Quais os riscos do superfungo mortal que causa surto em Pernambuco
A Secretaria de Saúde de Pernambuco confirmou, no
fim de maio, três casos de infecção por Candida auris, conhecido popularmente
como "superfungo".
Segundo as informações divulgadas até o momento, os
pacientes são do sexo masculino e estavam internados em três hospitais
diferentes nas cidades de Paulista, Olinda e Recife.
O primeiro diagnóstico ocorreu em 11 de maio no
Hospital Miguel Arraes, em Paulista. Por ora, a unidade de saúde parou de fazer
novos atendimentos para evitar que outras pessoas sejam afetadas por esse
patógeno.
O Candida auris foi detectado nos outros dois
indivíduos nos dias 14 e 23 de maio, respectivamente.
Os especialistas ainda não conseguiram estabelecer
uma cadeia de transmissão e se há alguma relação entre os três episódios
ocorridos em locais diferentes.
O Governo de Pernambuco anunciou na sexta-feira
(26/5) a criação de um comitê específico para monitorar e lidar com os casos da
infecção.
Essa não é a primeira vez que o Estado sofre com um
surto desse tipo: entre dezembro de 2021 e setembro de 2022, o Hospital da
Restauração, em Recife, registrou 47 indivíduos acometidos por esse
"superfungo".
Mas por que Candida auris causa tanta preocupação? E
quais os riscos individuais e coletivos deste fungo?
• Contaminação
difícil de controlar
Na maioria das vezes, as leveduras do gênero Candida
residem na pele, na boca e nos genitais sem causar problemas, mas podem causar
infecções quando uma pessoa está com a imunidade baixa ou quando esse fungo
invade a corrente sanguínea ou os pulmões.
No caso específico do Candida auris, ele costuma
causar problemas na corrente sanguínea, mas também pode afetar o sistema
respiratório, o sistema nervoso central e órgãos internos, assim como a pele.
Os sintomas mais comuns dessa infecção fúngica são
febre, calafrios, suores excessivos e pressão arterial baixa — mas há muitos
indivíduos que não apresentam muitos incômodos sugestivos.
O patógeno foi estudado pela primeira vez em 2009 no
canal auditivo de uma paciente no Japão — mas pesquisas recentes detectaram
cepas dele em 1996, na Coreia do Sul.
A taxa de mortalidade média dessa doença é estimada
em 39%, segundo cálculos em estudo de sete pesquisadores chineses publicado na
revista científica BMC Infectious Diseases em novembro de 2020.
Segundo o infectologista Arnaldo Lopes Colombo,
professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e especialista em
contaminação com fungos, é possível ser colonizado de forma passageira pelo C.
auris na pele ou na mucosa sem ter problemas. O fungo apresenta risco real se
contaminar a corrente sanguínea.
Para a pessoa ser infectada, explicou ele à BBC News
Brasil em 2019, é preciso que tenha sofrido procedimentos invasivos (como
cirurgias e uso de cateter venoso central) ou tenha o sistema imunológico
comprometido.
Pacientes internados em unidades de terapia
intensiva (UTI) por longos períodos e com uso prévio de antibióticos ou
antifúngicos também são considerados grupo de risco para a contaminação.
Além disso, o Candida auris costuma ser confundido
com outras infecções, levando a tratamentos inadequados.
Para completar, detergentes e desinfetantes comuns
não são suficientes para eliminar o fungo do ambiente. Muitas vezes, os
profissionais de saúde precisam fechar alas inteiras de hospitais e aplicar
produtos especiais para conseguir tornar aquele local seguro novamente para
receber os pacientes.
Do ponto de vista preventivo, cuidados básicos com a
higiene das mãos, uso de equipamentos de proteção em ambientes como a UTI e a
vigilância constante podem ajudar.
• Resistência
aos remédios
Desde 2022, o Candida auris faz parte da lista da
Organização Mundial da Saúde (OMS) de patógenos prioritários que trazem risco à
saúde.
Nos Estados Unidos, a infecção está se espalhando
rapidamente e de forma "alarmante", segundo o Centro de Controle e
Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos.
Os casos nos EUA quase dobraram em 2021: passaram de
756 para 1.471, de acordo com um relatório da entidade divulgado em março deste
ano.
Na maioria das infecções diagnosticadas em terras
americanas, o fungo era resistente aos tratamentos disponíveis.
Por esse motivo, o CDC classifica a situação como
uma "ameaça urgente relacionada à resistência antimicrobiana". Muitos
pacientes afetados estão em hospitais e lares de idosos.
Outro motivo de preocupação é o aumento de casos que
se tornaram "resistentes às equinocandinas", que é a classe de
antifúngicos mais recomendada para o tratamento da infecção por Candida auris.
O CDC atribui o aumento à falta de medidas de
prevenção nas unidades de saúde e às melhoras nos serviços de acompanhamento e
diagnóstico de casos.
Outro fator que parece ter contribuído, segundo a
entidade, foi o estresse ao sistema de saúde relacionado à pandemia de
covid-19.
No Brasil, já foram identificados ao menos quatro
surtos de maior importância relacionados a esse micro-organismo nos últimos
anos.
O episódio ocorrido em Recife entre 2021 e 2022 foi
alvo de um estudo publicado neste ano por cientistas da Fundação Oswaldo Cruz
(FioCruz).
Segundo os pesquisadores, o Candida auris
"requer uma grande vigilância por sua alta capacidade de formar colônias e
biofilmes, o que contribui para a disseminação do fungo".
"A identificação rápida e precisa dessa espécie
é essencial para gerenciar, controlar e prevenir infecções", concluem os
especialistas.
Fonte: BBC News Brasil
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