Caixa Asset: Presidente interino é sócio de
ex-assessor de Arthur Lira que foi alvo da PF
Nomeado na última
sexta-feira (1º/11) para assumir interinamente a presidência da Caixa Asset,
braço de gestão de fundos de investimento da Caixa Econômica Federal, Heitor
Souza Cunha é sócio, na LF Consultoria, de Luciano Ferreira Cavalcante,
ex-assessor do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). A
empresa tem sede no Lago Sul, em Brasília.
Presidente do União
Brasil de Alagoas, Luciano Cavalcante foi alvo da Operação Hefesto, da Polícia
Federal, desencadeada em junho de 2023 para investigar um suposto esquema de
desvio de dinheiro na compra de kits de robótica para a rede alagoana de ensino
com recursos do Ministério da Educação. O inquérito foi trancado e arquivado
pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes em setembro de
2023, sob o argumento de que houve “usurpação de competência” do STF, após a
Polícia Federal (PF) ter encontrado indícios de suposta participação do
deputado Lira no esquema.
A Agência
Pública esteve no endereço da LF Consultoria no Lago Sul, na manhã desta
segunda-feira (4). Uma secretária recebeu a reportagem e confirmou que a
empresa funciona no local. Disse também que Cavalcante e Cunha frequentam o
escritório “esporadicamente”. No momento em que a reportagem visitou o local,
ela informou que estaria sozinha na empresa.
Questionada sobre o
site com a relação dos serviços prestados pela companhia, a funcionária indicou
o site da
empresa, mas o endereço exibia um nome diferente: FCC Relações Governamentais.
Entre as atividades informadas, destaca-se a indicação de que faz “incidência
política”. “Somos uma empresa de relações governamentais especializada na
defesa de interesses em ambientes regulatórios complexos”, ressalta a empresa
no portal ao indicar fazer lobby junto ao governo e Congresso. “Nos Poderes
Legislativo e Executivo, identificamos tendências e desenvolvemos estratégias
para a defesa de interesses”, resume.
No mesmo endereço,
funciona também o escritório Maurício Carvalho Advogados, que pertence ao
advogado do deputado federal Arthur Lira, Luiz Maurício Carvalho e Silva. Ele
informou à Pública que apenas divide o imóvel com a LF Consultoria e
que as empresas não têm relação. “Não tem nenhuma relação, é só um rateio de
espaço físico”, afirmou Carvalho: “O Luciano é meu amigo de muitos anos já”.
Ex-assessor jurídico
da Codevasf, Carvalho também informa no portal de sua empresa de advocacia que
atua em relações governamentais e public affairs (assuntos
públicos), “perante os tomadores de decisão do Congresso Nacional e Poder
Executivo”.
O endereço divulgado
pela FCC e pelo escritório Maurício Carvalho Advogados é o mesmo registrado na
Junta Comercial do Distrito Federal como sendo a sede da LF Consultoria.
A reportagem deixou o
contato com a recepcionista do local para que Luciano e Heitor retornassem.
Enviamos os questionamentos para eles por meio de correio eletrônico, mas não
obtivemos retorno até a publicação.
Procurada, a Caixa
disse que “reforça o compromisso com as melhores práticas de governança e
integridade. A instituição adota mecanismos de compliance, estabelecendo
diretrizes que visam identificar e mitigar conflito de interesse de seus
empregados, assegurando a conformidade com as normas e valores que regem a
organização.”
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Ascensão na Caixa e parceria recente
Luciano Cavalcante
fundou a LF Consultoria em 16 de junho de 2023, apenas 15 dias após deflagrada
a operação da PF. Conforme dados da Junta Comercial, a empresa tem capital
social de R$ 100 mil e atua com gestão empresarial, publicidade, atividades de
intermediação e agenciamento de serviços e negócios.
Cavalcante, que possui
80% das cotas, administra a firma, de acordo com os registros públicos. Cunha
detém 20% das cotas desde 10 de abril deste ano, quando ainda ocupava o cargo
de consultor de dirigentes na Caixa Asset. Dois meses depois, em 4 de junho,
ele tomou posse como diretor executivo da diretoria de Distribuição e Produto.
Desde a sexta passada, responde interinamente pela presidência da Caixa Asset
enquanto ocorre a seleção do novo dirigente.
A Caixa Asset foi
criada em 2021 na gestão de Pedro Guimarães, durante o governo do ex-presidente
Jair Bolsonaro (PL). Cunha assumiu a vaga de Pablo Sarmento, destituído do
cargo após uma série de denúncias de abuso de poder que estão sendo apuradas
pela corregedoria interna, conforme revelou a
coluna da jornalista Malu Gaspar no jornal O Globo.
Sarmento também terá
de responder sobre a demissão de três servidores que se posicionaram contra uma
operação de R$ 500 milhões com o Banco Master, que virou alvo do Tribunal de
Contas da União (TCU).
