Por
que esclerose múltipla atinge mais mulheres jovens
Em 2015, quando tinha apenas 24 anos, a técnica em
segurança do trabalho Jocilene Emanuele Medina procurou um pronto-atendimento
em Pains, em Minas Gerais, onde mora, ao ter um episódio de vômito, vertigem e
desequilíbrio.
Após passar por consulta médica e fazer alguns
exames, ela foi encaminhada para um otorrinolaringologista onde recebeu o
diagnóstico de labirintite.
Mesmo seguindo o tratamento indicado, Manu, como é
mais conhecida, conta que os sintomas não melhoravam e ela passou a perder a
visão do lado esquerdo.
Preocupada, ela procurou um oftalmologista. "O
médico notou que eu estava com uma inflamação no nervo óptico e decidiu pela
minha internação imediata. Fiquei assustada, não imaginava a gravidade do meu
caso", diz.
Nos 15 dias de internação, mesmo com diversos exames
realizados, os médicos ainda não haviam fechado um diagnóstico sobre o que
estava acontecendo com Manu.
Foi só depois de um ano e meio de investigação que o
diagnóstico de esclerose múltipla chegou.
"Fiquei sem chão ao receber a notícia. Acho que
a fase inicial do diagnóstico é a mais difícil para o paciente. Ter 'fácil'
acesso à informação na internet, por exemplo, nos desespera ainda mais",
afirma Manu.
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Pacientes jovens
A esclerose múltipla é uma doença neurológica,
crônica e autoimune, em que as células de defesa do organismo atacam o próprio
sistema nervoso central, causando lesões no cérebro e na medula.
O dia 30 de maio é considerado o Dia Mundial da
Esclerose Múltipla - uma data eleita com o objetivo de levar informações sobre
a doença à sociedade.
A ABEM (Associação Brasileira de Esclerose Múltipla)
estima que cerca de 40 mil brasileiros possuem a doença, que atinge geralmente
pessoas jovens com idade média entre 20 e 40 anos, sendo mais comum entre as
mulheres e pessoas da raça branca.
A causa da doença, assim como por que ela é mais
comum em mulheres jovens, ainda são questões em aberto para a ciência.
Há, no entanto, algumas pistas de por que este grupo
representa a maioria dos diagnósticos.
Uma das teorias é que as flutuações dos hormônios
sexuais durante os anos reprodutivos poderiam influenciar a resposta
imunológica e aumentar o risco de desenvolver a doença.
Estudos sugerem que outro fator é o um componente
genético - genes específicos seriam responsáveis, em parte, pela
suscetibilidade das mulheres à esclerose múltipla.
Além disso, a resposta imunológica geralmente mais
forte nas mulheres pode contribuir para uma maior atividade inflamatória no
sistema nervoso central, o que aumenta o risco de desenvolvimento da doença.
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Esclerose múltipla não é um tipo de demência
É importante destacar que a esclerose múltipla não é
um tipo de demência, como muitas pessoas erroneamente pensam.
Segundo o neurologista e coordenador médico do
Centro de Excelência em Esclerose Múltipla do Einstein, Rodrigo Thomaz, a
palavra "esclerose" refere-se ao "endurecimento" que ocorre
no cérebro e na medula espinhal dos pacientes com o quadro.
"É possível observar a formação de pequenas
placas com cicatrizes endurecidas ao toque."
A esclerose múltipla tem como principal
característica a perda neurológica. Nas pessoas que têm a doença, as células
imunológicas invertem o seu papel - em vez de protegerem o sistema de defesa,
passam a atacá-lo, produzindo inflamações.
Essas inflamações afetam a bainha de mielina – uma
espécie de capa protetora que reveste os neurônios responsáveis por levar os
impulsos do sistema nervoso central para o corpo e vice-versa, fazendo com que
as funções coordenadas pelo cérebro fiquem comprometidas.
Além dos fatores específicos que relacionam as
mulheres à doença, pessoas com predisposição genética para doenças autoimunes e
que são expostas a fatores ambientais como infecções virais, tabagismo,
obesidade e níveis reduzidos de vitamina D, também são consideradas como grupos
de maior risco para desenvolver o quadro.
