João Filho: Bolsonaro acha que vitória de
Trump o levará para 2026, mas esquece que o laranjão não tem jurisdição aqui
Durante todo esse
ano, políticos bolsonaristas fizeram uma série de viagens para os EUA com
objetivo de propagar uma espécie campanha internacional para denunciar a
ditadura do judiciário no Brasil.
Capitaneados por
Eduardo Bolsonaro, o chanceler do neofascismo brasileiro, nossos patriotas
conseguiram o apoio de meia dúzia de políticos republicanos, que chegaram a
apresentar um projeto de lei para barrar a emissão de vistos de autoridades
estrangeiras que ousaram cercear a liberdade de expressão de cidadãos
americanos — leia-se Elon Musk.
Esses congressistas
também pediram ao secretário de Estado americano, Antony Blinken, para revogar
todos os vistos concedidos aos ministros do STF. Os bolsonaristas trabalham com
afinco junto aos americanos para punir o Estado brasileiro. Eis o grande patriotismo
dessa gente.
Essas ofensivas não
deram em nada. Ficaram restritas a um grupelho de xaropes trumpistas e foram
solenemente ignoradas no cenário político americano. Mas, com a eleição
avassaladora de Trump e a reeleição de todos os membros desse grupelho de xaropes
trumpistas, desenhou-se um cenário perfeito para os
delírios bolsonaristas.
Não foi à toa que uma
comitiva bolsonarista foi aos EUA para torcer pela vitória dos seus pares
golpistas americanos. Deputados e senadores faltaram ao trabalho no congresso
para fazer trabalho de militante e, muitos deles, como a Capitã Cloroquina, tiveram
os gastos cobertos pela Câmara e pelo Senado. Uma nova comitiva com mais de 30 deputados já
está sendo preparada para acompanhar a posse do novo presidente americano. Make
Mamata Great Again!
A vitória de Trump
tornou-se peça central no plano bolsonarista para reverter a inelegibilidade de
Bolsonaro nos tribunais e torná-lo um presidenciável até 2026. Somente
vira-latas altamente complexados podem acreditar que o presidente americano tem
poder para influenciar as decisões dos ministros do STF. Lembremos que Elon
Musk, o homem mais rico do mundo, começou estufando o peito para o STF e acabou
enfiando o rabinho entre as pernas depois de levar umas chineladas.
Eduardo Bolsonaro
acredita que o STF não resistirá à força da dupla bilionária Trump e Musk no
poder. Ele, que acompanhou a apuração ao lado de Trump, tem garantido a aliados que
o novo presidente americano se comprometeu a pressionar o governo e o
Judiciário pela reversão da inelegibilidade de seu pai.
“Vai ser colocado uma
espécie de freio. Você acha que o Alexandre de Moraes vai comprar briga com o
ministro Elon Musk?!”, delirou Eduardo ao
lembrar da possibilidade de Musk se tornar ministro.
O papai Jair também
está radiante com as novas possibilidades que a vitória de Trump pode trazer
para ele. Em entrevista à Folha, ele
afirmou que se trata de um “passo importantíssimo” para o seu retorno ao
Planalto. “Quase tudo o que acontece lá acontece aqui”, disse este analista de
mão cheia.
Bom, se isso fosse
verdade, o golpista americano estaria na mesma situação do golpista brasileiro:
inelegível e morrendo de medo de ser preso. Mas Bolsonaro foi além no seu
delírio e já até cogitou uma chapa presidencial com Temer de vice. Golpista se
identifica com golpista, mas é importante lembrar Bolsonaro que foi justamente
Temer quem colocou Xandão no STF.
Os dois são grandes
amigos até hoje. O complexo de vira-latas de Jair chegou ao auge quando
afirmou: “eu sei o meu lugar perto dele [Trump]. Eu estou para ele como o
Paraguai está para o Brasil”. Posso até imaginar o rabinho do vira-latas
balançando para o Tio Sam. Esse é o estadista que quer voltar ao poder.
O fato de Trump ter
eleito uma maioria no congresso americano atiçou os sonhos autocráticos de
Bolsonaro. Segundo ele, o mesmo pode acontecer no Brasil em 2026: “O Trump
agora tem maioria no Senado. […] Nós partimos para uma revolução em 2026.
Podemos ter, sim, uma bancada enorme de senadores e deputados, agregando outros
partidos do nosso lado. Tem tudo para acontecer”, declarou em entrevista à
uma rádio bolsonarista.
Não nos enganemos: o
que ele chama de “revolução”, os democratas chamamos de “golpe”. Vide 1964.
