HIV:
o “genocídio planejado” de Milei na Argentina
O
governo de Javier Milei na Argentina é a história local de uma realidade
global. A “nova direita”, que representa a aliança entre grupos
ultraconservadores e antidireitos e o desenvolvimento de uma política econômica
e social que estigmatiza, exclui e busca destruir as minorias, é um fenômeno
que vemos nos Estados Unidos de Donald Trump e vimos no Brasil de Jair
Bolsonaro.
O
governo de Milei se sentiu validado e até apoiado pela posse de Trump nos EUA,
de Giorgia Meloni na Itália e de Nayib Bukele em El Salvador, o que, como foi
observado em vários comunicados à imprensa, reforça seu discurso e encoraja
suas ações.
Na
Argentina, o governo de Javier Milei constrói sua narrativa rotulando todos os
que não concordam com suas políticas cruéis como uma casta, como criminosos, e
se orgulha de cortar direitos. O discurso de rejeição da “Agenda 2030” e do que
eles chamam de movimento “woke”, bem como a forte rejeição da agenda feminista
e LGBT+, levou ao fato de que membros da força política à qual Javier Milei
pertence associaram a homossexualidade a doenças ou patologias e a
comportamentos desprezíveis ligados ao abuso. Mais recentemente, o mundo ficou
horrorizado ao ouvir o presidente Milei se referir ao coletivo LGBT+ como
pedófilos e abusadores, no Fórum Econômico Mundial em Davos.
Nas
políticas públicas, desde que Javier Milei assumiu o cargo em dezembro de 2023,
estamos enfrentando um cenário de ajustes e cortes nos direitos pelos quais
lutamos. As pessoas com HIV, tuberculose e hepatites virais estão sofrendo
violações de seus direitos, e todos nós estamos ameaçados e em risco.
O que
já foi mencionado na declaração é um fato político, se reflete e se amplia na
gestão de políticas públicas do Ministério da Saúde Nacional – que na Argentina
é o órgão que rege as políticas de saúde relacionadas à prevenção e ao
atendimento integral do HIV, das hepatites virais e da tuberculose, incluindo a
compra de tratamentos.
·
Plano
de Milei é cortar verbas da resposta ao HIV…
De
acordo com a lei argentina, o poder executivo deve enviar um projeto de
orçamento ao Congresso para discussão. O governo apresentou um projeto de lei
que propunha uma redução de 76% no orçamento alocado ao Programa Nacional de
Resposta Integral ao HIV, Hepatite, ISTs e Tuberculose.
Diante
das críticas sobre esse ponto – e outros – Javier Milei decidiu não tratar do
projeto e, por meio do Decreto 1131/2024, prorrogou o orçamento aprovado em
2023 pelo segundo ano consecutivo, fazendo um corte de fato. Isso em um
contexto em que os casos de tuberculose aumentaram em quase 20%, a sífilis
continua a crescer exponencialmente, as novas notificações de HIV e a
mortalidade por AIDS também estão aumentando, e a hepatite viral continua a ser
uma das infecções mais prevalentes no país.
Vale
mencionar que essa extensão não tem precedentes na história constitucional da
Argentina, e vários especialistas apontam que ela é inconstitucional.
- … e também
destruir departamentos-chave
Nosso
país tem sido pioneiro em políticas públicas de resposta ao HIV. Na década de
1990, com uma lei avançada na época que garantia a resposta a partir de uma
perspectiva biomédica. Desde a nova Lei Nacional 27.675 sobre Resposta Integral
ao HIV, Hepatites Virais, outras Infecções Sexualmente Transmissíveis e
Tuberculose, aprovada em 2022, as pessoas com HIV, hepatite e tuberculose
alcançaram uma resposta mais abrangente. Agora, também consideram-se os
determinantes sociais das doenças, que devem ser garantidos pelas políticas
públicas desenvolvidas pelo Ministério da Saúde da Nação, como autoridade
implementadora.
Desde a
posse de Milei, houve mudanças de funcionários e improvisações típicas de um
governo que veio para destruir. Por meio do Decreto 1138/2024, 15 diretorias e
coordenações importantes do Ministério da Saúde foram fechadas, incluindo as de
Tuberculose, Hanseníase e Hepatites Virais.
Isso
constitui um ataque direto aos direitos humanos e afeta particularmente as
comunidades mais vulneráveis, em um contexto em que os diagnósticos de HIV e
tuberculose continuam a aumentar e a hepatite viral continua a ser prevalente.
