentimento é de que a justiça começou a ser feita. [...] Agora fica a esperança de que ao final do processo criminal, a médica de fato, seja condenada pelos crimes praticados e, principalmente, que seja impedida de continuar atuando", afirmou Samira ao g1.

Em nota, o advogado Valmor Antonio Weissheimer, que atua na defesa da médica, afirmou:

"A minha cliente sequer foi intimada, para exercer o direito ao contraditório; A Defesa encontra-se preparada com todas as teses defensivas, visando o esclarecimento dos fatos", diz trecho da nota.

Desde maio, uma Interdição Cautelar Total de 180 dias determinada pelo CRM-PR e aprovada pelo Conselho Federal de Medicina impede a médica de exercer a profissão.

<><> Áudio revela médica comemorando retirada de melanoma

Um áudio obtido com exclusividade pelo g1 Paraná em março deste ano, e que consta no inquérito encaminhado à Justiça, mostra o momento em que a médica Carolina Fernandes Biscaia Carminatti comemorou a retirada de um falso melanoma - tipo de câncer de pele mais agressivo - de Samira. A conversa foi gravada pela vítima em janeiro de 2024.

"Não sei se você é católica ou não, mas passa na igreja agradece a Deus, tem coisas assim que a gente tem que agradecer, sabe? Tem que agradecer, porque, como eu disse, a chance de pegar assim (melanoma), nesse estágio de que a gente só amplia a margem e está curada, é uma dádiva [...]. Não precisa se preocupar com metástase", afirmou a médica.

Samira conta que fez a gravação por precaução, pensando em repassar o material aos familiares, uma vez que ela teve melanoma em 2013 e este se tornou um tópico de preocupação. Ela pagou mais de R$ 5 mil à medica pelo procedimento.

A vítima contou que descobriu o falso diagnóstico após encontrar inconsistências no laudo apresentado por Carolina comparando com o documento retirado por ela diretamente no laboratório.

Depois da descoberta, a gravação e o laudo falso passaram a ser provas para a investigação da Polícia Civil que indiciou a médica.

"O indiciamento por parte da Autoridade Policial e a denúncia por parte do Ministério Público, já era algo esperado, primeiro porque são Instituições comprometidas em apurar crimes e, segundo porque eu sabia as inúmeras provas que eu tinha apresentado na delegacia e, assim como eu, as outras vítimas", afirmou Samira.

<><> Vítimas gastaram mais de R$ 130 mil

Conforme o delegado, as investigações identificaram que a médica examinava pintas e manchas dos pacientes e afirmava que algumas poderiam ser cancerígenas. Ela, então, fazia retirada de material e encaminhava para laboratório.

De acordo com a polícia, na reconsulta, ela apresentava ao paciente um laudo falso com diagnóstico de câncer de pele. O delegado disse que a falsificação era feita com máquina de xerox, no próprio consultório.

Além disso, a investigação apurou que documentos falsos eram colocados sobre os verdadeiros e, com a ajuda do equipamento, eram criadas novas versões de laudos.

As mais de 30 vítimas que denunciaram a médica Carolina Fernandes Biscaia gastaram mais de R$ 130 mil com cirurgias após falsos laudos de câncer de pele dados pela médica, afirmou o delegado Helder Lauria.

Além de emitir falsos laudos da doença, ela também indicou as cirurgias desnecessárias que totalizaram o valor indicado pela polícia. Conforme investigação, alguns procedimentos, individualmente, custaram R$ 13 mil.

Em março deste ano, o Conselho Regional de Medicina de Paraná (CRM-PR) puniu a médica com a chamada "censura pública" por anunciar ter especialidades que não possui.

Em consulta ao site do conselho, através dos números de registro profissional da médica no Paraná e em São Paulo, não são encontradas especialidades atribuídas à Biscaia. Nas redes sociais, a médica afirmava ser dermatologista.

Questionado pelo g1, o CRM-PR disse ter realizado todos os procedimentos investigativos e que os processos tramitam sob sigilo ético profissional, previsto no código de ética.

"Caso seja identificada alguma irregularidade, e que seja comprovada a violação da ética profissional prevista no Artigo 22 da Lei n° 3268/57, as punições vão desde advertência até a cassação do exercício profissional", afirmou a organização.

 

•        Veja os sintomas do câncer de pele no couro cabeludo

"Eles podem aparecer em diferentes tamanhos e formas; por isso, a prevenção e a detecção precoce são os melhores caminhos para evitar complicações", afirma a dermatologista Dra. Claudia Marçal, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia.