Com os republicanos
conquistando a maioria das cadeiras no congresso americano e com Elon Musk se
tornando o queridinho do governo eleito, é possível até que aumente a pressão
sobre o STF, mas nada além de uma retórica golpista amplificada por Trump.
Não me parece também
que o presidente americano gastará muita energia se indispondo com o governo
brasileiro para defender seus puxa-sacos latino-americanos. Até porque Lula não
representa um incômodo para Trump e os dois tendem a manter uma relação diplomática
pragmática.
Claro que essa gente é
imprevisível, mas dadas as condições materiais, uma atuação mais firme de Trump
em defesa de Bolsonaro é uma possibilidade remota.
No máximo o que pode
acontecer é os ministros do STF terem seus vistos americanos revogados, o que
seria apenas ridículo e não teria qualquer influência nas decisões do tribunal.
Tratar a eleição de Trump como tábua de salvação de Bolsonaro denota o desespero
da turma. Uma leitura simples dos fatos revela que o ex-presidente está muito
mais perto da cadeia do que da candidatura presidencial em 2026.
Apesar de tudo o que
acontece lá não acontecer automaticamente aqui, é preciso estar atento a alguns
sinais enviados pela vitória avassaladora de Trump. Tanto lá como cá, a extrema
direita golpista foi completamente normalizada pelo eleitorado e está consolidada
no jogo político.
Bolsonaro está
inelegível, mas qualquer outro bolsonarista será nome forte para a corrida
presidencial e a possibilidade de eleger um congresso majoritariamente
bolsonarista não é pequena.
O primeiro turno da
eleição já começou e é preciso saber ler os sinais. Lula continua sendo o único
nome capaz de fazer frente ao bolsonarismo e sua reeleição não dependerá apenas
de uma melhora na economia e da defesa da democracia contra os golpistas. O
mundo mudou e há muitas outras coisas em jogo.
¨
Folha, Globo e a
ilusão de Bolsonaro. Por Paulo Motoryn
A vitória de Donald
Trump nas eleições americanas trouxe um novo fôlego a Jair Bolsonaro. Tão logo
o resultado foi decretado, o ex-presidente se apressou em tentar forçar
paralelos entre sua trajetória e a do republicano, apostando em um retorno
triunfal em 2026.
Para disseminar a
narrativa que lhe interessa, Bolsonaro contou com aliados improváveis: as
famílias Frias e Marinho. Na quarta-feira, 7, logo pela manhã, o ex-presidente
teve uma entrevista exclusiva publicada na Folha de S.Paulo. À tarde, foi a vez
d’O Globo.
Às vésperas do seu
indiciamento pela tentativa de dar um golpe de estado, Bolsonaro esqueceu as
restrições que tem à imprensa para fazer seu “media day” – dia em que figuras
públicas concedem várias entrevistas seguidas, se dedicando a atividades de
comunicação.
Como de costume, a
mensagem nas diferentes entrevistas foi igual: que a sua prisão traria impacto
mundial, num misto de bravata, ameaça e vitimização. A aposta é que o novo
cenário internacional intimide o Supremo Tribunal Federal nos julgamentos que
virão em 2025.
Nem o ex-presidente
Michel Temer, do MDB, que Bolsonaro tentou afagar sugerindo à Folha que poderia
ser seu vice em 2026, acredita que o STF possa ser influenciado por Trump.
"Eleito Trump nos EUA, isso vai influenciar o Judiciário daqui? Eu não acredito",
disse.
Se Temer acredita ou
não, pouco importa. Bolsonaro tem que acreditar. É sua única esperança. Por
isso, se apressou em ir à imprensa dizer que a eleição de Trump era um “passo
importantíssimo” para a anistia dos golpistas de 8 de janeiro e para seu caminho
de volta à elegibilidade.
Sim, as apostas de que
Bolsonaro pode estar na disputa de 2026 têm crescido. Mas a maior parte delas
não considera que ele não tem quórum suficiente para reverter sua
inelegibilidade no plenário do TSE, mesmo que Kássio Nunes Marques e André
Mendonça estejam prestes a assumir o comando da Corte.
Nunes Marques já é,
hoje, vice-presidente do TSE. A dois meses da eleição presidencial, ele
sucederá Cármen Lúcia e assumirá o cargo de presidente. Mendonça, por sua vez,
será alçado a vice. A ascensão da dupla, porém, não garante a reversão da
inelegibilidade de Bolsonaro.
Nas duas condenações
que sofreu na Corte, o ex-presidente perdeu por cinco votos a dois – sendo que
um deles era de Nunes Marques, que já integrava o TSE em 2023. Com a
substituição de Cármen Lúcia por Mendonça, Bolsonaro ganha um voto – nada que
mude o cenário.
