A ilha da
vida real que inspirou a mais antiga história de viagem
O
céu assumiu o mais brilhante tom de azul do inverno sobre a cidade amarela de
Maó, na ilha de Menorca, na Espanha.
Todas
as construções são pintadas com tons de limão e cítricos, ocre, mostarda e
todos os tons intermediários.
Palmeiras
chacoalham ao vento e a estrada corta a montanha até o porto, onde os iates
aguardam o verão, com seu brilhante ar de superioridade.
Ao
longo da avenida central do comércio, as laranjeiras ainda estão repletas de
frutas. Pardais se reúnem nos seus galhos ao entardecer, para anunciar as
notícias do dia.
Conforme
a luz diminui, o ruído dos pássaros aumenta de volume. E, no pôr do sol, o
falatório é tão alto que você precisa levantar a voz para ser ouvido.
Cheguei
à ilha vindo da gelada Croácia, onde passei um mês com frio até os ossos.
Agora, em comparação, Menorca parece uma ilha tropical, com seu ar mais quente
e suave.
Ganhei
uma hora a mais de luz, com os dias mais longos da região. O otimismo trazido
pelo sol se espalha pelas ruas amarelas.
Sento-me
no alto terraço verde do Café Nou para observar de cima as laranjeiras com seus
pardais. Como uma tostada com tomate e leio sobre Mauricio Obregón (1921-1998),
historiador e professor universitário que dedicou grande parte do seu tempo a
traçar novamente as viagens antigas.
Obregón
acreditava que a ilha dos ciclopes, mencionada na Odisseia, poderia ser uma das
ilhas Baleares. Ou seja, a terra onde teriam perambulado os monstros de um só
olho poderia ser aqui, em Menorca.
Na
mitologia grega, Poseidon tem um caso amoroso com uma ninfa do mar que,
imediatamente, fica grávida. Nenhum deus grego nunca teve problemas com sua
contagem de espermatozoides.
A
criança cresce e se torna o mais forte de todos os ciclopes. Ele se torna
pastor e vive uma vida calma em uma ilha.
Depois
de escaparem por pouco da tentação das plantas psicodélicas na terra dos
comedores de lótus – e depois dos churrascos de carne de cabra na "ilha
repleta de maravilhas" –, Ulisses e 12 dos seus homens partiram em uma
expedição em busca dos ciclopes.
Segundo
a Odisseia, eles invadem a caverna do monstro, esperam que ele chegue e, em
mais um exemplo clássico de erro de avaliação, Ulisses exige um presente,
seguindo o protocolo existente entre anfitrião e visitante.
É
claro que o ciclope se recusa a dar um presente aos invasores da sua casa. Ele
os captura e se alimenta de parte da tripulação, entre uma saída e outra para
cuidar das suas ovelhas.
Ulisses,
astuto como sempre, elabora um plano. Ele serve bebida para o monstro, até que
ele adormece. Ulisses então espeta uma vara afiada no olho do ciclope e
consegue escapar com os tripulantes que ainda não tinham sido devorados.
Todos
eles chegam com segurança ao navio, quando Ulisses solta insultos para o
gigante, agora cego. O monstro atira furiosamente uma enorme pedra contra o
navio. Obviamente, ele erra o alvo, já que não consegue enxergar.
O
ciclope então pede ao seu pai que impeça Ulisses de voltar para casa. Em
resposta, "Poseidon se enfurece, implacavelmente".
O
deus vingativo, agora, tem sua própria vingança pessoal a fazer. Muito
inteligente, Ulisses!
• Entre praias e pássaros
Andei
de bicicleta pela ilha e encontrei enseadas rochosas perfeitas para nadar.
Nos
meus passeios, observei também pássaros em toda parte. Eles se moviam pelo ar
como notas musicais, dobrando suas asas em meio ao voo para cair e voltar para
cima.
Pássaros
brancos como as nuvens voavam em círculos sobre mim enquanto eu seguia de
bicicleta para o mar. Pássaros brancos e pretos com longas caudas pulavam pela
pista, voando bem a tempo para que eu passasse.
Aves
minúsculas se moviam entre os galhos baixos das oliveiras, com suas cabeças em
riste, olhos piscando e olhando uns para os outros e todos para mim. Fiquei
encantada, quase obsessiva. Ali estava um idioma que eu queria muito aprender.
O
ornitólogo local Javier passou a ser meu tradutor. Marquei um tour de
observação de pássaros, mas não havia mais ninguém, só eu.
Alto,
com cabelos escuros e sorriso tímido, sisudas calças de caminhada e mochila com
alças de segurança na altura do peito, Javier trazia dois pares de binóculos em
volta do pescoço e carregava um telescópio sobre o ombro.
A
felicidade consistia de uma bicicleta, pistas estreitas de terra para andar
devagar, um mar azul-turquesa rodeado de enseadas rochosas, um dia de sol e um
caderno para poder anotar tudo de novo que eu havia aprendido.
Pássaros
carvoeiros, falcões, mariposas malhadas, um roedor fazendo barulho em uma
árvore, um ninho de lagartas venenosas, uma ave de rapina colorindo o céu com
sua cauda vermelha.
Tento
anotar algo sobre o cheiro do calor nos pinheirais arenosos ou a forma das
esculturas criadas pelo mar, que deixou a madeira flutuante com a cor da areia
para depois depositá-la nas praias de inverno, com o olhar preciso de um
curador de arte.
Ali
estava eu, em constante movimento, pedalando em direção ao mar, passando por
burros em pequenos campos verdes e observando os pássaros. Eu me sentia mais
animal, mais emplumada, mais criatura.
• Onde encontrar a Odisseia em Menorca
Vila
pré-histórica de Torre d'en Galmés: Menorca possui uma das maiores
concentrações de sítios pré-históricos do mundo. Muitas pedras ainda estão de
pé e deram origem a lendas de que, um dia, a ilha teria sido habitada por
gigantes. Você pode imaginar um ciclope de um olho só passeando por este sítio
arqueológico.
Observação
de pássaros: na Odisseia, as aves são mensageiras dos deuses. E Menorca é um
excelente local para observação de pássaros, já que fica na sua rota de
migração entre a Europa e a África.
Praias
ideais para deusas gregas: Cala Mitjana e Cala Mijtaneta são praias selvagens,
particularmente adoradas pelos moradores de Menorca.
Fonte:
BBC Travel
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