Descoberta
a origem da gagueira no cérebro
A
gagueira costuma gerar muito estresse para os afetados, sobretudo porque outras
pessoas costumam reagir de forma desrespeitosa, agressiva ou incorreta a esse
distúrbio da fala. As repetições involuntárias de sílabas e sons, o alongamento
de fonemas e os bloqueios perceptíveis ou "silenciosos" podem trazer
insegurança para quem sofre do problema. O mal-estar também pode se tornar
fisicamente perceptível, através de rubor ou suor.
No
entanto, a gagueira não permite tirar conclusões sobre o caráter ou a
inteligência dos afetados. Quem gagueja sabe exatamente o que quer dizer, mas
não consegue expressar isso de maneira fluente no momento.
Por
muito tempo, a gagueira foi vista como um distúrbio psicológico ou emocional.
Trata-se, porém, de um distúrbio da fala de origem neurológica que afeta a área
do cérebro responsável pela regulação da produção da linguagem.
• Encontrada a origem da gagueira
Pesquisadores
finlandeses acreditam agora ter localizado a região do cérebro onde ocorre a
gagueira. Em pessoas que gaguejam, foram descobertas mudanças estruturais em
junções de uma determinada rede cerebral.
Segundo
a equipe liderada por Juho Joutsa, da Universidade de Turku, seu centro fica na
área do putâmen. O putâmen é uma das áreas centrais do telencéfalo [composto
pelo córtex cerebral e pelos núcleos da base] e faz parte da substância
cinzenta do cérebro. Ele é particularmente importante para as habilidades
motoras faciais, ou seja, expressões faciais.
• As diferentes causas da gagueira
O
distúrbio da fala pode ter diversas causas. Existe uma predisposição genética
que pode – embora não necessariamente – levar à ocorrência da gagueira. Além
disso, doenças neurológicas como Parkinson ou derrames podem causar o
distúrbio. Para o estudo, os pesquisadores finlandeses também examinaram
pacientes que começaram a gaguejar após um acidente vascular cerebral. O
acidente vascular cerebral afetou apenas a parte do cérebro onde está
localizada a rede cerebral em questão.
Os
participantes mostraram as mesmas mudanças estruturais nas junções desta rede
cerebral que aqueles entre os quais a gagueira se desenvolveu já na infância.
Segundo o estudo, isso mostra que a gagueira sempre surge nessa rede,
independentemente de causas genéticas ou neurológicas.
• Novos métodos de tratamento?
"O
estudo finlandês confirma de forma impressionante que o hemisfério cerebral
esquerdo é crucial na codificação da fala e na tradução de pensamentos para a
fala e a linguagem falada", afirma o professor Martin Sommer, médico-chefe
e diretor do Grupo de Trabalho Interdisciplinar sobre Distúrbios de Fluência do
Departamento de Neurologia do Centro Médico Universitário de Göttingen (UMG). O
estudo também mostra que as duas formas de gagueira, a gagueira neurogênica, ou
seja, causada por um acidente vascular cerebral, e a gagueira na primeira
infância, não diferem muito, segundo Sommer, que além de ser ele próprio
afetado pela gagueira, também fornece aconselhamentos através da Associação
Federal para Gagueira e Autoajuda (BVSS, na sigla em alemão).
Até
o momento, não existem métodos de tratamento farmacológicos ou neuromoduladores
eficazes contra a gagueira. Mas segundo os pesquisadores finlandeses, a
localização da mudança estrutural abre portas para novas opções terapêuticas,
como a estimulação cerebral profunda dirigida a esta rede cerebral.
O
neurofisiologista Sommer acolhe com satisfação a nova abordagem de pesquisa,
mas alerta: "É certamente possível derivar um tratamento a partir disto,
mas são necessários alguns passos intermediários para compreender onde é
necessário fixar qual eletrodo e com que polaridade. Isso não é assim tão fácil
assim e ainda não chegamos lá", ressalta.
• Gagueira: mais comum do que se pensa
Na
Alemanha, com quase 84 milhões de habitantes, estima-se que 800 mil pessoas
gaguejam permanentemente. Mais de 5% das crianças pequenas gaguejam, ou seja,
cerca de 50 em cada mil crianças, sendo que meninos são afetados com mais
frequência do que as meninas.
