Cesar Fonseca: Brics-Sul Global - arma
contra o fascismo trumpista
Os adversários do
presidente Lula, dentro e fora do governo, esfregam as mãos quanto à capacidade
dele de enfrentar perigos diante do governo Trump, amplamente vitorioso,
principalmente depois de ele ter apoiado a derrotada Kamala Harris.
Consideram,
negativamente, que, se Trump falar grosso com o Brasil, exigindo-lhe, por
exemplo, a renúncia ao BRICS, como pregou a general Laura Richardson,
comandante do Comando Sul dos Estados Unidos para a América Latina, haveria
recuo brasileiro relativamente à sua geopolítica sul-americana, afastando-se da
China, da Rússia e do Sul Global.
Pregam os pessimistas
americanófilos que dominam o poder no Brasil que é melhor cuidar de uma
aproximação com o novo presidente americano do que confrontá-lo, jogando
favoravelmente ao poder geopolítico dos BRICS, que nasceu por sugestão do
presidente Lula.
Evidentemente, o
BRICS, mais forte economicamente que o G7, dotado de infraestrutura
internacional em expansão, com apoio da China, torna-se a retaguarda
brasileira, se for ameaçado pelo fascismo trumpista.
Hoje, o Le Monde
francês prognostica que, se Trump endurecer com o Brasil, empurra o país para
os braços da China.
Trata-se de uma visão
midiática independente em relação à visão excessivamente dependente da mídia
nacional relativamente aos interesses dos Estados Unidos, por se situar no
campo geopolítico americano, como é o caso do Estadão, da Folha e do Globo,
americanófilos de carteirinha.
Desse modo, como
evidencia o Le Monde, o BRICS-Sul Global tem condições de ser a âncora que
apoiaria o Brasil diante de eventual pressão e chantagem americana em forma de
exigência para que se afaste do instrumento que ele criou como arma geopolítica
estratégica.
Frente às novas
circunstâncias que emergem para o governo Lula, depois da vitória de Trump, não
se trata de adotar posição relativamente acanhada ou temerosa, mas, ao
contrário, política ativa e altiva, sem medo de enfrentar os novos desafios que
teoricamente virão de possíveis retaliações do império contra o Brasil.
Essas retaliações
seriam ou não continuidade das pressões do Partido Democrata americano
realizadas contra a democracia brasileira, que resultaram no golpe parlamentar,
jurídico e midiático contra a ex-presidente Dilma Rousseff, hoje presidenta do
Banco BRICS.
DILMA, NOVO FATOR
ESTRATÉGICO
O BRICS e o Banco
BRICS podem ser alternativas para o governo Lula enfrentar as armadilhas do
modelo neoliberal, que não o deixa adotar medidas desenvolvimentistas,
submetendo o país ao arcabouço-calabouço fiscal ultraneoliberal.
O comprometimento do
governo com um teto de gasto neoliberal seria verdade absoluta que não possa
ser discutida, à luz de novos acontecimentos emergentes com a vitória trumpista
e perigos de ameaça à economia brasileira?
Poderia ou não, por
exemplo, existir ajuda financeira do BRICS ao governo para aumentar os
investimentos e enfrentar dívidas financeiras de caráter meramente
especulativo, como é o endividamento federativo em termos amplos?
Suponha-se que o Banco
BRICS, dirigido pela ex-presidenta Rousseff, assegure empréstimos para Lula
enfrentar o ajuste fiscal: o resultado poderia ou não ser a imediata queda da
taxa de juros e aumento dos investimentos?
Muda ou não a
expectativa da economia se o governo, como prognostica o jornal Le Monde,
recorrer financeiramente à China para respirar aliviado diante do sufoco
imposto pelo arcabouço fiscal pelos credores/Faria Lima?
Permitiria ou não a
injeção de dinheiro novo na circulação capitalista brasileira para impulsionar
a demanda global mediante inflação sob controle, invertendo o diagnóstico do
Banco Central Independente neoliberal de que economia aquecida produz inflação
irreversível?
A “verdade” ortodoxa é
uma, e a heterodoxa é outra.