"A redução do risco de desenvolver a esclerose
múltipla é questionável, uma vez que a doença tem componente genético que
aumenta o risco de alteração no funcionamento do sistema imunológico. No
entanto, o controle dos fatores ambientais pode, sim, interferir nas chances de
apresentação da doença", diz Claudia Vasconcelos, coordenadora do
Departamento Científico de Neuroimunologia da Academia Brasileira de
Neurologia.
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Sintomas mais comuns
- Fadiga (cansaço intenso e momentaneamente incapacitante)
- Alterações fonoaudiológicas (fala lenta, palavras arrastadas e voz
trêmula)
- Dificuldade para engolir líquidos, pastosos ou sólidos
- Transtornos visuais (visão embaçada ou dupla)
- Perda de equilíbrio
- Problemas na coordenação motora
- Instabilidade ao caminhar
- Tremores
- Vertigens e náuseas
- Incontinência ou retenção urinária
- Espasticidade (rigidez de um membro ao movimentar-se e acomete
principalmente os membros inferiores)
- Transtornos cognitivos
- Transtornos emocionais (depressão, ansiedade, irritação)
- Disfunção erétil nos homens e diminuição de lubrificação vaginal nas
mulheres
"Os sintomas e sinais da esclerose podem ser
transitórios, durar poucos minutos e desaparecer, fazendo com que o paciente
não dê muita importância a esses sinais. Por isso, ao ter qualquer sinal, por
menor que seja, é indicado que se busque um neurologista para ser investigada a
causa daquele sinal", explica Alex Machado Baêta, neurologista da BP - A
Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Visando tornar a esclerose múltipla mais conhecida,
Manu usa as redes sociais para falar abertamente sobre os desafios que os
pacientes com esclerose múltipla enfrentam no dia a dia.
"A falta de informações leva a um preconceito
indireto. Por não ser uma doença visível, a sociedade não enxerga minhas
necessidades. Às vezes, devido à fraqueza e fadiga, preciso usar fila
preferencial, e as pessoas não veem com bons olhos. Quando sabem o motivo
recebo olhares de dúvida ou piedade. Precisamos falar mais sobre a
doença", acrescenta.
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Os tratamentos disponíveis
A esclerose múltipla não tem cura.
Os tratamentos oferecidos buscam estabilizar e
interromper a atividade inflamatória ao longo dos anos para que o paciente
tenha uma melhora na qualidade de vida.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, atualmente,
cerca de 20 medicamentos aprovados por agência reguladora, com reconhecimento
científico para o tratamento, estão disponíveis. A maioria deles existem no
Brasil e estão disponíveis no SUS (Sistema Único de Saúde), dentro do rol da
Agência Nacional de Saúde Suplementar.
Além do tratamento medicamentoso, segundo os
especialistas, é importante que seja realizado uma neuroreabilitação prevenindo
complicações como as deformidades ósseas nos pacientes.
“São medicamentos que regulam as reações do sistema
imunológico que está voltado ao ataque, sendo, portanto, considerados
imunossupressores. Além do tratamento específico para controlar a doença, são
utilizados medicamentos e técnicas para alívio e manejo de sintomas. Na ocasião
dos surtos, são usados procedimentos, como pulsoterapia com corticoesteroides ou,
em casos agressivos, a plasmaférese terapêutica (processo que remove e
substitui o plasma sanguíneo do paciente)”, explica Thomaz.
“Atualmente, se vivencia uma verdadeira revolução no
tratamento e no prognóstico da doença, com risco muito menor de sequelas e
progressão degenerativa. O objetivo atual é evitar ao máximo que o cérebro e a
medula espinhal sejam “invadidos” pela doença, reduzindo o risco futuro para a
pessoa com EM”, acrescenta o neurologista e coordenador médico do Centro de
Excelência em Esclerose Múltipla do Einstein.
No caso de Manu, o tratamento inclui acompanhamento
com reumatologista para alívio de sintomas articulares e musculoesqueléticos,
reposição de vitamina D e foco na saúde mental, com acompanhamento com
psicólogo e remédios - prescritos por um médico - para o controle da ansiedade.
“Também tento vigiar minha alimentação evitando
alimentos inflamatórios, faço atividade física de baixo impacto como natação e
hidroginástica”, diz.
“A esclerose múltipla é como uma parceira de dança
que estou sempre vigiando para que ela não pise em meu pé. Conviver com a
doença é uma caixa de surpresas, cada dia é um novo desafio e nunca sei com
qual sintoma vou acordar.”
Fonte: BBC News Brasil
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