Precariado: a
esquerda permanece à distância
Vivemos
uma mudança de período histórico em escala global. O acirramento dos conflitos
sociais a partir de 2008 não dizem respeito apenas à crise mas também à
profunda reestruturação produtiva provocada pelos avanços tecnológicos e à
emergência da China como nova potencia global rivalizando com os EUA.
O
posicionamento da China como principal plataforma industrial do mundo e o
deslocamento de parte das indústrias do Ocidente para a Ásia, acompanhada da crescente
robotização da produção, extinguiram empregos industriais de melhor remuneração
em larga escala na Europa, EUA e em polos industriais da América Latina.
Milhões de operários perderam seus empregos, seja por verem suas fabricas
deslocadas para a Ásia, seja pela reestruturação produtiva que tornou suas
funções obsoletas. Este é um processo irreversível com fortes consequências
sociais e políticas. Para gerações de trabalhadores que pensavam ter saberes e
profissões garantidas para toda a vida, o futuro carrega uma enorme
insegurança. Suas referências e seu mundo desmoronaram. Revolução digital,
automação ou segunda idade da máquina são alguns nomes dados ao processo. Ainda
em estágios incipientes, novos instrumentos da produção material escapam à lógica
industrial e geram resultados ao mesmo tempo promissores e devastadores.
A
expansão tecnológica prevista para os próximos anos inclui um crescimento
exponencial da capacidade de armazenar e processar gigantescas bases de dados.
Não por acaso, rankings recentes das empresas mais valiosas do mundo são
encabeçados por empresas movidas por dados gerados pelos usuários. Para além de
alimentar a indústria mais lucrativa da atualidade, dados, algoritmos, suas
ciências, tecnologias, usos e aplicações oferecem possibilidades para melhorar
a vida pública e privada, ao mesmo tempo que implicam riscos substanciais. A
nova ordem levanta desafios éticos sobre os quais avançamos a passos lentos,
enquanto seus potenciais mercadológicos vêm sendo explorados a toque de caixa.
Neste contexto, prevalece o modelo batizado de “winners take all” no qual as
gigantes tecnológicas não apenas dominam o mercado, mas eliminam as
possibilidades de competição. Se este processo não for revertido, as
corporações moldarão em breve as necessidades e desejos de consumo dos
trabalhadores.
A
crise de 2008, cujas reverberações se fazem sentir até agora, foi catalisadora
das insatisfações. Na Europa, o crescimento da extrema direita é baseado na
promessa da volta a um passado mítico. Ao localizar no estrangeiro a culpa da
decadência, seja na figura dos imigrantes, seja nas instituições multilaterais,
ela consegue ganhar base social nos antigos cinturões industriais. Nos EUA,
Trump vence a eleição melhorando significativamente seu desempenho nos velhos
estados industriais, tradicional bastião Democrata. Na Inglaterra, o Brexit
vence o plebiscito manipulando também a ideia abstrata de volta a um passado
glorioso que estaria sendo destruído pelos imigrantes e pela União Europeia.
Os
desdobramentos até o momento da crise econômica sugerem que ainda estamos longe
de sua superação. Se, no século XX, crises foram seguidas pela expansão de
direitos civis e ganhos econômicos, desde 2008 assistimos a um processo veloz
de desmanche de redes de proteção social. As novas gerações que ingressam no
mercado de trabalho são contratadas em condições que não lhes dão acesso a
direitos trabalhistas já conquistados. A hipótese de uma futura recuperação
econômica que seja revertida em empregos é improvável, já que uma parcela
considerável destes deve ser substituída por máquinas e mecanismos de
inteligência artificial. É previsto que as novas ocupações a serem criadas
sejam numericamente inferiores aos postos de trabalho destruídos e que elas
exijam qualificações ainda inexistentes.
O
impacto da reestruturação produtiva se estende ao setor de serviços. Nele, a
automação possibilita eliminar milhões de empregos através da terceirização do
trabalho para os usuários, agora de forma não remunerada. Movimentações
bancárias feitas em aplicativo de celular eliminam milhares de empregos e
transferem para os correntistas o trabalho mais simplificado. O ensino à
distância reduz a demanda por professores, plataformas online de vendas
eliminam gradualmente o comércio de rua, serviços médicos passam a ser
automatizados e disponibilizados em aplicativos. É este o cenário que temos
pela frente. Mesmo o ícone deste processo, o Uber, na forma como existe hoje
também tem seus dias contados, uma vez que deve ser substituído por carros sem
motorista.