Os rentistas perderiam
ou não o discurso para o BRICS-Sul Global se novos investimentos fossem
alavancados por empréstimos chineses que os bancos americanos negam ao Brasil
para o desenvolvimentismo, salvo para refinanciar dívidas a juros altos,
anti-produção, anti-desenvolvimento, anti-nacionalismo?
XI JINPING
NA ÁREA
A China, cujo
presidente Xi Jinping estará no Brasil nos próximos dias, interessar-se-ia ou
não pelo desenvolvimentismo brasileiro, que elevaria a capacidade de consumo
interno para dinamizar a indústria chinesa que busca mercado em toda a América
Latina, nesse momento?
O cacife político de
Lula para dar novo rumo à economia, fugindo da tirania financeira da Faria Lima
e dos fundos financeiros internacionais, poderia ou não crescer se o Banco
BRICS abrir crédito barato ao Brasil para tocar as atividades produtivas?
Mudariam ou não as
perspectivas do arrocho fiscal para um novo espaço fiscal desenvolvimentista
nacionalista na linha cooperativa do Sul Global?
Essa arma fortalece ou
não Lula e a aliança de centro-esquerda, virando o jogo relativamente ao
centro-direita, que teve vitória parcial nas eleições municipais?
O centro-direita teria
a ganhar, em termos eleitorais, se tivesse de administrar um teto de gasto
neoliberal antidesenvolvimentista?
Por isso, os
conservadores querem que o estrangulamento financeiro do governo Lula continue
sob o arcabouço-calabouço neoliberal, para que as chances lulistas para 2026
desapareçam do mapa.
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A volta de Trump, a
tirania autorizada. Por Tereza Cruvinel
Há uma diferença entre
esta eleição de Trump e a de 2016: desta vez, a maioria dos americanos o
elegeram sabendo perfeitamente quem ele é. E deram de fato a ele um poder sem
precedentes, como se dissessem numa grande hashtag no X de seu amigo Musk: eu
autorizo.
Autorizam o populismo
autoritário e o racismo, a xenofobia e a deportação em massa de imigrantes, o
negacionismo climático e a volta da delinquência ambiental, o negacionismo
sanitário e a sonegação das vacinas, o boicote ao multilateralismo, a perseguição
dos adversários e até o abandono dos aliados, como a Europa e sua Otan. Desta
vez, tudo foi dito e bem ouvido.
Em 2016, Trump era de
fato um outsider do sistema político, um rico empresário e homem de mídia que
um dia anunciou, nas escadarias de sua torre em Nova York, que iria disputar a
presidência. Muitos talvez não soubessem mesmo quem ele era e o que significava.
Votaram nele porque eram republicanos, simpatizaram com ele ou tinham antipatia
pela democrata Hillary Clinton.
Agora o elegeram e
empoderaram tanto, sabendo que ele atentou contra a democracia quando perdeu
para Biden em 2020 e articulou o 6 de janeiro. Sabendo que já foi condenado
criminalmente uma vez e responde a três processos. Sabendo que, se perdesse
agora, poderia haver outra tentativa de insurreição.
O poder que lhe deram
agora inclui a maioria nas duas casas parlamentares, fora a maioria
conservadora na Suprema Corte, formada pelas três indicações que ele fez no
outro mandato.
Do alto de seu ego,
cavalgando este poder como um novo Poseidon, Trump II trará tempestades com
grande poder destrutivo, mudanças importantes na geopolítica global, na
economia e no comércio internacional, com o recrudescimento do protecionismo e
a imposição de tarifas a produtos estrangeiros.
Ditadores nem sempre
chegam ao poder por golpes de Estado. Muitas vezes usam a democracia como
escada. De alguma forma, esta eleição de Trump lembra a de julho de 1932 na
Alemanha, em que o partido nazista teve uma grande vitória. Foi o mais votado
(37%) embora não tenha feito a maioria no Parlamento. Em janeiro, após meses de
instabilidade, Hitler foi nomeado chanceler. Daí para virar ditador foi um
passo, e o resto nós sabemos.
