Marcelo
Uchôa: "O que me impressiona na defesa de Bolsonaro é a covardia"
O
jurista Marcelo Uchôa participou
do Fórum Onze e Meia desta
terça-feira (25) para comentar o julgamento
histórico do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete
acusados por tentativa de golpe de Estado e outros
crimes. O julgamento é realizado na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na
primeira parte, o ministro Alexandre de Moraes apresentou a denúncia e citou
todos os crimes pelos quais Bolsonaro e aliados irão responder. Em seguida, a
defesa de cada um dos oito acusados fez sua sustentação oral.
Uchôa
analisou que a única forma de defesa é justamente cada advogado jogar a culpa
do seu cliente para outro acusado, uma vez que a materialidade do crime
está comprovada e é "indiscutível", de acordo com o jurista.
Assim, a discussão que é feita no STF é em relação à autoria dos crimes.
O
jurista também analisou que uma eventual defesa de um acusado nesta situação é
a tentativa de tirar a credibilidade das provas apresentadas. Porém, Uchôa
destacou que essas questões já foram discutidas em sessões anteriores do
STF. "Além disso tudo, a investigação da Polícia Federal é muito robusta,
e do Ministério Público mais ainda. As provas estão nos autos, tem minuta de
golpe, tem áudio de pessoas tramando, áudios explicativos, anotações de agenda,
anotações pessoais falando o que fazer para matar o presidente, o vice. Tem
documentos que revelam a discussão sobre campos de prisioneiros. Então, é muito
difícil alguém sair dessa discussão não tendo a denúncia aceita", analisou
o jurista.
Em
relação especificamente à defesa do ex-presidente Bolsonaro, Uchôa afirmou que
ficou impressionado com a "covardia" do advogado. "Especialmente
com Mauro Cid, que era o braço direito dele [Bolsonaro] nessa trama, era um
camarada que pela pontuação da própria PGR, era um camarada que fazia a
interlocução entre aquele pequeno grupo e o oficialato das Forças Armada, e ele
agora foi abandonado pelo Bolsonaro", disse.
Uchôa
ainda acrescentou que a única defesa do ex-presidente é utilizar as narrativas
em defesa dos golpistas condenados, como a história de Débora dos Santos, e a
defesa pela anistia. "Eles jogam esses factoides que não são
jurídicos", disse o jurista. Para Uchôa, o pedido de anistia
também é uma comprovação do crime de tentativa de golpe, e que serão essas
"contradições" que irão condenar todos os acusados.
"Juridicamente, Bolsonaro
vai ser não só transformado em réu, mas condenado. E, não por acaso, mas porque
tem um motivo. Ele foi o chefe da trama, ele esteve antes, durante e depois,
sempre em primeira mão sendo informado, seria o principal beneficiado",
avaliou Uchôa.
O
jurista acrescentou afirmando que o papel da defesa do ex-presidente é de
"enxugar gelo". "Mas a gente sabe que ele está prestes a pagar
as contas dele, principalmente desses cinco crimes que são muito
importantes", afirmou. Os crimes pelos quais Bolsonaro e os outros sete
indicados foram acusados são: organização criminosa armada, tentativa de
abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano
qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
Uchôa
ainda destacou o papel de Bolsonaro na história do país em relação à
ditadura militar e à anistia aos golpistas de 1964.
"Bolsonaro
é a própria comprovação de que a anistia a um golpista é um fracasso. Porque
foi a anistia aos golpistas de 64 a 85 que permitiu que agora eles tentassem um
novo golpe. Inclusive o Bolsonaro, que é um apologista de torturador, não teria
tido coragem [de tentar um golpe] se lá atrás a gente tivesse feito o que está
sendo feito neste momento pelo STF, que é colocar no banco dos réus e condenar
[golpistas]".
O
jurista também afirmou que o julgamento no STF "testemunha que
as instituições estão funcionando e que o Judiciario entendeu perfeitmente
o erro de anistiar lá atrás a turma que deu golpe".
