Reforma
tributária anima mercado e Congresso começa a articular aprovação
A aprovação
folgada do novo marco fiscal na Câmara dos Deputados, concluída na quarta-feira (24), já começa a aquecer as expectativas
para o próximo grande projeto econômico prometido pelo governo de Luiz Inácio
Lula da Silva: a reforma
tributária.
Para economistas do mercado financeiro, ela é,
naturalmente, o próximo tema a começar a tomar a agenda do governo, dos
parlamentares e do próprio mercado — e a votação expressiva que o governo
conseguiu para o seu projeto fiscal na Câmara ajuda a elevar o otimismo com relação
à aprovação desta, que é uma das reformas mais complexas de se fazer.
No Congresso, a passagem do marco fiscal pela sua
fase mais difícil, na Câmara, já está levando os parlamentares a retomarem as
discussões acerca da reforma tributária, que estava em compasso de espera, com
perspectiva de entregar as primeiras versões do projeto para discussão ainda em
junho.
Dentro do governo, não é diferente: em
entrevista à CNN nesta quinta-feira (25), o secretário
extraordinário da Reforma Tributária, Bernard
Appy, contou que as tratativas pela reforma foram
intensificadas após a aprovação do marco fiscal na Câmara, inclusive com o
ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, começando a se envolver “diretamente” na
articulação da matéria junto às equipes técnicas.
O texto-base do novo marco fiscal, legislação que
deverá substituir o atual teto de gastos, foi
aprovado na Câmara com 372 votos. Por ser um
projeto de lei complementar, era necessário ao menos metade deles, ou 257 votos
favoráveis dos 513 deputados.
O projeto segue agora para votação no Senado, onde
uma base mais alinhada ao governo do que na Câmara dá aos políticos e
especialistas a tranquilidade de que o texto não deve enfrentar mais tantas
alterações, nem barreiras até ser terminalmente aprovado e sancionado.
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Ajuda para a bolsa
“A votação do arcabouço foi impressionante e mostra
um alinhamento entre Congresso, Ministério da Fazenda e o governo como um todo,
que deve transparecer, agora, na reforma tributária”, diz o economista-chefe do
Banco Master, Paulo Gala.
“Ela é a última grande reforma que ficou faltando,
depois da trabalhista e da Previdência, e a sua aprovação traria um cenário
bastante positivo, podendo, inclusive, ajudar a melhorar a bolsa de valores”,
acrescentou.
É este momento de sintonia entre parlamentares e
governo que, na avaliação dos economistas, deve ajudar a contornar as
históricas e inevitáveis resistências que surgem sempre que se tenta fazer uma
reformulação dos tributos.
“O debate deve ficar mais complexo na hora de
discutir a combinação dos tributos estaduais e municipais”, diz o
estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno. “Alguns estados vão se
beneficiar, outros vão sair perdendo, então vai começar a gerar a insatisfação
de alguns governantes.”
O ministro da Economia de Jair Bolsonaro, Paulo
Guedes, chegou a
apresentar projetos avançados para dar andamento à reforma tributária em 2020 e 2021, mas as discussões acabaram paralisadas em meio à
falta de articulação e de consensos.
O próprio Lula, em seus primeiros mandatos, chegou
também a tentar uma reforma tributária e a apresentar projetos, todos, porém,
também sem avanço.
O principal objetivo da primeira grande etapa da
reforma tributária é unificar e simplificar a miríade de impostos indiretos que
o país possui, aplicados nas empresas sobre as mercadorias e serviços.
PIS, Cofins e IPI, federais, o ICMS, que é estadual,
e o ISS, municipal, são alguns deles, muitos cobrados cumulativamente uns sobre
os outros.
Trata-se de um tema que já vem sendo discutido há
anos, inclusive com
projetos já bem maduros e amplamente debatidos dentro e fora do Congresso. Um deles, inclusive, elaborado pelo
próprio Appy, um dos maiores nomes em economia tributária do país e que
acabou levado para dentro do governo por Lula para
comandar o tema.
Tudo isso, na visão dos especialistas, ajuda na
perspectiva de que a aprovação de um projeto consensual seja finalmente
viabilizada, ainda neste ano.
“É uma discussão que já avançou bastante e tem
condições de ser aprovada ainda este ano”, disse Gala, do Master. “Se não for
neste ano, em que os governos tradicionalmente tem um capital político maior,
depois fica bem mais difícil.”
