segunda-feira, 29 de maio de 2023

Mais de 1 milhão de brasileiros vivem em “escravidão contemporânea”

No Brasil, estima-se que 1.053.000 pessoas vivem em condições de “escravidão contemporânea”. O dado é resultado de um levantamento feito pela organização internacional de direitos humanos Walk Free, divulgado neste ano e que avaliou a situação de 160 países.

Em número absolutos, o Brasil ficou em 11ª lugar no ranking. Entre os 10 primeiros, estão Índia, China, Coreia do Norte, Paquistão, Rússia, Indonésia, Nigéria, Turquia, Bangladesh e Estados Unidos. Segundo o estudo, esses países respondem, juntos, por cerca de 2 a cada 3 pessoas vivendo em escravidão contemporânea no mundo e mais da metade da população mundial. 

Muitos desses países compartilham características sociais e econômicas similares, com proteção limitadas para as liberdades civis e direitos humanos, ou estão em regiões voláteis, com instabilidade política e conflitos.

Uma das possíveis raízes do problema mencionadas pelo documento é o aumento da “cultura do consumo”, que, por um lado, pode impulsionar o crescimento econômico e a inovação, mas, por outro, pode “contribuir para a degradação ambiental, a desigualdade social e padrões insustentáveis ​​de consumo e desperdício.

“Bens produzidos com trabalho forçado agora viajam pelo mundo mais longe do que nunca, com quase 2/3 de todos os casos de trabalho forçado conectados às cadeias de suprimentos globais. Os trabalhadores são explorados em diversos setores e em todas as etapas da cadeia de abastecimento, embora a maior parte do trabalho forçado ocorra nos níveis mais baixos, como a extração de matérias-primas e as etapas de produção”, afirma a organização.

No Brasil, os 5 produtos importados que mais correm risco de ter sua origem baseada em trabalho escravo são eletrônicos, roupas, óleo de palma, painéis solares e produtos têxteis.

RESPOSTA DO GOVERNO

A Walk Free chama a atenção para o papel crítico desempenhado por governos no desenvolvimento e implementação de leis, políticas e programas necessários para prevenir e responder à escravidão contemporânea, categorizando a resposta do poder público frente à questão.

O levantamento qualificou as ações brasileiras como “fortes”. Contudo, ressalta que o país, assim como os Estados Unidos, o Brasil prejudica seu conjunto de medidas ao forçar pessoas a situações que vão “além das circunstâncias que as convenções internacionais consideram aceitáveis”, como o trabalho obrigatório imposto a detentos.

Para a análise de qualidade de resposta governamental, foram considerados aspectos como mecanismos do Poder Judiciário para evitar mais casos, apoio oferecido às vítimas (a fim de que possam sair do ciclo de violação de direitos) e o modo como o governo e o empresariado que atua no país reagem perante os casos – se param de fornecer bens e serviços envolvidos com a cadeia de escravidão. No Brasil, o nível de resposta foi classificado como 51,3%. No índice, quanto mais próximo de 100%, melhor a resposta do governo.

Na tentativa de reverter a situação, o documento também traz algumas sugestões aos governos, comunidade internacional e empresas:

# reconhecer e responder à escravidão moderna como uma questão interseccional;

# concentrar-se na prevenção e proteção daqueles que já são vulneráveis;

# garantir proteções civis e criminais eficazes na legislação para combater o casamento forçado e infantil;

# implementar medidas mais fortes para combater o trabalho forçado nas cadeias de abastecimento públicas e privadas;

# priorizar os direitos humanos ao se envolverem com regimes repressivos.

ESCRAVIDÃO CONTEMPORÂNEA

A organização esclarece que, embora a “escravidão contemporânea” não seja definida na lei, ela é usada como um termo genérico que concentra a atenção nas semelhanças entre esses conceitos legais. 