Esses departamentos não só eram encarregados de adquirir e distribuir
medicamentos e tratamentos para as pessoas em todo o país, planejar e
implementar ações de prevenção, mas também de realizar estimativas e estudos
sobre as populações mais vulneráveis, o que permitiu a elaboração de
estratégias de intervenção eficazes.
O
ministro da Saúde de Milei, Mario Lugones, também efetivou a demissão de 40% da
equipe da Diretoria de Resposta ao HIV, Hepatite e Tuberculose na última semana
de janeiro. Profissionais que há anos contribuíam com sua experiência e
dedicação para a resposta sustentada a essas pandemias foram demitidos,
restando apenas uma pessoa na área de tuberculose e duas
pessoas com perfil administrativo na área de hepatite. Essas demissões
se somam às 1.400 que o sucateamento do Ministério da Saúde e Saúde Pública implica.
- Governo quer
fugir de suas responsabilidades
Na
Argentina, garantir o fornecimento de tratamento de HIV é uma obrigação do
Estado Nacional, conforme definido na Constituição, na lei anterior de HIV e
sustentado pela atual Lei 26.675 – que é superior à sua antecessora, a agora
revogada Lei 23.798 (1990) e que tem como antecedente uma decisão da Suprema
Corte – Sentença Benghalensis (2000).
As leis
sobre HIV definem a necessidade de uma política pública homogênea com
diretrizes comuns para todo o território nacional. Centralizam as principais
decisões políticas, como a definição dos padrões de tratamento antirretroviral
e a compra de medicamentos e suprimentos, a serem tomadas pelo Ministério da
Saúde Nacional. Essa responsabilidade sempre foi assumida pela pasta, mas agora
o governo de Milei a está ignorando e pretende delegar essa função às
províncias, prejudicando assim o uso otimizado dos recursos públicos e a
igualdade de acesso em todo o país.
A
centralização das compras em escala nacional implica em agregar demanda e
facilitar a negociação de melhores preços para os produtos, e vários estudos
mostram a vantagem de agregar a demanda. Mas o governo pretende se desfazer
dessa responsabilidade, de fato, e em uma manobra antecipada tem sido utilizado
o espaço do Conselho Federal de Saúde (COFESA) para fornecer treinamento às
províncias para a gestão de compras por meio do Fundo Estratégico da OPAS.
- Saída da OMS
O
governo de Javier Milei tomou a decisão de retirar a participação da Argentina
na OMS. Essa decisão (que, de acordo com o porta-voz da presidência, foi
apoiada pela administração da saúde durante a pandemia da covid-19) nada mais é
do que uma tentativa de se aproximar do presidente dos Estados Unidos e mais um
passo em direção ao genocídio em andamento que representa a política de saúde
desse governo.
Essa
decisão só pode ser lida em seu contexto: esvaziamento da Diretoria de Resposta
ao HIV, Hepatite e Tuberculose, redução do orçamento para essas doenças e
demissões em massa no Ministério da Saúde Nacional que colocam as pessoas com
essas doenças em risco de vida.
A OMS
tem o papel de direção internacional em questões de saúde e seu objetivo é a
cooperação técnica dentro de uma estrutura multilateral do sistema das Nações
Unidas. A saída da Argentina da OMS nos deixaria impossibilitados de participar
da definição de políticas públicas, da colaboração, do apoio à resposta a
doenças, do acesso a vacinas, enfraqueceria a abordagem de doenças raras e nos
enfraqueceria em termos de preparação e organização diante de futuras
pandemias.
Especificamente
sobre HIV, hepatite e tuberculose: muitas das compras feitas pelo Ministério da
Saúde são internacionais, onde há os melhores preços disponíveis. A queda nas
compras internacionais significa colocar em risco a vida de 66 mil pessoas.
A saúde
e a vida das pessoas com HIV, hepatite e tuberculose estão em risco devido ao
esvaziamento e ao desmantelamento da Saúde Pública pelo governo Milei.
Convidamos
organizações, indivíduos e a comunidade internacional de HIV, hepatites virais
e tuberculose a denunciar e tornar visível o que está acontecendo na Argentina
sob o governo Milei.
Estamos
testemunhando o planejamento de um genocídio.
Fonte:
Por Fundação GEP, da Argentina, para Outra Saúde
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