Reunião
em Paris debate diretrizes de acordo internacional para acabar com poluição por
plástico
Representantes de 175 países se reúnem a partir
desta segunda-feira (29), em Paris, para um ciclo de cinco dias de debates para
definir um acordo que leve a um tratado para acabar com a poluição com
plásticos. O presidente francês, Emmanuel Macron, alerta para o perigo de uma
"bomba-relógio" se nada for feito.
“O acordo
deverá ser ambicioso”, disse à RFI a diretora-executiva do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente, Inger Andersen. “Se não acabarmos com a poluição
por plástico, se continuarmos a utilizá-lo sem reciclar, as consequências serão
catastróficas para os nossos ecossistemas aquáticos e terrestres, por isso essa
negociação é crucial”. Ela lembra ainda que “as negociações em vista estipulam
claramente que vai se tratar de um acordo juridicamente restritivo”.
Os diplomatas estão reunidos na sede da Unesco para
uma segunda etapa das negociações, das cinco agendadas para chegar a um acordo
histórico sobre o ciclo de vida do plástico.
No encontro há países com interesses divergentes,
ONGs e também empresas do setor plástico, para o desgosto dos ativistas
ambientais, que também estarão presentes nos debates.
O pontapé inicial foi dado na manhã desta
segunda-feira pelo presidente da comissão, o peruano Gustavo Meza-Cuadra
Velásquez. "O mundo está nos observando", disse. "O desafio é
enorme, todos nós sabemos disso aqui, mas não é intransponível".
Há pouco mais de um ano, em Nairóbi (Quênia), foi
alcançado um acordo de princípio para acabar com a poluição com plásticos no
mundo, com a ambição de desenvolver, até o final de 2024, um tratado
juridicamente vinculativo sob a égide das Nações Unidas.
• "Bomba-relógio"
O presidente francês, Emmanuel Macron, pediu em um
vídeo exibido na abertura da reunião nesta segunda-feira para "acabar com
um modelo globalizado e insustentável" de produção e consumo de plástico,
alertando para o risco de que a situação se torne "bomba-relógio".
Os desafios são grandes, já que a produção anual
mais que dobrou em 20 anos, atingindo 460 milhões de toneladas, quantidade que
ainda pode triplicar até 2060, se nada for feito.
Dois terços dessa produção global têm uma vida útil
curta e são descartados após apenas um ou poucos usos; 22% são abandonados
(lixões, incineração ao ar livre ou descarga na natureza) e menos de 10% são reciclados.
"O objetivo principal deve ser reduzir a
produção de novos plásticos e banir o quanto antes os produtos mais poluentes -
como os plásticos descartáveis - e os mais perigosos para a saúde",
destacou Macron.
"Há um consenso sobre o que está em jogo e há
uma vontade de agir", afirmou à AFP Diane Beaumenay-Joannet, da ONG
Surfrider Foundation. Ela disse estar "muito otimista com o fato de
estarmos avançando em um projeto de tratado", mas acredita que "sobre
o conteúdo preciso das obrigações, será complicado, principalmente em relação à
redução da produção".
Reticências
A favor da redução, uma coalizão de países, liderada
por Ruanda e Noruega, inclui, entre outros, a União Europeia (UE), o Canadá e
vários países da América Latina, como México, Peru e Chile. Seu objetivo é
acabar com a poluição plástica até 2040.
Mas há resistência de outros países, que dão maior
ênfase à reciclagem ou à melhor gestão de resíduos, como China, Estados Unidos,
Arábia Saudita e, em geral, os países da Opep, que buscam proteger sua
indústria petroquímica.
O plástico, derivado do petróleo, é um material
onipresente na vida cotidiana. Está em embalagens, fibras de roupas, material
de construção e instrumentos médicos.
Os resíduos vão parar nos oceanos, nas calotas
polares, no estômago das aves e até no topo das montanhas. Microplásticos
também foram detectados no sangue, leite materno e em placentas.
"Os países desenvolvidos são os maiores
consumidores e os que mais poluem. Eles produzem em outros países e enviam seus
resíduos de volta para outros países", aponta Diane Beaumenay-Joannet.