A expressão faz referência a situações de exploração que uma pessoa não pode recusar ou deixar por causa de ameaças, violência, coerção, engano e/ou abuso de poder. 

Segundo as últimas estimativas Globais da Escravidão Contemporânea, 50 milhões de pessoas viviam em situações de escravidão contemporânea em 2021. Dessas, aproximadamente 28 milhões estavam em trabalhos forçados e 22 milhões em casamentos forçados.

 

Ø  Pela manutenção da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo no Ministério dos Direitos Humanos

 

Na tarde desta sexta-feira, 26 de maio, ocorreu uma audiência entre as entidades que desenvolvem a Campanha Nacional de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo e o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, para debater o decreto que transfere a Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo do ministério para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As entidades divulgaram uma carta pública pela manutenção da Conatrae no Ministério dos Direitos Humanos (MDH). Confira a seguir!

Entidades da sociedade civil e brasileiros e brasileiras que defendem o combate à escravidão contemporânea pedem ao governo Lula para não transferir a Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) do Ministério dos Direitos Humanos para o Ministério do Trabalho.

Trabalho escravo, mais do que uma violação a direitos trabalhistas, é uma agressão aos direitos humanos. Por isso, a Conatrae, desde sua criação em 2003, sempre esteve nessa área do governo, articulando os diferentes ministérios envolvidos tanto na prevenção e repressão ao crime e quanto no atendimento às vítimas, em conformidade com tratados ratificados pelo Brasil.

Em audiência realizada no dia 26 de maio com representantes da Conatrae, o ministro Silvio Almeida defendeu enfaticamente a permanência da comissão no MDH.

Queremos um combate ao trabalho escravo que continue sólido, que resgate a dignidade dos trabalhadores, que enfrente o racismo e o machismo, que fortaleça a imagem da produção brasileira. Queremos que a Conatrae continue no Ministério dos Direitos Humanos.

Considerando isso, as organizações e pessoas abaixo aderem à moção apresentada na reunião extraordinária da Conatrae do dia 19 de maio de 2023, com o seguinte teor:

Moção para permanência da Conatrae no Ministério dos Direitos Humanos

A motivação da reunião extraordinária da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), neste 19 de maio de 2023, é a existência de um projeto de transferência deste colegiado do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania para o Ministério do Trabalho e Emprego.

Diante de tal informação, que não passou pela consulta dos membros da própria comissão, os abaixo-assinados vêm a público repudiar tal ação, tendo em vista as seguintes considerações:

a) A Conatrae nasceu em 2003 dentro de um processo de construção da política nacional de erradicação do trabalho escravo, como colegiado encarregado de monitorar a sua execução pelas várias partes interessadas, formado pela sociedade civil e o poder público.

b) A Conatrae sempre esteve na área dos direitos humanos, desde a sua criação no primeiro governo do presidente Lula. Desde sua origem foi colocada sob o manto do Ministério dos Direitos Humanos – na época, ainda Secretária Especial de Direitos Humanos da Presidência da República. Isso foi feito em consonância aos tratados internacionais assinados pelo Brasil na área, pela natureza e abrangência do crime de trabalho escravo, pela transversalidade das ações suscetíveis de contribuir na sua erradicação.

c) Não se mostra adequado que o órgão de monitoramento de combate ao trabalho escravo (Conatrae) fique vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego, cuja atribuição consiste na execução da política de combate ao trabalho escravo. Tal vinculação mostrar-se-á contrária aos princípios de boa governança.

Ademais não é admissível decretar tamanha mudança sem diálogo com a sociedade civil e demais parceiros do combate ao trabalho escravo, como vem sendo feito.

Assim sendo, as entidades abaixo-assinadas são contrárias ao projeto de transferência da Conatrae do atual MDHC para o MTE, acreditando que ele pode causar danos ao monitoramento da política nacional de enfrentamento ao trabalho escravo e pedem ao governo o arquivamento dessa proposta.

 

Fonte: Poder 360/CPT

 

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