Mesmo que o TSE
fizesse uma guinada pró-Bolsonaro, especialistas apontam que é no STF que os
recursos às decisões de inelegibilidade devem ser analisadas – e, inclusive, já
estão sendo, com quase nenhuma chance de sucesso para o ex-presidente.
Um outro rumor que
ouriçou bolsonaristas na semana passada surgiu depois que Nunes Marques
autorizou o deputado estadual pernambucano Lula Cabral, do Solidariedade, a
tomar posse como prefeito de Cabo de Santo Agostinho mesmo tendo sido declarado
inelegível pelo Tribunal Regional Eleitoral.
Na semana passada,
quando o caso pipocou nas redes sociais, consultei o Fernando Neisser, advogado
especializado em Direito Eleitoral. “Essa é uma decisão normal. Inelegibilidade
decorrente de rejeição de contas tem esse espaço de interpretação mesmo”, explicou.
De fato, Lula Cabral
concorreu sub judice em função de ter tido suas contas como ex-prefeito
rejeitadas pela Câmara Municipal. No caso de Bolsonaro, me explicou Neisser,
isso nem seria possível. “Não há nenhuma relação desse caso com Bolsonaro”,
pontuou.
Tão improvável quanto
a elegibilidade é a tal anistia, que Bolsonaro também propagou como real nas
entrevistas à imprensa: “O Congresso é o caminho para tudo”, profetizou. Mas os
especialistas são unânimes em dizer: mesmo que a anistia vá à frente, ela deverá
ser questionada no STF.
Ou seja: mesmo que,
por ora, não exista nenhuma chance real de que isso aconteça, Bolsonaro
trabalha para alimentar a ilusão de seu retorno em 2026 — uma janela de
oportunidade aberta por Trump e amplificada pela cobertura generosa da imprensa
brasileira.
¨ Gestão de emendas pelo Congresso determinou avanço do centrão no
Nordeste, afirma cientista política
Nos meses que
antecederam as eleições deste ano, muito foi debatido sobre como a disputa entre Lula (PT) e
Bolsonaro (PL) poderia interferir nos embates municipais, numa espécie de
reflexo da “polarização” nacional. Mas, passado o 2º turno, as análises apontam
para uma outra máxima das disputas nas cidades: com raras exceções, os temas
municipais é que definiram as disputas.
“Eu diria que o ano de
2024 marca um retorno à pauta das disputas municipais, como a gente não via
desde 2012”, opina a cientista política Luciana Santana, professora da
Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
Santana cita a capital
cearense como exceção. “O caso mais surpreendente foi Fortaleza (CE), onde o PT disputou com o PL - mas não necessariamente por
causa dessas duas figuras [Lula e Bolsonaro], mas porque as lideranças e os
candidatos garantiram localmente essa competitividade”, diz ela. “A disputa foi
muito acirrada, tal qual a eleição nacional de 2022, mas isso não significa que
foi uma influência direta”, pondera.
Em entrevista para o
programa Trilhas do Nordeste, a cientista política analisa o avanço
do chamado centrão no Nordeste em 2024, a nova configuração política da região
e o faz um balanço do pleito para as forças da esquerda. Assista à entrevista
completa abaixo.
Diferente do cenário
nacional, em que o PSD foi o maior vitorioso, no Nordeste foi MDB quem elegeu o
maior número de prefeitos e vereadores. No ranking de gestores municipais
eleitos na região, o MDB aparece com 280 prefeituras, seguido do PSD (273) e PSB
(214) - este último, tendo os melhores desempenhos no Ceará e em Pernambuco.
O crescimento do
centrão é retrato de um fortalecimento nacional desse grupo, que já domina o
Congresso e conseguiu, através de emendas parlamentares, fazer essa influência
se refletir nos municípios.
“Pelo alto grau de
protagonismo do Legislativo Federal, conquistado a partir de 2020, o poder
decisório do Congresso em relação a esses recursos tem feito a diferença. Esses
recursos chegam nas bases e têm melhorado a situação das prefeituras aliadas.
[O Congresso] É um espaço que está sendo bem utilizado estrategicamente pelos
partidos do centrão”, explica a cientista política.
Partidos que compõem o
centrão conseguiram se fortalecer. O PP do presidente da Câmara, Arthur Lira
(PP-Alagoas), liderado em Pernambuco por Eduardo da Fonte, chegou a 24
prefeituras, sendo a 3ª sigla com mais prefeitos no estado, atrás apenas do
PSDB de Raquel Lyra (32) e o PSB de João Campos (31). A lista de partidos com
mais prefeitos em Pernambuco segue com o Republicanos (22), o PSD (19), o MDB
(12) e o União Brasil (10), todos do centrão.
Fonte: The Intercept/Brasil
de Fato
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