Do
ponto de vista histórico, a novidade neste processo é a velocidade crescente
das transformações – e isto faz toda a diferença. Trabalho formal é extinto em
massa e milhões de trabalhadores caem na informalidade, no empreendedorismo do
desespero, o que produz também consequências políticas. Os aparatos construídos
pela esquerda a partir da Revolução Industrial, em particular os sindicatos,
perdem capacidade de diálogo com este enorme contingente das classes
trabalhadoras.
A
“flexibilização” das relações de trabalho, o enfraquecimento das organizações
sindicais e as novas tecnologias digitais têm produzido novas formas de ação
coletivas descentralizadas. A exemplo da greve dos caminhoneiros ocorrida em
2018, novas formas de organização são marcadas por horizontalidade e
ambiguidades, desafiando assim as hierarquias da luta política tradicional.
Enquanto na sociedade industrial operários se concentravam nas fábricas numa
lógica que favorecia a solidariedade, a sociedade digital estimula a
contratação personalizada dos serviços produzindo, por consequência, o
isolamento dos trabalhadores e uma força de trabalho marcada pela
heterogeneidade.
A
característica autônoma e individual do trabalho precário, a ausência de
vínculos coletivos e de compartilhamento dos mesmos espaços dificultam a
formação da consciência de classe, assim como as formas de inserção no processo
produtivo cada vez mais variadas e o acesso à renda cada vez mais diferenciado.
O sentido de pertencimento a grupo sociais, no entanto, continua presente. No
vácuo dos aparatos organizados pela lógica de classe, crescem as igrejas
evangélicas e nacionalismo, mas também crescem os movimentos feministas,
negros, de defesa de direitos dos povos indígenas e da população LGBTQ+.
O
que está em disputa hoje é a apropriação dos enormes ganhos de produtividade
gerados pela tecnologia. Estes ganhos de produtividade têm sido apropriados de
forma extremamente desigual, concentrando renda no topo e pauperizando setores
médios. Este é o cenário de radicalização do conflito. O espaço para os
arranjos negociados entre a direita liberal e a social democracia terminou. A
ascensão de uma extrema direita neofascista é um fato. A constituição de uma
esquerda capaz de disputar o precariado e se constituir em alternativa de poder
é uma possibilidade.
Brasil vive transição demográfica que
impactará políticas públicas, diz professor
Após
a divulgação do Censo 2022, é possível apontar que a queda da média de
moradores por domicílio registrada é fruto da “transição demográfica” pela qual
o Brasil passa.
É
o que explica o professor da UFMG e membro da Comissão Consultiva do Censo
2022.
“Essa transição é caracterizada pela redução
da natalidade e mortalidade”, disse, à CNN Rádio.
De
acordo com o demógrafo, “está em processo um grande processo de envelhecimento
da população”, com idosos com autonomia de saúde e financeira.
“Eles
vivem em domicílios menores ou só com o cônjuge, então o número de pessoas por
domicílio neste grupo etário diminui.”
Da
mesma forma, outra causa é a redução do número de filhos e mesmo a separação de
casais.
“Temos
essas várias tendências demográficas diferentes que apontam para essa queda de
moradores por habitação.”
Ao
mesmo tempo, o professor aponta que o envelhecimento da população vai continuar
acontecendo e, com ela, virão desdobramentos.
“O
Censo materializa aquilo que já sabíamos na teoria: populações dos municípios
vão começar a decrescer, até antes de 2040, com cidades diminuindo de tamanho.”
Este
cenário “traz consequências para a oferta de serviços e transferência de recursos
para os municípios, por exemplo.”
“Até
que todo o país, na média, decresça concomitantemente ao envelhecimento da
população, que traz efeitos sobre a previdência, e serviço de saúde”,
completou.
Paralelamente,
porém, há certo reequilíbrio das políticas públicas, já que a “redução da
população infantil tende a facilitar essas políticas para o público jovem, como
transferência de renda e educação”.
Fonte:
Por Cristina Marins e José Luís Fevereiro, em Outras Palavras
Nenhum comentário:
Postar um comentário