Outra questão no problema da poluição com plástico é
seu papel no aquecimento global: em 2019, o problema gerou 1,8 bilhão de
toneladas de gases de efeito estufa, ou seja, 3,4% das emissões globais, número
que pode dobrar até 2060, segundo a Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Alpinistas
encontram mais de 1,6 tonelada de resíduos plásticos no Himalaia
Um explorador francês encontrou recentemente no
Himalaia 1,6 tonelada de resíduos plásticos, no momento em que começam as
negociações para tentar conter esta poluição em todo o mundo.
“É um verdadeiro lixão. Atrás de cada rocha há um
monte de bombas de oxigênio, latas, lona de barraca, sapatos, uma coisa
realmente absurda”, lamentou Luc Boisnard, no Nepal, onde voltava de uma
primeira tentativa de escalar o Makalu, a 8.485 metros de altitude, onde espera
voltar a subir em breve.
O objetivo deste administrador de empresa de 53
anos, alpinista há muitos anos, é despoluir os picos que “se tornaram
gigantescos depósitos de lixo”.
O nome da operação e a associação que criou para o
projeto é Himalayan Clean-up.
A expedição ao Makalu, iniciada em março, foi sua
segunda depois de escalar o Everest em 2010. Ao mesmo tempo, outro membro da
associação acaba de voltar de Annapurna, 8.091 metros de altitude.
Das duas escaladas, os dois homens, ajudados por uma
dezena de sherpas, trouxeram 3,7 toneladas de resíduos, dos quais 45% são
plásticos: 1.100 quilos em Makalu e 550 quilos em Annapurna.
É mais uma ilustração da difusão desse material
derivado do petróleo, que ocorre em meio à segunda rodada de negociações em
Paris para elaborar um tratado juridicamente vinculativo, sob os auspícios da
ONU, para acabar com a poluição plástica até 2024.
Em sua primeira expedição ao topo do mundo, Boisnard
trouxe de volta uma tonelada de lixo, incluindo 550 quilos de plástico.
– O papel do turismo –
A maior parte desses resíduos é resquício de
expedições de grande altitude acumuladas desde 1920, quando a região começou a
se abrir para o turismo.
Na tentativa de aliviar suas mochilas e, às vezes,
com pouco respeito pelo meio ambiente, alguns alpinistas iniciantes deixam
deliberadamente alguns de seus pertences em torno de acampamentos-base, ou mesmo
nas trilhas para os cumes.
Alguns deles “são jogados nas geleiras do Himalaia,
onde permanecerão por 200 anos”, lamenta Boisnard.
Esses plásticos se desintegram lentamente,
contaminando paisagens e rios a longo prazo.
Em 2019, um estudo científico mostrou a presença de
microplásticos acima dos 8.000 metros de altitude, inclusive na neve.
Além do problema dos resíduos, o primeiro objetivo
do futuro tratado sobre plásticos será reduzir seu uso e produção.
Em 20 anos, essa produção mais que dobrou, para 460 milhões
de toneladas por ano, e pode triplicar até 2060, se nada for feito. Dois terços
são jogados fora após um ou poucos usos, e menos de 10% do plástico é
reciclado.
Além das montanhas, plásticos de todos os tamanhos
também são encontrados no fundo dos oceanos, em blocos de gelo, no estômago das
aves e até no sangue humano, no leite materno, ou na placenta.
Quanto
menores os fragmentos de plástico, maior o dano ambiental
Onde está aquele copinho de plástico que você usou
para beber água no ano passado? E o papel da bala que chupou há cinco anos?
Pesquisas recentes têm destacado a necessidade de entender melhor os efeitos
dos fragmentos desses recipientes sintéticos nos animais e ecossistemas de água
doce.
Embora a mortalidade observada nos testes tenha sido
baixa, a exposição no longo prazo pode ter efeitos prejudiciais na saúde dos
organismos – e quanto menores os fragmentos, maior o potencial de danos. Os
efeitos cumulativos podem ser preocupantes até para os humanos, mas como não há
legislação a respeito, também não existe ainda um monitoramento das possíveis
consequências.
São considerados microplásticos as unidades com
menos de cinco milímetros de diâmetro. Essas partículas são encontradas desde
as profundezas do oceano até em lagos e rios. Cada tipo de plástico possui uma
composição específica que pode causar danos diferentes no organismo. Pesquisas
recentemente publicadas pelo Laboratório de Limnologia do Departamento de
Ecologia do Instituto de Biociências (IB) da USP trazem diferentes abordagens
no trabalho com estes fragmentos.
