sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Jeferson Miola: No Brasil, como nos EUA, o povo não se alimenta de PIB nem de ajuste neoliberal

vitória soberba de Donald Trump nos EUA desbancou muitas expectativas e verdades cristalizadas, dentre elas a de que o bom estado da economia é fator grandemente determinante para o sucesso eleitoral.

Caso este postulado valesse como uma “lei do comportamento do eleitorado”, a candidata Kamala Harris teria sido eleita para a presidência daquele país.

No atual governo estadunidense, do qual a candidata do Partido Democrata é vice-presidente, o PIB aumentou 2,9% no último ano, o desemprego está em 4,1% e os salários cresceram 3,9%.

Entretanto, a despeito desses indicadores, foi Donald Trump, e não Kamala Harris, quem conseguiu capturar o voto descontente e incomodado, aquele que traduziu um mal-estar econômico aparentemente invisível, mas vivido de modo implacável pelos segmentos populares.

Na vitória do “homem alaranjado”, a sensação econômica concreta das pessoas e o mal-estar com a difícil condição material de vida falaram mais alto que o medo em relação às aberrações que ele defendeu na campanha e que deverá concretizar no governo.

No Brasil de Lula 3 a situação econômica não é muito diferente: o PIB cresce ao redor de 3%, o desemprego está num dos níveis mais baixos das últimas décadas [6,4%], aumenta a renda dos trabalhadores empobrecidos –formais, informais e por conta própria–, e crescem os ganhos de aposentados, dos beneficiários do BPC e do Bolsa Família.

Apesar disso, no entanto, e do enorme empenho na reconstrução das políticas permanentes de Estado, as pesquisas mostram a aprovação do governo empacada.

E, por outro lado, a eleição municipal evidenciou que os eleitores lulistas, inclusive os beneficiários do Bolsa Família, votaram massivamente em candidatos da direita e da extrema-direita.

Isso que aparenta ser um paradoxo sociológico pode, no entanto, encontrar explicação na frase da economista Maria da Conceição Tavares, que anos atrás disse que “ninguém come PIB, come alimentos”. Deve-se emendar: o povo também não se alimenta de ajuste neoliberal.

Do ponto de vista da classe trabalhadora, em sua imensa maioria empobrecida, excluída e sujeitada a empregos e salários precários, não importa só ver o PIB crescer, é preciso que tal crescimento se materialize em capacidade de consumo e de oportunidade de uma vida decente.

O custo de vida, a carestia dos alimentos e dos produtos de primeira necessidade de consumo como energia, gasolina, remédios, transporte, educação etc, neutralizam os efeitos positivos da economia para a maioria pobre, porque são os ricos, os rentistas e segmentos de maior renda que se apropriam dos frutos do crescimento do PIB.

Se tudo o que já está sendo feito [e é muito] pelo governo Lula para aumentar a renda das maiorias sociais tem sido insuficiente para conquistar apoio popular e gratidão eleitoral, será um equívoco perigoso o governo adotar políticas austericidas e de ajuste neoliberal que só diminuirão a conexão do governo e das esquerdas com a maioria do povo brasileiro, e cujos efeitos serão sentidos na eleição de 2026.

A realidade indica, portanto, que é necessário fazer mais do que está sendo feito, e não menos.

Isso significa aumentar consideravelmente o poder de compra dos salários, em especial do salário mínimo, e também ampliar a proteção social com uma renda mínima compatível para a vida digna de milhões de trabalhadores expulsos pelo neoliberalismo para sempre do mundo do trabalho e da produção.

Será um erro grave se o governo sacrificar os orçamentos do SUS e da educação e atacar as aposentadorias, o salário-desemprego, o salário mínimo, o BPC e programas sociais em nome do equilíbrio fiscal.

Como o próprio presidente Lula declarou, é inaceitável que cerca de R$ 640 bilhões sejam drenados do orçamento para beneficiar empresários e grupos privados com desonerações e isenções tributárias que aumentam a concentração de renda e atrasam o desenvolvimento.

Outros R$ 800 bilhões são saqueados do orçamento da União para alimentar a ganância de rentistas, financistas e investidores que parasitam a renda nacional por meio dos juros e serviços da dívida, enquanto são isentos de imposto sobre suas rendas e fortunas.