No currículo publicado
no site da Caixa Asset, Heitor Souza Cunha informa que atuou como diretor da
rede de varejo da Caixa entre 2021 e 2022, foi superintendente nacional do
crédito e atuou em diversas funções de gestão na rede de varejo. Ele diz que foi
responsável pela liderança da rede durante o pagamento do auxílio emergencial e
que criou o produto antecipação saque-aniversário, “tornando a segunda maior
carteira de crédito comercial da Caixa”.
Desde novembro do ano
passado, o banco é dirigido por Carlos Vieira, indicado à presidência da Caixa
por Arthur Lira, após acordo do parlamentar com o presidente Luiz Inácio Lula
da Silva (PT).
¨
Luciano Cavalcante e uma rede familiar de
consultorias
Fora a LF Consultoria,
Luciano Cavalcante possui outras duas empresas do mesmo ramo em seu nome: a LDL
Serviços e Consultoria Ltda. e a L. F. Cavalcante Ltda. Além disso, as
atividades da empresa mantida com Heitor Cunha coincidem com o ramo de atuação
da empresa da filha de Luciano Cavalcante e do filho do deputado Arthur Lira, a
Omnia 360, que faz representação de mídia e fatura uma porcentagem dos negócios
firmados para seus clientes com as agências de publicidade contratadas pelo
governo.
A LDL Serviços e
Consultoria, fundada em março do ano passado, tem sede em Maceió e tem entre os
sócios o vice-presidente do União Brasil de Alagoas, Luiz Antonio da Silva
Ferreira Neto, e o empresário Davi Toledo Tenório de Amorim. O endereço da
companhia foi alvo de busca e apreensão na Operação Hefesto, conforme mostrou o
portal Metrópoles em junho de 2023.
Amorim tem sociedade
também com o policial civil Murilo Sérgio Jucá Nogueira, apontado pela PF como
dono do cofre em que foram apreendidos R$ 4 milhões durante a Operação Hefesto.
O sócio de Cavalcante e o policial têm negócios juntos na Ancol Anjos Engenharia
Indústria.
Já a L. F. Cavalcante
Ltda. foi aberta em setembro de 2023, em São Paulo, em um apartamento na rua
Serra de Jairé, bairro Quarta Parada. Além de atividades de consultoria em
gestão empresarial, de intermediação e agenciamento de serviços e negócios em
geral, a empresa também presta “atividades auxiliares dos seguros, da
previdência complementar e dos planos de saúde”, conforme registro na Receita
Federal.
A relação de Luciano
Cavalcante com a Omnia 360 é mais indireta. A filha dele, Maria Luiza Ferreira
Cavalcante, e Arthur Lira Filho, filho do presidente da Câmara, Arthur Lira,
são sócios na companhia de “representação de veículos de mídia” que também tem
entre suas atividades registradas na Junta Comercial a “consultoria em
publicidade”.
Entre as firmas
representadas pela Omnia estão a RZK Digital e a OPL Digital, que faturaram R$
5 milhões, entre julho de 2021 e novembro de 2023, com campanhas da Caixa,
mantida sob a influência de Arthur Lira após negociação com o governo petista,
conforme revelou a Pública.
Maria, mais conhecida
como Malu, ainda é sócia da Rocket Digital junto com Rodolfo Darakdjian –
proprietário da OPL Digital –, que também presta serviços para a estatal, de
acordo com os dados divulgados pela Pública.
Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, a OPL Digital e a RZK
Digital também atuaram em campanhas publicitárias da Secretaria de Comunicação
Social (Secom), dos ministérios da Saúde e Educação e do Banco do Brasil.
¨ “Um escândalo jamais visto”, afirma Giannazi sobre os leilões de
escolas estaduais em São Paulo
O governador de São
Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), realizou o leilão do segundo
lote da Parceria Público-Privada (PPP) Novas Escolas, que privatiza a
construção e gestão de unidades de ensino no interior do estado na última
segunda-feira (4).
Vencedor do leilão, o
Consórcio SP + Escolas terá de construir e administrar 16 escolas públicas em
sistema de Parcerias Público-Privadas e, para tanto, ofereceu a proposta mensal
de R$ 11,5 milhões.
“É um
escândalo jamais visto um governador leiloar escolas públicas na Bolsa de
Valores de São Paulo, na B3. Isso é um escândalo, é algo inaceitável, é
revoltante você ver algo acontecendo, porque nós estávamos acostumados
aqui em São Paulo com a privataria tucana, que já era terrível. Agora, nós
temos a privataria bolsotucana”, afirmou
o deputado estadual e diretor de escola pública, Carlos Giannazi (PSOL).
Convidado do programa
TVGGN 20H, Giannazi chamou a atenção ainda para o fato de que o edital permitia
a participação de empresas estrangeiras. “Olha só a gravidade da
situação. Isso significa, na prática, que o dinheiro do orçamento público do
povo do Estado de São Paulo seria direcionado também para empresas
internacionais, dinheiro do orçamento da educação.”