Com orientação do professor Marcelo Pompêo, um dos
estudos avaliou a exposição às partículas de PET, o polímero usado em garrafas
plásticas, na sobrevivência e nos biomarcadores do pequeno crustáceo de água
doce Hyalella azteca. Os resultados mostraram que não houve mortalidade
significativa, mas sim um estresse oxidativo, com a formação de espécies
reativas de oxigênio, que são tóxicas nos organismos. Trata-se de uma ameaça
silenciosa já nas concentrações encontradas hoje nos rios.
Essa e outras pesquisas recentes indicam que o
microplástico talvez esteja mais associado a danos físicos do que químicos,
lesionando as células dos animais com suas formas irregulares. Isso significa
que até mesmo as baixas concentrações podem causar efeitos nocivos.
• Larvas
de mosquito
Há também investigações sobre a fragmentação dos
plásticos pelos próprios organismos, como o estudo sobre larvas aquáticas de
mosquito, publicado neste ano. Para realizar a tarefa, os pesquisadores se
debruçaram sobre a toxicidade de micropartículas de polipropileno (PP) nas
larvas de moscas-d’água da espécie Chironomus sancticaroli. Esse plástico é
frequentemente usado em potes de comida com tampas.
A exemplo da outra pesquisa, os testes foram
realizados com concentrações de poluentes iguais às encontradas atualmente e a
mortalidade dos animais expostos foi baixa, mas a exposição ao polipropileno
promoveu alterações fisiológicas que podem tornar o organismo suscetível a
doenças e infecções.
• Sem
solução à vista
O objetivo dos estudiosos atualmente é desenvolver
métodos para quantificar a presença de partículas sintéticas no ambiente e
quais seriam níveis seguros dessa presença. A falta de pesquisas do tipo
inviabiliza a adoção de vigilância sobre esse e diversos outros poluentes
encontrados na água. Soma-se o fato de que as soluções existentes para lidar
com a poluição por plástico ainda não têm resultados satisfatórios, como conta
ao Jornal da USP o pesquisador Lucas Gonçalves Queiroz, um dos ecólogos
responsáveis pelos artigos.
“Mesmo essas sacolas biodegradáveis, geradas de
polímeros naturais, vão ser fragmentadas e também vão formar microplásticos.
Tomar iniciativas é extremamente importante, mas para atingir outros objetivos,
como reciclagem e redução da dependência de combustíveis fósseis — porque boa parte
dos plásticos é obtida a partir do petróleo.”
Sobre a reciclagem, Bárbara Rani-Borges, que também
compõe o time de cientistas do laboratório, acrescenta: “Durante o processo de
reciclagem também há produção de CO2 [gás carbônico] e o material também vai se
quebrar e gerar microplástico. A reciclagem é muito importante para gestão dos
resíduos sólidos, mas para a problemática do microplástico não fará tanta
diferença”.
A pesquisadora, que trabalhou com bactérias e fungos
capazes de fazer a biodegradação de plásticos, destaca que mesmo essas
iniciativas não são a solução para o problema do microplástico no ambiente.
“[Os microrganismos] precisam de uma condição ideal de luminosidade, de
temperatura, de pH [de acidez] e de uma série de fatores que no ambiente
dificilmente serão encontrados. Não é a solução também porque a conta não
fecha. A quantidade de plástico que é produzido anualmente é muito grande e a
eficiência desses organismos que podem induzir a biodegradação é muito baixa.
Não tem como isso ser feito em escala industrial.”
Além dos efeitos diretos, o plástico também pode
servir como transportador de outros contaminantes impregnados em ranhuras e
poros, como pesticidas e drogas. Da mesma maneira, alguns fungos e bactérias
que causam doenças podem colonizar a sua superfície. “É o que alguns trabalhos
chamam de plastisfera, um microecossistema.”
• Como
medir os danos
Para realizar testes de toxicidade, os pesquisadores
usam pequenos invertebrados. “Nós expomos esses organismos a diferentes
concentrações e conseguimos determinar qual é letal, qual causa algum efeito
tóxico”, detalha Lucas Queiroz. Em duas das pesquisas realizadas pelo
laboratório, foram avaliados a mortalidade e o estresse oxidativo dos
organismos.