Ao invés de sacrificar dezenas de milhões de trabalhadores brasileiros com o ajuste neoliberal, o governo deveria propor à sociedade e ao Congresso a discussão sobre privilégios indecentes das castas burocráticas incrustradas no Estado e que se apropriam de parcelas significativos dos impostos pagos pela população.

O judiciário brasileiro, por exemplo, consome 1,6% do PIB por ano, um dos custos mais altos do mundo.

Idem para o Legislativo, para o Ministério Público e outras carreiras nababescas do Executivo que se locupletam com inventos criativos para aumentar o valor do holerite.

No TCU, por exemplo, mecanismos engenhosos permitem que ministros ganhem mais de R$ 1,3 milhão por ano.

Só em pensões vitalícias para esposas e filhas de militares, a mais antiga dessas pensões paga desde o ano 1930 do século passado, a União dispende mais de R$ 25 bilhões por ano.

Ao todo, não passam de 210 mil pensionistas, a maior parte delas [144 mil, dados de 2022] filhas de militares, que consomem o equivalente a meio PAC por ano.

Como disse o presidente Lula, “nós não podemos jogar, toda vez que tem que cortar alguma coisa, em cima do ombro das pessoas mais necessitadas”.

Lula tem razão. Existem outras alternativas para cobrar a conta de quem mais pode pagar.

 

¨      BC eleva os juros e sabota a economia. Por Altamiro Borges, em seu blog

Em mais um ato de sabotagem contra a economia brasileira, o Banco Central aprovou nesta quarta-feira (6) uma nova alta da taxa básica de juros.

Desta vez, o aumento foi ainda maior, de 0,5 ponto, fazendo com que a Selic atinja o índice obsceno de 11,25% ao ano – o segundo maior do planeta.

A desculpa apresentada agora foi o das incertezas resultantes das eleições nos EUA. Balela!

A única certeza é que os abutres financeiros saíram novamente ganhando!

A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC se deu por unanimidade, o que significa que os quatro integrantes nomeados pelo governo Lula – incluindo Gabriel Galípolo, já aprovado pelo Senado para presidir o banco a partir de janeiro de 2025 – se curvaram às pressões do “deus-mercado”.

Conforme registra a Folha rentista, “a escolha pelo aumento mais agressivo da Selic veio em linha com a expectativa consensual do mercado financeiro”.

<><> A chantagem do “deus-mercado”

“Levantamento feito pela Bloomberg mostra que a alta de 0,5 ponto era a projeção unânime dos economistas consultados. O ciclo de subida de juros teve início na última reunião, em setembro, quando o Copom optou por um movimento mais gradual, de elevação de 0,25 ponto percentual – primeiro aumento feito no terceiro mandato do presidente Lula (PT). Com a segunda alta consecutiva, a Selic se iguala ao nível em que se encontrava em março”.

Além das “incertezas” externas, o Copom reafirmou seu doentio pavor com o crescimento da economia nativa, com a geração de emprego e renda.

“O comitê voltou a dizer que o cenário demanda uma política de juros mais contracionista. Isso significa uma atuação que ajude a frear a força da atividade econômica de forma a controlar o avanço da inflação. Como justificativa, citou a resiliência na atividade econômica, as pressões no mercado de trabalho, o hiato do produto positivo (indicação de que a economia está aquecida e operando acima do seu potencial, sujeita a pressões inflacionárias)”, relata a Folha rentista.

<><> Reação tímida da sociedade

A decisão do Banco Central, que ainda segue sob comando do bolsonarista Roberto Campos Neto – o Bob Fields Neto –, foi eminentemente política. Ela visou pressionar o governo Lula a tomar medidas duras de austericídio fiscal.

Em seu comunicado, o comitê defendeu cortes nos gastos e chantageou: “Uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida, com a apresentação e execução de medidas estruturais para o orçamento fiscal, contribuirá para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”.

A alta absurda da Selic gerou imediata reação de vários setores da sociedade.

A presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, protestou no X: “Copom mantém a sabotagem à economia e eleva ainda mais os juros estratosféricos. Irresponsabilidade total com um país que precisa e quer continuar crescendo”.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) também manifestou sua “indignação”: “Para o setor industrial, a decisão é extremamente conservadora e trará apenas prejuízos à atividade econômica, com reflexos negativos no emprego e renda”.