A
gagueira geralmente começa repentinamente entre os 2 e os 6 anos de idade,
geralmente desaparecendo por si só nos dois anos seguintes. Mas cerca de 1% das
pessoas afetadas continua a gaguejar na vida adulta.
• Como a gagueira é tratada?
Medicamentos,
terapias respiratórias ou de relaxamento ou quaisquer outras terapias de cura
não são realmente eficazes contra a gagueira. "Ainda existem ofertas de
tratamento duvidosos que prometem curas milagrosas, por isso é preciso ter
cuidado”, alerta Sommer.
"Mesmo
a gagueira mais grave pode ser evitada com métodos simples, como a fala com
metrônomo, mas a gagueira, neste caso, não desaparece, está apenas camuflada
atrás de um modo de fala modificado. E quem quer falar assim o dia todo? Então
é necessário ter cuidado para não cair nas mãos erradas", avisa o
especialista.
• Mudando o comportamento da fala
No
entanto, há dois métodos de terapia da gagueira que são eficazes e também podem
ser combinados: modelagem da fluência (Fluency Shaping) e modificação da
gagueira. Ambos os métodos se "baseiam na ideia de que o controle
consciente do processo muscular da fala na laringe e na boca permite um uso
suave da voz como profilático ou quando ocorrem sintomas de gagueira”, explica
a terapeuta de gagueira Frauke Kern.
Tais
métodos podem reduzir a duração e a gravidade do sintoma real e reduzir o medo
da gagueira, recuperando o controle sobre o processo de fala, diz Kern. Ela faz
parte do conselho federal da Associação Federal Alemã de Fonoaudiologia.
O
método de modelagem de fluência muda a maneira como se fala, por exemplo,
usando uma "voz suave" no início de uma palavra ou alongando
conscientemente uma sílaba ou um som. O objetivo deste método é evitar a
ocorrência de gagueira ao falar.
Já
com o método de modificação da gagueira, os afetados aprendem as chamadas
técnicas de liberação de bloqueio para sair de uma situação estressante
"de forma controlada e um tanto administrável. Este é um método
interessante que envolve, por assim dizer, conhecer eventos de gagueira",
diz o neurofisiologista Sommer. Isso reduz a tensão e supera o momento de
gagueira. A vantagem desta técnica, segundo a terapeuta Kern, é que ela
preserva a fala natural.
• Enfrentando o desafio
Por
vergonha ou medo de se expor, muitos afetados acabam evitando certas palavras
ou situações de fala. Isto pode fazer com que quem sofre de gagueira se retire
da vida quotidiana e fique socialmente isolado.
Pessoas
que gaguejam, portanto, também aprendem a enfrentar situações difíceis. "O
maior perigo quando se gagueja é ficar de boca fechada, e muita gente faz isso.
Mas é uma pena, porque quem fica de boca fechada não é visto ou ouvido. Quem
fica calado não vai muito longe. Esse comportamento de evitar exposição é
lamentável porque limita significativamente as oportunidades de desenvolvimento
das pessoas. É por isso que é importante não ficar de boca fechada, mas dizer o
que se quer dizer”, aconselha o neurologista Sommer.
Grupos
de apoio também podem ajudar a superar o medo de falar. Lidar com a gagueira de
forma aberta e confiante entre familiares, amigos ou colegas de trabalho também
costuma ser útil.
• O que de fato não ajuda?
As
pessoas que gaguejam não precisam de conselhos – nem mesmo os
bem-intencionados. Elas não precisam respirar fundo, concentrar-se ou se
acalmar. Conselhos como esses só servem para irritar ou deixar os afetados
ainda mais inseguros.
"O
melhor é esperar, observar e ouvir. Quem gagueja precisa de mais tempo, é assim
mesmo! Sempre tem gente que tenta continuar a palavra ou a frase. Em primeiro
lugar, interromper alguém é muito ofensivo. Além disso, talvez nem seja isso
que eu realmente quisesse dizer. Então fica complicado", diz Sommer.
Fonte:
Deutsche Welle
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