Putin controla espólio militar e econômico do Grupo
Wagner
A suspeita morte do líder mercenário Ievguêni
Prigojin foi antecedida por uma escalada na disputa dele com a cúpula da Defesa
acerca das atividades de seu Grupo Wagner fora da Rússia —de onde havia
sido banido após liderar um inédito motim contra os generais do presidente Vladimir Putin, no fim de
junho.
Prigojin morreu na quarta (23), após o jato Embraer
Legacy 600 em que estava cair abruptamente durante um voo entre Moscou e São
Petersburgo, com um padrão que sugere uma violenta explosão a bordo ou uma
improvável falha catastrófica em um modelo conhecido por alta confiabilidade.
Os dedos acusadores no Ocidente e mesmo entre
apoiadores de Prigojin voltaram-se para Putin, que com sua autonomia de czar é
visto como o início e o fim de qualquer crise na Rússia. O Kremlin classificou
de mentira a ilação, amparada na longa lista de desafetos do presidente mortos
de forma estranha ao longo dos anos, mas o cipoal de interesses do mercenário
adensa o roteiro.
Desde o motim, Prigojin reuniu-se pelo menos uma
vez com Putin, cinco dias após o fim da revolta. Ele se conheciam desde os anos
1990, e o empresário ganhou seu apelido de "chef de Putin"pelos
serviços de alimentação prestados ao governo.
O Kremlin passou a lembrar que o Grupo Wagner,
surgido em 2014, nunca teve existência legal na Rússia —apesar de ganhar
do governo, segundo o presidente, US$ 1 bilhão anuais (cerca de R$ 5 bilhões) para suas
atividades.
Mas nada se falou sobre as atividades externas do
grupo, sua mina de ouro —em alguns casos, como no Mali, uma metáfora quase literal, dado que
cerca de 2.000 soldados do grupo trabalham para o governo protegendo a extração do metal. Eles
chegaram em 2021, chutando rivais franceses da função, e em troca o Wagner
ganhou licenças próprias de mineração e exportação.
É um padrão nas operações nos sete países africanos
em que é confirmada a presença do grupo, iniciada em 2018 no Sudão e na
República Centro-Africana. No segundo país, o Wagner age como guarda pretoriana
da elite, recebendo para tal permissões sobre minérios, madeira e até para
produzir cerveja.
Até 2021, segundo uma investigação feita pelo
jornal britânico Financial Times, gerou US$ 250 milhões (R$ 1,25 bilhão) em
receitas para o grupo. Não é por acaso o olho gordo de atores russos desde que
Prigojin assinou sua sentença de morte política ao desafiar Putin, ainda que
seu alvo fosse o ministro Serguei Choigu (Defesa) e sua intenção de enquadrar
os mercenários em ação na Ucrânia.
As desavenças entre ambos era públicas acerca do
manejo do conflito, visto como desastroso pelo Wagner. Outros críticos, como o
líder tchetcheno Ramzan Kadirov, contudo, recuaram do embate direto.
Segundo uma pessoa próxima da cúpula militar disse
à Folha, a corrida agora é dupla. Primeiro, Putin quer asseverar controle total
sobre os talvez 25 mil homens do Wagner —nada é certo sobre números da organização nebulosa de Prigojin, que
mantém empresas para controle de fluxo de capital sob o radar nos Emirados
Árabes Unidos e outros países sem sanções ocidentais devido à Guerra da
Ucrânia.
Esse primeiro passo foi dado com o decreto segundo
o qual todos os integrantes do Wagner têm de jurar fidelidade à Rússia,
publicado no sábado (26). Aqui, é indiferente se alguém mandou matar Prigojin,
ou mesmo quem foi: o recado é claro sobre lealdades e o que pode acontecer com
quem as fere —qualquer que fosse o objetivo do motim, ele foi um desastre político para Putin.
Ele foi direcionado principalmente para os
combatentes aninhados sob a ditadura aliada em Belarus, onde são um útil
elemento de desestabilização para as fronteiras leste da Otan [aliança militar
ocidental]. Repetindo o que vêm dizendo desde que os mercenários amotinados
foram levados para lá como parte do acordo para o fim da crise, Polônia e
Lituânia afirmaram que fecharão suas fronteiras se for detectado algum
movimento do Wagner perto delas.