Quando um poluente entra no organismo, a tendência é
que se formem espécies reativas de oxigênio, que são tóxicas. Enzimas
antioxidantes são responsáveis por eliminar esses compostos químicos – e o
organismo entra em um estresse oxidativo quando tenta combater esses
contaminantes e precisa produzir mais enzimas do que o normal. Por meio do
aumento ou da redução da atividade dessas enzimas, é possível saber o nível de
exposição a partículas nocivas.
Há também outras medidas importantes. “Nós
quantificamos as partículas que foram ingeridas. Alguns dos nossos estudos
avaliam também a taxa de partículas que saem, porque pode acontecer de algumas
ficarem presas no corpo. Dependendo de quanto tempo essa partícula ficar
retida, podemos considerar como uma bioacumulação, mas precisaria de um estudo
específico para isso”, define Bárbara Borges.
• Fragmentado
Uma partícula menor normalmente é mais preocupante
do que uma maior porque quanto maior é a área de contato relativa, maior é o
nível de toxicidade. “Aquela garrafinha de água que consumimos 20 anos atrás
está em algum lugar e, quanto mais ela vai envelhecendo, mais ela vai se
quebrando por conta das condições ambientais. Ela virará milhões de partículas
microplásticas”, alerta a pesquisadora ao Jornal da USP. A tendência é que
essas partículas sejam reduzidas continuamente. Há uma série de fatores
ambientais que fragilizam o material para que ele se degrade em pedaços
menores, como os raios solares, exposição a água e atrito com solo e pedras,
variações de temperatura.
Um cubo de 3 centímetros de cada lado teria uma área
superficial total de 54 centímetros quadrados. Para calcular essa área, somamos
as áreas dos seis lados do cubo. Cada lado possui uma área de nove centímetros
quadrados (3 vezes 3 centímetros de cada lado). Multiplicando seis por nove
temos a área de contato total de 54 centímetros quadrados.
Se a mesma peça fosse fragmentada em cubos de 1
centímetro, seriam 162 centímetros quadrados no total, uma área de contato três
vezes maior. Para calcular essa área, somamos as áreas totais de cada lado dos
cubos menores — 1 centímetro quadrado. Como são seis lados e 27 cubos menores,
temos um total de 162 (6 vezes 27) centímetros quadrados, que corresponde a
três vezes a área do cubo maior (3 vezes 54). Se o plástico carregar
substâncias nocivas, elas serão mais facilmente liberadas por fragmentos
menores.
Quando os pedaços são muito pequenos, na faixa dos
nanômetros (0,000001 milímetros), podem ficar acumulados no organismo. “Quanto
menor, mais fácil também para essa partícula atravessar as barreiras celulares,
chegar a outros órgãos e ficar alojada”, explica a pesquisadora.
O plástico é qualquer material fabricado
industrialmente cuja plasticidade permite que seja moldado em várias formas. De
acordo com um relatório de 2021 do Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (Pnuma), ele soma 85% do lixo encontrado nos oceanos, onde os rios
desaguam. Os mais encontrados no ambiente são o plástico PE (polietileno), o
plástico PP (polipropileno), o PET (polietileno tereftalato), o isopor (poliestireno)
e o PVC (policloreto de vinila). Em conjunto, eles representam cerca de 70% dos
plásticos encontrados, mas isso depende da amostra.
Bárbara Borges acrescenta que a lavagem de roupas de
material sintético, ainda mais em temperaturas elevadas, libera milhares de
fibras de poliéster, que também são microplásticos. Embora não considere uma
solução, a cientista enfatiza a importância de uma legislação para o problema.
“É importante reciclar o nosso lixo, reduzir a
quantidade de plástico que consumimos no nosso dia a dia, prestar mais atenção
na quantidade de lixo que produzimos e tentar encontrar uma forma de reduzir
essa quantidade, mas nós precisamos de leis mais rígidas”. Lucas Queiroz
ressalta que, mesmo que não sejam produzidos mais plásticos a partir de hoje, o
problema já se prolongaria por gerações. “O que temos de plástico no ambiente
hoje já é suficiente para produzir microplástico por centenas de milhares de
anos.”
Fonte: RFI/IstoÉ Dinheiro
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