Para o deputado
estadual, trata-se de um projeto nefasto que complementa o programa de
privatizações de Tarcísio, que já entregou à iniciativa privada a Sabesp,
linhas da CPTM e metrô, além da Fundação Casa.
“Ele está
privatizando também áreas de pesquisa do Estado de São Paulo, na Secretaria da
Agricultura. Estou acompanhando o movimento lá em Campinas, no Instituto
Agronômico de Campinas. Ele está querendo vender uma fazenda, a Fazenda Elisa,
que é uma área de pesquisa importantíssima da agricultura, do café. Então, ele
vai vender uma, já em Pindamonhangaba”, ressalta
o entrevistado.
Giannazi lembra que as
privatizações só foram possíveis graças a uma lei aprovada por João Doria, para
permitir a venda de parques estaduais.
“Está em
curso no Estado de São Paulo a maior privataria de todos os tempos da história
do Brasil, porque são muitos ativos, muitos equipamentos públicos que estão na
lista. Inclusive, no semestre passado, nós tínhamos denunciado um site, não sei
se vocês acompanharam, que ele estava vendendo várias áreas públicas do Estado
de São Paulo. Aparecia até um prédio da rota, um prédio da Assembleia
Legislativa, que tinha preço. Era como se fosse uma imobiliária. Nós o
denunciamos e ele retirou do ar.”
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Reação
Para pôr fim ao
projeto de venda do patrimônio e empresas públicas do Estado é necessária a
mobilização popular. Porém, o paulista não parece engajado com a causa, que se
torna mote apenas de movimentos sociais e sindicatos.
“O
sindicato APEOESP recorreu, na semana passada, contra o primeiro leilão. Ganhou, por um dia, uma liminar de um juiz.
Imediatamente, o Tarcísio convenceu o presidente do Tribunal de Justiça (TJ) a
caçar a liminar. Durou um dia a nossa vitória sindical”, lamenta o
deputado estadual.
O que a população
talvez não saiba ainda é que a venda de escolas nada mais é, segundo o
entrevistado, que a entrega de dinheiro da educação para a iniciativa privada,
especialmente porque empresas privadas se guiam pelo lucro, não pela qualidade
do serviço prestado aos estudantes.
“A empresa
ganhadora vai receber do Estado, depois que ela construída a escola, R$ 11
milhões por mês. Para fazer a manutenção, pagar os funcionários que ela
contratar. Todo mês ela vai ganhar R$ 11 milhões. O outro leilão foi um preço
acima, acho que de R$ 14 ou R$ 15 milhões por mês. E é o dinheiro público que
vai enriquecer essas empresas, que não vão oferecer qualidade, que vão reduzir
o número de funcionários, porque elas precisam ter lucro, logicamente. Então,
ela reduz o número de funcionários e compra material mais barato para a
escola.”
A precarização dos
serviços nas escolas estaduais já é uma realidade, tendo em vista que as áreas
de alimentação e limpeza das escolas estaduais já são de responsabilidade de
terceirizadas. Como consequência, são frequentes as greves dos funcionários, que
reivindicam os pagamentos atrasados.
Existe, ainda, a
participação do crime organizado na gestão das creches da Prefeitura, segundo o
convidado.
“O crime
organizado controla algumas delas em algumas regiões. Inclusive, existe a marca
das creches que é investigada pelo Ministério Público, pela Polícia
Federal, que envolve o [prefeito] Ricardo Nunes. Tem aí uma investigação também
sobre o crime organizado controlando essas empresas.”
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Projeto pedagógico
Ainda que a proposta
inicial do leilão seja conceder à iniciativa privada apenas a gestão das
escolas públicas, para Giannazi a entrega também da área pedagógica é uma
questão de tempo, especialmente porque o atual secretário da Educação paulista,
Renato Feder, é dono da empresa Multi e já respondeu pelos colégios no
Paraná.
“A Multi
vende produtos eletrônicos para o próprio Estado, tem um contrato de R$ 200
milhões com a Secretaria da Educação, da qual ele é o secretário. Ele
paga a própria empresa. É uma contradição enorme. É um conflito de interesse
jamais visto”, aponta o convidado.
No Paraná, onde as
escolas foram entregues para empresas, os professores são contratados sem
concurso público. “Então, é a porta de entrada. A privatização desse
setor já é a porta de entrada para a privatização em geral. Nós, que somos da
educação, entendemos que não tem como dividir uma escola em parte
administrativa, em parte pedagógica. A escola é uma só. Tudo que acontece na
escola tem a ver com o projeto pedagógico. A merendeira, que vai ser
especializada, ela é uma educadora, porque ela se relaciona com os alunos. Ela
é incluída no projeto pedagógico da escola, o pessoal da alimentação, o vigia
da escola, o pessoal da limpeza também interage. Então, tudo é educação
dentro de uma escola pública, uma escola particular”, conclui
Giannazi.
Fonte: Por Alice
Maciel, da Agência Pública/Jornal GGN
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