A segunda parte do jogo é mais complexa e já estava
em curso, que é a disputa pelo espólio do mercenário. Uma vez proibido de atuar
na Rússia como punição pela rebelião frustrada, Prigojin passou a dedicar-se a
salvar seu império internacional, na aparência poupado por Putin.
Na aparência, pelo visto. Na véspera da queda do
avião, o influente Iunus-Bek Ievkurov, 1 dos 10 ministros adjuntos da Defesa do
país, fez uma inédita visita à conflagrada Líbia, onde a Rússia apoia a facção
do senhor da guerra Khalifa Haftar há anos.
Até então, o serviço de Moscou era prestado pelo
Wagner, que mantém 2.000 homens no país, inclusive com apoio de caças. Segundo
o relato unânime na mídia árabe e russa, Ievkurov avisou que os mercenários
sairiam do país até setembro e que forças regulares de Moscou os substituiriam.
Antes de voar para a Líbia, Ievkurov havia dado o
mesmo recado ao ministro da Defesa da Síria, Ali Mahmoud Abbas. Putin interveio
em 2015 na guerra civil local, salvando a ditadura amiga de Bashar al-Assad. As
Forças Armadas já haviam expulsado o Wagner da sua base principal, o aeródromo
de Hmeimin, e agora querem ver os mercenários longe do país.
O conhecido jornalista investigativo Andrei
Zakharov disse no Telegram suspeitar que o mesmo será feito nos outros mercados
do Wagner na África. O incômodo foi visível: o próprio Putin disse que Prigojin
morreu após voltar de uma viagem ao continente, que observadores da cena russa
disseram ter sido devido às movimentações de Ievkurov.
Além disso, há a questão da fortuna amealhada por
Prigojin, que está dispersa em um pântano de offshores e empresas de fachada.
Segundo Venda Flebab-Brown, diretora de Atores Armados Não Estatais do
Instituto Brookings (EUA), só em contratos oficiais o Wagner ganhou ao longo de
sua curta história US$ 20 bilhões (R$ 100 bilhões).
Ø Suécia acusa homem de espionar o país e os EUA em nome da Rússia
A Suécia acusou um homem nesta segunda-feira de
espionar o país e os Estados Unidos em nome da Rússia e de transferir
ilegalmente tecnologia avançada para as forças armadas russas durante um
período de nove anos.
Os promotores indiciaram Sergej Skvortsov, cidadão
da Suécia e da Rússia, por atividade de inteligência grosseiramente ilegal
contra os dois países entre 2013 e 2022, mostrou o processo.
A advogada do homem de 60 anos disse que ele nega
qualquer irregularidade. "Ele reitera que nega todas as acusações",
disse a advogada Ulrika Borg à Reuters.
Os promotores disseram que o suspeito reuniu
informações em nome da Rússia que poderiam ser prejudiciais à segurança dos
Estados Unidos e da Suécia e forneceu à Rússia tecnologia que o país não
poderia adquirir no mercado aberto devido a regulações e sanções comerciais.
"Skvortsov e sua empresa têm sido uma
plataforma para o serviço de inteligência militar GRU e parte do Estado russo
para aquisição ilícita de tecnologia do Ocidente", diz a acusação.
O serviço de segurança afirmou num comunicado que
os supostos crimes podem representar graves ameaças à segurança da Suécia e de
outros Estados.
"O objetivo do negócio do suspeito tem sido
fornecer à Rússia tecnologia sensível e sob demanda que possa ser usada
militarmente, onde o objetivo da aquisição tem sido aumentar as capacidades
militares do Estado russo", afirmou.
A polícia prendeu Skvortsov em novembro do ano
passado, nos arredores de Estocolmo, juntamente com um segundo indivíduo que
foi libertado pouco depois.
