Presidentes, governadores e prefeitos devem ou não ter o direito de
disputar reeleições no Brasil? Empresas podem ou não financiar candidatos? O
voto deve ser facultativo ou obrigatório? Nenhuma dessas questões é trivial.
Todas elas merecem amplo debate com a sociedade. No entanto, na Câmara dos
Deputados do presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ) a voz do povo é o que menos
importa.
Numa reforma política que vem sendo feita de atropelo, passando por cima
até por uma comissão interna da casa, que foi dissolvida pelo imperador Cunha,
temas cruciais para o funcionamento da democracia brasileira vêm sendo
decididos sem que a sociedade tenha qualquer chance de se manifestar. Nem um
pio sequer.
Num belo dia, Cunha tenta consagrar na Constituição Federal o
financiamento privado e é derrotado. No dia seguinte, numa manobra regimental
cuja legalidade será questionada no Supremo Tribunal Federal, tudo muda e ele
impõe sua vontade. Não se discute aqui o mérito das doações privadas, muito
embora a história recente do País, repleta de escândalos, esteja a demonstrar o
efeito nocivo que o interesse privado exerce sobre a política, seja no
escândalo dos cartéis da Petrobras, seja no caso dos cartéis do metrô de São
Paulo. A questão é a forma. Cunha age como se fosse ungido por um poder
absoluto e como se a sociedade fosse um mero detalhe.
O mesmo se aplica à reeleição. Sem qualquer debate mais aprofundado, uma
experiência recente no Brasil está sendo descartada. Dos três presidentes
brasileiros que puderam se reeleger, todos foram vitoriosos. Fernando Henrique
Cardoso teve um segundo mandato mais difícil do que o primeiro. Com Luiz Inácio
Lula da Silva, deu-se o inverso. No caso de Dilma Rousseff, só o tempo dirá. De
todo modo, o fato de a população depositar votos de confiança nos “incumbentes”
sinaliza que a sociedade, de certa forma, aprova a reeleição – que, por sinal,
existe nas mais avançadas democracias.
A reforma política de Cunha, chamada de “contrareforma” por seus
adversários, ainda terá que passar por novos testes na Câmara e no Senado. O
ideal, no entanto, seria recomeçar tudo do zero, permitindo um amplo diálogo
com a sociedade. Até porque um dos principais problemas do Brasil de hoje é a
crise da democracia representativa, com crescente distanciamento entre eleitos
e eleitores.