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Prisão preventiva para Bolsonaro
O
jurista ainda analisou os pedidos de prisão preventiva contra Bolsonaro e
declarou que o ex-presidente já deveria ter sido preso preventivamente ou,
pelo menos, estar usando tornozeleira. Isso porque Bolsonaro convocou atos para
atacar o STF, já dormiu na embaixada da Hungria e já falou em viajar para
os Estados Unidos, o que comprova "que ele já apontou de todas as
formas que ele é capaz de fugir e de obstruir a Justiça", segundo
Uchôa.
Na
opinião do jurista, esses pedidos de prisão e tornozeleira já eram para ter
sido aceitos, mas não são impossíveis de ocorrer no futuro "se realmente
ficar demonstrado que Bolsonaro está tentando utilizar a opinião pública como
massa de manobra para evitar que a Justiça aconteça".
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"Não julgamos pessoas, julgamos fatos e provas”, diz
Flávio Dino
Durante
a sessão da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal (STF)
nesta terça-feira (25), que avalia se Jair Bolsonaro e aliados se
tornarão réus por tentativa de golpe de Estado, o ministro Flávio Dino recorreu à
literatura para rebater a tese de perseguição política levantada pela defesa do
ex-presidente.
Dino
citou o clássico O Estrangeiro (L’Étranger, 1942), de Albert
Camus, para ilustrar a diferença entre um julgamento baseado em provas e um
julgamento moralista e subjetivo.
"Aqui
não é o livro de Albert Camus, ‘O Estrangeiro’, em que o personagem foi julgado
porque não chorou no enterro da mãe. Não importa se ele chorou ou não no
enterro da mãe, não importa se ele tem supostamente boa ou má índole. O que
importa é o fato concreto e se ele foi provado", afirmou.
A
citação remete à trama do romance, no qual Meursault, um homem indiferente às
convenções sociais, é condenado não apenas pelo crime que cometeu, mas por sua
falta de emoção.
Segundo
Dino, essa abordagem não pode ser aplicada ao direito penal, deixando claro que
Bolsonaro não está sendo julgado por seu comportamento ou postura política, mas
pelos fatos e provas apresentadas.
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As etapas do julgamento e a necessidade de provas concretas
O
ministro destacou a importância de seguir as etapas do processo penal,
diferenciando três níveis de cognição jurídica:
- Juízo de
plausibilidade –
Quando se avalia se há indícios mínimos para iniciar uma ação penal.
- Juízo de
verossimilhança –
Quando a análise das provas se aprofunda para verificar a consistência da
denúncia.
- Juízo de certeza – Estágio
final do julgamento, no qual é possível determinar, com segurança, a culpa
ou inocência do acusado.
Dino
enfatizou que o julgamento de Bolsonaro ainda está na transição entre
plausibilidade e verossimilhança, ou seja, não é o momento de determinar uma
sentença definitiva, mas de avaliar se há elementos suficientes para abrir um
processo penal.
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Direito à defesa e acesso às provas
Outro
ponto abordado no voto do ministro foi a defesa do princípio da paridade de
armas, que garante que acusação e defesa tenham acesso igualitário às provas.
Ele criticou a tese de que todos os documentos deveriam estar disponíveis desde
o início, argumentando que isso tornaria a instrução processual desnecessária.
"Se
todos já conhecessem todos os documentos e o contraditório já tivesse se
verificado, então para que a instrução processual?", questionou Dino,
respondendo a um dos argumentos da defesa.
Além
disso, rechaçou alegações de ocultação de provas, explicando que o processo
segue um encadeamento lógico de atos que permite à defesa ter acesso
progressivo aos elementos da investigação.
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Serendipidade e pesca probatória: os limites da investigação
Dino
também explicou a diferença entre dois conceitos jurídicos relevantes em
investigações criminais:
- Pesca
probatória –
Quando não há um objetivo específico, e os investigadores lançam redes
amplas sem uma hipótese concreta.
- Serendipidade – Quando,
durante uma investigação legítima, surgem novas provas ou indícios de
crimes distintos dos inicialmente apurados.
O
ministro afirmou que o caso em questão não se trata de pesca probatória, pois
há uma hipótese investigativa concreta, e as provas foram obtidas dentro dos
limites legais.
