Luis
Nassif: As esperanças na estratégia da Fazenda
Em “Xadrez do
arcabouço e o nó da tática defensiva de Lula”, expus o
que considero os problemas da economia:
- Há um boicote claro do Banco Central, mantendo a Selic a 13,75%.
- Com o arcabouço, pretendeu-se revogar os grilhões da Lei do Teto e
apresentar uma alternativa para desarmar os álibis de Roberto Campos Neto
para não derrubar a inflação. Sem o álibi, ficará exposto às pressões dos
grandes grupos e do próprio mercado.
- Para a estratégia das certo, necessitaria de duas condições: a
redução da Selic (que depende de Campos Neto) e o fim de inúmeros
subsídios que beneficiam grandes grupos (que depende da parceria com o
presidente da Câmara Arthur Lira).
A estratégia da Fazenda está diretamente ligada à
fragilidade política do governo. Recém chegado da Bahia, sem conhecer as idiossincrasias
da política da capital, o Ministro da Casa Civil, Rui Costa, tentou o decreto
de saneamento, passando por cima da Câmara, e acabou atropelado. Perdeu chance
de interlocução com o Congresso. Conhecedor de Brasília, mesmo assim o Ministro
Alexandre Padilha não parece à vontade no seu papel de articulador político.
Nessa quadra, o único caminho a trilhar – pensa-se
na Fazenda – seria buscar a interlocução com Artur Lira, trocando o Teto de
Gastos por um novo modelo que, com o tempo, mostrará mais flexibilidade do que
o nome sugere. Foi o que fez o Ministro Fernando Haddad.
Sua estratégia consiste em aproximar-se do mercado,
trocar a Lei do Teto pelo arcabouço, sem jamais deixar de lado a interlocução
com o Congresso.
Após a aprovação do arcabouço, houve uma queda de
200 pontos básicos na curva longa de juros, mostrando que o mercado endossou o
plano. Significa também que a Selic poderia estar pelo menos 2 pontos abaixo,
chegando ao próximo ano na casa de um dígito.
O desafio, portanto, é concluir o ciclo.
·
Os avanços iniciais
A cada dia, fica cada vez mais claro que Roberto
Campos Neto, presidente do Banco Central, se meteu em uma enrascada, com sua
insistência em Selic elevada. No almoço na casa do presidente do Senado,
Rodrigo Pacheco, houve um coro uníssono de empresários de todos os setores
falando que já deu, a economia não pode mais suportar essa carga.
O grande nó nessa questão é a teimosia ignorante de
Campos Neto, um absoluto jejuno em teoria monetária.
Há uma enorme crise no pensamento monetário. Antes
da grande crise de 2008, consolidou-se a teoria das expectativas racionais, de
Thomas Sargent, em colaboração com Christopher Sims, prêmio Nobel de Economia
de 2011.
A crise de 2008 afetou profundamente a teoria,
porque mostrou o poder incontrolável adquirido pelos mercados financeiros,
tornando impossível seu enquadramento em modelos econométricos. A teoria das
expectativas racionais perdeu legitimidade e a única alternativa apresentada
foi a MMT, Nova Teoria Monetária, que não conquistou a maioria dos corações e
mentes da economia. Há uma enorme interrogação pela frente e Campos não tem a
menor ideia sequer sobre os dilemas da macroeconomia contemporânea, ainda menos
sobre os caminhos a percorrer.
Agora, a indicação de Gabriel Galípolo para a
Diretoria de Política Monetária do BC ajudará nesse processo de jogar para
baixo as expectativas do mercado. Sem desrespeitar as leis de mercado, Galípolo
tornará a política monetária mais efetiva, atuando no mercado de taxas de juros
longas e de câmbio. Em todas as economias avançadas, uma das formas de induzir
as expectativas inflacionárias é impedir a ação especulativa sobre ambos os
mercados, reduzindo a volatilidade.
De qualquer modo, a pressão dos agentes econômicos
sobre Campos Neto está nítida e tende a crescer.
·
Os avanços
Em cinco meses, conseguiu-se avanço na Petrobras. No
Seminário da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Aloizio
Mercadante e diretores do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social) apresentaram algumas alternativas para driblar o custo do dinheiro,
especialmente no financiamento da inovação e das pequenas e micro empresas.