·
Parlamentares retomam os trabalhos
No Congresso, a expectativa é que o foco dos
deputados se volte à reforma tributária agora que o novo marco fiscal foi
aprovado e despachado para o Senado.
Parte dos parlamentares acreditava ser necessário
tratar antes das novas regras fiscais para então delinear como ficam as
mudanças no sistema tributário brasileiro.
Um grupo de trabalho para elaborar um parecer
atualizado da reforma tributária chegou a ser criado em 15 de fevereiro na
Câmara dos Deputados, e, na terça-feira da semana passada (16), ele teve as
atividades prorrogadas por mais 20 dias. Ou seja, deve trabalhar até o início
de junho.
A cúpula do grupo tinha em mente pedir a prorrogação
dos trabalhos caso ainda não houvesse um ambiente pronto para a aprovação da
matéria. A ideia é evitar que o parecer seja apresentado antes do tempo e acabe
ficando parado, levando ao risco de ser desidratado.
O relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), já disse
que pretende
entregar o parecer em 6 de junho e que a
votação do documento deve acontecer até o final do mês.
A intenção é aprovar o projeto na Câmara antes do
recesso parlamentar, que começa em 18 de julho.
Enquanto Aguinaldo não apresenta o parecer, o grupo
deve continuar promovendo mais audiências públicas e reuniões, especialmente
com representantes de setores afetados, o que inclui governadores, prefeitos e
bancadas estaduais.
Essa atuação continuará até a apreciação em
plenário. A tendência é que, com o passar das semanas, haja maior consenso.
·
Discordâncias
Até o momento, porém, a ideia de uma reforma
tributária como a desenhada pelo Congresso causa apreensão em alguns setores da
economia.
Setores do agronegócio e de comércio e serviços veem
com ressalvas a proposta e dizem que preferem aguardar o texto do relator antes
de emitirem opiniões concretas.
Deputados e senadores que representam esses setores,
porém, têm se posicionado contra alguns trechos e a favor de uma compensação
financeira.
A bancada ruralista, por exemplo, reclama do trecho
proposto pelo governo de
“cashback” dos impostos pagos em produtos da cesta básica.
A ideia do governo é que apenas as pessoas mais
pobres tenham acesso a esse desconto dos tributos. Para os críticos, porém,
essa proposta é irreal, de difícil aplicação e poderia provocar um aumento dos
preços.
Outra demanda dos setores é que haja alíquotas
diferenciadas no novo tributo de consumo que vem sendo desenhado com a
unificação proposta dos impostos atuais.
Aguinaldo Ribeiro tem indicado que aceitará incluir
em seu texto alguma diferenciação de alíquota para não onerar excessivamente um
setor em detrimento de outro.
Apesar das reivindicações, há também a avaliação no
Parlamento de que o ambiente para a aprovação de uma reforma tributária agora
pode ser maior do que em tentativas anteriores.
Isso porque há uma linha de discussão mais
unificada, sem vários textos sobre o tema concorrendo entre si, e conta a favor
o apoio do governo federal, com Haddad se envolvendo diretamente nas
tratativas, por exemplo.
A gestão petista não consolidou ainda a base aliada
no Congresso. Mesmo assim, a aprovação do novo marco fiscal na Câmara com forte
apoio de partidos do centrão também foi percebido como um ponto positivo.
Ø Tributos sobre combustíveis sobem em junho; governo espera conter alta
Duas rodadas de aumento na tributação sobre
combustíveis estão previstas para os próximos meses, o que pode impactar os
preços ao consumidor — pressionando-os para cima.
Porém, o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, indicou que
a Petrobras, estatal controlada pela União, pode agir para impedir ou, pelo
menos, atenuar altas nos preços em razão da
elevação de impostos.
Para isso, a empresa teria de baixar os preços dos
combustíveis na bomba quando os aumentos de tributos começarem a valer – o que
já foi feito anteriormente, em fevereiro deste ano (quando houve aumento de
impostos federais).
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Mudanças no ICMS em junho
No início de junho, os estados promoverão
alterações no formato de cobrança do ICMS sobre gasolina. O tributo estadual,
até então calculado em porcentagem do preço (de 17% a 23%, dependendo do
estado), passará a incidir com uma alíquota fixa, em reais, de R$ 1,22 por
litro.