Para nós, aqui na
América do Sul, tão desimportante para a política externa americana, Trump pode
significar o fortalecimento da extrema direita na região. Milei na Argentina e
Bolsonaro no Brasil estão eufóricos. O argentino acha que seu governo desastroso
pode ser salvo por Trump. Bolsonaro e os seus acham que ele poderá livrá-lo da
inelegibilidade para poder concorrer em 2026. Ilusão. Para isso acontecer nosso
Judiciário teria que dobrar o joelho e renegar a soberania.
Muitos sofrerão com a
volta de Trump, mas estou pensando mesmo é nos palestinos de Gaza. Trump pode
acabar com a guerra na Ucrânia para livrar-se de seu custo, mas no Oriente
Médio nada fará pela paz ou a criação do segundo Estado. Netanyahu terá sinal verde
para avançar com seu genocídio rumo à limpeza étnica que é seu real objetivo.
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Trump e o salto para o
abismo. Por Florestan Fernandes Jr
As semelhanças entre
Hitler e Donald Trump vão além da ideologia de extrema-direita. As estratégias
políticas e de comunicação são as mesmas.
Em novembro de 1923,
portanto há cem anos, Adolf Hitler liderou uma marcha malsucedida para derrubar
o governo do Estado da Baviera.
Pelo crime de alta
traição, Hitler foi condenado a cinco anos de prisão, mas cumpriu apenas um.
Resultado: livre para
organizar o partido nazista, Hitler chegou ao poder como Chanceler em 1933 e
ditador no ano seguinte.
Já Donald Trump sequer
chegou a ser julgado por sua atuação na invasão do Capitólio, em janeiro de
2021.
Livre, com muito
dinheiro e o apoio do dono do X, Elon Musk, Trump continuou sua cruzada de
extrema-direita e agora consegue o feito de ser reeleito nos EUA, com uma
votação robusta. Se será um ditador nos moldes de Hitler, só o tempo dirá.
O que me parece mais
temeroso é que Trump, aos 78 anos, é um homem bilionário, poderoso, narcisista
(portanto egocêntrico) que pode e provavelmente trará prejuízos irremediáveis
ao futuro das democracias e do meio ambiente. Ou seja, os danos, em escala
global, são existenciais.
Infelizmente, esse é o
espírito do tempo que vivemos e, diante desse fato, além do lamento, nos cabe a
reflexão.
Penso que algo de
muito caro nos sonhos e nas mentes das pessoas foi quebrado nas últimas
décadas. Culpar as redes sociais, as fake news, é uma tentação simplista, na
qual quem realmente deseja compreender os fatos não pode incorrer. As
democracias falharam em algum ponto nevrálgico. É indispensável uma reflexão
séria, responsável, sem terceirização de responsabilidades.
Dito isso, há outro
ponto muito importante no contexto que discuto aqui: a impunidade daqueles que
corroem abertamente o estado democrático de direito. Como bem me lembrou
Alfredo Attié durante a apuração dos votos nos EUA: “O grande responsável pela
reeleição de Trump é a Justiça norte-americana, em sua omissão e lentidão de
responsabilizá-lo pela tentativa de golpe. O mesmo pode acontecer aqui, com uma
Justiça que é ainda menos independente.” Attié tem toda razão.
Aqui em nossas bandas,
dois anos após a descoberta da minuta do golpe e dos atos terroristas em
Brasília, ninguém da alta cúpula do governo Bolsonaro foi sequer indiciado. A
punição só veio para aqueles desvairados que destruíram as sedes dos três
poderes. Ou seja, no mar de golpistas, os tubarões seguem nadando livremente.
Igualmente livres
estão Bolsonaro e sua trupe quanto aos crimes de falsificação da caderneta de
vacinação e a venda das joias sauditas.
Isso sem falar no
processo que investigava a responsabilidade de Bolsonaro durante a pandemia de
Covid-19. Esse crime de proporções gigantescas, que ceifou a vida de tantos
brasileiros, não pode cair no esquecimento.
Lembro aqui que, em
janeiro de 2024, Gilmar Mendes determinou que o procurador-geral da República,
Paulo Gonet, reavaliasse a conduta e as omissões de Bolsonaro durante a
pandemia. Até agora, nada.