Sabe-se que a recuperação do papel histórico do BNDES demandará algum tempo,
mas tenta-se contornar com a criação de fundos garantidores, que ajudarão no
barateamento das obras de infra-estrutura. E Mercadante tem-se revelado um
aliado relevante.
Em relação à melhoria da Receita, pela primeira vez
se fará um ajuste fiscal em cima dos ricos – os beneficiados por subsídios e engenharias
fiscais. Em 2015 o ajuste fiscal recaiu sobre os consumidores e destruiu a
imagem do governo.
A Fazenda contabiliza dez vitórias expressivas nessa
direção, como as questões da subvenção de custeio, preço de transferência, base
PIS-Cofins, reoneração de combustíveis, MP para taxar offshores (contas no
exterior) e a mudança no CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais),
onde obteve até o apoio da OCDE para mudar a sistemática de um conselho
paritário entre representantes do governo e das empresas, com o empate
favorecendo as empresas.
A recente capa da Veja, com Haddad, seria a
constatação de que conseguiu dar uma racionalidade às ações de governo.
O maior otimismo é com o quadro externo.
Está fácil para o Brasil, comenta-se na Fazenda.
Nenhum país tem o potencial do Brasil para novos investimentos. Europa, Estados
Unidos e China têm torque próprio, não dependem de nada. Ainda assim, a
economia da Europa e Estados Unidos não vão bem e a China se embaralha com
questões geopolíticas. A África está endividada e o Oriente Médio nada em
dinheiro, mas não tem projetos de investimento. A Arábia Saudita dispõe de um
trilhão de dólares para investir, sem dispor de alternativas na região.
O Brasil é candidato natural pela questão
energética. Além de ter a matriz mais limpa do planeta, com 92% de energia
renovável, tem uma série de produtos verdes prontos para serem desenvolvidos:
aço verde, hidrogênio verde.
·
O reforço do MDIC
Na Fazenda, considera-se que Simone Tebet está se
saindo bem, assim como os Ministros Renan Filho, da Infraestrutura, Alexandre
Silveira, de Minas e Energia, e Nísia Trindade, da Saúde. O Ministro do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, padece da falta de uma
equipe de peso. Preferiu se cercar de correligionários paulistas, com parco
conhecimento sobre política industrial. Recebeu, agora, o reforço do economista
Uallace Moreira, com amplo conhecimento sobre o tema, especialmente do modelo
de desenvolvimento chinês.
Lula voltou bastante otimista de seu périplo internacional.
Mas, agora, terá que se dedicar intensamente às articulações políticas. Nos
últimos dias vazaram algumas implicâncias de Ministros com os almoços diários
com a esposa Janja. Em qualquer circunstância, seria um gesto de carinho a ser
festejado. Mesmo porque, o namoro com Janja rejuvenesceu Lula. Acontece que, no
mundo político, os almoços têm um sentido especial. É através deles que se
convidam aliados, adversários, parlamentares para o grande jogo de conquista de
apoio para garantir a governabilidade. E, agora, Lula terá que entrar de cabeça
no jogo político.
Há condições políticas e econômicas para superar a
fase atual e permitir ao país voltar ao crescimento. Mas, no campo político,
primeiro terá que se arrumar a casa. Com a casa arrumada, pode-se delegar.
Ø A inteligência política de Lula regida pela pragmática tem seu preço. Por
Maria Betânia Silva
Na semana passada Lula fez um discurso na
Fiesp para acalmar os corações e o ambiente. Mais precisamente, os corações dos
defensores do meio ambiente.
Lançou a ideia de carro popular mais barato, menos
poluente que é um projeto para impulsionar a economia, considerando a cadeia
produtiva que envolve a fabricação de automóveis.
Ou seja, ele reedita uma política baseada na
indústria automotiva, como já fizera no passado, a isso agregando como se fosse
acessório necessário, um carro menos poluente.
A preocupação com o ambiente natural no caso é
contemplada na compra do veículo com um item obrigatório vindo de
fábrica: um dispositivo menos poluente.
Nessa esteira, Lula se alinha à lógica vigente nos
países ditos desenvolvidos que incorporam a preocupação ambiental a uma
sociedade cada vez mais tecnologizada no domínio da autonomia individual, sem
que isso implique necessariamente redução de resíduos poluentes e um real
compromisso com o planeta ou com as gerações futuras.