"Aqui
não ocorreu um processo inquisitorial do tipo ‘fulano é culpado, mas não
sabemos bem de quê’. O que houve foi um encadeamento de hipóteses que
justificam a busca da verdade dentro da legalidade."
O
julgamento se baseia em fatos, não em impressões pessoais
Ao
finalizar seu voto, Dino reiterou que o julgamento deve ser técnico e baseado
em provas, e não em critérios subjetivos ou políticos. Ele reforçou que
Bolsonaro e os demais acusados não estão sendo julgados por suas
personalidades, mas pelos fatos e evidências documentadas no processo.
"Nós
não julgamos pessoas, julgamos fatos e provas. Como temos um padrão probatório
mínimo, podemos avançar, e no curso da instrução todos os documentos serão
adequadamente escrutinados."
A
declaração foi interpretada como um recado direto à narrativa bolsonarista de
perseguição política, desmontando a retórica de que o ex-presidente estaria
sendo julgado por suas opiniões ou posicionamento ideológico, e não por sua
participação em um suposto plano golpista.
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Camus, o absurdo e a indiferença da vida
O uso
de O Estrangeiro como referência jurídica por Dino também despertou interesse
para a obra de Albert Camus, um dos principais filósofos do século 20.
O
romance, publicado em 1942, acompanha Meursault, um homem apático e
indiferente, que é julgado não apenas por um assassinato que cometeu, mas por
sua frieza no funeral da mãe. Seu destino é selado mais por sua atitude
emocionalmente distante do que pelos fatos concretos do caso, evidenciando um
julgamento moralista e subjetivo.
Camus,
em suas obras, desenvolveu o conceito de absurdismo, defendendo que a vida não
tem um sentido intrínseco e que o ser humano deve aceitar essa falta de
significado sem recorrer a ilusões metafísicas ou morais.
No
contexto do julgamento no STF, a citação de O Estrangeiro por Flávio Dino
serviu para reforçar a importância de um julgamento baseado em provas, e não em
interpretações subjetivas da conduta do réu.
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Um recado claro contra o "mimimi" bolsonarista
A fala
do ministro Flávio Dino é um um antídoto contra a narrativa bolsonarista de
perseguição política.
A
decisão da Primeira Turma do STF pode marcar um passo importante na
responsabilização de Bolsonaro e aliados pelo 8 de janeiro e a tentativa de
golpe, reforçando que o sistema de justiça não se baseia em ideologia ou
preferências pessoais, mas em evidências e no devido processo legal.
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Defesa de Bolsonaro ataca delação de Cid e diz que
ex-presidente ajudou Múcio com militares
Representando
o corpo de advogados de Jair Bolsonaro (PL), Celso Vilardi atacou frontalmente
a delação do tenente coronel Mauro Cid dizendo que o ex-ajudante da Presidência
"mentiu, omitiu e se contradisse" em depoimentos à Polícia Federal
(PF).
Vilardi
ainda citou uma suposta articulação que teria sido feita por Jair Bolsonaro com
José Múcio Monteiro no início de dezembro de 2022, quando, segundo ele, as
Forças Armadas não atendiam o então ministro da Defesa escolhido por Lula.
Ao
falar sobre Cid, o advogado lembrou o vazamento de conversas do militar
publicados pela revista Veja, em que ele teria feito um "desabafo"
sobre os depoimentos feitos no acordo de delação.
"É
o fato de que o delator rompeu com o acordo quando vazou a delação. E saiu na
revista Veja", lembrou Vilardi.
Ao
chamar Cid para esclarecimentos, segundo o advogado, "a Polícia Federal
diz que ele mentiu, omitiu e se contradisse".
"Segundo
a Polícia Federal ele mentiu, omitiu e se contradisse. E então há uma audiência
para que ele tivesse oportunidade de se corrigir. Mas aí, com todo respeito, há
uma inversão porque na verdade não é o Estado que foi buscar as provas de
corroboração do que ele disse. Ao contrário, o Estado trouxe indícios e ele
[Cid] se adequa aos indícios trazidos pelo Estado", afirmou Vilardi.