<><> Riscos do câncer de pele no couro cabeludo

O oncologista Dr. Ramon Andrade de Mello, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cancerologia e pós-doutor clínico no Royal Marsden NHS Foundation Trust e pesquisador honorário da Universidade de Oxford, alerta para os riscos do câncer de pele no couro cabeludo, especialmente se não for diagnosticado e tratado precocemente, pois há possibilidade de metástase para o cérebro.

"Apesar de não serem classificados como tumores cerebrais, as metástases cerebrais são tipos de câncer que chegam no cérebro após circular pelo corpo, e temos a impressão de que eles são até dez vezes mais comuns do que os tumores cerebrais justamente por termos muito mais diagnósticos de câncer de mama, pulmão, pele e intestino do que tumores no cérebro. É uma questão estatística", explica

<><> Proteção contra o melanoma

O tipo de câncer de pele com pior prognóstico é o melanoma e, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), para o triênio de 2023 a 2025, a estimativa de novos casos no Brasil é de 8.980, sendo 4.640 em homens e 4.340 em mulheres - esses valores correspondem a um risco estimado de 4,37 casos novos a cada 100 mil homens e 3,90 a cada 100 mil mulheres.

O oncologista explica que o melanoma é um câncer derivado das células pigmentares da pele. "É o tipo de câncer de pele mais mortal. Ele pode se espalhar para outras partes do corpo precocemente, quando as lesões ainda são muito pequenas", explica o Dr. Ramon Andrade de Mello.

O problema é mais suscetível em pessoas com cabelos muito finos, ralos e principalmente em calvos. A dermatologista Dra. Claudia Marçal afirma que os cabelos são uma proteção natural contra as radiações solares, porém, na medida em que os cabelos vão escasseando, perde-se essa proteção.

"Indico aplicar um protetor solar em spray para alcançar a área. Caso a pessoa seja calva, ela pode utilizar o mesmo produto aplicado no rosto, com FPS de, no mínimo, 30 e PPD 10, reaplicando a cada duas horas. Além disso, principalmente para quem trabalha exposto ao sol, deve-se usar bonés e chapéus", recomenda a médica.

<><> Sintomas do câncer de pele

Apesar do prognóstico ruim, a incidência de tumor nessa área não é tão grande quanto em outras. Dependendo do tipo de câncer de pele, os sintomas e a apresentação podem ser diferentes. Os cânceres de pele não melanoma, os mais comuns, costumam se apresentar com lesões de pele que não cicatrizam e parecem incomuns ou doem, sangram e formam crosta por mais de quatro semanas, segundo o oncologista.

"Já o câncer de pele melanoma é caracterizado por uma lesão que muda de forma, cor, tamanho, sangra ou desenvolve uma borda irregular", explica o Dr. Ramon Andrade de Mello. Por isso, é importante se atentar aos detalhes da mancha. "Uma nova grande mancha marrom na pele, às vezes contendo manchas escuras salpicadas; um novo ponto na pele que muda de tamanho, forma ou cor; uma ferida que não cicatriza; tudo isso pode ser sintoma de um câncer melanoma", diz a Dra. Claudia Marçal.

<><> Diagnóstico do câncer de pele

Uma das formas de acelerar o diagnóstico do câncer de pele é por meio do autoexame do tecido cutâneo, utilizando principalmente a regra de manchas e lesões ABCDE:

A: de assimétrica;

B: de bordas irregulares;

C: de cores desiguais;

D: de diâmetro maior que 6 milímetros;

E: de evolução - quando crescem aceleradamente.

"No couro cabeludo, essa detecção é mais difícil de ser feita individualmente, mas você pode pedir ajuda ao seu companheiro, familiar ou amigo. Basta alguns minutos, uma vez por mês, de preferência com luz natural, verificar alguma mudança na região. Normalmente, surge uma ferida pequena com casquinha que sangra facilmente", diz o Dr. Ramon Andrade de Mello.

Em todo caso, deve-se procurar orientação médica. "Além disso, se a ferida for maior que seis milímetros, se houver coloração dupla ou tripla e se não cicatrizar em quatro semanas, é fundamental procurar o médico imediatamente para obter um diagnóstico preciso e tratamento adequado que, normalmente, é cirúrgico para retirada total da lesão e deve ser realizado o mais precocemente possível", finaliza a Dra. Claudia Marçal.

 

Fonte: g1/Portal EdiCase

 

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