O carro continua a ser destaque e o seu uso
não tão poluente, uma conquista. A sua fabricação, contudo, não o é. Mas
isso é mero detalhe.
A diferença entre o que pode ser feito no BR
nesse aspecto e os países ditos desenvolvidos é que, nesses países, o
transporte coletivo ainda resiste em condições razoáveis, como um legado do
estado de bem estar social que tiveram e que o BR quase conheceu somente nos 13
anos dos governos do PT, como algo transitório e solúvel como um nescafé.
Para mim, ficou bem claro que Lula adota um modelo
de desenvolvimento focado na conquista de bens materiais e baseado apenas no
sucesso individual.
Não me surpreende que o faça, mas receio que esteja
perdendo o bonde da História. O que seria uma grande pena dada a sua
envergadura como líder humanista que é. A rigor, parece perder o bonde
para a História instauradora de um novo paradigma. Mas, seria muito
esperar isso dele, né? Ele é o próprio sucesso individual a ser projetado em
cada um de nós. E embora não haja nada de errado nisso, trata- se de algo
insuficiente.
Não há, no caso, uma concepção de desenvolvimento
focada no coletivo como “a alma do negócio”.
O coletivo dependerá da felicidade individual de ter
um carro na garagem enquanto o MST – se sobreviver à CPI e acho que vai –
produz a comida orgânica em concorrência com a toxicidade do agro, importante
peça na balança comercial do país. Estaremos, assim, na trilha de fazer com que
nosso povo adquira o “padrão de vida europeu”. Essa é a aposta.
Só resta saber quanto tempo os recursos naturais do
BR poderão sustentar esse modelo para o povo brasileiro e para as empresas
européias que terão algum interesse em explorar/comprar matéria-prima e/ou
exportar peças automotivas, para garantir sua manutenção nos seus próprios
países.
Mais do que isso, o discurso de Lula revelou algo
que talvez nem tenha chamado a atenção de muita gente… Lula delegou
a Alckmin papel de empreendedor, ao dizer que caberia a ele, no próximo ano,
sair pelo mundo “vendendo” “nossos projetos”.
Particularmente, eu acho que Lula deixou claro qual
é o lugar que a proteção ambiental ocupa no seu governo: uma proteção
secundária, não é a prioridade. É uma agenda necessária, mas torná- la
prioridade é coisa para o futuro. Ele poderá, assim, concluir seu mandato
glorificado pela direita e por uma esquerda menos esquerdista.
Lula se mostra cada vez mais perspicaz com o seu
pragmatismo político, evitando assumir que trilha o rastro do neoliberalismo,
talvez porque esse sistema tenha chegado ao ponto de não retorno no mundo atual
e nesse ponto permanecerá por décadas.
É como se a única saída para o Brasil fosse se
tornar a Europa das Américas e não algo diferente daquele continente.
Não diria que Lula está totalmente errado. Não! Ele
trilha o caminho que enxerga como o único possível.
Problema meu não ficar alegre com essa trilha.
Boa parte da sociedade, acredito, ficará realizada e
feliz quando começar a adquirir o seu carrinho ” verde”. Não importa que venha
a se irritar com o tempo perdido no engarrafamento ou com os alagamentos,
ou com o aumento da temperatura, ou, ainda, com a perda da safra de uvas.
A irritação é passageira, o sentimento de sucesso
material, não! Isso é o que dá a certeza de que a vida de trabalho individual
vale e valeu a pena. O indivíduo é o cara como o Sujeito universal e potente.
Fico com a impressão de que o sonho de mudança para
um mundo cuja construção coletiva possa ter, por exemplo, inspiração nas
experiências de vida mais duradoura como aquelas de resistentes comunidades
indígenas ou mesmo africanas, alimentadas na perspectiva decolonial, não é mais
sustentável a médio prazo. Esse sonho não tem mais como prosperar.
As condições objetivas do mundo estão dadas:
enquanto houver recursos naturais a serem explorados que os exploremos. Devo,
por isso, me resignar a essa realidade que não coincide com os meus
sonhos e oscila entre eles e o pesadelo.
Fonte: Jornal GGN
Nenhum comentário:
Postar um comentário