"A média das alíquotas dos estados [atualmente,
no Brasil] fica em torno de 19%, o que representa R$ 1,0599/litro. Com a
vigência do valor ad rem, de R$ 1,22/litro, a partir de 1º de junho, um aumento
médio de R$ 0,16/litro, o que representa um aumento médio de 22% no preço final
ao consumidor, na média Brasil", estimou o Centro Brasileiro de
Infraestrutura (CBIE).
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Tributos federais em julho
Já no começo de julho, o governo federal retomará a
tributação com alíquota cheia do PIS/Cofins sobre gasolina e etanol.
A expectativa, com isso, é que o preço suba
cerca de R$ 0,22 por litro no caso dos dois combustíveis, segundo cálculos do
governo.
- Em fevereiro, o governo
anunciou a volta dos impostos federais sobre gasolina e álcool.
- Na ocasião, foi feita uma "reoneração" parcial. Para
compensar o aumento apenas parcial dos tributos, foi instituído um imposto
sobre exportação de óleo cru – este com validade de quatro meses.
- Ao fim desse período, no começo de julho, haverá um novo aumento dos
tributos sobre gasolina e álcool.
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Governo pode atuar, indica Haddad
Em meados de maio, o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, indicou, durante audiência pública na Câmara dos Deputados, que a
Petrobras pode reduzir os preços dos combustíveis nos próximos meses para
compensar o aumento dos tributos federais previstos para julho.
"Com o aumento [de tributos] previsto para 1º
de julho, vai ser absorvido pela queda do preço deixada para esse dia. Nós não
baixamos tudo o que podíamos. Justamente esperando o 1º de julho, quando acaba
o imposto de exportação e acaba o ciclo de reoneração", declarou, ele na
ocasião.
Com ações listadas em bolsa, a Petrobras divulgou um fato relevante no mesmo dia.
"A Petrobras não antecipa decisões de reajustes
e reforça que não há nenhuma decisão tomada por seu Grupo Executivo de Mercado
e Preços (GEMP) que ainda não tenha sido anunciada ao mercado", informou a
empresa, em 17 de maio.
Haddad não citou especificamente a alteração no
ICMS, com impacto nos preços, que acontecerá na próxima semana.
De acordo com ele, essa redução prevista para julho,
na gasolina e no álcool pela Petrobras, estaria em linha com os preços
internacionais.
"A Petrobras deixou claro que obviamente vai
olhar o preço internacional. Não tem como escapar disso porque ela importa. Ela
pode, em uma situação mais favorável como agora em que o preço do petróleo
caiu, mas que o preço do dólar caiu, combinar os dois fatores e reonerar sem
impacto na bomba", declarou Haddad.
Ele também sinalizou que o mesmo procedimento deve
ser feito com o diesel, cuja desoneração vale até o fim desse ano. "E tudo
bem, como vai acontecer com o diesel no final do ano. Já deixou uma gordura
para computar a reoneração", acrescentou.
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Política de preços da Petrobras
Neste mês de maio, a Petrobras anunciou uma nova
política para os combustíveis, que considerará
usa duas referências de mercado:
- o "custo alternativo do cliente, como valor a ser priorizado na
precificação", e
- o "valor marginal para a Petrobras".
Especialistas ouvidos pelo g1 consideram que a nova
política deve
beneficiar o consumidor final no curto prazo, porque impede que oscilações
muito drásticas no preço do dólar ou do petróleo sejam repassadas nos
combustíveis.
Após o anúncio da nova política, a estatal
anunciou mais uma redução do preço do diesel e da gasolina para as
distribuidoras.
Em entrevista à GloboNews, em 17 de maio, o
presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, admitiu que
a empresa poderá seguir orientações do governo para precificar os combustíveis.
"A Petrobras do governo anterior é uma
Petrobras que combinava esse jogo, mas a Petrobras que combinava jogo acabou e
ela vai fazer o que é importante para o Brasil. E se tiver que seguir a
orientação do governo, seguirá se fizer sentido para ela, para o consumidor e
acionista", disse Prates, em meados de maio.
Questionado na mesma entrevista se a Petrobras vai
baixar os preços para compensar o aumento dos tributos, o presidente da
estatal, Jean Paul Prates, disse que a
companhia vai avaliar.
"Não sei, vamos ver até lá, as circunstâncias
vão dizer, se a gente estiver num ciclo de baixa [do preço do barril de
petróleo]", respondeu. "Quando chegar lá, no dia, a gente vai dizer
se cabe ou não cabe absorver o tanto de imposto que vai reentrar",
completou.
Fonte: CNN Brasil/g1
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