Ø Erdogan vai à Rússia para discutir com Putin retomada de acordo de
grãos com Ucrânia
O presidente turco Recep Tayyip Erdogan chega
"em breve" a Sochi, na Rússia, para conversar com o russo Vladimir
Putin sobre a retomada do acordo de exportações de grãos com a Ucrânia. O
anúncio foi feito nesta segunda-feira (28) pelo porta-voz do partido do
presidente, Omer Celik.
"Nosso presidente tomou essa iniciativa [de
uma negociação sobre a retomada do acordo] para evitar que o mundo enfrente uma
crise alimentar. Ele visitará em breve Sochi. Acreditamos que novidades devem
ser anunciadas depois desta visita", afirmou Celik. As autoridades turcas
e as autoridades russas não confirmaram a data deste encontro.
De acordo com a agência de notícias Bloomberg, o
turco poderia ir à Rússia no dia 8 de setembro, antes de sua viagem
para a Cúpula do G20, que acontece em Nova Delhi.
·
Acordo foi interrompido em julho
O governo russo suspendeu o acordo que permitia a
exportação de grãos a partir dos portos ucranianos durante a guerra no dia 17
de julho.
Desde então, o país tem ameaçado atacar todos os
navios que deixam a Ucrânia pelo mar Negro, limitando o escoamento da
produção de grãos às rotas terrestres e a uma rota fluvial de pouca profundidade.
Em um mês, os ataques russos aos portos
ucranianos teriam destruído "270 mil toneladas de grãos", segundo o
ministro ucraniano de Infraestrutura, Oleksander Kubrakov.
O governo ucraniano respondeu, no início de agosto,
com a abertura de um corredor "temporário" do mar Negro, controlado
em grande parte pela Marinha Russa. Apesar do risco, alguns navios têm
usado esse corredor na travessia do mar Negro. No domingo (27), o segundo navio
de grãos chegou a Istambul.
A Turquia, que ajudou a fechar o acordo entre os
dois países em julho de 2022, tenta agora retomar o compromisso inicial para
utilizá-lo como alavanca para as negociações de paz entre os dois países.
O ministro turco de Relações Exteriores, Hakan
Fidan, deve visitar Moscou nos próximos dias para organizar o encontro
entre Erdogan e Putin.
Ø Coronel: Ocidente se tornou vítima de sua propaganda, sobrestimando o
poder das tropas ucranianas
As tropas ucranianas não são supersoldados que
podem continuar lutando incansavelmente sem armas suficientes, contrariamente à
sua representação na propaganda ocidental, disse o estrategista militar do
Ministério da Defesa austríaco, coronel Markus Reisner.
O especialista militar, que foi comandante dos
contingentes da Áustria no Mali e no Kosovo, argumentou que era irrealista
esperar milagres na linha de frente, enquanto os apoiadores de Kiev não
conseguem fornecer à Ucrânia equipamentos suficientes para uma ofensiva eficaz.
"O problema é [que] somos vítimas de nossa
própria propaganda, e eu digo isso sem rodeios", disse Reisner em
entrevista ao canal de TV alemão ZDF.
Ele explicou que "no início da guerra, nós nos
convencemos a acreditar que os soldados ucranianos com os Panzerfausts
[lançadores de granadas] alemães em suas mãos estariam detendo os russos".
Reisner observou que desde então essas forças têm
sido continuamente desgastadas, com o Ocidente fornecendo apenas entre 50% e
60% do que os altos escalões oficiais ucranianos estavam pedindo para lançar
uma ofensiva própria.
De acordo com o coronel austríaco, Kiev aproveitou
ao máximo o que estava disponível para ela, mas lhe faltam "elementos
cruciais, como, por exemplo, uma força aérea funcional".
Na ausência de qualquer sucesso significativo, a
mídia dos Estados Unidos já começou a procurar um bode expiatório para o
aparente fracasso da contraofensiva, mas as altas expectativas eram irrealistas
em primeiro lugar, concluiu Reisner.
Anteriormente, o jornal The Wall Street Journal
afirmou que Washington considera que forneceu a Kiev equipamentos militares
suficientes para romper as defesas russas.
Fonte: FolhaPress/Reuters/AFP
Nenhum comentário:
Postar um comentário