Mas enquanto não houver maior pressão da sociedade, os abutres financeiros continuarão impondo taxas de juros pornográficas e o Brasil seguirá sendo o paraíso dos banqueiros.

 

¨      Ubiratan de Paula Santos: Às favas com a guilhotina do ajuste fiscal

O neoliberalismo, que alargou a desigualdade e retirou direitos de trabalhadores, aposentados, cuidados com os idosos e impõe limitações e encarecimento na atenção à saúde, desde o final dos anos 70, foi derrotado, como vem sendo na Europa Ocidental.

Só se mantém prosperado no Brasil, Argentina, Chile.

Embora a economia tenha dados positivos nos EUA, como aqui, o povo deve se perguntar positivo para quem?

Quem se apropria da maior fatia, o 1% mais rico ou os demais 99%, ou os 50% mais pobres?

Que entrega real tem sido dada na saúde, na segurança, na educação?

Há insatisfação com os partidos da Ordem, com o status quo, com os que caminham pisando em brasas, sem nitidez, sem demonstrar de que lado estão, que não explicam ao povo, que têm medo do confronto, não passam credibilidade de que estão lutando pra valer pelos mais necessitados.

Quem mostra intimidade, inclusive pública, com a Faria Lima e Wall Street são rejeitados.

Quem vem sinalizando indignação com o status quo é a ultradireita. Trump lá, Milei na Argentina e Marçal e Bozo aqui, com vários filhotes refletindo o apelo, como o eleito em Cuiabá, os candidatos em Fortaleza, Curitiba e Rio de Janeiro.

Não se pode ser neutro, centrista, levar governo para o centro como apregoam muitos ao lerem os resultados das recentes eleições municipais no Brasil.

O centro (Simone Tebet, tucanos, MDB, Kassab, etc.) não tem votos nacionais. Seus representantes não tiveram candidatos competitivos a presidente nas duas últimas eleições e tomaram quatro derrotas de Lula e Dilma entre 2002 e 2014.

Ganharam este ano as eleições municipais, com vitória mais alargada do que antes, pela falta de nitidez do campo de cá e do governo Lula 3.

O governo Lula 3 é bom, mas morno, sem vida, vivacidade, sem demonstrar ser o brigador pelas causas do povo.

Perde-se em temas como atas das eleições na Venezuela. Manifesta apoio público a um candidato nas eleições nos EUA.

Não põe em pé o programa da reindustrialização.

Não melhora efetivamente a saúde e agora ameaça retirar recursos do SUS, Educação e Previdência.

Não amplia em padrão chinês a agricultura para inundar o país de alimentos de qualidade para o povo.

Opta por mais de 400 bilhões no plano safra, 75% para os grandes agroexportadores, que não geram emprego, retêm no exterior parte do dinheiro das exportações subsidiadas e fazem oposição cerrada no Congresso.

Tudo pelo aprisionamento ao centro, ao liberalismo que vem dominando a política econômica, o que significa a dominar a Política de seu governo.

Ontem (5/11/2024), Lula adiou decisão sobre cortes. Espero que as eleições nos EUA e as daqui sirvam de alerta para evitar a sedução de seu ministério pela Faria Lima, pelos consultados pelo Banco Central para a emissão do Relatório FOCUS para definir sua política.

É preciso investir, gastar para dar um salto perceptível na melhora dos serviços públicos, produzir alimentos, turbinar a ciência e tecnologia, as universidades públicas, enfrentar o problema da segurança pública na direção do programa apresentado pelo Ministério da Justiça, que deve ser explicado ao povo dos 27 entes federados.

Ou seja, às favas com a guilhotina do pretendido ajuste fiscal.

Investir, gastar para dar um salto perceptível na melhora dos serviços públicos, produzir alimentos, turbinar a ciência e tecnologia, as universidades públicas, enfrentar o problema da segurança pública na direção do programa apresentado pelo Ministério da Justiça. que deve ser explicado ao povo dos 27 entes federados.

Ou seja, às favas com a guilhotina do pretendido ajuste fiscal.

 

Fonte: Viomundo

 

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