Fomos deixando passar
tudo, desde a carnificina que foi a Covid, até as ameaças abertas e
sistemáticas de golpes de Estado com a participação de militares.
É certo que teremos
pressão do novo-velho governo dos EUA contra as democracias comandadas por
progressistas. O fortalecimento dos regimes autocráticos de extrema-direita
está no horizonte, só que agora em um mundo muito mais complexo e destrutivo
que o do século passado.
Basta um arroubo de
fúria de um dos líderes fascistas para pôr a humanidade a perder. Tamanha é
nossa distopia cotidiana, que me ponho a pensar que talvez, até nessa fatídica
hora, pipocarão influencers anunciando e exibindo, em tempo real, nas redes, o mundo
se despedaçando, o fim dos tempos.
Na minha ressaca
reflexiva, pós-eleição estadunidense, parafraseio o astronauta Neil Armstrong:
os eleitores nos Estados Unidos deram um pequeno passo em direção ao passado,
mas um grande salto para o abismo.
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Marcia Carmo: ‘Trump -
euforia de Milei, cautela de Petro e preocupação cubana’
O presidente da
Argentina, Javier Milei, comemorou quase como própria a eleição de Donald Trump
à Casa Branca. Até às 15h20 desta quarta-feira, Milei tinha tuitado e retuitado
na rede social X (ex-Twitter) 43 mensagens para seus 3,5 milhões de seguidores.
A conta é administrada por ele mesmo. Entre as postagens, o presidente
argentino aparece como um leão, abraçando um sorridente Trump. O felino e a
motosserra, que explicita os cortes no Estado, foram os símbolos da campanha de
Milei à Casa Rosada.
Num rápido encontro
com o americano, no início do ano, o argentino lhe disse que torcia pelo seu
retorno à Presidência dos Estados Unidos. Milei agora pretende ser um dos
primeiros a desembarcar em Washington para a posse de Trump em janeiro do ano
que vem. “Parabéns por sua incrível vitória eleitoral. Você sabe que pode
contar com (o apoio) da Argentina. Parabéns e bênçãos”, escreveu no X. Milei
ainda acrescentou o slogan de Trump: ‘Make America Great Again’ (MAGA).
Milei também tentava,
nesta quarta-feira, ser um dos primeiros presidentes a falar, telefonicamente,
com Trump. O argentino é fã do ex-presidente e o bajulou, ostensivamente,
naquele encontro, em fevereiro em Maryland. Ele também é fã do empresário Elon Musk,
que participou, saltitante, do palanque de Trump e anunciou a distribuição de
um milhão de dólares, por dia, aos eleitores. Milei e Musk, que já tiveram três
encontros pessoalmente, se falaram nesta quarta, logo cedo. O argentino espera
que a Argentina conte com apoio dos Estados Unidos para receber investimentos e
novos recursos do FMI – atualmente, o país já está pendurado numa dívida
bilionária adquirida na gestão do ex-presidente Macri. É preciso ver se esse
apoio eufórico de Milei será traduzido em resultados reais para seu país. Hoje
os títulos públicos da Argentina dispararam. A euforia de Milei e do mercado
financeiro é oposta, por exemplo, à atitude de Gustavo Petro, o primeiro
presidente de esquerda na história da Colômbia. “O povo estadunidense expressou
sua vontade e ela deve ser respeitada. Parabéns Trump pela vitória”. Mas, em
seguida, ressalvou, recordando as bandeiras agressivas do americano contra a
imigração (e promessa de deportações em massa) especialmente dos
latino-americanos : “A única maneira de fechar fronteiras é com a prosperidade
dos povos do sul e o fim dos bloqueios”. Com a eleição de Trump, o fim do
bloqueio econômico contra Cuba, que já dura mais de seis décadas, parece mais
distante. A preocupação com o aquecimento global (que Trump e Milei negam)
entra em terreno mais delicado ainda. E muitos estarão de olho no papel da
China, principalmente na nossa América Latina.
Fonte: Brasil 247
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