O
advogado então focou a defesa no 8 de Janeiro, afirmando que "não é
possível que se queira imputar a responsabilidade ao Presidente da República, o
colocando como líder de uma organização criminosa, quando ele não participou
dessa questão do 8 de Janeiro. Pelo contrário ele a repudiou".
Em
seguida, como "prova" de que Bolsonaro estaria colaborando com a
transição do governo, ele citou uma suposta intermediação feita pelo
ex-presidente para que Múcio fosse atendido pelos militares.
Segundo
ele, Bolsonaro "socorreu o ministro da Defesa nomeado pelo presidente Lula
porque o comando militar não o atendia".
"Foi
o presidente [Bolsonaro] quem determinou que eles atendessem o ministro da
Defesa que assumiu em 1º de janeiro. Portanto, ministro, não é possível que se
queira dizer que é compatível com uma tentativa de golpe com uso do comando
militar quando o presidente da República autoriza a transmissão do poderio
militar no começo de dezembro", disse Vilardi, pedindo a rejeição da
denúncia contra Bolsonaro.
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Moraes humilha defesa de Bolsonaro ao desmenti-la durante
julgamento
As defesas
do ex-presidente e dos outros acusados utilizaram a tática de desqualificar a
Primeira Turma da Corte e de afirmar que não tiveram acesso às provas das
acusações.
Durante
a sua fala, na segunda parte do julgamento que pode tornar Bolsonaro e os
outros 7 indiciados, caso a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR)
seja aceita pela Corte, o ministro Alexandre de Moraes humilhou a defesa de
Bolsonaro e dos outros acusados ao desmontar e desmentir a tese de que não
tiveram acesso às provas colhidas durante a investigação.
“Quem
tem de comprovar cada fato imputado, sem dúvida razoável, é o Ministério
Público. E não me parece que o Ministério Público tenha utilizado qualquer
prova ou indício a que a defesa não tenha tido acesso, também. Até porque todos
os advogados, mesmo que em determinado momento as pessoas físicas dos advogados
fossem outras, acompanharam desde sempre as investigações”, declarou
Moraes.
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Moraes destrói história de “velhinhas com bíblia” e expõe golpistas
A
segunda parte do julgamento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF)
contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros 7 indiciados (Núcleo 1)
pela tentativa de golpe de Estado, organização criminosa e abolição violenta do
Estado Democrático de Direito foi marcada pela fala do ministro Alexandre de
Moraes sobre as teses do ex-presidente e de seus apoiadores sobre o ocorrido no
fatídico dia.
Durante
a sua fala, Moraes desmontou a tese de que as pessoas que participaram da
tentativa de golpe de Estado no dia 8 de janeiro de 2023 estavam "dando um
passeio no parque" e que boa parte do público era composto "por
senhorinhas com a Bíblia nas mãos".
"Aproveito
para desfazer uma narrativa totalmente inverídica. Até um dos advogados usou a
tese da Terra plana. Se criou uma narrativa que, assim como a Terra seria
plana, o STF estaria condenando 'velhinhas com a Bíblia na mão', que estariam
passeando em um domingo ensolarado pelo Supremo Tribunal Federal, pelo
Congresso Nacional e pelo Palácio do Planalto. Nada mais mentiroso do que isso.
Seja porque ninguém estava lá passeando, e as imagens demonstram",
declarou Alexandre de Moraes.
Em
seguida, Alexandre de Moraes mostrou um quadro com as condenações, que revela
que as pessoas com mais de 50 anos julgadas e condenadas representam a minoria.
"Das 497 condenações, só 43 têm mais de 60 anos. E, na verdade, se nós
pegarmos mais de 70 anos, são 7 condenados. A grande maioria [de condenados]
até 59 anos, 459 condenações. Essa narrativa que se criou e que se repete a
partir de notícias fraudulentas pelas redes sociais, fake news, de que são só
mulheres e mulheres idosas, é totalmente mentirosa. Mulheres são 32% dos
condenados, homens são 68%, e somente 7 pessoas condenadas com mais de 70 anos.
Fonte:
Fórum
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